Pará: império fundiário de CR Almeida pode desabar

Criação de Unidade de Conservação no Xingu engole as “terras” do mega empresário CR Almeida dono da Ceciolândia

21 de março de 2005

  1 – O Procurador Ubiratan Cazetta e outros  procuradores do Ministério Público Federal ofereceram denúncia na Justiça de Santarém contra pessoas arroladas por vários crimes na compra, venda e registro de terras griladas em cartório. 2 – Carlos Alberto Lamarão, diretor do Interpa: ” As “terras dos Almeidas” eram lotes de 20 mil hectares, … Ver artigo

 

1 – O Procurador Ubiratan Cazetta e outros  procuradores do Ministério Público Federal ofereceram denúncia na Justiça de Santarém contra pessoas arroladas por vários crimes na compra, venda e registro de terras griladas em cartório.


2 – Carlos Alberto Lamarão, diretor do Interpa: ” As “terras dos Almeidas” eram lotes de 20 mil hectares,  mas os títulos fraudados se
transformaram, nos cartórios, em 4,7 milhões de hectares”. 


3 – Marcílio Monteiro, gerente do Ibama-PA: “A grilagem de quase 7 milhões de hectares  reforça a necessidade de
 criação de Unidades de Conservação, em especial na Terra do Meio. O Ministério Público Federal está de parabéns”.


Segundo a crônica judiciária, a Ceciolândia (cidade de CR Almeida) construída sob a égide da grilagem  representa a área de vários territórios europeus e estados brasileiros. Avaliada em cerca de 500 milhões de reais, a área em poder de Almeida não é uma “terra qualquer”, segundo a denúncia do Ministério Público Federal: “Trata-se de um verdadeiro santuário da natureza, dotado de inúmeros recursos de elevado potencial econômico, forjado no seio de floresta nativa da mais pródiga biodiversidade, entremeada de rios navegáveis, e que abriga reservas ainda imensuráveis de minérios preciosos, tais como o ouro, e de madeiras nobres, como o mogno. “As terras dos Almeida” dispõem de 65 milhões de metros cúbicos de madeira nobres com alta incidência de mogno. Segundo técnicos do Ibama, este patrimônio florestal, se explorado, valeria em torno de 6 bilhões de dólares.
Segundo a denúncia do MPF, há “existência de indícios e provas de operação fraudulenta que resultaram na formação de imensa propriedade rural (Fazenda Rio Curuá em Altamira/PA) nas mãos de Cecílio Rego de Almeida e de seu filho Roberto Beltrão de Almeida, ainda que por intermédio de empresa suas ou por estas controladas e, ainda, de pessoas de sua confiança”.
Os fatos descritos na chamada operação fraudulenta, engendrada desde a década de 80, no documento do MPF para melhor compreensão foram exemplificados em três grandes etapas:
1) Falsidade ideológica levada a cabo no Cartório do Registro de Imóveis de Altamira (Cartório Moreira – em 1984) que deflagrou a grilagem da terra;
2) Outra falsidade da mesma natureza e no mesmo cartório perpetrada no ano de 1993, que ultimou a grilagem;
3) Alienação da terra grilada, em negócio que encerrou falsidade ideológica, no ano de 1995.
Entre as “evidências da fraude” levantadas pelo MPF no depoimento de Roberto Beltrão de Almeida o depoente simplesmente diz que: “considerando que, para a aquisição em questão, não seria necessária consulta ao Iterpa – Instituto de Terra do Pará, Ibama, Incra ou Funai, posto que, por orientação de sua assessoria jurídica, tais órgãos não teriam competência para atestar a legalidade das terras”. 
As terras as quais Almeida se refere possuem área maior duas vezes a superfície de Sergipe.
Para Marcílio Monteiro, Gerente Executivo do Ibama no Pará, “a grilagem de quase 7 milhões de hectares  reforçam as atitudes tomadas pelo MMA e Ibama, em especial na Terra do Meio, na criação de Unidades de Conservação como uma das estratégias de barrar práticas de grilagem e especulação fundiária na Amazônia”. E conclui Monteiro: “O MPF está de parabéns pela atitude de coibir esta prática de usurpação do patrimônio público que contribui para gerar violência no meio rural”.


Impunidade
Nos últimos anos, o desencontro de instâncias dos governos e a certeza da impunidade estimularam o grupo CR Almeida a se apropriar de 5% do Pará. As Unidades de Conservação, recentemente criadas no Xingu, engolem as “terras do mega grileiro”  Almeida na estratégica Terra do Meio na Amazônia Oriental, Pará. Segundo ambientalistas, nada disso intimida os Almeida que mantém 10 advogados de plantão nos meios forenses de Brasília e de Belém, atentos a toda e qualquer movimento processual sobre a questão. O latifúndio de CR Almeida colocado à mesa de debates por ambientalistas na região é visto como um entrave fundiário e ambiental  com raízes suficientes para ter vida longa nos subterrâneos do poder.


summary


State of Pará: CR Almeida’s land empire may crumble
Creation of a Conservation Unit in Xingu engulfs the
“land” of magnate CR Almeida, owner of Ceciolândia


The assassination of missionary Dorothy Stang publicly exposed the heart of the conflict related to land ownership and environmental issues in the Amazon and shed light on the killings organized by some of the landowners linked to organized crime and illegal environmental practices such as: grilagem (practice of land-grabbing), latifúndio (idoll huge estates), illegal building of roads, slave labor, illegal deforestation and slash and burning practices, contraband of pesticides and biopiracy. President Lula’s government recent placement of 3.7 million hectares into Conservation Units  located in the troubled Terra do Meio, a piece of land containing around nine million hectares set in between the Xingu and the Tapajós Rivers in the state of Pará, check mates Cecílio Rego de Almeida’s land empire. Cecílio Rego de Almeida, considered the largest landowner on the planet, has 6.7 million hectares of property which were fraudulently taken and registered in notary’s offices which suffered legal intervention in the town of Altamira, located in the west part of the state of Pará, 900 km from the city of Belém .  


According to NGOs reports and judicial chronicles, Ceciliolândia (Cecílio’s Land) acquired by grilagem is larger than several European countries. Almeida’s possession isn’t just “any piece of land”, for it is appraised at a whopping 500 million reais (roughly US$170 million). According to the Federal Public Ministry: “We are dealing with a true nature’s sanctuary, blessed with innumerable resources of high economical potential, forged in the heart of a pristine forest with the most prodigal biodiversity, intermingled with navigatable rivers, and which shelters still unimaginable reserves of precious minerals such as gold, and fine timber such as mahogany. Almeida’s land is comprised of 65 million cubic meters of fine timber with a high incidence of mahogany. According to Ibama, this forest patrimony would be worth around 6 billion dollars if explored commercially.
According to the Federal Public Ministry’s accusation “signs and proof exist of fraudulent operations that led to the ownership of this latifúndio (Fazenda Rio Curuá in Altamira/PA) to land in the hands of Cecílio Rego de Almeida and his son Roberto Beltrão de Almeida, even if it was through one of their companies or controlled by one of them, or even through people they trusted”.
According to Marcílio Monteiro, Ibama’s Executive Manager in Pará, “the grilagem of almost 7 million hectares justify the actions taken by Ministry of Environment and Ibama, in the creation of Conservation Units as one of the strategies to stop practices of grilagem, and land speculation in the Amazon, specifically concerning the Terra do Meio”.  Monteiro then concluded:  “The Federal Public Ministry is to be congratulated for its action to limit the practice of taking fraudulently what should be public patrimony and which contributes to generate violence in the rural areas”.
According to the Judicial Director of the Land Institute of Pará, Carlos Alberto Lamarão, land belonging to the CR Almeida Group was initially composed of land parcels with rental contract that when added up equaled 20 thousand hectares. However, fraudulent titles revealed that the original 20 thousand hectares were transformed, in the notary’s offices, into 4.7 million hectares.
Today the land belonging to CR Almeida’s Group, which had been deemed to be Conservation Units and Indian Land, is now almost completely under federal government’s control.
Through the Pacote Verde (green policy) signed by President Luis Inácio Lula da Silva on the 17th of February of 2005, the federal government created five Conservation Units in the Amazon:
Terra do Meio Ecological Station (Pará State) – 3.4 million hectares.
Serra do Pardo National Forest (Pará State) – 445 thousand hectares.
Riozinho da Liberdade Extrative Reserve (Acre/Amazonas States) – 325 thousand hectares. 
Balata-Tufari National Forest (Amazonas State) – 802 thousand hectares.
Anauá National Forest (Roraima State) – 259 thousand hectares.



Unidades de Conservação tentam estancar sangria nas florestas


As “terras dos Almeida” que já estavam sobrepostas em Unidades de Conservação e Terras Indígenas estão agora em sua quase totalidade sob domínio do governo federal.


Em busca de solução
A Procuradoria da República acredita que o judiciário deva resolver a questão ainda este ano. Caso não seja resolvida, obstáculos poderão surgir na efetiva implantação de Unidades de Conservação na “Terra do Meio” criadas em 2004 e 2005 pelo governo Lula como: a Reserva Extrativista Verde Para Sempre (1,2 milhões ha) em Porto de Moz; a Resex Riozinho do Anfrísio  (736 mil ha) e a Estação Ecológica “Terra do Meio” (3,2 milhões de ha) em Altamira. Além do Parque Nacional da Serra do Pardo, (400 mil hectares) em São Felix do Xingu.
Com o novo mapa Geoecológico criado no Xingu, a “reserva ecológica particular dos Almeida”, tem 45% da Resex Riozinho do Anfrísio, 100% da Floresta Nacional de Altamira (Flona Altamira), 100% da Terra Indígena Xipaya, 100% da Terra Indígena dos Kuruaya e 82 % da Terra Indígena Baú, da etnia Kayapó.
Os territórios de cinco municípios do Pará que compõem a Ceciolândia: Altamira, 34% do seu território; Trairão, 18,45%; Itaituba, 8,18%; e Novo Progresso com 4,11%.  São Félix do Xingu, um dos maiores municípios do mundo, tem 0,2% de seu território incorporado na “reserva de Cecílio” (Ver mapa e UC).
Segundo o Diretor Jurídico do Instituto de Terras do Pará, Carlos Alberto Lamarão, as  “terras dos Almeida” eram lotes constituídos através de contratos de locação e que somados atingiam 20 mil hectares. Mas, títulos fraudados revelaram que os originários 20 mil hectares se transformaram, nos cartórios, em 4,7 milhões de hectares. E, segundo os documentos apreendidos em cartórios, o memorial descritivo das terras alcançam  cerca de 7 milhões de hectares correspondendo a 5% do estado do Pará.  A área, maior que muitos países da Europa, é conhecida na crônica policial e nos relatórios das ONGs como Ceciolândia.
Questões colocadas
Segundo o dirigente do Iterpa, as questões que se colocam são: os governos ficarão impassíveis diante desta sangria na floresta?  Com a criação de Unidades de Conservação, o império de CR Almeida está com os dias contados? Uma das instituições que levantou a questão no final do ano passado foi o Instituto de Pesquisas da Amazônia. O IPAM com sede em Belém reuniu dirigentes de órgãos governamentais e não governamentais e dezenas de cientistas, pesquisadores, técnicos e estudiosos da questão social e ambiental na Amazônia, debateu a questão da Terra do Meio e as conseqüências sociais e ambientais provocadas pela lenta mas efetiva agressão aos recursos naturais numa região de fronteira e a complexa questão fundiária na região do Xingu.
No final do ano passado,  em Belém, a face legal do grupo CR Almeida aplicou um golpe de marketing. Usou como pano de fundo a ecologia na Amazônia. A Incenxil, empresa que administra os negócios do grupo, divulgou na imprensa a empresa Amazônia Projetos Ecológicos. O objetivo é investir milhares de dólares em ações de estudos e pesquisas na rica biodiversidade da chamada Terra do Meio e gerar produtos fármacos-ecológicos para o Primeiro Mundo.


HISTÓRICO


1997 – A Polícia Federal do Pará indiciou sete pessoas por crimes de estelionato, falsidade ideológica e sonegação de impostos na compra, venda e registro em cartório para alienação de terra grilada de 4,7 milhões de hectares em Altamira. Entre os indiciados, está Roberto Beltrão de Almeida filho do empresário Cecílio do Rego Almeida, dono do grupo C. R. Almeida. CR Almeida por ter 73 anos foi excluído do processo.


1999 – Instituída CPI na Assembléia Legislativa do Pará “com vistas a apurar denúncias de irregularidades na área de terra adquirida pela empresa C. R. Almeida no município de Altamira. Uma das irregularidades investigadas pela Comissão foi à fraude cartorária que resultou na constituição de aparente propriedade particular de quase cinco milhões de hectares, incidentes sobre terras públicas da União e do Estado”.


2003 – O M P F ofereceu denúncia na Justiça Federal de Santarém assinada pelos Procuradores José Augusto Torres Potiguar, André Luiz Morais de Menezes, Ubiratan Cazetta e Felício Pontes JR contra as sete pessoas arroladas pela PF por  crimes de estelionato, falsidade ideológica e sonegação de impostos na compra, venda e registro em cartório para alienação de terra grilada de 4,7 milhões de hectares de terra em Altamira.