Parque da Chapada Diamantina pede socorro

3 de março de 2004

15 anos depois do decreto, o Parque Nacional da Chapada Diamantina ainda não saiu do papel

 


A beleza das escarpas e do filete d’água que
  cai no Parque da Chapada Diamantina

O Morro do Pai Inácio, lenda viva e símbolo da Chapada Diamantina, distante 400 km de Salvador, foi palco de protestos, em setembro, com manifestações de ecologistas, representantes de ONGs, jornalistas ambientais, educadores e moradores da região. Depois de 15 anos da criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina, a região só viu crescer o turismo sem a contrapartida necessária à sustentação ambiental. A comunidade local reclama da omissão das autoridades e entre as prioridades de ação para a efetiva implantação do parque está o problema fundiário. Diversas reuniões, fóruns, oficinas, movimentos populares e campanhas têm sido realizadas para discutir e promover a implementação efetiva do parque, que vem sendo destruído por incêndios incontroláveis, desmatamentos criminosos e ações irresponsáveis e sem controle de empresários do ecoturismo.

A comunidade exige do governo a inclusão de recursos, no orçamento anual, para o pagamento das indenizações aos posseiros. Caravanas formadas por ambientalistas, educadores, jornalistas ambientais, trilheiros, guias, representantes de ONGs, moradores das comunidades e autoridades sairam de cidades como Palmeiras, Lençóis, Mucugê, Andaraí, Souto Soares, Ibicoara e outras da região da Chapada Diamantina, rumo à base do Morro do Pai Inácio, para chamar atenção de autoridades e imprensa sobre o descaso com a efetiva implantação do Parque Nacional da Chapada Diamantina. Vários deputados baianos como o Edson Duarte, PV, Waldir Pires, PT e Zé das Virgens, PT, deram todo o apoio às manifestações e acompanham as ações para a real implantação do parque. 

Riqueza natural

A diversidade ecológica em ecossistemas como cerrado, florestas de mata atlântica, formações geológicas esculturais, campos rupestres, canions, grutas, serras, cascatas, cachoeiras, rios caudalosos, campos gerais, morrões, além do interesse pela energia misteriosa do lugar, com aparições de objetos voadores não identificados, fazem da Chapada Diamantina roteiro certo para ecoturistas do Brasil e do mundo. A introdução do Festival de Inverno no calendário de festas da região começa a atrair uma demanda maior de visitantes e cidades como Lençóis já está pequena para receber e abrigar tanta gente de fora.

15 anos de descaso

Em setembro de 1985, foi criado o Parque Nacional da Chapada Diamantina. Passaram-se 15 anos da publicação do Decreto Federal nª 91.655, de 17/09/85 e a única ação efetiva realizada pela "administração" do parque, à cargo do Ibama, foi o levantamento fundiário da área. Os 152.000 hectares identificados, em 1998, pelo Ibama, estão distribuídos ao longo dos municípios de Lençóis, Andaraí, Palmeiras, Mucugê, Ibicoara e Mucugê. De norte a sul o comprimento é de aproximadamente 100 km e na direção leste-oeste, a largura média é de 26 km. 

De acordo com análises de estudiosos do Parque Nacional da Chapada Diamantina houve um grande engano cometido no trabalho de implantação do parque, quanto à falta de conscientização junto às comunidades residentes no seu interior. Dizem eles que as comunidades deveriam ser envolvidas no processo de implementação de uma unidade de conservação que tem como histórico, apenas, o próprio decreto de criação. A comunidade questiona o incentivo ao ecoturismo propagado pelo governo e empresariado, nos quatros cantos do mundo, inclusive com sites na internet, sem a devida estruturação da região, por meio da implantação de projetos de educação e sustentação ambiental.

O cenário 

Serras com formações curiosas, como o morro do Camelo; poços de águas escuras, que metem medo, ou claras, para ver o céu refletido; caminhadas por trilhas onde se observa a riqueza da mata; ou lugares ainda não muito visitados como o pico do Barbado, (maior elevação da Bahia em relação ao nível do mar, com 2.033 metros de altura, com subidas em escarpas rochosas) formam cenários exuberantes da Chapada Diamantina.

Degradação e tráfico de animais


Manifestações dos ambientalistas na Chapada Diamantina

"Isso era Lençóis há 10 anos". A frase , pinchada num painel instalado na entrada da cidade, sintetiza bem a indignação de trilheiros e ecologistas diante das transformações por que vem passando um dos maiores paraísos ecológicos do Brasil: a Chapada Diamantina.

A degradação ambiental com poluição de rios e trilhas, incêndios constantes e desmatamentos de florestas, tráfico de animais, dizimação da cultura nativa, associados à propaganda maciça para o incentivo ao ecoturismo sem a infra-estrutura necessária à sustentação racional dos recursos naturais utilizados por uma demanda de visitantes cada vez maior, são indícios que podem levar a Chapada Diamantina a se transformar num lugar onde o perigo e a intranquilidade dos centros urbanos cheguem com muita rapidez. 

A cidade de Porto Seguro, sul da Bahia, é um exemplo clássico desse perigo, onde a prostituição infanto-juvenil, o tráfico de drogas e a exploração imobiliária por estrangeiros sucumbiram as belezas naturais reveladas por Pero Vaz de Caminha. 

Para evitar esse perigo, pessoas que cuidam da chapada com carinho, como os ambientalistas Carlos Formiga e Rosa, em Lençóis; Xoxa, em Souto Soares, o pessoal da Comissão de Meio Ambiente do Capão, entre muitas outras, estão sempre de plantão para denunciar crimes cometidos por autoridades ou empresários inescrupulosos. 

Perigo

A ocorrência de acidentes com trilheiros despreparados e a falta de estrutura de socorro têm preocupado guias antigos como Esmeraldo e novos como Manu. Recentemente uma jovem fraturou a coluna e ficou mais de 15 horas à espera de socorro. A pouca estrutura existente em Lençóis não foi suficiente para o deslocamento rápido até o local do acidente e foi necessário esperar mais de 12 horas por um helicóptero. "É necessário muito cuidado com pisar nas pedras, banhos de cachoeiras em locais que oferecem perigo e também estarmos preparados para os cuidados de primeiros socorros", diz Esmeraldo, guia nativo que conhece bem as trilhas da região.

Mais informações:
Roberto Sapucaia – [email protected]
www.svn.com.br/trilhasecaminhos
Fones – (75) 339-2160 
Radio Jornal Souto Soares
(75) 334-1162
Promotoria Pública- 
Dra Luciana – (75) 334-1181
Vereador Xoxa PV (75) 339-2160 

Estudos fundiários 

O Ibama promoveu o levantamento fundiário do Parque Nacional da Chapada Diamantina entre o período de janeiro a agosto de 1998, realizado por uma equipe técnica composta por: 

Heloisa Orlando (Ph D em Conservação Ambiental -Nottingham University-U.K, Bacharel em Direito pela UFBA e IESB-Instituto de Estudos Sócio-ambientais do Sul da Bahia; 

Iêda Marques, geóloga, ambientalista da Agrovila Campina, Capão-Chapada Diamantina-BA; 

Marta Simões, fotógrafa, ambientalista, assessora técnica da Fumac Piloto de Boninal-Chapada Diamantina-BA, Barbado – Associação de ONGs da Chapada Diamantina; 

Rui Rocha, engenheiro Agrônomo, e Claude Samuel é engenheiro ambientalista, Barbado. Segundo estes estudiosos, embora a orientação metodológica para realização do levantamento fundiário se restringisse a aspectos técnicos e jurídicos, foram acrescentadas algumas inovações e uma nova metodologia foi adotada, considerando principalmente a participação da população local. Desta forma, eles informam que logo no início dos trabalhos foram implantados três marcos de apoio básico, próximos às cidades de Mucugê, Andaraí e Palmeiras. Ao todo foram levantadas e mapeadas 308 ocupações, correspondente a área total de 71.809,17ha, sendo que 15,58% dessa área estão fora dos limites do parque . Dessas ocupações o levantamento cadastrou 161 famílias residentes, num total de 686 pessoas. 

Origem das terras

Segundo relato dos estudiosos, os documentos de aquisição dos imóveis apresentados são, na sua maioria, escritura particular de compra e venda, carta de sentença, certidão de partilha registrada nos cartórios de Registro de Imóveis e Hipotecas ou recibos e declaração de compra e venda lavrados em Tabelionatos de Notas.