Ressecamento do solo atinge dez milhões de hectares/ano. E há falta de recursos
6 de abril de 2004Desertos ocupam 30% do território mundial e causam prejuízo anual de US$ 42 bilhões
Durante duas semanas, de 15 a 26 de novembro último, 2500 delegados representando 155 países estiveram reunidos em Recife, na III Conferência dos Países Signatários da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e à Seca, – COP3 – para uma troca de experiências sobre os programas de combate à desertificação e a busca de novas fontes de financiamento para implementar projetos e programas.
O tema principal da conferência, aberta pelo Presidente da Assembléia Geral das Nações Unidas, Theo Ben Guribab, foi a análise dos relatórios dos trabalhos desenvolvidos em países africanos, especialmente processos de controle do ressecamento do solo, armazenamento e aproveitamento de águas subterrâneas. Trata-se da primeira avaliação dos programas implementados nos países signatários da convenção da ONU contra a desertificação.
A queixa geral foi a falta de recursos para implantar os projetos. Não há ajuda dos países industrializados, fato destacado por Guribab e lamentado pelo Ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, que defendeu a necessidade de montagem de um novo mecanismo financeiro para enfrentar a desertificação.
Na África, a maior fonte de recursos é proveniente de acordos bilaterais, enquanto na Ásia e na América Latina o dinheiro vem de instituições financeiras internacionais. No Brasil, segundo Sarney Filho, são necessários recursos da ordem de R$ 2 bilhões anuais, nos próximos 20 anos, para combater a desertificação, mas no orçamento federal do próximo ano estão previstos apenas R$ 60 milhões.
Reuniões paralelas
A exemplo do que ocorre nas conferências sobre meio ambiente a nível mundial, encontros paralelos patrocinados por organizações não-governamentais são realizados para debater, do ponto de vista dessas entidades, os assuntos objeto do temário.
Em Recife, 50 ONGs nordestinas organizaram um fórum paralelo e propuseram que as idéias e experiências que apresentam êxito no semi-árido brasileiro sejam transformadas em políticas públicas.
As ONGs apresentaram um longo documento intitulado "Ações Permanentes para o Desenvolvimento Sustentável do Semi-Árido", propondo que as ações observem uma linha fundamentada no desenvolvimento sustentável, e que sejam dadas condições de autonomia às populações locais.
O coordenador do fórum paralelo, Expedito Rufino, membro da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, disse que o interesse da sociedade é que o desenvolvimento não represente apenas crescimento econômico, mas "condições dignas de vida, justiça, participação social e preservação ambiental".
Já os parlamentares de 20 países, reunidos na Conferência Interparlamentar da Convenção de Combate à Desertificação, sugeriram a inclusão da desertificação e da erosão no currículo do ensino primário de todos os países signatários da convenção.
Eles fizeram um apelo aos colegas dos outros países signatários, cujos Congressos ainda não ratificaram a convenção, para que se empenhem no sentido da aprovação do texto do documento, de maneira que sua aplicação possa efetivar-se no respectivo território, o mais cedo possível.
Em documento divulgado durante a reunião, os parlamentares sugeriram a adoção de mecanismos destinados à conversão das dívidas externas em investimentos na educação ambiental, tendo como foco o estudo da desertificação e das formas de combatê-la.
Os parlamentares se comprometeram a lutar, em seus respectivos países, por medidas efetivas de combate à desertificação, especialmente o manejo integrado de bacias hidrográficas, a promoção de pesquisas sobre as causas e as conseqüências da desertificação, e a adaptação de tecnologias e de uso de biotecnologia para produzir plantas e árvores resistentes à seca.
Propostas do Brasil
O Ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, eleito presidente da COP3, apresentou ao Fundo Ambiental Global (GEF), um projeto de revitalização das áreas de caatinga degradadas, que prevê o reflorestamento e a reconstituição da vegetação nativa. Trata-se do primeiro acordo a ser firmado com o GEF, no âmbito do Plano Nacional de Combate à Desertificação – PNCD – administrado pelo Ministério do Meio Ambiente.
O projeto apresentado pelo ministro atesta que o sertão nordestino tem 1,5 milhão de quilômetros quadrados sob risco de desertificação, dos quais 180 mil quilômetros quadrados estão em processo de degradação grave ou muito grave.
Durante a conferência, o Governo de Pernambuco pediu ao Ministro do Meio Ambiente, José Sarney, uma definição sobre a proposta de transformar o ecossistema da caatinga em patrimônio nacional, a exemplo do que foi feito com a Amazônia e o Pantanal.
Por sua vez, o Diretor-Geral do Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, Antônio Guerreiro, chefe da delegação brasileira à COP3, apresentou uma proposta intitulada Mandato do Recife, no qual sugere a adoção de metas objetivas de combate à desertificação, a serem atingidas no período de dez anos.
Segundo a proposta, técnicos convocados pelas Nações Unidas terão o prazo de um ano para estabelecer metas nas áreas de recursos hídricos, reflorestamento, energia e melhoria da qualidade de vida das populações das áreas atingidas pela desertificação.
A intenção do diplomata é permitir que essas metas sejam submetidas à aprovação da COP4, que deverá reunir-se em abril do próximo ano na Ásia. A proposta de Guerreiro tem o apoio das ONGs que se reuniram paralelamente em Recife.