Soja Transgênica

MP não acaba guerra dos transgênicos

10 de fevereiro de 2004

No vácuo legal entre a Medida Provisória e a não regulamentação, os produtores estão comercializando normalmente a soja transgênica

 







Soja: produtor brasileiro, em 2003,
está de mão e bolsos cheios

Certificação
Aparentemente, o problema maior reside na certificação. Como a MP não se refere exclusivamente à soja transgênica, mas exige que toda a safra de soja seja certificada para verificar a presença de genes modificados, não há estrutura capaz de avaliar uma produção de 47 milhões de toneladas.


Além disso, a MP 113 não definiu quem vai pagar a certificação. Os produtores de soja transgênica, constituídos em grande parte de pequenos e médios agricultores, cujas propriedades são inferiores a 50 hectares, alegam que não podem arcar com essa despesa, pois com ela desapareceria grande parte da vantagem de plantar soja transgênica, ou seja, uma economia da ordem de 30%, por causa da redução do uso de herbicidas.


O texto da MP diz que a soja e seus derivados devem ter rótulo com sua origem e presença de Organismos Geneticamente Modificados – OGMs. O problema é definir qual o percentual da presença dos OGMs, se 1% ou 4%. O próprio governo está em dúvida. O decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de agosto de 2001, exige a notificação apenas nos casos onde a presença de OGMs seja de 4%, mas, por pressão do Ministério do Meio Ambiente, foi incluída no decreto de regulamentação da MP 113 a exigência de 1%.


Desafio
Enquanto o governo não se decide, os produtores gaúchos dizem que estão dispostos a continuar plantando soja transgênica a partir da próxima safra. Essa determinação, que é também dos produtores de Mato Grosso, se fortalece com a indecisão do governo e com os resultados positivos alcançados com o plantio.


No Rio Grande do Sul, a Federação dos Trabalhadores na Agricultura – Fetag – é que está estimulando o plantio da soja transgênica, sob o argumento de que, se o Governo quer proibir que apresente os motivos claramente.


Oito anos de batalha


A batalha dos transgênicos começou em 1995, quando o governo regulamentou a Lei de Biossegurança, que criou a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio – e estabeleceu normas para atividades com OGMs.


Em 1998 a CTNBio aprovou o primeiro OGM para plantio comercial: a soja RR produzida pela Monsanto. A comissão decidiu dispensar a apresentação do Estudo de Impacto Ambiental EIA-Rima por considerar o produto seguro para a saúde dos consumidores.
O Instituto de Defesa do Consumidor – Idec – e o Greenpeace, recorreram à Justiça e obtiveram liminar proibindo a União de autorizar o plantio sem o EIA-Rima e normas de rotulagem. A liminar foi revogada pela 6ª Vara do Distrito Federal, mas em 1999, volta a ser proibida.


No ano seguinte, a disputa transfere-se para o Tribunal Regional Federal – TRF – mas só em fevereiro do ano passado a juíza Selene Maria de Almeida julgou o feito, dando ganho de causa à CTNBio, mas os outros dois juízes da Turma pediram vista do processo.


Foi essa decisão que estimulou milhares de agricultores, especialmente no Rio Grande do Sul, a plantar soja transgênica, na expectativa de que os outros dois juízes da Turma acompanhassem o voto da relatora.
Como, decorridos 13 meses após a sentença inicial nada ocorreu, configurou-se o que os juristas chamam de “moratória judicial” em relação aos transgênicos, estimulando mais ainda o plantio.


Há esperanças de que o julgamento seja retomado nos próximos dias, mas ante a proverbial morosidade da Justiça, é temeroso estipular prazos, mesmo em se tratando de matéria que diga respeito à saúde de milhões de pessoas, consumidores de soja e de seus subprodutos.


A disputa em 72 emendas


A leitura das 72 emendas que os parlamentares apresentaram à MP 113 ilustra a disputa entre os grupos a favor e contra os transgênicos, na Câmara dos Deputados.Os artigos mais visados foram o 1ª, o 6ª, o 7ª e o 8ª.
O 1ª limita a 31 de janeiro de 2004 a comercialização da soja transgênica, determinando a incineração do estoque existente a partir daquela data, assim como a completa limpeza dos espaços de armazenagem para recebimento da safra de 2004.


O 6ª proíbe as instituições oficiais de crédito aplicar recursos no financiamento da produção e plantio da soja transgênica. O 7ª dispõe que o produtor ou fornecedor que produzir ou comercializar a soja transgênica ficará impedido de obter empréstimos e financiamentos de instituições oficiais de crédito, não terá acesso a eventuais benefícios fiscais ou creditícios nem será admitido a participar de programas de repactuação ou parcelamento de dívidas relativas a tributos e contribuições instituídos pelo Governo Federal.


Já o 8ª adverte que, “sem prejuízo de outras cominações civis, penais e administrativas previstas em lei”, quem continuar plantando ou comercializando soja transgênica pagará multa a partir de R$ 16.110,00, “fixada proporcionalmente a lesividade da conduta”.


Os autores das emendas que suprimem o art. 1ª dizem que a proibição da soja transgênica a partir de 1ª de fevereiro de 2004 pressupõe que a Justiça não liberará o produto, quando o julgamento ainda está em marcha.


Outros dizem que a fixação de uma data limite para comercialização constitui-se em fator de depressão dos preços ao agricultor, do que resultará redução de sua renda.


Há os que são contra a destruição das sementes transgênicas, argumentando que isso produziria um aumento imediato dos preços das sementes naturais encontradas no mercado, com o fim da concorrência entre os dois tipos.


Os críticos da vedação às instituições financeiras oficiais de crédito de aplicar recursos no financiamento da produção e comercialização da soja transgênica afirmam tratar-se de um instrumento “impeditivo e injusto” para os produtores rurais.
Já os ambientalistas apresentaram emendas estendendo a proibição às instituições financeiras do setor privado.


O art. 7ª que além de vedar o acesso ao crédito impõe uma série de outras restrições a quem plantar ou comercializar soja transgênica, foi considerado “cruel” por quase todos os parlamentares que pediram a sua exclusão da MP 113. As mesmas críticas são feitas pelos subscritores das emendas que suprimem o art. 8ª.


No fogo cruzado, a CTNBio


Quando a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio – autorizou a liberação da soja transgênica RR da Monsanto, chamou a si todas as restrições e inimizades das lideranças ambientalistas, tanto no âmbito das organizações não-governamentais – ONGs – como no Congresso. Mesmo no Poder Executivo, a sorte da CTNBio começou a mudar em janeiro deste ano, com a ascensão do governo Lula.


Um decreto gerado no Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT – e encaminhado à comissão interministerial criada por Lula para estudar o caso dos transgênicos, reduz a CTNBio à condição de órgão consultivo, retirando-lhe todo o poder deliberativo.


Criada em 1995, durante o governo FHC, com o propósito de julgar a segurança de organismos transgênicos, a CTNBio é formada por 18 membros titulares e 18 suplentes, incluindo oito técnicos, cientistas, representantes de seis ministérios – MCT, Saúde, Meio Ambiente, Educação, Relações Exteriores e Agricultura – da sociedade civil (direitos do consumidor) e do setor empresarial.


O MCT considera a CTNBio um colegiado muito grande e heterogêneo, sem um peso preponderante do governo e que pode até decidir contra os interesses da administração pública. A visão da nova administração federal mudou: quem deve decidir sobre se os transgênicos devem ou não ser tolerados é o governo.


O mais provável é que a atribuição da CTNBio, de autorizar ou não o plantio e a comercialização dos transgênicos seja transferida para o Ministério do Meio Ambiente, uma antiga reivindicação da hoje ministra Marina Silva, quando ainda exercia o mandato de senadora.


Para as lideranças ambientalistas essa seria a melhor alternativa, que na prática corresponderia à instituição do sistema de licenciamento ambiental para a soja transgênica.


As mudanças recentemente ocorridas na CTNBio poderão abrir caminho para alterar a sua forma de atuação, transformando-se em órgão apenas consultivo, o que representaria o seu enfraquecimento.


O ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, escolheu para presidir a Comissão o médico Erney Felício Plessmann de Camargo, que também assumiu, no Governo Lula, a presidência do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.


Além disso, todos os ministérios com participação na CTNBio trocaram seus representantes titulares, com exceção do Ministério da Agricultura.


O novo presidente da CTNbio é especialista em biologia molecular de parasitas e epidemiologia da malária. Foi diretor do Instituto Butantã.


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Provisional Measure doesn?t end transgenic war
In the legal loophole found between the Provisional Measure and the current legislation,
producers are commercializing transgenic soy as usual


The Provisional Measure (PM) number 113, that regulates the commercialization of the transgenic soy harvest, was published in the Official Bulletin on March 26th. One month has already gone by and the decree regulating the PM has still not been released. It is in this legal loophole that producers are currently commercializing the harvested transgenic soy in Rio Grande do Sul state, even without certification. In this state, it is estimated that, from the 2,5 million tons of the harvested transgenic soy from the total eight million ton harvest, 55% were already sold, without any problems, to the national market. In Mato Grosso state, 65% of the transgenic soy has already been sold. The delay in the regulation is associated with the possibility of modifications in PM 113, which is still under discussion in Congress, where it received 72 amendments and should be voted by May 11th. From this date on it will start blocking the voting guideline in the House of Representatives. The regulation decree text is ready in the Civil House, but without a release date.


Certification
Apparently, the biggest problem lies in the certification. As the PM does not exclusively refers to transgenic soy, but actually demands the entire soy harvest to be certified, checking on the presence of modified genes, it does not have a capable structure to evaluate a 47 million ton production.


Besides this, PM 113 did not define who will pay for the certification. The transgenic soy producers, made up mostly by small and medium land owners, whose properties are smaller than 50 hectares, allege that they cannot bear with these expenses, for it would largely reduce part of the advantage of planting transgenic soy, in other words, the economy of about 30% , due to the reduction of herbicidal usage.


The PM text states that the soy and its derivatives must have a label declaring its origin and presence of Genetically Modified Organisms- GMOs. The problem is to define the percentage of GMOs presence, if 1% or 4%. Even the government is not sure. The decree of Former Brazilian President Fernando Henrique Cardoso, on August 2001, demands the notification only in cases where the presence of GMOs is 4%, but, because of the pressure of the Ministry of Environment, the 1% requirement was enclosed in the regulation decree of PM 113.


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