Sabiá ou Ararajuba?

A polêmica da Ave Nacional continua

29 de janeiro de 2004

Cartas, e-mails e telefonemas continuam chegando à redação da Folha do Meio Ambiente,


Carta
Dirijo-me a vocês para solicitar informações sobre a eleição para ave-símbolo do Brasil, cujo resultado foi divulgado pela Folha do Meio Ambiente (Edição 129). Como membro-fundador da Sociedade Brasileira de Ornitologia e incansável batalhador pela causa da ciência, forço-me a uma manifestação em torno desse tema. Preciso, antes de tudo, ressaltar que considero inaceitável uma proposta como essa, tendo sido articulada sem um mínimo de participação da comunidade de cientistas que integram a ornitologia brasileira. É natural que uma ave-símbolo deva representar os anseios da sociedade. Entretanto, não há como desconsiderar a opinião do meio científico, sob o risco de que a escolha não condiga com o panorama do País. Afirmo isso – até com ar de indignação – porque é projeto, capitaneado há décadas pelo falecido prof. Helmut Sick, de que nossa ave-símbolo fosse a ararajuba. A proposta desse grande cientista correu os vários degraus da política e de nossos legisladores, mas até o momento não encontrou eco. Gostaria de saber de vocês dos critérios utilizados para essa enquete bem como qual o segmento da sociedade para o qual essa pesquisa foi direcionada.
Ao eleitor – representante de uma população que dispõe de internet – restou escolher o único pássaro que o agrada nas manhãs urbanas com um canto elaborado, o marrom sabiá-laranjeira, espécie comum em grande parte do Brasil, mas também em vários outros países da América do Sul.
Afinal de contas, quem sabe que o nosso poeta Gonçalves Dias, em seu famoso “Canção do Exílio”, referir-se-ia ao “sabiá-laranjeira” e não a alguma outra espécie mais provável pela situação geográfica e ambiental, tal como ventilado na literatura ornitológica?
Fernando C. Straube
[email protected]


Caro Fernando Straube
Respondendo sua carta, acho que antecipo a resposta de colegas seus como dr Mauro Galetti, prof. Roberto B. Cavalcanti, da UnB, e da bióloga Carolina, cujas cartas serão publicadas na próxima edição. Em primeiro lugar, obrigado pelo email. Como jornalista não filiado a nenhum tipo de associação ou organização ornitológica, fiz uma reportagem para a Folha do Meio Ambiente sobre Aves Nacionais de diversos países. E constatei que não havia uma Ave Nacional do Brasil. Na reportagem eu disse claramente que havia um grupo de ornitólogos que defendia a ararajuba e outro grupo que defendia o sabiá. Por isso, na nossa página da internet, coloquei uma enquete para o leitor opinar. Com foto do sabiá e da ararajuba. Apenas isso e nada mais. Foi uma matéria jornalística. Não sou eu que vou levar o decreto ao Palácio do Planalto, não tenho responsabilidade burocrática e nem política sobre o tema.
Depois de fazer uma pesquisa na música popular brasileira, na literatura e pelos comentários dos votantes na internet, eu confesso que senti o sabiá muito mais próximo do povo brasileiro. A enquete foi livre, democrática, aberta para quem quisesse votar. Se alguém concorda ou não concorda, o que posso fazer?
Aceito suas ponderações, mas não aceito o patrulhamento. Mais uma vez, gostaria de dizer que falei sobre Ave Nacional (ave que representa o espírito, a alma, a cultura brasileira) e não sobre Ave Símbolo.
O jornal está à sua disposição para escrever sobre o tema. Ficaremos na maior alegria. Mais uma vez, obrigado.
Silvestre Gorgulho

Sabiá, Ave Nacional do Brasil

29 de janeiro de 2004

Fernando Henrique Cardoso assina decreto atendendo exposição de motivos de três ministros de Estado que cita Folha do Meio Ambiente

Agora é oficial. Minha terra tem palmeiras, tem 1.677 espécies de aves e tem o Sabiá como Ave Nacional. O presidente Fernando Henrique Cardoso, atendendo exposição de motivos dos ministros Euclides Scalco, Secretário Geral da Presidência da República, do ministro Paulo Renato, da Educação, e do ministro José Carlos Carvalho, do Meio Ambiente, assinou dia 03 de outubro, decreto fazendo do Sabiá (Turdus rufiventris) o mais novo símbolo nacional oficial, representando a fauna ornitológica brasileira. O decreto que regulou o assunto, assinado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e publicado pelo Diário Oficial da União no dia 04 de outubro (seção 1, página 35) revoga o decreto 63.234, de 12 de setembro de 1968, mas mantém as comemorações do Dia Nacional da Ave, com cunho eminentemente educativo, no dia 5 de outubro. E escolhe o Sabiá como centro destas festividades. O Sabiá – turdus rufiventris foi a espécie escolhida pela popularidade que exerce na cultura e no folclore brasileiros. A sugestão inicial partiu da Associação de Preservação da Vida Selvagem, presidida por Johan Dalgas Frisch, e que tem como diretores os jornalistas Rogério Marinho e Ciro Porto. Em 1987, no governo José Sarney, o Sabiá passou perto de se tornar a Ave Nacional. Um erro de redação no decreto, assinado pelo então ministro da educação, Jorge Bornhausen, acabou atrapalhando: o nome científico da ave – Turdus rufiventris – não foi citado.

Sabiá, ajude a salvar a Ararajuba


Mônica Koch (*)
No dia 03 de outubro, o Brasil ganhou sua Ave Nacional, de acordo com decreto publicado pelo presidente da República. O decreto presidencial prevê como centro de interesses para as festividades do Dia da Ave (05 de outubro de cada ano), o Sabiá Turdus rufiventris, como símbolo representativo da fauna ornitológica brasileira.


Concordo com a escolha do Sabiá-laranjeira como Ave Nacional do Brasil, corroborando com todas as manifestações já divulgadas nas edições da Folha do Meio Ambiente. Gostaria de destacar um fato: o Sabiá é uma ave que está por toda parte. Está nas matas, nos parques, nos quintais, terreiros e até dentro das cidades, onde exista um mínimo de arborização. Assim, a espécie tem uma ampla distribuição geográfica e, por isso mesmo, é fácil buscar o engajamento das pessoas, especialmente das crianças, na luta pela preservação ambiental. Todo mundo já viu e conhece o canto do Sabiá. Se entrarmos numa sala de aula e perguntarmos para a criançada: quem conhece uma música ou uma poesia com o nome de Sabiá? Não há quem não levante a mão. O Sabiá pode dar mil argumentos para uma bela aula de educação ambiental. Pela forte presença na literatura e no cancioneiro popular brasileiro, o Sabiá é uma ave que está sempre na cabeça das pessoas de Norte a Sul do Brasil. Por isso, independentemente de raça ou de poder aquisitivo de quem defende seu status de ave símbolo, o Sabiá bem que pode ser utilizado como bandeira para a sensibilização das pessoas, conscientizando cada uma do seu papel para maior e melhor conservação do meio ambiente.


E o que dizer da Ararajuba? Essa belíssima ave verde-amarela tão admirada e também super cobiçada pelo mercado? Infelizmente, a beleza e o alto valor comercial da Ararajuba estão comprometendo a sobrevivência da espécie, por ser presa fácil na mãos de traficantes e contrabandistas. Em processo de extinção, a Ararajuba precisa de apoio. E não com títulos apenas, mas um apoio efetivo para impedir seu processo de extinção. Acho importante ressaltar que ambas as aves, o Sabiá e a Ararajuba, são queridas dos brasileiros. E o fato do Sabiá ser a Ave Nacional, não impede – aliás até obriga – que os órgãos ambientais e as entidades não-governamentais tenham um carinho especial pela Ararajuba. É grande a nossa responsabilidade pela proteção da espécie. Trata-se de uma espécie que possivelmente já enfrenta problemas de variabilidade genética da população existente na natureza, mas que ainda apresenta possibilidades de recuperação. Não há tempo a perder. É dar as mãos e agir. Até o Sabiá pode ajudar.
(*) Mônica Koch é bióloga, ex-Cemave e atual coordenadora de Projetos da Renctas
[email protected]


A Exposição de Motivos dos ministros ao Presidente da República cita a enquête feita pela Folha do Meio Ambiente


Esta é a íntegra da Exposição de Motivos ao Presidente Fernando Henrique Cardoso:


Excelentíssimo Senhor Presidente da República,


Temos a honra de submeter à elevada consideração de Vossa Excelência proposta de Decreto Visando alterar o Decreto nº 63.234, de setembro de 1968, que institui o “Dia da Ave Nacional”, com o objetivo de criar um centro de interesse definido para as comemorações dessa data e, para tal, designar o Sabiá (Turdus Rufiventris) como representativo da fauna ornitológica brasileira.


A sugestão que acolhemos foi encaminhada pela “Associação de Preservação da Vida Selvagem”, filiada à entidade internacional de proteção da fauna e da flora que teve como presidentes: Embaixador Assis Chateaubriand, Amador Aguiar, Omar Fontana e, atualmente Johan Dalgas Frisch.


Justifica-se a escolha do Sabiá, considerando sua presença em todo Território Nacional e por ser, dentre as aves, a mais inspiradora e, conseqüentemente, a mais aclamada e decantada pelo sentimento popular e cultural.


Além do mais, Senhor Presidente, em enquete promovida pelo jornal especializado “Folha do Meio Ambiente”, o Sabiá obteve 91,7% dos votos, confirmando, assim, o desejo popular de elegê-lo a “Ave Nacional do Brasil”.


Respeitosamente,


EUCLIDES GIROLAMO SCALCO
Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República 
PAULO RENATO DE SOUZA
Ministro de Estado da Educação 
JOSÉ CARLOS CARVALHO
Ministro de Estado do Meio Ambiente


O Decreto


O Decreto publicado no Diário Oficial de 04 de outubro de 2002:


ATOS DO PODER EXECUTIVO


DECRETO DE 3 DE OUTUBRO DE 2002


Dispõe sobre o “Dia da Ave” e dá outras providências.


O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso II, da Constituição,


D E C R E T A:


Art.1º O “Dia da Ave”, instituído pelo Decreto nº 63.234, de 12 de setembro de 1968, será comemorado no dia 5 de outubro de cada ano.


Art.2º O centro de interesse para as festividades do “Dia da Ave” será o Sabiá (Turdus Rufiventris), como símbolo representativo da fauna ornitológica brasileira e considerada popularmente Ave Nacional do Brasil.


Art.3º As comemorações do “Dia da Ave” terão cunho eminentemente educativo e serão realizadas com a participação das escolas e da comunidade.


Art.4º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.


Art.5º Revoga-se o Decreto nº 63.234, de 12 de setembro de 1968.


Brasília, 3 de outubro de 2002; 181ºda Independência e 114º da República.


FERNANDO HENRIQUE CARDOSO 
Paulo Renato Souza 
José Carlos Carvalho 
Euclides Scalco


“A escolha do Sabiá como Ave Nacional foi a melhor. O Sabiá é muito popular e bem
conhecido por seu canto maravilhoso. Este canto bem variado ilustra a alma brasileira: alegre ou cheia de saudade” 

Jacques Vielliard – Academia Brasileira de Ciências e professor da Unicamp


A majestade o Sabiá
Família Turdidae






















Sabiá-laranjeira 
Turdus rufiventris
Rufous-bellied Thrush

Por Andreza Amaral (*)
Os Sabiás são aves pequenas, variando entre 17 e 25 cm, pertencentes ao grupo dos passeriformes. Estão presentes no mundo inteiro, nas capoeiras, cerrados e beiras de mata, e freqüentam fazendas e habitações rurais do interior, onde costumam fazer seus ninhos nos pomares. Sempre realizam migrações em grande escala, à procura de regiões mais quentes na época de inverno, voltando para casa quando a temperatura esquenta.

Em geral, têm plumagem pouco chamativa, destacando-se apenas o colorido da garganta, principalmente quando ele canta ou estica o pescoço, e a coloração do bico quando estão em fase de acasalamento, que fica com um tom mais forte, sendo os machos e as fêmeas muito parecidos.


O canto do Sabiá é muito admirado. Lembra o som de uma flauta. Seu canto é sempre mais belo nas matas, perdendo seu brilho nas cidades grandes. O macho canta mais quando quer encontrar uma namorada, já as fêmeas são mais caladas. Há espécies capazes até de imitar outras aves, como o carachué-de-bico-amarelo, do oeste do país.


São importantes na disseminação de sementes, especialmente de palmeiras, comendo os coquinhos e cuspindo as sementes depois de quase uma hora, além de adorarem frutas de um modo geral, não dispensando uma suculenta aranha, ou até mesmo vermes e pequenos moluscos.


São aves muito ativas, gostam de pular, correr no solo, virar folhas na mata, sacodem a cauda, tornando-se mais inquietos à tardinha, quando voam em redor da área onde pretendem dormir, emitindo vozes de chamada e advertência, na disputa de melhor lugar para empoleirar-se. São muito desconfiados e gostam de se esconder. São muito briguentos também, disputando as frutinhas de uma árvore com outros grupos de aves.


Seu ninho é como uma tigela funda, de paredes grossas, às vezes reforçado com barro por fora. É construído solidamente em árvores, tocos, vãos de telhados ou até mesmo em barrancos.


No período quente do ano, a fêmea põe quatro ovinhos verde-azulados com pintinhas cor de ferrugem e os choca por 12 dias, sendo os filhotes cuidados pelos pais até ficarem com 17 dias. Algumas vezes nascem filhotes albinos, especialmente nas cidades, mas estes não têm muita sorte, costumam ser solitários e podem ser facilmente vistos por predadores. Além do homem que o aprisiona, o Sabiá tem outros inimigos naturais, dentre eles alguns mamíferos e até mesmo rãs.


Grande cantor, o Sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris), maior representante deste grupo no Brasil, com cerca de 27cm e pesando até 75g, tem o dorso marrom e a barriga laranja-ferrugem. É a espécie mais famosa e também a mais comum, preferindo viver na mata, em parques, quintais, mas também pode ser encontrado na cidade, perto das casas, desde que tenha arborização.
(*) Andreza Amaral
é bióloga/Poaves



Sabiá-coleira
Turdus albicollis phaeopygus
Gray-flankedThrush
Obs: pertence a espécie albicollis por ter canto semelhante



Sabiá-verdadeiro
Turdus fumigatus
Cocoa Thrush



Sabiá-de-cabeça-negra
Turdus nigriceps
Slaty Thrush



Sabiá-branco
Turdus leucomelas
Pale-breasted Thrush



Sabiá-caraxué
Turdus nudigenis
Bare-eyed Thrush
Obs: a pele em volta dos olhos fica alaranjada na época da reprodução



Sabiá-coleira 
Turdus alb. albicollis
White-necked Thrush



Sabiá-pardo
Turdus amaurochalinus
Creamy-bellied Thrush



Sabiá-poliglota
Turdus lawrenci
Lawrence’s Thrush
Obs: na época da reprodução, apresenta bico amarelado



Sabiá-de-peito-pontilhado
Catharus fuscescens
Veery


O fascínio das Aves

Todo 5 de outubro, para comemorar o Dia da Ave, muitas escolas e associações ecológicas promovem passeios a parques e florestas para observação de pássaros, uma das atividades que mais crescem no ecoturismo. Curtir o vôo de uma ave, apreciar seu canto e fotografar sua plumagem, mais do que o prazer que proporciona é se integrar ao meio ambiente, ajudando formar uma forte consciência ecológica. Neste ano, as comemorações tiveram um sabor especial: no dia quatro de outubro o Diário Oficial publicou decreto do presidente FHC fazendo do Sabiá Laranjeira a Ave Nacional do Brasil.

A Associação Observadores de Aves de Pernambuco (OAP), há 17 anos divulga o gosto pela atividade de observação de aves. Médicos, guias de turismo, biólogos, estudantes, funcionários públicos participaram de atividades de campo desenvolvidas pela OAP em todo o estado. Como já tradição, a OAP comemorou o Dia da Ave no Parque Estadual Dois Irmãos, em Recife, com atividades de observação de aves, onde os novos sócios, adultos e crianças, puderam desfrutar da beleza de várias espécies típicas da área como o Tangará Dançarino (Chiroxiphia pareola). Além disso, foi realizada uma exposição com 50 fotos de aves que ocorrem em Pernambuco, onde existem registradas 499 espécies. Foi uma festa de fotos e de informações sobre uma das diversidades mais belas deste planeta: as aves.