Código Florestal

Esse debate não vai acabar tão cedo

24 de março de 2004

O presidente FHC reedita a Medida Provisória e se coloca como novo defensor das florestas

     A pressão da sociedade derrubou o projeto ruralista que alterava o Código Florestal, apresentado pelo deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR) e aprovado por comissão mista do Congresso Nacional. A medida reduzia a reserva legal nas propriedades rurais da Amazônia de 80% para 50% e foi criticada até pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Os líderes de todos os partidos fecharam um acordo que garante a manutenção dos índices atuais de 80% nas áreas florestais e 20% no cerrado e as discussões voltam à estaca zero. 


A solução foi proposta pelo líder do PT na Câmara, deputado Aloízio Mercadante (PT-SP) e acatada pelo PFL, principal reduto dos ruralistas, e pelo PMDB, que abriga Micheletto. “A base será o projeto do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente)”, afirmou o líder pefelista, deputado Inocêncio Oliveira (PE). A Medida Provisória no. 1.956, editada em 1996, será reeditada enquanto durar as discussões. 


Os líderes decidiram também dobrar o número de integrantes da comissão de senadores e deputados, dominada por ruralistas. Dos 14 integrantes atuais, apenas três são favoráveis ao projeto do Conama, que mantém a reserva legal de 80% na área florestal e 35% no cerrado. O presidente da comissão, senador Jonas Pinheiro (PFL-MT), e o relator, Micheletto, serão mantidos. A intenção dos parlamentares é evitar mudanças nos percentuais até a definição do zoneamento econômico ecológico pelos estados. 


O Código Florestal determina uma reserva legal de 50% nas áreas de florestas da Amazônia e de 20% no cerrado. Com o recorde de desmatamento em 1995 que atingiu mais de 29 mil km2, o presidente Fernando Henrique Cardoso editou, em 1996, a Medida Provisória ampliando as reservas, para conter a derrubada da floresta. A medida adotada reverteu a tendência de desmatamento à média de 16 mil km2, mas sempre foi combatida pelos produtores rurais. 


“Com a redução da reserva legal de 80% para 50%, nas áreas florestais da Amazônia, se retrocede ao período anterior à medida provisória”, explica o diretor-executivo do WWF (Fundo Mundial para a Natureza), Garo Batmanian. O relatório apresentado pelo deputado Micheletto inclui a possibilidade de ampliar ainda mais o desmatamento, que pode chegar a 75%, após o zoneamento econômico ecológico. O projeto prevê que os estados devem fazer o zoneamento em três anos. 


A intenção dos ruralistas é ampliar a área na Amazônia e no Cerrado, especialmente na região Centro-Oeste, para cultivo de grãos e pecuária. Representados por cerca de 200 parlamentares no Congresso, os ruralistas têm poder de fogo sobre o Governo. Eles alegam que as reservas legais e as áreas de preservação permanente (APP), que protege encostas e margens de rios e lagos, engessam o País. 


A exploração é permitida mesmo nas áreas florestais, desde que seja feita com projetos de desenvolvimento sustentável. O que não se permite atualmente é o corte raso em 80% das florestas. “A vocação da Amazônia são os produtos florestais”, assegura Batmanian. O diretor do WWF revela que a agricultura vem batendo recorde desde 1995 e que o setor não necessita de ampliação de área para cultivo. “Os próprios ruralistas mostram que apenas 14% do Cerrado foi ocupado (5% com a agricultura e 9% com a pecuária). Com a proposta do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) essa área seria ampliada em 60%”. 


Desatualizado


O Código Florestal, que define as regras para exploração dos ecossistemas, é de 1965 e precisa ser atualizado. Com isso até os ambientalistas concordam. Eles defendem mudanças na legislação, mas discordam das alterações incluídas em medidas provisórias, que têm um processo de tramitação rápida no Congresso e isso impede que as questões sejam aprofundadas. Os ruralistas querem manter os índices que estavam no Código até a edição da MP, 50% de reserva legal em áreas de florestas na Amazônia e 20% no Cerrado. O Conama propõe 80% na área florestal e 35% no Cerrado. 


Ao contrário do Código, o projeto dos ruralistas dispensa a obrigatoriedade de recomposição da reserva legal nas propriedades com até 25 hectares. A proposta dispensa ainda as áreas de preservação permanente em áreas urbanas. Com isso, as margens de rios e os morros ficariam desprotegidos e sujeitos a enchentes e erosões. 


Bloqueio de E-mails


Técnicos do Senado bloquearam a chegada de mensagens da Campanha SOS Florestas no dia 4 de maio. A campanha foi iniciada em 24 de abril, por um grupo de instituições ambientalistas, para defender junto aos parlamentares a aprovação da proposta que altera o Código Florestal, apresentada pelo Conama. 


A censura exercida pelos técnicos impediu e-mails do WWF, do Greenpeace e do Instituto Socioambiental (ISA), entre 4 e 5 de maio, até que a senadora Marina Silva (PT-AC) protestou contra o bloqueio das mensagens e recebeu o apoio do presidente do Congresso, senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA): “A senadora tem razão e o Prodasen não pode exercer censura”.