Educação

Aprendizagem baseada no cérebro

4 de março de 2004

Saiba como o ambiente influencia a memória e a aprendizagem. A melhor comparação do cérebro não é tecnológica (com um computador) e, sim, ecológica (com uma floresta)


Os anos 90 foram batizados como a Década do Cérebro, devido às inúmeras pesquisas desenvolvidas em vários países do mundo.


Uma investigação atual do renomado Instituto Salk (San Diego, Califórnia, Estados Unidos) examina como o ambiente, o exercício e a nutrição influenciam a memória e a aprendizagem. Em abril do corrente ano, visitamos o Instituto e ouvimos uma palestra da Dra. Henriette van Praag que descreveu experimentos efetuados e revelou que, em condições enriquecidas de vida, ratos adultos ativos podem desenvolver novas células no hipocampo. Pesquisas recentes mostram que o crescimento de novos neurônios (neurogênese) também acontece no hipocampo (região do cérebro fortemente ligada à memória e à aprendizagem) de cérebros humanos adultos, sob as mesmas condições. Os resultados indicam que em ambientes enriquecidos há maior crescimento de dendritos, o número de sinapses aumenta e a aprendizagem melhora.


Dr. Gerald Edelman, do Instituto de Neurociência de San Diego, derruba a metáfora do cérebro como um computador, dizendo que a comparação não é tecnológica e sim ecológica. Ele vê similaridades entre a rica ecologia da floresta tropical e o desenvolvimento gradual da rede de neurônios do cérebro. Como uma floresta, o cérebro está ativo algumas vezes, quieto outras, mas sempre cheio de vida. Semelhante à selva, o cérebro tem regiões distintas para lidar com várias funções mentais, tais como pensar, sexualidade, memória, emoções, respiração e criatividade. Ambos, as plantas e animais e a rede de neurônios, funcionam tanto de forma competitiva como cooperativa, respondendo aos desafios do ambiente. A lei da selva como do cérebro é a sobrevivência. 


No workshop em que participamos, Dr. Robert Sylwester, professor emérito da Universidade de Oregon, examinando o cérebro modular e plástico, formado por inúmeros sistemas neuronais especializados, afirma que seria mais preciso caracterizá-lo como uma sociedade cooperativa de sub-cérebros do que uma massa orgânica única, que processa tudo de forma idêntica. No nível organizacional mais simples, cada sistema neuronal realiza uma tarefa específica. Nos níveis mais elevados, estão conceitos educacionais relevantes como (1) o cérebro definido por múltiplas inteligências e (2) o cérebro desenhado para diferenciar entre dicotomias relativamente abstratas como verdadeiro/falso; certo/errado; belo/feio. 


A lição do cérebro


A lição do cérebro como um sistema modular, composto de inúmeros subsistemas que colaboram, permite visualizar uma sala de aula cooperativa e democrática, onde há interdependência humana, altamente estimuladora para o desenvolvimento do cérebro social. 


Dr. Eric Jensen, famoso escritor e conferencista internacional, no curso que participamos em San Diego, informou que está surgindo um novo enfoque compreensivo e multidisciplinar, baseado parcialmente em como as pesquisas recentes sugerem que nosso cérebro aprende. 


Uma sala de aula compatível com o cérebro tem algumas facetas diferenciadas. Emoções positivas são ativadas e engajadas. Há surpresa, celebrações, música, artes, dança, movimentação, exercícios e jogos. Estabelece-se um clima marcadamente positivo. Estimula-se o desenvolvimento de relações humanas baseadas na confiança. As ameaças são eliminadas. Os objetivos a atingir são explicitados claramente. Busca-se construir significado, definindo razões válidas e propósitos visíveis. 


Um ambiente educacional enriquecido não se restringe aos visuais, materiais, pôsteres, manipulativos, as cores e a alegria. Outras características são também essenciais. É necessário um adequado nível de desafio, que pode acontecer em atividades de simulação, estudos de caso, dramatizações, jogos, excursões, projetos e experiências de vida. É preciso introduzir novidade como parte do processo, seja através do contraste ou de coisas novas a realizar. É fundamental aumentar o feedback, dos colegas, família e a auto-avaliação pelo estudante, que deve acontecer no momento certo, ser específica e controlado pelo aprendiz. É importante haver coerência e sentido, oportunizando escolhas pelos alunos. 


Os estudos científicos revelam com clareza o poder das emoções na aprendizagem e memória. Elas filtram nossos sentidos. Quando fortes e bloqueadas, causam estresis, doenças e depressão. Quando produtivamente expressas, fomentam um clima estimulador para a aprendizagem. Somos mais seres emocionais do que seres cognitivos, ressalta Eric Jensen. 


Os professores que efetivamente compreendem que a aprendizagem envolve cérebro, corpo e sentimentos adotam uma gestão mais competente tanto das emoções como da aprendizagem de seus estudantes.


Os rápidos avanços na compreensão do cérebro e seus processos terão forte impacto na profissão da educação. Os professores devem começar imediatamente a explorar quais as formas mais indicadas de responder à revolução da ciência biológica e da tecnologia de computadores, revolução esta que dominará o cenário educacional no próximo milênio. 


No livro que estamos escrevendo sobre este tema, a ser publicado em breve, antecipamos que Educar Mentes e Corações será a tarefa mais estimuladora e desafiante que pais e educadores, no mundo inteiro, deverão enfrentar e vencer no século 21!