Cerrado

Unesco mostra como foi o ocupação do Cerrado

3 de março de 2004

Estudo faz avaliação multitemporal da perda de cobertura vegetal no DF e da diversidade florística da Reserva da Biosfera do Cerrado de 1954 a 1998


O Distrito Federal possui características especiais que fazem dele um modelo ideal para análises como esta. Foi planejado e instalado a partir de meados dos anos 50 em um território de baixa ocupação humana e ambiente primitivo. Apresenta, hoje, aspectos urbanos e rurais marcantes – infelizmente os grandes responsáveis pela perda da vegetação nativa. Por outro lado, o território conta ainda com um conjunto de áreas protegidas que pode contribuir para a restauração dos corredores biológicos essenciais à conservação da biodiversidade.


Segundo os técnicos da Unesco, a idéia do estudo é oferecer um instrumento para facilitar uma melhor gestão da Biosfera do Cerrado e para sua devida preservação, conservação e desenvolvimento ambientalmente equilibrado, conforme prevê a Agenda 21.


Por que o estudo sobre o Cerrado?


Para a Unesco o estudo representa uma contribuição para um plano de gestão que concilie a integridade das unidades de conservação e o desenvolvimento sustentável do DF. O objetivo foi avaliar a dinâmica da ocupação do solo do DF e seu efeito sobre a cobertura vegetal assim como analisar a riqueza e a diversidade da flora nas áreas nucleares da Reserva da Biosfera do Cerrado.


Na análise foram empregadas técnicas de geoprocessamento, o que possibilitou o desenvolvimento de uma base de dados geográficos de várias épocas para o Distrito Federal. Foram avaliados seis momentos distintos: 1954, 1964, 1973, 1984, 1994 e 1998. Todos os mapeamentos utilizaram como referência o Sistema Cartográfico do Distrito Federal – SICAD, adotado pela Codeplan.


Principais resultados


1 A formação da paisagem no DF está intimamente relacionada com os intensivos processos de urbanização e com o crescimento da ocupação agrícola, principais responsáveis pela redução das áreas naturais do cerrado.
























Quantificação multitemporal das áreas de cobertura
 vegetal e uso do solo (ha)


Classe de Legenda


1954


1964


1973


1984


1994


1998


Mata
Cerrado
Campo
Corpos d’Água
Área Agrícola
Área Urbana
Reflorestamento
Solo Exposto
TOTAL


109.414
220.003
251.609
160
93
121
0
0
581.400


94.533
198.694
275.267
4.074
2.570
4.625
0
1.637
581.400


88.017
176.103
254.597
4.749
35.223
12.208
0
10.503
581.400


73.060
105.281
222.187
5.750
120.954
21.409
19.357
13.402
581.400


69.416
100.541
144.762
5.909
213.896
28.134
11.977
6.765
581.400


57.770
57.622
130.501
5.369
269.366
38.179
9.236
13.357
581.400


Quantificação multitemporal das áreas de cobertura vegetal e uso do solo (ha)



2 No período estudado (44 anos), o DF perdeu 57,65% da sua cobertura original. A maior perda foi para o ambiente de cerrado (73,80%).
















Perda de cobertura vegetal em 44 anos, de 1954 a 1998 no DF e ocupação antrópica no período (área original 581.400 ha com 99.98% não antropizados).


Classes de Legenda


Área (ha)


% do original


Mata
Cerrado
Campo
Total Perdido
Uso Antrópico da Área Desmatada
Corpos d’Água
Área Agrícola
Reflorestamento
Solo Exposto


51.644
162.380
121.108
335.132

5.369
269.366
9.236
13.356


47,20
73,80
48,13
57,65





3 Com base nos levantamentos da flora atual, estima-se que, no DF, deviam existir originalmente pelo menos 300 espécies de árvore no cerrado. Considerando que os 27% remanescentes ainda contenham 70% das espécies que originalmente existiam em 100% do território, a perda foi da ordem de 100 espécies de árvore ao longo de 44 anos.


4 Considerando-se que 70% das espécies herbáceas são comuns entre campo e cerrado e que a perda foi de 48% da área campestre, calcula-se que a perda está na faixa de 300 espécies herbáceas e arbustivas.


5 O número conhecido atualmente de espécies arbóreas de mata no DF está em torno de 500 espécies, e o número de herbáceas está em cerca de 200. Considerando a baixa similaridade entre essas formações (em torno de 30%), acredita-se que já houve perda de 200 espécies entre arbóreas e herbáceas.


6 A perda da cobertura vegetal do DF está estimada em 57,65%, o que resultou na perda também de 20% das espécies vasculares (samambaias, orquídeas, gramíneas, ervas, palmeiras e árvores lenhosas) que existiam originalmente no DF. Em termos de diversidade da flora do cerrado, estima-se, portanto, uma perda de 600 espécies vasculares.


















Comparação entre as 10 famílias mais representadas em número de espécies do cerrado (Mendonça et al., 1998).


FAMÍLIA


Flora do Cerrado
nº espécies


Núcleo da RBC
 nº espécies
      %


Leguminosae
Compositae
Orchidaceae
Gramineae
Rubiaceae
Melastomataceae
Myrtaceae
Euphorbiaceae
Malpighiaceae
Lythraceae
Outras famílias
Totais


777
557
491
371
250
231
211
183
126
113
3119
6429


210
269
80
151
81
80
72
50
58
22
1021
2094


27,02
48,29
16,29
40,70
32,40
34.63
34,12
27,32
46,03
19,46
32,73
32,50


Conheça as recomendações e conclusões do estudo da Unesco


Recomendações




  •  Levantar, organizar e estruturar um banco de dados geo-referenciado em ambiente de Sistema de Informações Geográficas – SIG, para as reservas-núcleo da Reserva da Biosfera do Cerrado, contendo informações de levantamentos relacionados à biodiversidade nessas áreas.



  • Definir as áreas de risco ambiental localizadas ao redor das zonas- núcleos da Reserva da Biosfera do Cerrado, bem como as medidas mitigadoras a serem adotadas no sentido de minimizar as pressões antrópicas nessas unidades.



  • Dar continuidade ao processo de monitoramento ambiental a fim de acompanhar a evolução da dinâmica da paisagem no DF.



  • Estabelecer uma estratégia voltada para a recuperação ambiental por meio do plantio de espécies nativas do cerrado em áreas consideradas prioritárias.



  • Propor um zoneamento ambiental para o DF, a fim de compatibilizar as diretrizes definidas pelo Plano Diretor de Ordenamento Territorial do DF.



  • PDOT e as necessidades conservacionistas, garantindo a presença de corredores ecológicos e a conectividade entre os fragmentos de áreas naturais.



  • Fomentar um programa de coletas e identificações botânicas nas áreas nucleares da Reserva da Biosfera, de modo a obter-se uma avaliação precisa da representatividade da flora dessa área.



  • Estabelecer um projeto de conservação das áreas de preservação permanente e recuperação de áreas degradadas com participação efetiva da sociedade.



  • Apoiar o sistema de fiscalização e educação ambiental.



  • Criar e implementar santuários de vida silvestre e parques urbanos em áreas públicas de modo que alguns fragmentos remanescentes de cerrado, campo, cerradão e mata seca da zona de transição da Reserva da Biosfera passem a compor esses corredores.



  • Oferecer estímulos para que proprietários urbanos e rurais passem a cultivar plantas nativas. Conduzir campanhas esclarecedoras sobre os benefícios indiretos dessa medida. Estimular o uso de espécies alimentícias e medicinais.



  • Utilizar espécies nativas na arborização urbana.


Mais informações: 
www.unesco.org.br
 (61)321-3525


Conclusão


O estudo da Unesco sobre a ocupação do Cerrado permite concluir que a perda da cobertura vegetal afeta diretamente a qualidade de vida no DF de várias formas:


1> No clima: regulação de temperatura, umidade, insolação, ventos e qualidade do ar.


2> Na água: nível de infiltração no solo, proteção e depuração das nascentes e cursos d’água (a vegetação funciona como uma espécie de filtro natural).


3> No solo: evita a erosão, a perda da fertilidade, o assoreamento de rios e lagos e as nuvens de poeira no ar.


4> Paisagens e áreas verdes para lazer: essencial para a saúde física e mental.






Glossário


Programa MaB (Man and Biosphere Program – Programa O Homem e a Biosfera): Criado na UNESCO em 1971. Principal objetivo: conciliar a conservação dos recursos naturais com a utilização econômica dos mesmos pela sociedade, de forma sustentável.


Reserva da Biosfera: Atualmente, existem no mundo 391 reservas da biosfera. A gestão das reservas da biosfera coloca no mesmo nível de importância as variáveis ambientais, culturais e socioeconômicas, respeitando as especificidades de cada reserva.


Reserva da Biosfera do Cerrado: Reconhecida pela UNESCO em 1993 e engloba cerca de 50.500 hectares protegidos em sua área nuclear: o Parque Nacional de Brasília (30.000 ha), a Estação Ecológica de Águas Emendadas (10.500) e a Zona de Vida Silvestre da Área de Proteção Ambiental das Bacias do Gama e Cabeça de Veado (10.000). Em torno desses núcleos, encontram-se as zonas tampão e as zonas de transição que têm a função de proteger e atuar como corredores ecológicos. Essa reserva tem como desafio conciliar a conservação da natureza com o bem-estar da população, englobando em seu todo 40% do território do Distrito Federal. De todas as reservas da biosfera existentes, a Reserva da Biosfera do Cerrado é uma das poucas que possuem a peculiaridade de ocupação humana numericamente significativa, além de incluir cidades, unidades de conservação, setores agrícolas e diversificada rede de ensino e pesquisa, possibilitando seu acompanhamento a partir de um marco zero, final dos anos 50 e início dos 60.


 



Goiás quer salvar Cerrado


Juliana Miura


A devastação do Cerrado não pode continuar – essa é a posição da Agência Ambiental de Goiás. Para barrar a devastação do meio ambiente no Estado, o Conselho Estadual de Goiás está elaborando ações para implantar uma moratória na exploração do Cerrado. Dessa forma, será possível conservar a vegetação que ainda não foi destruída e ainda recuperar áreas já degradadas. 


Em todo o território nacional, mais de dois milhões de km 2 de cerrado já foram destruídos e apenas pouco mais de 5% da vegetação originária ainda está intacta. Segundo o Ibama, as áreas destinadas à conservação ambiental somam apenas 0,8% do total do bioma Cerrado. 


O objetivo da Moratória no Cerrado é impedir a abertura de novas áreas para utilização agrícola, a fim de permitir que seja feito um levantamento da situação real do meio ambiente goiano. Segundo a Agência Ambiental de Goiás, as regiões já destinadas para as atividades agropecuárias são suficientes para atender à crescente demanda por alimentos, bastando para isso que se utilize técnicas apropriadas para elevar a produção por hectare.


Para o presidente da Agência Ambiental, Paulo Souza Neto, é inadmissível que o Estado que primeiro colocou o bioma Cerrado como “Patrimônio Natural do Estado de Goiás”, conforme a Lei Florestal Estadual, permita que se continue desmatando áreas naturais. Ele acredita que essa proposta fará com que a sociedade busque o desenvolvimento econômico com bases sustentáveis, optando por alternativas como o reflorestamento, manejo e aproveitamento da vegetação nativa, produção de florestas energéticas, entre outras. Com isso, saem ganhando a sociedade e o meio ambiente. 


SUMMARY