Mergulho: um universo silencioso

29 de abril de 2004

Um curso sério e equipamento adequado são garantia de sucesso e segurança para conhecer o mundo submerso

Debaixo d’água, o homem está em um ambiente completamente diferente do seu habitual, o ar. Alguns princípios da física, que geralmente nem percebemos, podem gerar efeitos perigosos, caso não sejam bem compreendidos por nós.
No livro “Manual de Mergulho” (PDIC-Brasil, Rua Visconde de Inhauma, 134, sala 1.311, CEP 20091-000, RJ, fone 021-263.8068) Marcus Werneck oferece a orientação necessária para todos os interessados na prática do Open Water e explica detalhadamente algumas leis da física que têm influência definitiva sobre o mergulhador e seu equipamento.
A parte mais importante, sem dúvida, diz respeito a água, este líquido incolor e transparente que, ao contrário do ar, é praticamente, incompressível. Sua densidade, peso por unidade de volume, é de aproximadamente 1.000kgf/m3 – um litro de água doce pesa cerca de um quilograma-força; a água do mar, por conter diversas substâncias dissolvidas, é ligeiramente mais densa: 1.025kgf/m3.


Hiperventilação
Poucos sistemas do corpo humano respondem tão rapidamente a situações de pânico, ansiedade e aumento de pressão como o respiratório. O aumento da velocidade e/ou profundidade da respiração pode levar a uma super-respiração deliberada ou não. A isto chamamos de hiperventilação. Inspirar  e expirar rapidamente e profundamente além das necessidades do corpo, resulta numa produção de dióxido de carbono e num pequeno aumento na pressão parcial do oxigênio na corrente sanguínea.
Reduzindo a quantidade de dióxido de carbono no corpo, a capacidade do mergulhador livre (mergulho sem cilindro) aumenta muito. A hiperventilação prolongada reduz o nível de dióxido de carbono no corpo ainda mais, rompendo o equilíbrio sanguíneo ácido/base, provocando sintomas de hipocapnia: formigamento nos dedos, contração dos pulsos e mãos, ou mesmo perda de consciência. Algumas vezes, a hipocapnia causada pela hiperventilação será um resultado direto da ansiedade ou pânico.
O mergulho em apnéia, se continuado após hiperventilação excessiva, atrasará a necessidade de respirar, podendo resultar em hipoxia ou falta de suprimento suficiente de oxigênio. Em profundidades, a pressão da água comprime o pulmão dos mergulhadores de forma que a pressão do ar dentro dele se iguale à pressão circundadente. Quando isto ocorre, a pressão parcial do oxigênio nos pulmões aumentará, permitindo que mais oxigênio seja absorvido pelo sangue do que seria normalmente absorvido à pressão atmosférica.
Este aumento rápido e temporário de oxigênio no sangue leva os mergulhadores a sentir que podem ficar mais tempo, ainda, embaixo d’água. Durante a subida, a pressão nos pulmões diminui, assim como a pressão parcial do oxigênio. O corpo de um mergulhador pode conter oxigênio insuficiente para permanecer consciente e pode ocorrer uma perda de consciência durante a subida para profundidades menores ou logo após alcançar a superfície, devido a esta condição. Isto se chama apagamento ou sincope de apnéia.
Evite a super-respiração prolongada, limitando a hiperventilação a três ou quatro respirações antes de mergulhar em apnéia. Relaxe durante as atividades de mergulho, limite o exercício físico o máximo possível, respire profundamente e devagar para evitar o desequilíbrio respiratório.


Orientação para uma mergulhadora


Estando em boa condição física, o mergulho pode ser praticado por qualquer pessoa. Mas existem algumas questões específicas para a mulher. O controle da temperatura é uma delas. O calor do corpo é retido com mais facilidade por uma mulher do que por um homem, devido a presença de mais gordura subcutânea e menos glândulas sudoríparas.
A temperatura do corpo de uma mulher será alguns graus maior que a de um homem antes que se inicie o processo de resfriamento causado pelo suor. Não é incomum super-aquecer-se enquanto se veste para um mergulho. Devido ao calor excessivo que pode ser perigoso, resfrie-se na água de vez em quando se sentir muito calor.
As mulheres também podem ficar com frio mais rapidamente do que os companheiros mergulhadores, devido à maior razão superfície/massa do corpo. Isto é mais verdadeiro para as mulheres magras, com menos de 27% de gordura no corpo. Uma roupa de mergulho adequada ou uma roupa seca para vestir logo depois  pode ajudar a aliviar o problema. Se ficar com muito frio, saia da água e aqueça-se.
Outra consideração importante, diz respeito ao mergulho durante a menstruação. Se a mulher estiver se sentindo bem, não há motivo para deixar de mergulhar. A retenção de líquidos e a circulação sanguínea enfraquecida, porém, são um fato. Estas condições podem aumentar sua suscetibilidade à doença descompressiva. Mergulhe conservadoramente e diminua seu tempo de fundo mais do que o recomendado pelas tabelas de mergulho da Marinha Americana.
O uso de anticoncepcionais também deve ser considerado. Qualquer método contraceptivo que enfraqueça a circulação ou cause a formação de coágulos no sangue pode aumentar a suscetibilidade à doença descompressiva. Mais uma vez, o conselho é mergulhar conservadoramente e evitar mergulhos descompressivos.
E, se você suspeita que está grávida, não mergulhe. A “Undersea Medical Society” faz esta recomendação devido  aos possíveis efeitos maléficos ao feto durante seus primeiros estágios de desenvolvimento.
Quanto ao mergulho na gravidez, as pesquisas ainda estão em andamento, nenhuma delas é conclusiva. Experimentos com cães mostraram que o feto era mais resistente à doença descompressiva do que a mãe. Mas pesquisas realizadas com cabras e ovelhas (cuja placenta se parece mais com a humana) mostraram uma incidência maior de bolhas de nitrogênio no sangue do feto. Há alguma controvérsia sobre os resultados terem sido causados por manipulação cirúrgica.
Uma mulher grávida pode ser mais suscetível à doença descompressiva por dois motivos: edema nos tecidos (retenção de líquidos) que pode afetar a capacidade de liberar o nitrogênio do sistema da mãe; e maior quantidade de gordura no corpo. Como o nitrogênio é mais solúvel em gordura, não pode ser eliminado tão rápido quanto seria normalmente com o uso das tabelas de descompressão.
O feto é suscetível à doença descompressiva porque tem um sistema circulatório diferente da mãe. O sangue do feto não passa pelos pulmões, que auxiliam a filtrar algumas bolhas de nitrogênio maléficas. Em vez disso, estas bolhas viajam mais diretamente ao cérebro, coração e outros órgãos, onde podem causar problemas sérios.
Outra consideração relevante sobre a mergulhadora grávida é a reação adversa a possíveis picadas e mordidas de animais marinhos. Reações graves ocorrem e, embora não esteja provado, o feto pode sofrer efeitos maléficos.