Folha do Meio Ambiente é 100!
6 de abril de 2004A intenção era apenas uma publicação divulgando os resultados do seminário Recursos Externos em Projetos de Meio Ambiente – Possibilidades e Critérios Brasileiros, realizado em Brasília, em junho de 1989. Mas foi tão grande a repercussão da iniciativa, tantas as solicitações de exemplares, vindas de todos os pontos do País, que a solução foi… Ver artigo
A intenção era apenas uma publicação divulgando os resultados do seminário Recursos Externos em Projetos de Meio Ambiente – Possibilidades e Critérios Brasileiros, realizado em Brasília, em junho de 1989. Mas foi tão grande a repercussão da iniciativa, tantas as solicitações de exemplares, vindas de todos os pontos do País, que a solução foi transformá-la em semente, uma espécie de número zero da Folha do Meio Ambiente, que agora chega ao seu centésimo número.
O editorial de lançamento da primeira edição destacava os objetivos do jornal e o seu caráter de independência: "Acreditamos que a grande e crescente importância da questão ambiental está exigindo uma publicação independente e objetiva jornalisticamente, onde apareçam diferentes versões e pontos de vista, e que possa se tornar inclusive um fórum de discussões e debates".
De fato, ao longo desses dez anos, nossos leitores tiveram em mãos, a cada mês, uma publicação de propriedade de jornalistas, feita por jornalistas, inteiramente desvinculada de compromissos com instituições e afastada de grupos político-ideológicos. Comprometida, exclusivamente, com a defesa das riquezas naturais e do desenvolvimento sustentável.
Nosso espaço sempre esteve disponível para a livre veiculação de todas opiniões, ideologias e tendências, como é normal no exercício do jornalismo democrático.
Porém nosso conceito de meio ambiente é bem mais amplo do que o simples verde pelo verde, e tem como referência a marca registrada deste jornal: "o meio ambiente começa no meio da gente". Ou seja, todas as ações prejudiciais à comunidade, todas as discriminações aos grupos étnicos, todos os atentados à natureza, todas as restrições ao desenvolvimento equilibrado têm merecido e sempre merecerão nosso apoio. Foram e serão sempre o objetivo de nossa existência como veículo de comunicação.
A feliz coincidência de nosso número 100 corresponder à chegada de um novo milênio, é mais uma oportunidade para a reafirmação desses princípios que nortearam e continuarão norteando nossas atividades na Folha do Meio Ambiente.
Aproveitamos para relembrar aos nossos leitores algumas das principais matérias veiculadas por este jornal nas 99 edições, as quais, por si só, definem o caráter de nossa linha de atuação.
São temas de grande relevância para o meio ambiente-devastação da natureza, ecoturismo, trabalho escravo, água, pirataria na biodiversidade, contaminação pelo mercúrio, queimadas, tratamento do lixo, política indigenista, seca no Nordeste, extinção da Mata Atlântica, defesa da Amazônia, desertificação, saneamento, violência, a beleza das bromélias, o encanto das orquídeas ou a proteção da bela e indefesa ararinha azul.
A Folha do Meio começa denunciando o descaso com que é tratado o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, fundado em 1808 por D. João VI e que chegou a ser considerado um dos três maiores do mundo. O então presidente Collor, em visita ao Pantanal, por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente, anunciou uma série de medidas de preservação, inclusive a criação de diversas áreas de proteção ambiental. Na mesma edição o jornal noticia que várias organizações não-governamentais entregaram documento ao Presidente da República, reclamando providências em face da morosidade da atuação das agências ambientais do governo.
Intenção e gesto
É preciso cessar a prática de dois pesos e duas medidas, que conduz a um imobilismo danoso ao exercício democrático. Não é admissível que a sociedade delegue ao Executivo a missão de zelar (e preservar para futuras gerações) o patrimônio ecológico e cultural, e que esta mesma sociedade, através de seu braço político, impeça esta missão em nome de uma filantropia imediatista e eleitoreira, que favorece a bem poucos.
A vitória está em que se reduza a dura distância entre intenção e gesto.
Os bóias frias
Em matéria de duas páginas o jornal denuncia o trabalho escravo, apontando os "bóias frias" e os trabalhadores sem-terra como as vítimas preferidas dos "gatos" e outros aliciadores de mão-de-obra escrava. Famílias inteiras são levadas das regiões mais pobres do país, como o Nordeste e o Norte de Minas Gerais, para as fazendas de São Paulo, Mato Grosso, Goiás e Paraná, onde trabalham apenas para comer e se submetem a condições piores do que às dos animais. Trabalhando na roçada para o plantio, em carvoarias e destilarias, essas pessoas, agenciadas pelo "gato", não têm registro em carteira, enfrentam jornadas de trabalho de até 15 horas e não podem reclamar, pois além da escravidão por dívida, há a coerção pela força.
A Biopirataria
Em dezembro de 1993 a Folha denunciou que plantas, animais, fungos e bactérias estavam sendo levados para fora do País, numa espécie de pirataria, quase sempre realizada com o respaldo da lei. O pesquisador do Cenargen, órgão da Embrapa, Jasiel César, advertia: "Estados Unidos, Comunidade Econômica Européia e Japão estão numa declarada guerra pelo domínio da biotecnologia: nesta guerra vale tudo, não existe ética, não há escrúpulos". Outro pesquisador do Cenargen, Assis Roberto de Bem, conta ter recebido comunicação do Jardim Zoológico de Brasília, afirmando que um pesquisador americano já estava com o tubo de ensaio na mão para coletar o sangue do lobo-guará, animal nativo do cerrado.
Garimpos
Em seu n0 25, o jornal denuncia a contaminação de dez mil garimpeiros pelo mercúrio depositado no rio Tapajós. As denúncias surgiram durante o seminário "Conseqüências da Garimpagem no Âmbito Social e Ambiental na Amazônia", realizado em Belém. Mas as denúncias envolvendo o garimpo vão além do mercúrio e envolvem também prostituição, tráfico de drogas e de mulheres e contrabando de ouro. Em edições posteriores a Folha voltaria ao tema, ampliando as denúncias e requerendo providências do governo.
O lixo
Em outubro de 1990 o jornal iniciou a abordagem do lixo associada à reciclagem, matéria que seria objeto de outras reportagens nos últimos anos. Naquele ano o Brasil já produzia 36,1 milhões de toneladas de lixo por ano, ou 90 mil toneladas por dia. Destas, apenas 44 mil eram coletadas, e deste montante, somente 7,5% passavam pela reciclagem. Apenas 1,3% do lixo era incinerado, ficando o restante depositado no solo, sendo 24,3% enterrado e 67% colocado a céu aberto, nos lixões. Os dados foram fornecidos pelo Laboratório de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade de Viçosa, em Minas Gerais.