Entrevista

José Dirceu: governo Lula tem política ambiental consistente

25 de novembro de 2003

O exercício de governar requer decisões que agradam a uns e desagradam a outros, mas que sejam pelo bem do País

Folha Meio – O deputado Gabeira saiu do PT e esse fato levantou a questão da política ambiental do governo. Existe possibilidade de mudanças na política ambiental?

Ministro José Dirceu – Não. O governo tem uma política ambiental consistente. Veja que a ministra Marina tem o comando dessa política ambiental, o país precisa e deve regulamentar a questão dos transgênicos, para não cair na ilegalidade, como está acontecendo.

O presidente Lula determinou e a ministra Marina Silva está coordenando um grupo de trabalho interministerial – é a primeira vez que isso acontece – com relação ao desmatamento da Amazônia. Existe um projeto, que está sendo elaborado de comum acordo com os governadores da Amazônia, com os parlamentares, com as ONGs, com relação ao desenvolvimento sustentado da Amazônia. A verdade é que há uma política bem clara no governo com relação ao meio ambiente.

Nós não só vamos defender o meio ambiente, o desenvolvimento sustentável, como vamos dar condições ao Ministério do Meio Ambiente para o fazer. E não se devem tomar decisões de emergência. Faltou álcool no país, no ano passado e nós diminuímos de 25% para 20% a participação do álcool na gasolina. O Brasil teve que cumprir uma decisão do Mercosul, do tribunal arbitral e estamos importando 600 mil pneus do Uruguai, o que é uma quantidade insignificante. Mas isso não significa que o Brasil vá autorizar no país uma produção que ataque o meio ambiente de pneus usados.

Então, não podemos tomar medidas de exceção com a prática atentatória ao meio ambiente e muito menos passar a idéia para a opinião pública de que o governo vai submeter o meio ambiente ao desenvolvimento econômico e social.

Pela primeira vez, o Ministério de Minas e Energia, o BNDES e o Ministério do Meio Ambiente trabalham juntos para liberar ou projetos ou recursos para as obras hidrelétricas, o que mostra a atenção do governo à questão do meio ambiente. Vou deixar bem claro: todas as obras de hidrelétricas e termoelétricas do país, hoje, são submetidas à gestão conjunta. E a ministra Marina Silva é ouvida.

Nós estamos procurando criar, em todas as situações, termos de ajuste de conduta, onde o Ministério Público tem presença, para evitar a degradação, o ataque ao meio ambiente nas obras públicas. Isso está sendo feito, inclusive, com relação à transposição de águas para a Bacia do Rio São Francisco.

Nós não só vamos defender o meio ambiente, como vamos dar condições ao Ministério do Meio Ambiente para o fazer.

FMA – E o caso dos transgênicos? O governo tem uma solução definitiva?

José Dirceu – Veja, o projeto de lei da biossegurança depende de uma decisão final do presidente da República, ele está pronto e será enviado ao Congresso Nacional. Todos os ministérios já foram ouvidos, houve debates junto com a sociedade. Pode haver discordância e divergência, mas o debate no governo foi longo, foram meses, envolveu todos os ministérios afins e houve participação da sociedade, e no Congresso Nacional haverá audiências públicas. Então, haverá, democraticamente, um debate no país sobre a questão de um sistema nacional de biossegurança.

Quem autoriza ou não a pesquisa e o plantio de uma determinada variedade de sementes são instituições que existem no país.

No Conselho Nacional de Biotecnologia, haverá um órgão consultivo da sociedade e também um conselho de ministros. Quem faz o licenciamento ambiental é o Ibama, da mesma maneira que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) dá o seu parecer técnico sobre os aspectos da saúde pública e da mesma maneira que a agricultura dá o seu parecer técnico.

O país já tem o princípio da precaução da Constituição e não se pode pesquisar ou autorizar o plantio no Brasil de organismos geneticamente modificados sem licenciamento ambiental.

O Brasil já é signatário do Protocolo de Cartagena(1) da precaução e já tem uma legislação sobre rotulagem, para proteger o consumidor, que pode adotar a decisão de comprar ou não um produto transgênico.

O que aconteceu foi que nós encontramos uma safra colhida de sete e ou oito milhões de toneladas de soja, autorizamos a sua venda e agora autorizamos o plantio da soja, que há sete anos já vem sendo plantada no Rio Grande do Sul de maneira ilegal, mas a legislação é o Congresso que vai decidir.

GLOSSÁRIO
(1) Acordo de Cartagena – No dia 11 de setembro de 2003, entrou em vigor o Protocolo de Cartagena, o primeiro acordo internacional que rege a transferência, o manejo e o uso de organismos geneticamente modificados. O acordo visado uso seguro de transgênicos. Adotado em 2000, pelos membros da Convenção sobre Diversidade Biológica, o tratado busca um comércio internacional de transgênicos mais transparente, com medidas de segurança de acordo com as necessidades dos consumidores, das indústrias e sobretudo do meio ambiente. O objetivo do protocolo e descartar os potenciais conflitos entre as leis de comércio e o regime de biossegurança global.