A beleza da fotografia que denuncia e conscientiza
22 de junho de 2004A pesar da imensa exploração, o Cerrado ainda guarda um potencial genético muito grande. Evidente que há impactos irremediáveis e várias espécies estão já bem comprometidas. Mas existem vários projetos de recuperação tanto pelos organismos governamentais, como Embrapa, Ibama, universidades e Jardim Botânico, como projetos de conscientização promovidos por organismos não governamentais, como Funatura, WWF,… Ver artigo
A pesar da imensa exploração, o Cerrado ainda guarda um potencial genético muito grande. Evidente que há impactos irremediáveis e várias espécies estão já bem comprometidas. Mas existem vários projetos de recuperação tanto pelos organismos governamentais, como Embrapa, Ibama, universidades e Jardim Botânico, como projetos de conscientização promovidos por organismos não governamentais, como Funatura, WWF, SOS Cerrado, Patrulha Ecológica e esse que estamos falando numa iniciativa do fotógrafo Carlos Terrana.
O bioma Cerrado foi reconhecido como “Hot Spot” para a conservação da biodiversidade mundial. Isso tem um significado muito forte, pois é como se acendesse uma luz vermelha para o bioma. É um alerta máximo e muito sério. Para Celso Salatino Schenkel, Coordenador de Meio Ambiente e Desenvolvimento da Unesco no Brasil, é fundamental que a conservação da diversidade biológica do Cerrado seja tratada sob a perspectiva do planejamento bio-regional e que corredores ecológicos de grande escala, intermunicipais e interestaduais,- sejam estabelecidos. “A sociedade precisa entender que a biodiversidade deve ser tratada como patrimônio ambiental. Quem se arrisca a perder ativos ambientais na quantidade e qualidade dos que dispomos no Brasil está abrindo mão de insumos para o desenvolvimento, está perdendo bens inestimáveis capazes de gerar trabalho, renda e melhor qualidade de vida”, afirma Schenkel.
O site de Carlos Terrana < www.soscerrado.com > tem vários ícones de navegação, mas seu principal atrativo é justamente o belíssimo acervo fotográfico. Para Carlos Terrana, o Cerrado é o menos protegido pelas leis brasileiras. Estranhamente, a Constituição promulgada em 1988 não considerou patrimônio ambiental uma das mais ricas e raras biodiversidades do mundo. Um esquecimento perigoso, que abriu portas para ações criminosas de desmatamento, invasões, exploração e caça. As conseqüências são demais conhecidas: degradação, flora e animais em extinção, poluição das águas, etc. Para o jornalista e ambientalista Marcya Reis foram os bandeirantes os primeiros a farejar as riquezas que a terra escondia e, desde então, o bioma começou a ser explorado e destruído. Garimpos e mineradoras se espalham por toda a região até os dias de hoje. Poluem nascentes, desviam o curso de rios, provocam assoreamento e jogam metais pesados diretamente nas águas. Os caçadores de animais silvestres também vieram e abastecem um contrabando desenfreado. Caçadas aos milhares, as espécies de aves e animais que só aqui existem, estão na fila da extinção. As árvores do Cerrado viram carvão nas mãos de homens que ganham a vida num trabalho insalubre e ingrato. Pouco a pouco, a vegetação nativa do Cerrado desaparece da paisagem pela obra de carvoarias.
Carlos Terrana – Entrevista
“A fotografia é uma ferramenta importante
para a criação de um pensamento
humanitário e preservacionista”.
Carlos Terrana
Folha do Meio – Por que você que é um fotógrafo bem sucedido no meio político e social, resolveu se dedicar à preservação do Cerrado?
Terrana – Depois de 20 anos percorrendo o Centro-Oeste em busca de imagens das belezas naturais do Cerrado me deparei com um dilema pois, nos últimos anos a cada viagem, acabava trazendo mais fotos de destruição do que de belezas naturais. Mas a gota d’água mesmo foi quando tomei conhecimento de que o Cerrado havia ficado de fora da nova Constituição. Foi aí que decidi usar o meu material fotográfico para realizar uma campanha nacional de valorização desse ecossistema tão explorado e tão degradado.
FMA – Quando você fez o site SOS Cerrado quais as dificuldades e as alegrias que teve?
Terrana – Olha, a primeira grande dificuldade foi desenvolver o site sem suporte técnico e também sem apoio financeiro. Difícil mesmo foi procurar vários órgãos como Ibama, Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do DF, Jardim Botânico de Brasília e não encontrar nenhum tipo de incentivo. Eu digo incentivo, porque apoio parecia pedir demais.
Mas quem quer, quem tem sonho não pode ficar no meio do caminho. Fui atrás e hoje tenho uma grande alegria que vale por tudo. Justamente quando vejo brasileiros entre 10 e 70 anos, de todos os cantos do País, enviando a mensagem para a ministra do Meio Ambiente Marina Silva, no link “participe”. Aí fica clara a vontade dessas pessoas em ver corrigido este erro em nossa Constituição e todos querem dar ao Cerrado o valor que ele merece como um ecossistema rico em flora, fauna e fantasticamente rico em água.
FMA – Em dois anos quais as compensações pessoais e profissionais que você teve?
Terrana – Foram muitas tanto pessoais como profissionais. Estou utilizando centenas de imagens que estavam em meus arquivos, sem uso prático e agora estou canalizando esse material para uma causa nobre. É muito bom ver a gente fazer de um trabalho tão bonito, feito com tanta emoção e criar para ele uma função social. Mais do que uma fotografia artística é uma fotografia de defesa e valorização da vida.
FMA – E agora você tem algum projeto em mente?
Terrana – Bem, primeiro quero consolidar e tornar o site SOS.CERRADO.COM auto-sustentável. Estou em busca de parcerias.
FMA – Para concluir, o que você recomenda, qual a sua opinião para melhor preservação do Cerrado?
Terrana – Veja, a agricultura é importante, o agronegócio é importante mas há que ter um equilíbrio. A verdade é que as grandes e extensivas monoculturas estão destruindo o nosso Cerrado. Não estão respeitando as matas ciliares e nem os mananciais. Estão deixando agrotóxico correr para os rios. Precisamos mudar esse modelo que destrói a natureza para produzir riqueza. A grande riqueza está no que existe no pouco do Cerrado que resta. A destruição não pode ser tão rápida. O bom senso tem que prevalecer. A própria sociedade deve cobrar das autoridades, da fiscalização e das lideranças políticas mais proteção para esse ecossistema tão devastado quanto a Mata Atlântica.
A ocupação do Cerrado vem acontecendo de forma intensa comprometendo a fauna, flora e mananciais da região. Tal qual aconteceu com a Mata Atlântica, o bioma Cerrado também corre perigo. Nas fotos de Carlos Terrana, duas realidades: o contraste da ocupação com a beleza das flores
As Guardiãs das Nascentes
As mulheres são sempre as mais eficientes guardiãs das águas e da vida. Cibele era guardiã das cavernas e adorada no alto das montanhas, onde estão as nascentes dos rios. Sarasvati, na Índia, era guardiã das águas e das artes. Na Grécia, as Erínias eram deusas infernais e guardiãs das leis terrenas, enquanto Horae favorecia as colheitas e era guardiã da natureza. Gaia tinha aspecto de criadora e era a deusa da Terra. Oxum
incorporou nos cultos
afro-brasileiros a defesa
das águas. As nascentes
do Cerrado também têm suas guardiãs que, fotografadas por Carlos Terrana, enriqueceram com graça e magia a mostra da Semana do Meio Ambiente em Brasília.
Juliana Gonzaga e seu filho, nas Veredas da Chapada dos Veadeiros (acima); Uaíra Serena, no Salto do Itiquira (central); e Vera Sant (ao lado). Três Guardiãs das Nascentes clamando por novas zeladoras das águas do Cerrado