Ponto de Vista - Licenciamento ambiental

Meio Ambiente e Sociedade

27 de setembro de 2004

Licenciamento ambiental é mesmo um entrave ao desenvolvimento do setor produtivo?


Vê-se hoje nos jornais um conjunto de críticas aos processos de licenciamento ambiental classificados de entraves ao desenvolvimento do setor produtivo, como o agronegócio, mineração, exploração de petróleo e gás; e do país, caso dos projetos de infra-estrutura como usinas hidrelétricas, estradas e portos.
Por sua vez, os ambientalistas reunidos em organizações nacionais e regionais unem-se aos porta-vozes dos órgãos ambientais estaduais e federal no coro em defesa, além da preservação do meio ambiente, do direito de a sociedade brasileira opinar e decidir que rumo deseja seguir. Para opinar e decidir, entretanto, é necessário conhecer a legislação ambiental, o contexto socioeconômico e ambiental da área do empreendimento, a importância do projeto, seus impactos positivos e negativos no ambiente e para o desenvolvimento local, regional e nacional e todos os aspectos que envolvem o licenciamento ambiental.
Todo e qualquer processo de licenciamento ambiental no âmbito federal, ou estadual, requer que a sociedade seja informada e participe do processo decisório. Reunido ou não em organizações sociais, o cidadão pode opinar, pedir esclarecimentos e alterações no projeto, propor compensações socioambientais e, até mesmo, embargar um empreendimento.
A participação da sociedade começa desde o pedido de licenciamento, o qual deve ser publicado em veículos de comunicação locais e nacionais, quando for o caso. Alguns Estados, como São Paulo, exigem que o empreendedor realize audiência pública quando solicita o Termo de Referência-TR.
O TR é uma espécie de roteiro para os Estudos de Impacto Ambiental, nos quais deve constar um plano de comunicação. A partir da entrega ao órgão ambiental dos estudos, que são complementados por uma peça de comunicação à sociedade – o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) -, estes devem ser postos à disposição para consulta por um prazo, geralmente, de 45 dias. Daí, são marcadas audiências públicas, para ouvir os cidadãos e representantes dos diversos segmentos sociais.
Todos esses instrumentos deveriam garantir o direito à informação e à participação social. Na prática, entretanto, o que se verifica é o puro cumprimento da norma, sem atentar para a eficácia dos processos de comunicação. Talvez por falta de quadros técnicos especializados, ou de percepção dos problemas, os órgãos ambientais mostram-se pouco atentos à sua análise.
O que se nota é que os processos e instrumentos de comunicação embutidos no licenciamento ambiental – e exigidos por preceito constitucional – são desenhados e executados de forma dissociada do contexto socioambiental a que se referem. Por exemplo, são raros os casos em que o Rima é redigido visando o público-alvo e traduzido em linguagem acessível. Normalmente, é feito um resumo dos estudos técnico-científicos e utilizados os mesmos gráficos e tabelas do EIA; isso quando não é feita apenas uma montagem dos textos. Também não se verifica a preocupação em responder às dúvidas reais e às expectativas das comunidades envolvidas.
Os planos de Comunicação Social exigidos na maioria dos processos de licenciamento pouco contemplam o conhecimento social da área de influência do empreendimento, bem como as expectativas das populações. A impressão que se tem é de que são trabalhados à parte do EIA,  uma vez que raramente atendem aos demais programas prescritos, ou incluem subprogramas de comunicação de risco, aí incluídos emergência e crise.
As audiências públicas são geralmente produzidas como um espetáculo, com o único fim de atender ao rito legal. O objetivo principal de informar a população e promover a discussão fica relegado a segundo plano, uma vez que as apresentações padecem do mesmo mal do Rima. Já houve até um caso de a audiência pública ser suspensa sob a alegação de que a população não estava preparada para analisar o empreendimento…
Em todos os casos, pode-se constatar que as populações, seus anseios, dúvidas e expectativas não são consideradas durante todo o processo de licenciamento ambiental, sendo chamadas apenas para validar os ritos legais, quando necessário.