Encontro das águas minerais em Caxambu

O Brasil precisa valorizar sua água mineral

22 de junho de 2004

Carta de Caxambu pede à ministra Marina Silva criação a APA do Circuito das Águas


Foto: João César Pinheiro, diretor-geral do DNPM; Emanuel Martins, do DNPM de Minas; o deputado estadual Laudelino dos Santos  (PT-MG) e Reynaldo Guedes, do FOCAS
participaram da mesa do Encontro de Caxambu que pediu urgência aos governos federal e de Minas Gerais na criação da APA do Circuito das águas


Gestão sustentável
Para o engenheiro Paulo Maciel, representante da Ecobusiness e ex- secretário de Meio Ambiente de Belo Horizonte, a ” gestão sustentável de recursos hídricos é na verdade uma gestão de conflitos, e o Sistema Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos foi criado para, entre outras coisas, arbitrar os conflitos existentes.
Em nível nacional há o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, onde o executivo é a Agência Nacional de Águas. Em nível regional são os comitês regionais de bacias hidrográficas. Hoje no Brasil existem 98 comitês, sendo 7 federais e 91 estaduais. Dos estaduais, 21 estão em Minas Gerais.
Com os comitês e agências de bacia se discute, delibera-se e questiona-se até quando pode-se tirar água sem prejudicar o meio ambiente. Para isso existem os planos de recursos hídricos, que são feitos dentro de uma análise do desenvolvimento regional onde são avaliados. A partir daí se aplica o princípio Poluidor – Pagador:
· Volume utilizado: usuário – pagador (quem usa paga)
· Volume consumido: consumidor-pagador (quem consome paga)
· Poluição lançada: poluidor-pagador (quem polui paga)
· Modificação do regime: modificador-pagador (quem muda o ambiente paga)
· Benefício recebido: beneficiado-pagador (quem recebe o benefício paga)


Interesses e conflitos
Élcio Linhares, diretor de águas subterrâneas do Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo, colocou em questão o interesse de grandes empresas em explorar as águas.
Seria esse interesse maior do que o interesse público? O usuário do bem mineral teria os mesmos direitos do usuário dos recursos hídricos? Esses questionamentos seriam o objetivo básico para uma gestão integrada das águas minerais.
Termalismo na Previdência
Para o médico Marcos Untura, reumatologista e diretor científico da Sociedade Brasileira de Termalismo “é imprescindível preservar sempre as áreas de recarga”.
Segundo Untura, no Brasil ainda temos uma visão arcaica de que as águas minerais só teriam seu uso terapêutico direcionado às pessoas idosas, enquanto que no continente europeu seu uso é amplamente estendido a todos indefinidamente.
“Precisamos inserir o termalismo na previdência social, fazer parceria com a iniciativa privada para desenvolvimento dos estabelecimentos termais e regulamentar a comissão permanente de crenologia.”


Reencontro homem
e natureza
O engenheiro José Peccinini Petri, presidente de honra da Sociedade Brasileira de Termalismo, acrescentou que uma das grandes preocupações do termalismo é justamente não alterar o produto mineral. Deve ser feita a caracterização terapêutica e turística deste produto. Evidentemente o Brasil é um grande possuidor de recursos minerais, no entanto não existem ainda pesquisas complexas dentro da hidrogeologia.
“O termalismo nada mais é que o reencontro do homem com a natureza. Temos que tomar o devido cuidado para que nossas cidades não sejam ?mortas? como está acontecendo hoje. Temos que estudar os problemas existentes dentro das estâncias, estudar os conflitos, coordenar e integrar os trabalhos de geologia, hidrologia, etc, para que haja um equilíbrio entre todas essas especialidades, e que tenham todos os mesmo fim, que é o bem comum da humanidade”, afirmou Petri.


Água mineral artificial
O diretor-geral adjunto do DNPM, João César Pinheiro, disse não compactuar com o termo águas minerais artificiais e artificialmente modificadas. A água purificada adicionada de sais (como a Pure Life) pode ser obtida de qualquer captação e até de abastecimento público, mas não deve ser comercializada como água mineral. João César Pinheiro defendeu a criação urgente da comissão de crenologia no Brasil para que se comece, finalmente, com os estudos e o aperfeiçoamento da geomedicina.


APA Circuito das Águas
A proposta mais importante do Encontro de Caxambu foi a criação da Área de Proteção Ambiental -APA do Circuito das Águas, para que possa ser feita uma gestão integrada do aproveitamento dos recursos hídricos e adotar o Zoneamento Ecológico Econômico como instrumento de gerenciamento territorial.


 


Eventos naturais hídricos no Brasil
Aqüífero Guarani, Circuito das Águas, Floresta Amazônica e o Pantanal são especialíssimos


Milano Lopes, de Brasília
A utilização das águas minerais no Circuito das Águas, no Sul de Minas Gerais, que abrange os municípios de Cambuquira, Caxambu, Lambari e São Lourenço, caminha para a sustentabilidade. Dia 22 de junho, no Rio de Janeiro, o deputado Odair (PT-MG) se reuniu com o Diretor de Hidrologia da Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais – CPRM – José Ribeiro, para dar a partida do mapeamento hidrogeológico do Circuito das Águas que vai definir os limites das fontes e dos usos das águas minerais. Junto com a floresta Amazônica, o Pantanal e o aqüífero Guarani, o Circuito das Águas é um dos grandes eventos naturais relacionados à água dentro do Brasil, pois se trata da mais rica região em diversidade de águas minerais do planeta. Na região sul de Minas concentram-se doze
diferentes qualidades de águas minerais.


Código obsoleto
Segundo o deputado Odair, o mapeamento hidrogeológico vai definir o que existe, efetivamente, de água na região e, a partir dessa mensuração, definir os níveis de consumo adequados.
Para quem ainda não percebeu a gravidade do problema, basta entender uma coisa bem simples:  o Código de Águas  (Decreto-Lei nº 7841, de 8 de agosto de 1945) está tão obsoleto que as águas minerais são consideradas como minério e, como tal, pode ser, em tese, explorado até a exaustão pelos concessionários dos direitos de lavra.
Em Minas, a Lei nº13.199, de 1999, assegura o controle, pelos usuários atuais e futuros, do uso da água e de sua utilização em quantidade, qualidade e regime satisfatórios.
Em compensação, a mesma lei estabelece que, na execução dessa política de utilização da água mineral, devem ser observados o gerenciamento integrado dos recursos hídricos,  e o reconhecimento dos recursos hídricos como bem natural de valor ecológico, social e econômico, cuja utilização deve ser orientada pelos princípios do desenvolvimento sustentável.
Já a lei estadual nº 13.771, (11/dez/2000) vai mais longe. Estabelece em seu art. 8º, que “a implantação ou ampliação de empreendimentos consumidores de elevados volumes de águas subterrâneas, classificados ambientalmente como empreendimentos de grande porte e potencial poluidor, será precedida de estudo hidrogeológico para avaliação das disponibilidades hídricas e do não comprometimento do aqüífero a ser explotado, sem prejuízo da apreciação do Conselho Estadual de Política Ambiental – COPAM”.
Em 1998, o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM – divulgou a portaria nº 231, dispondo que “o conhecimento do potencial hídrico subterrâneo da área e o seu dimensionamento, a sua preservação, a sua conservação e a racionalização do seu uso necessitam de estudos geológicos e hidrogeológicos de detalhe, estudos esses indispensáveis para a definição da área de proteção de uma fonte.”
A própria CPRM, em seu relatório técnico “Estudos Geoambientais das Fontes Hidrominerais de Cambuquira, Caxambu, Lambari e São Lourenço”, produzido em 1999, indicou que “os aqüíferos intergranulares são rasos, sem muita importância como recurso hídrico, mas de extrema influência na recarga dos aqüíferos fraturados. São aqüíferos de produtividade limitada e, portanto, as demandas deverão adequar-se às limitações existentes.”
Segundo o deputado Odair Cunha, a legislação estadual mineira que complementa a legislação federal, e as manifestações de órgãos técnicos como o DNPM e a CPRM, além do apoio do Congresso, garantem sustentação à realização do mapeamento.



O Código de Águas  está tão obsoleto que as águas
minerais são consideradas
minério e, como tal, podem ser
exploradas até
a exaustão pelos
concessionários dos direitos
de lavra


summary


Natural water events in Brazil
 Aquífero Guarani, Circuito das Águas, Amazon Forest and the Pantanal
The use of the mineral waters in the Circuito das Águas (Water Circuit), located in the southern part of the state of Minas Gerais, including the townships of Cambuquira, Caxambu, Lambari, Conceição do Rio Verde and São Lourenço, appears to be on the road toward becoming sustainable.  On June 17, in Rio de Janeiro, Minas Gerais State Representative Odair (PT) met with the director of Hydrology of the CPRM – the Mineral Resources Research Company, José Ribeiro, to get the hydro geological mapping underway for the Circuito das Águas, in Minas Gerais, which will define the limits of the sources and uses of the mineral waters.   Together with the Amazon forest, the Pantanal and the Aquífero Guarani (Guarani Waterway), the Circuito das Águas is one of the largest natural water events in Brazil, because it is the richest region in terms of biodiversity of mineral waters on the planet.  Concentrated in the southern Minas Gerais State region twelve different types of water minerals can be found.  According to Representative Odair, the hydro geological mapping will effectively define what waters there are in the region and based on this measurement, define the proper consumption levels.  
For anyone who has not yet realized the seriousness of the problem one need only understand one simple fact:  the Water Code (Decree Law no. 7841 of August 8, 1945) is so obsolete that the mineral waters are still regarded as a mineral asset and as such may be, theoretically, exploited until they are depleted by the concessionaires holding the mining rights.  Representative Odair maintains that the hydro geological mapping of the Circuito das Águas, to be truly effective, must be as broad as possible, encompassing all uses of the resource.  In addition to Nestlé, other private users, especially hotels, will be included in the survey, so that the definition of the sources and the uses of the waters is conducted comprehensively.


O Circuito das Águas em MG (Cambuquira, Caxambu, Lambari e São Lourenço) é um dos grandes eventos naturais
relacionados à água dentro do Brasil, pois se trata da mais rica região em
diversidade de águas minerais
do planeta.
Na região
concentram-se
12 diferentes qualidades de águas minerais


Mapeamento deve ser bem abrangente
Além da Nestlé, outros usuários privados serão alcançados


Abrangência
O deputado Odair sustenta que o mapeamento hidrogeológico do Circuito das Águas, para ter eficácia, deve ser o mais abrangente possível, incluindo todos os usos do recurso. Além da Nestlé, outros usuários privados, especialmente os hotéis, serão alcançados pelo levantamento, para que a definição de fontes e usos seja feita de forma completa.
Sabe-se que o consumo dos hotéis instalados nas cidades que compõem o Circuito das Águas, em especial a cidade de São Lourenço, constitui a maior parcela dos usos da água mineral.
Entre as organizações da sociedade civil, a mais entusiasta do mapeamento hidrogeológico, conforme o deputado Odair, é o Fórum de ONGs do Circuito das Águas do Sul de Minas – FOCAS – que chegou a elaborar um texto sobre o assunto, o qual serviu de referência para que o parlamentar mineiro apresentasse, no ano passado, uma indicação à Ministra do Meio Ambiente, solicitando a adoção da providência.
Desmineralização
Além do levantamento hidrogeológico, outra questão que vem mobilizando as organizações da sociedade civil no Circuito das Águas, especialmente em São Lourenço, é a desmineralização das águas minerais.
Recentemente, no plenário da Câmara, a deputada Luciana Genro, (PT-RS), denunciou a desmineralização das águas minerais de São Lourenço pela Nestlé, solicitando providências dos governos de Minas Gerais e da União.
Lembrou o deputado Odair que no ano passado a Nestlé recebeu uma notificação do DNPM para apresentar um Plano de Aproveitamento Econômico que esclareceria a questão da desmineralização. Mas ao invés do plano, a Nestlé retornou com uma série de indagações e o processo continuou.
Este ano a empresa recebeu nova notificação, tendo o DNPM dado um prazo de 30 dias, exaurido em 28 de abril, para uma decisão da Nestlé. Esta preferiu entrar na justiça, solicitando uma prorrogação desse prazo até 30 de outubro próximo.
Enquanto isso, a Nestlé fez um acordo com lideranças locais da cidade de São Lourenço e de autoridades estaduais, envolvendo a gestão participativa do Parque das Águas, e promete uma solução para a produção da Pure Life, a água desmineralizada, até 30 de outubro deste ano.
Ao garantir que não tem total clareza sobre a desmineralização, o deputado Odair afirmou que há grupos a favor e contra, assinalando que o importante é continuar os debates, inclusive com a participação do governo. O fato – acrescentou – é que não há nenhuma legislação, sequer uma portaria, autorizando a desmineralização.
Na condição de coordenador da Frente Parlamentar das Águas, o deputado Odair anunciou que no início do segundo semestre será promovido, na Câmara, um seminário onde se discutirá uma política globalizada para as águas, incluindo as águas minerais e uma revisão do Código das Águas, que tem quase 60 anos de vigência.
Na Câmara – afirmou Odair – o presidente João Paulo criou uma comissão especial para apreciar, em conjunto, os projetos relativos ao Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, em especial o PL 1616.


Mapeamento
hidrogeológico do Circuito das Águas
em MG vai definir
os limites das fontes
e dos usos da água