Os grandes eventos do meio ambiente em 2001
13 de fevereiro de 2004Bioterrorismo, Código Florestal, CPI das ONGs, Protocolo de Kyoto, Lei sobre o lixo radioativo, revitalização do São Francisco, projeto saneamento e outros temas controversos adiados para 2002
Janeiro
Resíduos sólidos – A grande notícia, na área dos resíduos sólidos, foi a criação, pela Câmara dos Deputados, de uma Comissão Especial destinada a dar um parecer único nos 52 projetos sobre resíduos, muitos dos quais estão há dez anos em tramitação.
A comissão, composta por 64 deputados de todos os partidos, é presidida pelo deputado José Índio (PMDB-SP) e tem como relator o deputado Emerson Kapaz (PPS-SP) mas não tem prazo para apresentar seu parecer.
Dada a diversidade de assuntos, a comissão decidiu constituir grupos de trabalho com a tarefa de examinar, separadamente, cada um dos temas propostos pelos 52 projetos.
Fevereiro
CPI das ONGs – O Senado criou, em fevereiro, uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI – para investigar a atuação das ONGs no Brasil, especialmente as que recebem recursos do exterior e as que adquiriram terras na Amazônia e no Sudeste.
A CPI ouviu vários depoimentos, mas até agora nada de concreto apurou. Um dos depoentes foi o deputado Sérgio Carvalho, (PSDB-RR) que foi o relator da CPI da Grilagem de Terras na Amazônia, criada na Câmara dos Deputados.
Segundo o parlamentar, a ONG Forever Green adquiriu irregularmente 100 mil hectares de terras na região, enquanto a Associação Amazônia é proprietária, também por aquisição irregular, de 172 mil hectares.
Março
A água em destaque – A água, em especial o gerenciamento desse recurso, foi o grande tema do meio ambiente no ano de 2001. Programas e projetos foram criados no rastro de denúncias sobre o mau uso da água.
Em Brasília, as denúncias envolveram a ação predatória dos condomínios sobre os lençóis freáticos; o surgimento descontrolado dos poços artesianos e a constatação de que, apenas nos dois últimos anos, mais de 600 nascentes do Entorno do Distrito Federal simplesmente secaram, vítimas da ação predatória.
A receita para acabar com um rio é simples: basta uma mistura de desmatamento com ocupação desordenada do solo, deposição de lixo e entulho, escoamento inadequado das águas da chuva e práticas agrícolas inadequadas em suas margens.
Abril
“Novelas”: saneamento e Código Florestal – No início do ano, o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, enviou ao Congresso o projeto de lei nº 4.147, que institui diretrizes nacionais para o saneamento básico. Desde o início, o projeto provocou uma polêmica que se arrastou durante todo o ano e, ao que tudo indica, continuará sem solução em 2002.
A principal crítica ao projeto é que ele transfere para os estados a responsabilidade pelo saneamento básico dos municípios de regiões metropolitanas e aglomerados urbanos.
Há também uma resistência à privatização das empresas estatais de saneamento, implícita no projeto. Os opositores à privatização acham que o usuário terá de arcar com aumentos abusivos nos preços dos serviços das empresas privatizadas.
Embora dos 5.500 municípios, 5.200 continuarão com seus serviços de saneamento, os 300 restantes – que são os maiores e os de maior força política – não permitem a interferência do Estado.
Código Florestal – Outra polêmica que se arrastou durante todo o ano foram as mudanças no Código Florestal. De um lado está a bancada ruralista na Câmara, defendendo menor área de proteção ambiental nas propriedades; de outro, as lideranças ambientalistas, com o apoio do Ministério do Meio Ambiente sustentando que a reserva legal deve ter um percentual adequado à garantia de preservação da floresta.
A Comissão Mista do Congresso encarregada de examinar a Medida Provisória que altera o Código Florestal, chegou a aprovar o projeto de conversão, mas a matéria não foi submetida ao plenário do Congresso, dada a resistência do ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, com o apoio do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Julho
Avanço no Protocolo de Kyoto – Com os Estados Unidos isolados e seus representantes vaiados, os 178 países que se reuniram em Bonn, na Alemanha, em julho, concordaram em abrir espaço para a execução do Protocolo de Kyoto, que permitirá a redução das emissões de gases-estufa, especialmente o carvão, o petróleo e o gás natural.
Mas para alcançar um acordo, foi necessário ceder, e muito. Os países em desenvolvimento, como o Brasil, e os da União Européia, concordaram que os países que têm florestas poderão utilizá-las para conseguir créditos sobre o total das emissões a reduzir.
Com isso, a meta de reduzir em 5,2% as emissões de gases-estufa entre 2008 e 2012, sobre os valores de 1990, ficará reduzida a apenas 2%.
Julho
Velho Chico renasce aos 500 anos – As comemorações dos 500 anos do descobrimento do rio São Francisco (o navegador italiano Américo Vespúcio avistou o rio em 4 de outubro de 1501) foram marcadas por iniciativas do governo e da sociedade, destinadas a revitalizar o Velho Chico, em adiantado estado de degradação.
A primeira e importante medida foi a criação, em maio, do Comitê da Bacia do São Francisco, abrangendo sete estados e uma área correspondente a 8% do território nacional.
A segunda foi o lançamento do movimento destinado a convencer a Unesco a conceder ao São Francisco o título de Paisagem Cultural da Humanidade. Uma das exigências da Unesco é que sejam tombados os bens históricos e culturais que formam o complexo do São Francisco, entre eles o Parque Nacional da Serra da Canastra, onde está a nascente; ruínas de igrejas, grutas e conventos que fizeram a história da população ribeirinha ao longo dos últimos cinco séculos.
Porém a medida mais importante foi a aprovação do Projeto de Conservação e Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, lançado em junho pelo presidente da República.
O projeto começou a ser efetivamente implementado em outubro, com a visita do presidente Fernando Henrique Cardoso à serra da Canastra, onde assinou convênios para aplicação, ainda este ano, de R$ 86 milhões.
Nos próximos dez anos o projeto vai consumir R$ 1,2 bilhão em ações como tratamento de esgoto e lixo urbano, conservação de solos, convivência com a seca, reflorestamento e recomposição de matas ciliares, educação ambiental, conservação e preservação da biodiversidade e repovoamento de espécies da fauna e da flora.
Agosto
Ecoturismo ganha espaço – O grande acontecimento na área do ecoturismo em 2001 foi a realização, em Cuiabá, da Conferência sobre Desenvolvimento e Gestão Sustentável do Ecoturismo nas Américas, com a presença de 25 países.
Um dos itens discutidos no encontro foi a adoção do Código Mundial de Ética do Turismo, cuja criação já havia sido aprovada em 1997, durante a Assembléia Geral da Organização Mundial do Turismo, realizada em Istambul, na Turquia.
Os participantes do encontro puderam perceber, durante os três dias de debates, como é difícil conciliar turismo e sustentabilidade. Durante a conferência, uma intensa nuvem de poeira e de fumaça cobriu Cuiabá. O mês era setembro, e as queimadas atingiam o seu age.
Agosto
Gerenciamento de águas – Outro evento de grande significação foi o IV Diálogo Interamericano de Gerenciamento de Águas, que reuniu, em Foz de Iguaçu, representantes de 52 países. O encontro serviu para impulsionar a troca de informação, de conhecimento e de práticas entre os países das Américas sobre o uso da água.
O principal produto da conferência foi a Declaração de Foz de Iguaçu, que contemplou temas como gerenciamento integrado de recursos hídricos, governabilidade e políticas de recursos hídricos, terras úmidas e outros ambientes sensíveis a recursos hídricos, gerenciamento de recursos hídricos em regiões áridas e semi-áridas e educação ambiental.
Setembro
Condenação à escravidão – Depois de nove dias de debates, 30 horas de prorrogação, abandono dos Estados Unidos e Israel, muita divergência e texto final subscrito por apenas 99 das 173 delegações, a Conferência Mundial contra o Racismo, realizada em setembro em Durban, na África do Sul, preferiu o caminho da moderação para evitar o fracasso.
Ainda assim a conferência aprovou uma declaração admitindo que a escravidão e o tráfico de escravos constituem um crime contra a humanidade. Além disso, os países participantes ratificaram todas as convenções de direitos humanos já aprovadas desde 1948.
Por iniciativa da delegação brasileira, foi incluída na declaração final uma referência aos discriminados por causa de sua orientação sexual, como os gays e lésbicas, mas uma articulação da delegação iraniana com a do Vaticano levou à retirada dessa referência no texto.
Setembro
O bioterrorismo – Na seqüência dos atentados às duas torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, e ao edifício do Pentágono, em Washington, começaram a chegar pelo correio, endereçadas a senadores e emissoras de televisão, cartas contendo no seu interior um pó branco, cujo manuseio provocou diversas vítimas fatais.
É o antraz que inaugurou uma nova fase do terrorismo mundial: o bioterrorismo, em que as armas são bactérias de doenças infecciosas capazes de atingir grandes contingentes populacionais. Teoricamente, está aberto o caminho para que doenças tratadas em laboratório, como o botulismo e a varíola, em suas formas fatais, possam ser espalhadas criminosamente através de cartas ou via canais de ventilação de edifícios.
Os especialistas garantem que é improvável um ataque com antraz numa grande cidade, como Nova York ou São Paulo, lembrando que não existe uma capacitação tecnológica para uma produção de alta escala sem detecção das autoridades.
De qualquer forma, no último quadrimestre do ano o mundo conheceu a dura realidade do bioterrorismo, e os governos começam a investir em operações de prevenção e em alertas à comunidade.
Setembro
Cotas para negros – O Congresso começou a discutir projeto do senador José Sarney (PMDB-AP) que institui cotas para negros nas vagas abertas no serviço público e nas universidades públicas, além dos contratos de crédito educativo.
Os defensores do projeto sustentam seu argumento com a estatística: os negros têm uma remuneração média 49% inferior aos brancos; o percentual de analfabetos entre os negros é 2,5 vezes maior que entre os brancos e a escolaridade média dos brancos é 50% superior à dos negros, o que explica o fato de a taxa de desemprego entre os negros ser maior que entre os brancos.
Outubro
ONGs na berlinda –
As ONGs Fundação O Boticário e Sociedade de Pesquisa Vida Selvagem também foram denunciadas, mas apresentaram provas de inocência, aparentemente aceitas pela comissão.
O fato é que, decorridos nove meses de funcionamento, a CPI das ONGs até agora não conseguiu deslanchar, não dispondo de dados que permitam concluir que há organizações não-governamentais infringindo a legislação brasileira.
Outubro
Brasil realiza encontro de ministros da América Latina e prévia da Rio +10 – Ministros de todos os países do Caribe e América Latina, bem como observadores da Europa, Ásia e América do Norte se reuniram no Rio de Janeiro, de 21 a 24 de outubro, para discutir assuntos ambientais de cada um dos países envolvidos que repercutem no plano global. Foram debatidas questões relacionadas às florestas, biodiversidade, água e desastres provocados por fenômenos naturais, principalmente na região do Caribe. Simultaneamento ao Fórum de Ministros de Meio Ambiente, realizou-se a Conferência Preparatória da Rio+10. Ambos os encontros tiveram o apoio de ONGs e do setor privado. O ministro Sarney Filho presidiu o encontro e explicou a importância destas discussões para um posicionamento mais forte do continente americano na reunião de Joannesburgo, África do Sul, em 2002. Houve também exposição empresarial com objetivo de apresentar exemplos da ação do setor privado em favor do desenvolvimento sustentável.
Novembro
OMC e meio ambiente – O meio ambiente também foi tema do lançamento da nova rodada de negociações na Organização Mundial do Comércio – OMC – realizada em novembro, em Doha, no Catar.
Em relação ao meio ambiente, os 182 países participantes concordaram em “negociações sem prejulgar os resultados” sobre a relação entre acordos multilaterais de investimentos (MEAs) e as regras da OMC, sobre procedimentos para troca de informações entre a OMC e os MEAs, e para redução ou eliminação de tarifas e barreiras não tarifárias para serviços e produtos ambientais”.
Outras negociações sobre eco-etiquetagem e acordos que beneficiem comércio, meio ambiente e desenvolvimento serão decididas no final de 2003. As negociações serão abertas em janeiro próximo e deverão durar três anos, até janeiro de 2005.
Novembro
Lixo radioativo já tem lei – Decorridos 14 anos do acidente do césio em Goiânia, o Congresso aprovou e o presidente da República sancionou lei estabelecendo normas para o destino final dos rejeitos radioativos produzidos no Brasil.
A lei concentra na Comissão Nacional da Energia Nuclear – CNEN – praticamente todas as ações ligadas à deposição do lixo nuclear, inclusive a responsabilidade pelos custos do processo de guarda.
A lei proíbe o armazenamento de rejeitos de qualquer natureza nas ilhas oceânicas e águas territoriais e cria depósitos permanentes e provisórios para o armazenamento dos rejeitos.