Polêmica na fronteira do Mercosul

Ninguém quer proximidade com aterro sanitário

26 de fevereiro de 2004

Cidades da fronteira Brasil e Uruguai discutem com agricultores e Ibama lugar correto para lixão

      Localizada a 500 quilômetros de Porto Alegre, RS, Sant’Ana do Livramento faz fronteira com Rivera, no Uruguai. E se ao longo dos últimos anos nunca teve maiores problemas com o meio ambiente, por ser uma região que vive da pecuária, começou o ano de 200l com uma polêmica: onde colocar as 90 toneladas de lixo diário produzido por sua população de mais de 90 mil habitantes? O antigo lixão está com sua capacidade esgotada. Foi feito um estudo para um aterro sanitário que indica três locais possíveis. Mas, um desses locais, chamado Passo do Guedes, é uma área que reune pequenos e médios agricultores que abastecem a cidade e que não querem um aterro sanitário nas proximidades. A Folha do Meio foi ver de perto o problema.


Há anos despejando lixo no mesmo local, a cidade crescendo e se espalhando, sem planejamento, Livramento vive o impasse da grande maioria das cidades brasileiras: onde colocar seu lixo. Há algum tempo o atual lixão dá sinais de saturamento e por isso foi feito um estudo pela FEPAM – Fundação Estadual de Proteção ao Ambiente Natural – para determinar um novo local. Tres áreas foram indicadas como passíveis de localizar o aterro sanitário. Todavia não há uma definição, pois na verdade uma das áreas está causando a maior polêmica por estar localizada muito próxima a linha divisória entre Livramento (Brasil) e Rivera (Uruguai), o que não é permitido por tratados internacionais. A segunda área estaria muito longe da sede do município, o que dificultaria o transporte do lixo. A terceira área é a que está gerando polêmica. Isto porque, o local escolhido para a instalação do lixão fica muito próxima de pequenas chácaras de plantadores de hortifrutigranjeiros, cuja produção é de subsistência e também abastece os mercados da cidade. Dentro dessa localidade chamada Passo do Guedes também estão localizados os 80 hectares da vinícola Santa Colina, que se instalou na cidade há mais de dez anos e pretende ampliar sua produção chegando a plantar uva nos 700 hectares. Os empresários estáo preocupados com a imagem que a proximidade do aterro sanitário poderá causar à vinícola. 


Passo do Guedes


Localizado há l8 quilômetros da cidade, o Passo do Guedes é uma bonita região cercada de coxilhas e banhada por vertentes. Ali famílias de pequenos produtores instalaram-se há mais de 20 anos, investindo em torno de 4 a 5 mil por hectare. A produção de pêra começa a ser feita agora, já que o solo da região da fronteira oeste foi considerado como o melhor do estado para o plantio dessa fruta. Mas, como lembra o produtor Camilo Campelo Souza, a pêra leva seis anos para dar a primeira produção: “é uma produção ecológica, não usa agrotóxicos, mas os investimentos até a primeira colheita têm que ser feitos ano após ano, por isso a instalação do aterro sanitário próximo a nós, é preocupante” diz. Além da pêra, a região produz ameixa, figo, pêssego e conta ainda com uma bacia leiteira, com uma produção de mil litros/dia. O Passo do Guedes também é uma área da cidade que se caracteriza por um grande número de vertentes naturais. Só na propriedade de Camilo existem seis nascentes. Além disso as belezas naturais da região e o fácil acesso faz pensar em turismo ecológico. É o que quer para um futuro próximo, o presidente da recém criada Associação do Passo do Guedes-Leopoldo Dutra. A associação reune produtores do Passo do Guedes, motivados pelo receio de que a instalação do aterro venha a prejudicar a imagem dos produtos ali plantados. Ao mesmo tempo, os produtores que compõem a entidade recém criada querem propor alternativas para uma nova localização do aterro: “Não queremos apenas nos livrar do problema nesta área e jogar para outros. Queremos uma solução que beneficie a comunidade em geral” defende Leopoldo Dutra. Os produtores contam com a assessoria do ambientalista Josë Luiz Sampaio, vice presidente da Fundação Rio Ibirapuitã, que já conhece o problema do lixão em Livramento há muito tempo. 


Lixão


Livramento foi crescendo e expandindo sua área habitada e hoje o lixão está cada vez mais próximo. Estima-se que a cidade produza aproximadamente 90 toneladas diárias de lixo para uma população de 90 mil habitantes. A produção per capita é altíssima. O atual lixão está localizado na região denominada Rincão da Bolsa e num raio de mil metros existem pequenas propriedades com apiários, hortifrutigranjeiros, produtores de leite. Conforme o professor e ambientalista José Luiz Sampaio, a área do lixo está esgotada e os poços próximos estão contaminados. Esta questão do lixão se arrasta desde l996 – lembra o vice-presidente da FURI – quando foi feita a primeira denúncia na Promotoria de Defesa Comunitária”. Na época, segundo o ambientalista, uma parte do problema foi solucionada com a retirada das familias com crianças da área. Em junho de 2000 o lixão foi interditado por tres dias, quando foi assinado pelo IBAMA um têrmo de referência, para elaboração e apresentação de estudo ambiental visando a implantação de um aterro sanitário. Inclusive, na época, a questão tornou-se tão séria que o ambientalista da Furi foi alvo de uma tentativa de homicídio registrada na delegacia local. 


Área para o aterro não tem definição


Ainda no mês de fevereiro, o prefeito eleito Guilherme Bassedas Costa, esteve em Porto Alegre mantendo contatos com a direção do escritório do IBAMA e ficou sabendo que ainda não está definida a área para a localização do aterro. Por enquanto, os projetos referentes ao aterro sanitário ainda se encontram no âmbito da FEPAM, mas poderão passar para abrangência do IBAMA com a definição de responsabilidade. Tanto o pessoal do IBAMA quando o da FEPAM tem dúvidas a respeito da interpretação da lei que estabelece a responsabilidade na questão da definição da área. “Pelo que nós pudemos apurar, das tres áreas sugeridas pelo município no ano passado, apenas uma, foi definitivamente descartada, por localizar-se em cima da faixa de fronteira, mas as outras áreas ainda são alvo de estudo”diz o prefeito. Sem a palavra final do Ibama, a polêmica continua.


Mais informações:
Ibama Porto Alegre: (51) 225-2144 
Pefeitura de Santana do Livramento: (55) 242-4621