A Amazônia Azul
18 de julho de 2005ONU pode prolongar Plataforma Continental brasileira ainda este ano
O Brasil pode acrescentar 52% a mais no seu território [8,514.204,9 km2], contabilizando uma área que compreende a soma da ZEE e com a Plataforma Continental [4.411.000 km2].
Essa é uma imensa área, tão rica como a própria Amazônia Verde, e que representa 4,5 milhões de quilômetros quadrados. Na verdade, um acréscimo de mais 52% de área ao território brasileiro que é de 8.514.204,9km2. E o que falta para o Brasil sacramentar esse aumento territorial? Falta ver acatada pela Comissão de Limites da ONU, uma proposta de prolongamento da Plataforma Continental, que excede às 200 milhas da sua Zona Econômica Exclusiva. E o governo brasileiro espera que a decisão possa ser dada ainda este ano.
summary
THE BLUE AMAZÔNIA
Brazil is green and yellow. The Amazon Forest is green. The Brazilian Continental Shelf is blue like the Earth. Brazil knows the value of the Green Amazônia encompassing its forests and rivers. However, all Brazilians need to be aware of another treasure, greater than the Amazônia itself, which could cause Brazil to increase its already gigantic territory by 52% in area: it is the Blue Amazon. In its 8,514,204.9 km2, Brazil could yet this year see the addition of another 4,400,000 km2. The Blue Amazônia is made up of all the area formed by the total of the Exclusive Economic Zone [3,500,000 km2], which comprises the exclusive property of the Country and by the Continental Shelf [911,000 km2], the natural extension of the landmass of a coastal country. In other words, this extension widens the economic property of a country by an additional 350 nautical miles from every point along the entire coast. This is an immense area as rich as the Green Amazônia itself and that represents 4.5 million square kilometers. What is needed for Brazil to insure this territorial increase? All that is needed is for the United Nations Limits Commission to honor a proposal for the extension of the Continental Shelf, which exceeds the 200-mile limit from the Exclusive Economic Zone. The Brazilian government expects that a decision could be forthcoming still this year.
The coastal countries historically have accepted the existence of the three-mile (5,556km) ocean zone. This was the distance, which at one time could be reached by cannon shot. In other words, after the three miles there was a tolerance of countries and the ocean was acknowledged as belonging to everyone. The Brazilian proposal will probably only be decided now during the course of 2005. The members of CIRM – the Interministerial Commission on Ocean Resources are confident that the Brazilian proposal will be approved. Our sea borders with French Guyana to the north and Uruguay to the south are perfectly defined and the countries which face us on the east are very far away, on the other side of the Atlantic,” explains Roberto de Guimarães Carvalho, Naval Squadron Admiral and Navy Commander.
If the Brazilian proposal is fully accepted by the United Nations, Brazil will add 52% to its 8.514.204,9 km2.
It is important, in the opinion of Commander José Eduardo Borges de Souza, to fully disclose the Blue Amazônia concept. “This is why we are working together with MEC (Education and Culture Ministry) to include this topic in the Geography school books in the high schools. The objective is to convey to young Brazilians knowledge about the Blue Amazônia. In addition to awakening the interest of young people, everyone should have an exact idea of its economic and strategic importance,” according to the commander. He also added “MEC is also endeavoring to attract new partners. One of them is the IBGE (Brazilian Institute of Geography and Statistics). We have to create a prototype for a book, which can be adopted by the Brazilian public schools, now at the beginning of the second semester. We must introduce this new Brazilian geopolitical context of the Blue Amazônia.”
O mar das três e das 200 milhas
O calendário para buscar a última fronteira brasileira: de 1950 a 2005
Os países costeiros, historicamente, sempre aceitaram a existência do mar das três milhas (5.556km). Essa distância era, justamente, o alcance dos canhões. Ou seja, depois das três milhas havia a tolerância dos países e era considerado um mar de todos. Vai aqui uma visão cronológica da evolução destas questões.
1950 – A necessidade de um ordenamento jurídico sobre o mar se tornou urgente, quando a ciência mostrou o potencial de riquezas do mar e de seu subsolo. Por isso, a ONU começou a discutir a elaboração de um tratado que viria a ser a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar.
1963 – Em fevereiro, deu-se a “Guerra da Lagosta”, quando o Brasil vivenciou uma primeira crise pela disputa dos direitos de pesca, pela atuação de navios pesqueiros franceses
1970 – Antes mesmo da Convenção da ONU entrar em vigor, o Brasil e vários outros países estabeleceram por leis próprias o mar territorial de 200 milhas. A partir de 70, o Brasil participou de todas as reuniões de discussão sobre a questão do mar. Representantes da Marinha e do Itamaraty estavam sempre presentes nos encontros da ONU, discutindo a ampliação do mar territorial para 12 milhas; a criação da denominada Zona Contígua, com mais 12 milhas de largura, a contar do limite externo do mar territorial; e o estabelecimento da Zona Econômica Exclusiva (ZEE), com 200 milhas de largura, a partir da linha base da costa.
1974 – Foi criada a CIRM – Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, para coordenar os esforços de diversos organismos governamentais na integração do mar ao espaço brasileiro em prol do desenvolvimento econômico e social do País.
1975 – O Brasil aderiu ao Tratado da Antártica e deu início às atividades operacionais e de pesquisa do Projeto Antártica no verão austral de 1982/83.
1982 – A ONU adota, formalmente, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar. Apesar de ratificada pelo Brasil, ainda não o foi por todos os países. Inclusive pelos Estados Unidos. Os conceitos de mar territorial, de Zona Contígua e de Zona Econômica Exclusiva foram incluídos na Convenção.
1987 – Começa o trabalho de realização do Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira. Objetivo: estabelecer o limite exterior de nossa plataforma no seu enfoque jurídico. Esse trabalho possibilita, ao Brasil, pleitear junto a Comissão de Limites da ONU o prolongamento da Plataforma Continental (PC), que excede as 200 milhas da sua ZEE.
2004 – Depois de muitos estudos feitos pela Marinha, pela comunidade científica brasileira e pela Petrobras, o Brasil coletou 150.000 km de dados e apresentou uma proposta à Comissão de Limites da ONU: o prolongamento da Plataforma Continental (PC), que excede as 200 milhas da sua ZEE, até um limite de 350 milhas, a partir da linha da costa. Nesse prolongamento, o estado costeiro tem direito à exploração e explotação dos recursos do solo e subsolo marinhos, mas não dos recursos vivos da camada líquida.
2005 – Até hoje, além do Brasil, só um país apresentou esse pleito: a Rússia. Por problemas de delimitação das suas fronteiras marítimas com outros países, ou seja, pelo direito também de outros países, a Rússia não foi atendida. A proposta brasileira só deverá ter uma decisão final agora no decorrer de 2005. Os integrantes da CIRM – Comissão Interministerial para os Recursos do Mar estão confiantes de que a proposta brasileira seja acolhida. “Nossas fronteiras marítimas com a Guiana Francesa, ao norte, e com o Uruguai, ao sul, estão perfeitamente definidas, e os países que nos defrontam a leste, estão bastante distantes, do outro lado do Atlântico”, explica Roberto de Guimarães Carvalho, Almirante de Esquadra e Comandante da Marinha.
Se a proposta brasileira for acatada integralmente pela ONU, O Brasil ganhará 52% aos seus 8.514.204,9 km2. Ou seja, vai incorporar uma área de cerca de 911.000 km2 à jurisdição nacional, somada aos cerca de 3.500.000 km2 da ZEE. Isso perfaz um total de 4.411.000 km2, o que corresponde à mais da metade território terrestre nacional. Maior do que as dimensões da própria Amazônia Legal.
Qual o valor da
Amazônia Azul?
Segundo o Almirante de Esquadra Roberto de Guimarães Carvalho, o valor da Amazônia Azul é incomensurável. Pela área circulam cerca de 95% do nosso comércio exterior [importações e exportações], cujo valor total deve alcançar neste ano algo em torno de US$ 156 milhões. “Infelizmente, a grande maioria dos bens que importamos e exportamos, é transportado por navios de outras bandeiras, tal a situação a que foi conduzida a nossa Marinha Mercante”, acrescenta o comandante da Marinha.
Outro grande valor são as riquezas que advém do mar, desde minerais até alimentos. Das plataformas da Amazônia Azul o Brasil extrai cerca de 80% do petróleo que produz, algo como U$ 2 bilhões/mês.
O setor pesqueiro é visto em duas mãos: primeiro pela exploração racional da pesca por brasileiros e, segundo, pelo impedimento ilegal da pesca na área feita navios de outras nações.
O próprio comandante Roberto de Guimarães Carvalho explica que o potencial econômico da Amazônia Azul não se esgota nestas três atividades. “Poderíamos ainda citar a navegação de cabotagem, o turismo marítimo, os esportes náuticos, e, no futuro, a exploração dos nódulos polimetálicos existentes no leito do mar”, diz ele e salienta: “Mas as responsabilidades do Brasil no Atlântico Sul não se limitam à Amazônia Azul. Por uma outra Convenção Internacional, também ratificada pelo Brasil, temos o compromisso de realizar operações de busca e salvamento em uma extensa área marítima, que avança pelo oceano Atlântico, ultrapassando, em muito, os limites da Amazônia Azul”.
Explicação importante:
1) No mar territorial e no espaço aéreo a ele sobrejacente, o estado costeiro tem soberania plena. Já na Zona Contígua e na ZEE, isso não acontece. O estado costeiro não pode, por exemplo, negar o chamado “direito de passagem inocente” a navios de outras bandeiras, inclusive navios de guerra.
2) A exploração e explotação dos recursos vivos e não vivos do subsolo, do solo e das águas sobrejacentes na ZEE são prerrogativas do estado costeiro. Mas, a seu critério, poderá autorizar a outros países que o façam. No que diz respeito aos recursos vivos, a Convenção prevê que, caso o estado costeiro não tenha capacidade de exercer aquelas atividades, é obrigado a permitir que outros estados o façam.
José Eduardo Borges de Souza – ENTREVISTA
Silvestre Gorgulho
O Contra-Almirante José Eduardo Borges de Souza assumiu a Secretaria da Comissão Interministerial para Recursos do Mar (CIRM) em 25 de agosto de 2004. Criada em dezembro de 1979, o Comandante José Eduardo é o 16o Secretário na história da Comissão. José Eduardo coordena também o Programa Antártico Brasileiro, que – segundo ele – é top de linha, inclusive como referência ao meio ambiente, na visão de todos os países que têm bases científicas localizadas na Antártica.
Comandante José Eduardo Borges de Souza: “Temos que introduzir esse novo
contexto na geopolítica brasileira que é a Amazônia Azul”.
Folha do Meio – Quem escolheu o nome Amazônia Azul?
Comandante José Eduardo Borges de Souza – Foi o Almirante de Esquadra Roberto de Guimarães Carvalho, Comandante da Marinha. Aliás, ele foi feliz ao fazer um paralelo entre as riquezas e os recursos existentes nesta imensa área azul com aquelas existentes em nossa Amazônia verde.
FMA – O Brasil chega ao século 21 com suas fronteiras terrestres fixadas. A grande dúvida é sobre o limite da Plataforma Continental, para concluir o traçado definitivo da base física de Nação. Como o senhor vê isso?
José Eduardo – Vejo com preocupação e entusiasmo. Preocupação porque estamos atrasados em fixar, definitivamente, nossas fronteiras à Leste. A cobiça e o interesse econômico pelas riquezas existentes em nossa plataforma continental são enormes. Precisamos coibir e limitar suas ações, dentro das regras estabelecidas pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Porém, vejo com grande entusiasmo todo o trabalho desenvolvido pela Comissão Interministerial para os Recursos no Mar, com participação significativa da Petrobras, ao longo destes 18 longos e árduos anos.
O País terá um acréscimo de uma área de 911.000 km2, definindo a extensão da Plataforma Continental Jurídica Brasileira, onde terá exclusividade para realizar pesquisas, exploração e explotação dos recursos minerais e energéticos existentes no solo e no subsolo marinho. O significado de todo este processo para o futuro de nossa Nação, neste momento, é incomensurável.
FMA – O mundo cobiça a Amazônia Verde. Na sua opinião, será que um dia também não cobiçará a Amazônia Azul?
José Eduardo – Essa cobiça já se faz presente. Prova cabal desta afirmação, foi o questionamento apresentado por alguns países, como os Estados Unidos, na LEPLAC [Comissão de Levantamento da Plataforma Continental da ONU] quanto aos valores apresentados pelo Brasil no processo de levantamento de sua plataforma continental. Segundo eles, baseados nos levantamentos anteriores efetuados por seus navios e técnicos, o trabalho do LEPLAC brasileiro necessita ser revisto e recalculado em determinados pontos.
Isto demonstra, claramente, a presença precoce e a interferência direta de nações estrangeiros em nossa Amazônia Azul. Isso é preocupante. Se o Brasil não se preparar, é fato que seremos obrigados a conviver com nações explorando nossas riquezas adjacentes à Plataforma Continental Jurídica Brasileira, sem a participação do governo e de empresas brasileiras.
FMA – A Marinha brasileira, que é a grande incentivadora desta proposta, tem recebido apoio do Itamaraty ?
José Eduardo – O interesse estratégico do País quanto às riquezas minerais do fundo dos oceanos não se resume somente à área da Amazônia Azul.
A “Área”, designação dos fundos marinhos que não estão sob a jurisdição dos Estados Partes da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, é gerenciada por um organismo internacional autônomo, estabelecido sob o patrocínio da ONU, chamado Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISBA).
O Ministério das Relações Exteriores, além de coordenar o grupo-tarefa para os assuntos afetos à “Área” e o LEPLAC, atua como interlocutor brasileiro junto a ISBA, representando e garantindo nossos interesses no cenário internacional. O MRE tem papel importante e fundamental nestas questões.
FMA – A experiência e as tecnologias de defesa da Amazônia Verde, pelo Projeto Sivam, vão poder ser repetidas na Amazônia Azul?
José Eduardo – Tão importante quanto delimitar nossas fronteiras à leste, é garantir nossa soberania na Amazônia Azul. É importante que se mantenha uma constante vigilância. Esta ação recai sobre a tarefa constitucional da Marinha em patrulhar nossas águas jurisdicionais. Assim sendo, na contra-mão do que vem ocorrendo com as Forças Armadas, é fundamental disponibilizar mais recursos e permitir a renovação de nossos meios.
Neste momento, é prematuro afirmar que toda a tecnologia disponível e aplicada ao Sivam seja adequada às necessidades de vigilância de nossa Amazônia Azul. São ambientes totalmente díspares e de dimensões desproporcionais.
A preparação de meios navais, neste contexto, deve ser encarada como a solução mais coerente, em vista das “ameaças” esperadas – outros navios – e dos custos envolvidos.
O investimento em navios modernos, devidamente equipados e armados, que possam desencorajar qualquer tentativa de “invasão” dentro de nossos limites, torna-se diminuto perante a grandeza do que estará sendo protegido para as futuras gerações.
FMA – Da parte do CIRM, existe algum projeto para levar às escolas essa discussão ou até mesmo esse novo mapa do Brasil às escolas?
José Eduardo – É importante dar ampla divulgação ao conceito de Amazônia Azul. Por isso, estamos trabalhando em conjunto com o MEC para inserir este tema, inicialmente, nos livros didáticos de geografia do ensino médio. O propósito desta iniciativa é transmitir aos jovens brasileiros o conhecimento sobre a Amazônia Azul. Além de despertar o interesse dos jovens, todos devem ter a exata compreensão de sua importância, tanto econômica quanto estratégica.
Existe, ainda, por parte do MEC, a tentativa de agregar novos parceiros. Um deles é o IBGE. Temos que criar o protótipo de um livro que possa ser adotado nas escolas públicas brasileiras. Isso agora no início do segundo semestre. Temos que introduzir esse novo contexto na geopolítica brasileira que é a Amazônia Azul.