Até 2005 todo cidadão brasileiro terá energia elétric
25 de março de 2004Atuação da Aneel busca equilíbrio do mercado de energia, ações de cunho social e desenvolvimento da área rural
Foram muitos choques, apagões e conflitos entre os agentes do setor elétrico e os consumidores. Mas, aos poucos, o consumidor brasileiro vai aprendendo a conviver com uma nova realidade na área de fornecimento de energia. Entrou em campo, há dois anos, a Agência Nacional de Energia Elétrica que criou um novo modelo institucional: aumentou a competição, cuidou da prestação do serviço de energia e fez nascer uma nova mentalidade cidadã, estimulando os consumidores a reclamarem pelos seus direitos. E, felizmente, isso não é apenas retórica, explica o Diretor-Geral da ANEEL, José Mário Miranda Abdo que nesta entrevista cita exemplos concretos: o apagão de março do ano passado acendeu nas concessionárias 14.426 reclamações, 8.815 das quais foram deferidas (61,1%). Importante: a Agência, que descentralizou suas ações para atender melhor os usuários nos estados, incentiva a organização dos consumidores e lançou um sistema de monitoramento que denuncia automaticamente a interrupção de energia elétrica, o Projeto Argos. Mais: fez até do conhecido 196 (o telefone que avisa a falta de energia) uma chamada paga pela concessionária. É bom lembrar que até esse serviço, antes da Aneel, quem pagava era o pobre do usuário que estava sem luz. Conectado nesses dois anos de trabalho da Aneel, estruturando e cumprindo a missão de regular, mediar e fiscalizar está o engenheiro paulista de Araraquara, formado na Universidade de Brasília, José Mário Miranda Abdo, que falou à Folha do Meio.
Folha do Meio – Foram criadas 4 agências reguladoras para as áreas de petróleo, vigilância sanitária, telecomunicações e energia elétrica, estando no forno a mais recente, a de águas. Os críticos dizem que elas lembram muito mais uma seção burocrática de ministério do que um órgão que deveria agir com independência. O que o senhor acha?
José Mário Abdo – As agências foram criadas como parte do processo de reforma do Estado, para atuarem como órgãos reguladores, fiscalizadores e responsáveis pelas concessões, permissões e autorizações em seus respectivos setores de atuação. E cada agência vem cumprindo sua missão, apesar do curto período de existência e estruturação. A Aneel, em especial, tem a missão de proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes, ou seja, entre os concessionários, empresários do setor, mas, sobretudo em benefício da sociedade. É preciso que o mercado se desenvolva sempre, pois o Brasil precisa de energia elétrica, cada vez mais. A verdade é que isso já não estava sendo possível, pela retração de investimentos externos, dentro do modelo estatal. Mas, é fundamental que este desenvolvimento do mercado ocorra com equilíbrio. E, o mais importante: em benefício da sociedade brasileira. E nesta missão, a Aneel já pode apresentar resultados bastante expressivos e inéditos na história do setor elétrico brasileiro.
FMA – A Aneel não tem estrutura muito burocrática?
Abdo – De forma alguma. E é importante ressaltar que estes resultados são fruto de um esforço sem precedentes que tem como base estrutural a independência da Agência, prevista em sua lei de criação. A Aneel é autarquia constituída sob regime especial, com autonomia patrimonial, administrativa e financeira, conforme estabelece a Lei 9.427*. Na realidade, todo o novo modelo tem autonomia, inclusive as agências estaduais. Hoje, em número de sete, já conveniadas com a Aneel. O problema está na grande expectativa criada. Toda a sociedade quer resultados imediatos. No caso da Aneel, podemos dizer que o seu primeiro dia de funcionamento somente ocorreu, após a edição do Decreto 2.335/97*, que aprovou sua estrutura regimental. É uma Agência bastante enxuta e que em nada se parece com estruturas burocráticas. Com dois anos de funcionamento, a Aneel tem muito a mostrar à sociedade.
(*) Lei 9.427 – Lei de 26 de dezembro de 1996, que criou a Agência Nacional de Energia Elétrica. | (*) Decreto 2.335 – Foi o Decreto de 6 de outubro de 1997 que regulamentou as atividades Aneel. |
FMA – E quais são os principais resultados nestes dois anos da Aneel?
Abdo – Veja bem, a Aneel tinha apenas três semanas de existência e pode mostrar ao Brasil para que veio. Isto ocorreu no blecaute* do Rio de Janeiro, no verão de 1998. No caso, a Aneel agiu com firmeza, obrigando as concessionárias a indenizarem os consumidores efetivamente prejudicados. E mais: após analisar os recursos das empresas e julgá-los improcedentes, em instância administrativa final, a Aneel multou em R$ 2.016 milhões as concessionárias envolvidas e em R$ 638 mil, as distribuidoras responsáveis. Todos se lembram do apagão de 11 de março de 99, ocorrido no sistema sudeste. É bom lembrar que a Aneel, imediatamente apurou as causas e puniu as empresas responsáveis numa ação inédita de pagamento de prejuízos. Foram 9 mil brasileiros indenizados. Antes da Aneel isso não acontecia. No total, 14.426 consumidores já foram ressarcidos de seus prejuízos, em decorrência dos blecautes.
(*) Blecaute – Palavra de origem inglesa “blackout” para explicar falta de energia, escurecimento total. |
FMA – Nada disso existia antes?
Abdo – Tudo existe de dois anos para cá. E esse é o papel de uma agência reguladora, o que não existia antes no País. Veja bem, a Aneel já fiscalizou 100% das concessionárias e empresas do setor. Essa é uma ação inédita que a Agência faz com recursos e pessoal próprio, com a colaboração das agências estaduais conveniadas, universidades e empresas de auditoria. Isto contou com o levantamento legal das centrais de geração, incluindo segurança das instalações e existência de licenças ambientais para construção ou operação. No total a Aneel fez , somente no primeiro ano, 1.715 recomendações, 2.287 determinações, gerando 236 termos de notificação e 13 autos de infração. Agiu rápido em defesa do cidadão-consumidor. O consumidor de energia elétrica hoje tem a quem reclamar pelos maus serviços. E sabe que será ouvido. Pouca gente sabe, mas hoje a Aneel desenvolveu um projeto para melhorar ainda mais a fiscalização do serviço de energia: o Projeto Argos*. Um aparelho que se instala na caixa de luz do consumidor para medir as interrupções de energia e também a duração das interrupções.
(*) Projeto Argos – É uma rede de pequenos sensores instalados em equipamentos de medição nas residências, indústrias e comércio que, pela rede telefônica, repassa todos os dados à estação central em Brasília, permitindo o monitoramento automático dos serviços prestados pelas distribuidoras de energia. Em caráter experimental, o Argos está sendo utilizado por 1.000 consumidores em cinco estados: PA, BA, RJ, SP e RS. |
FMA – E como isso funciona?
Abdo – Simples! Ainda está em fase experimental. Mas é um sistema de monitoramento automático que fazemos aqui da sede da Aneel. Nós podemos monitorar todo o sistema, em tempo real, e sem ônus nenhum para o usuário.