Transgênicos entre nós
23 de maio de 2005Até porque ainda não a compreendemos bem, a natureza nos parece fantasticamente forte a ponto de absorver todos os impactos decorrentes das ações humanas. Ao contrário: estes impactos são quase sempre irreversíveis, e as catástrofes que provocam, o testemunho de que os riscos ambientais são sempre subestimados.Vacinas e cirurgias genéticas, diagnósticos de doenças hereditárias e… Ver artigo
Até porque ainda não a compreendemos bem, a natureza nos parece fantasticamente forte a ponto de absorver todos os impactos decorrentes das ações humanas. Ao contrário: estes impactos são quase sempre irreversíveis, e as catástrofes que provocam, o testemunho de que os riscos ambientais são sempre subestimados.
Vacinas e cirurgias genéticas, diagnósticos de doenças hereditárias e não-hereditárias, produção de medicamentos e outras aplicações inéditas, surgidas através de organismos transgênicos, acenam como incríveis benefícios. Entretanto, a modificação do patrimônio genético de sementes, de alimentos e de organismos vivos, e sua disseminação no ambiente, encontra-se eivada de controvérsias. São seres vivos que nunca existiram na natureza. Os efeitos que podem causar sequer são conhecidos. E, como não os conhecemos, convenhamos, muitos desses efeitos sequer são previsíveis.
A polêmica alterna-se, então, entre o fascínio dos que antevêem um futuro científico revolucionário e os que temem riscos imprevisíveis e irreversíveis. De um lado, os benefícios prováveis. De outro, os riscos possíveis.
Poluição genética
A poluição genética é uma das maiores preocupações, no caso das sementes modificadas. Ela traz a perda de biodiversidade, o aparecimento de ervas daninhas mais resistentes, o aumento do uso de agrotóxicos, e a redução da fertilidade do solo.
No México, aconteceu exatamente isso. Lá, o pólen do milho transgênico fertilizou o milho nativo. A tendência, é a extinção do milho nativo. Ou seja: a extinção da espécie.
Tolerância
O limite de tolerância de resíduo do agrotóxico glifosato, para comercializar a soja transgênica, foi elevado de 0,2 mg/kg para 10 mg/kg.
A contaminação permitida na soja transgênica passou, então, a ser de 50 vezes mais que na soja convencional.
O volume do agrotóxico glifosato, aplicado na soja convencional, é de 1,58 litros/hectare. Na soja transgênica, 5,50 litros/hectare. Portanto, um aumento de 248,1%.
O aumento do agrotóxico elimina as ervas daninhas sensíveis e mantém as resistentes. Assim, selecionam-se populações cada vez mais fortes. O resultado são doses crescentes de veneno.
Os resíduos
Os resíduos de agrotóxico contaminam o grão. No solo, eliminam bactérias, fungos e nematóides que trabalham em associações benéficas com as plantas. O solo torna-se estéril.
O solo estéril requer mais adubo. Por vezes, o adubo é comercializado pelas mesmas empresas que venderam o agrotóxico. Cria-se dificuldades para se vender facilidades.
Estes são alguns dos efeitos que já se conhece. E, estamos falando apenas da soja, que mistura gene da planta com o de uma bactéria.
A transgenia
A transgenia já está mais longe, entretanto. São genes vegetais misturados a genes animais; genes animais de uma espécie, misturados a genes animais de outra; genes de animais a genes humanos e tantas quantas forem as possibilidades da engenharia molecular.
Os efeitos não são de todo conhecidos e, muitos dos efeitos conhecidos são nefastos.
Calcula-se que hoje, cerca de 2,5 bilhões de pessoas já consomem algum tipo de produto que tem em sua composição derivados de vegetais geneticamente alterados.
Alimentos livres de transgênicos é o que a Nestlé, Carrefour, ASDA, Marks&Spencer, Unilever, Coca-Cola e outros grandes, já preferem comercializar.
A imprevisibilidade é parte de um evento científico. Se é imprevisível, é novo e, se é novo, é desconhecido. Ainda não se sabe dos riscos que corremos com a nova tecnologia.
Princípio da Precaução
Na dúvida, não ultrapasse! diz a placa de trânsito. É o Princípio da Precaução. Que deve ser adotado quando se trata do desconhecido. Ele evoca prudência. Evoca prevenção.
O princípio da responsabilidade, de Hans Jonas, também é assim. Nos chama à razão, enquanto a espécie que tem a maior fatia de responsabilidade sobre as outras espécies vivas
Precaução, prudência e responsabilidade são parte de uma nova ética ambiental. A mesma ética que percebe a finitude dos recursos naturais, a irreversibilidade de muitos dos impactos ambientais, e a responsabilidade humana sobre as duas coisas.
Por isso, a natureza ainda é a melhor invenção!
Como disse o filósofo alemão, Hans Jonas: “O que está em causa são a própria natureza e imagem do homem. É a prudência que, por si só, se torna nosso primeiro dever ético.” Sábias palavras…