A triste agonia das florestas
23 de maio de 2005Desmatamento avança a passos largos e a única exceção é a Zona da Mata, onde, segundo o IEF, houve regeneração de áreas desmatadas
As carvoarias se alastravam engolindo as florestas pela demanda crescente do carvão para as indústrias do gusa.
A polícia florestal tinha um corpo pequeno para tantas ações que precisavam ser fiscalizadas
Triângulo – A pior região, segundo Vargas Filho, em termos de manutenção da cobertura florestal nativa, é o Triângulo Mineiro, uma das principais áreas do Estado onde se pratica a agricultura mecanizada intensiva. “No Triângulo não se desmata mais porque não há mais o que desmatar”, afirma o diretor do IEF. A exceção é a Zona da Mata, a Sudeste do Estado, onde os últimos levantamentos do IEF indicam que houve regeneração da área de mata. Pelo menos lá, haverá o que comemorar. Segundo Rubens Filho, com a decadência da agropecuária da região, muitas áreas degradadas foram abandonadas.
Zona da Mata – A história da destruição da cobertura vegetal do estado começou na primeira metade do século 19, quando a própria Zona da Mata de Minas foi devastada pelos produtores de café. Mais recentemente, em pleno século 20, as imensas áreas de Mata Atlântica que cobriam a região Leste do Estado alimentaram os altos-fornos do nascente parque siderúrgico mineiro.
Parque do Rio Doce – O primeiro grito contra a destruição das reservas de mata nativa do Estado foi dado em 1974, quando o recém-criado Centro para a Conservação da Natureza em Minas Gerais recorreu à Justiça para impedir a construção de uma rodovia que cortaria o Parque Estadual do Rio Doce, a maior área contínua protegida de Mata Atlântica existente em Minas.
A rodovia não se tornou realidade. Mas o parque sofre com o adensamento populacional no seu entorno. A grande ameaça vem da expansão da malha urbana da cidade de Timóteo, através da ocupação de áreas de risco e do parcelamento do solo, autorizados, muitas vezes, pelo próprio poder público.
Agendas Marrom e Verde
Para Maria Dalce Ricas, superintendente-executiva da Associação Mineira de Defesa do Ambiente – Amda há, na política ambiental brasileira, um descompasso entre a Agenda Marrom e a Agenda Verde. Para ela, a Agenda Verde caminha mais lenta porque esbarra na morosidade do poder público e no corporativismo do setor agropecuário, que em Minas, em 1995, durante a votação do projeto que criava a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – Semad se revoltou contra a transferência do IEF para a nova pasta. Por pouco o projeto não foi aprovado sem o Instituto. Os produtores temiam que o IEF na Semad funcionasse como um entrave à atividade rural.
CNA – Por vários anos, os produtores rurais chegaram a figurar na Lista Suja, da Amda. Uma destas ocasiões foi em 1999, quando a Confederação Nacional da Agricultura – CNA trabalhou contra o projeto do deputado federal Fábio Feldman (PSDB-SP) que tornava imune de corte os remanescentes da Mata Atlântica existentes no país.
Sem-Terra – Entretanto, a destruição das florestas nativas não veio apenas dos produtores rurais. Em Minas, os Sem-Terra também deram sua contribuição. Em vários casos de ocupação, eles trataram com descaso a preservação das áreas de mata. Um dos mais emblemáticos, denunciado pela Amda, é o da Fazenda Barriguda, na região de Unaí, no Noroeste do Estado. Para evitar que a reforma agrária se transformasse em uma fonte de degradação, o Conselho Estadual de Política Ambiental – Copam editou, em novembro de 1999, deliberação normativa que tornou obrigatório o licenciamento ambiental também dos assentamentos para reforma agrária.
O carvão vegetal e o gusa
A cobertura vegetal nativa sofre uma extrema pressão da indústria de gusa, cujos altos-fornos são alimentados por carvão vegetal. Atualmente, de acordo com a Lei Florestal, 100% do carvão consumido pela indústria deveria vir de florestas plantadas. Ocorre, entretanto, que o Estado tem um déficit na produção de madeira de reflorestamento, fato que tem aumentado a pressão sobre as áreas de mata nativa e, consequentemente, a cotação do produto, o que leva os proprietários de áreas florestais remanescentes a transformarem suas matas em carvão. Para isso, alegam que o pedido de desmatamento se destina à implantação de pastos ou área de cultura. Entretanto, segundo Rubens Filho, amostragem feita pelo Instituto revelou que em cerca de 30% dos pedidos de desmatamento que deram entrada no órgão, a razão principal era mesmo a produção de carvão.
Para inibir o consumo de carvão ilegal, o IEF substituiu o Selo Florestal por um sistema informatizado que funciona como que uma conta corrente: o Instituto lança a produção correspondente às autorizações de desmatamento concedidas a produtores rurais e os consumidores os pedidos de compra do produto, que serão abatidos da mesma conta. Ruben Filho admite, entretanto, que o Instituto não controla todo o processo ao ponto de garantir que nenhum carvão produzido de forma clandestina chegará às indústrias.
O principal problema é o reduzido corpo de fiscais. “Nossa capacidade de recursos humanos é limitada”, afirma Rubens Filho. As fraudes no Selo Florestal foram motivo de inquéritos policiais e CPIs da Assembléia Legislativa.
As investigações revelaram, em todos os casos, a existência de um conluio entre produtores e a parcela dos consumidores de carvão vegetal que insiste em não investir no plantio de florestas homogêneas para auto-suprimento.