Nascente do rio Amazonas

Pororoca de expedições

18 de julho de 2005

Amazonas: a nascente é um mito e a foz é uma lenda

Paula Saldanha e Roberto Werneck  afirmam que os registros mostram que o Amazonas é ainda mais longo, pois faltam ser incluídos na medição cerca de 300km


 


 


As reentracias de rios e matas da bacia hidrográfica do Amazonas, com 7.050.000 km2,   guardam mistérios e belezas de uma natureza exuberante


 


ENTREVISTA
Paula Saldanha e
Roberto Werneck


Em dezembro de 2000, várias instituições científicas de todo o mundo, incluindo a National Geographic Society e a Smithsonian Institution, confirmaram o local da nascente, na Quebrada Carhuasanta, nevado Mismi, exatamente onde a dupla de documentaristas Paula Saldanha e Roberto Werneck esteve em 1994.Considerando esta  nova nascente, no Nevado Mismi, o rio Amazonas tem seu comprimento aumentado em 90 km para o sul. Paula e Roberto afirmam, desde 1995, que os registros históricos mostram que o Amazonas é ainda mais longo, pois faltam ser incluídos na medição total cerca de 300 km até o final de seu delta. A dupla concluiu o documentário com gravações no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, em 1995, informando aos pesquisadores as coordenadas desta nascente e solicitando a medição do grande Amazonas. Agora que o local da nascente do Amazonas foi homologado em mapa publicado pela Smithsonian Institution, Paula e Roberto estão propondo a diversas instituições que realizem trabalhos para a definição do limite extremo do delta, no oceano Atlântico, para posterior medição total deste rio lendário que em 1500 foi chamado de Mar Doce.


Folha do Meio – Como surgiu o projeto da expedição à nascente do Amazonas, realizada por vocês há 10 anos?
Paula Saldanha – Já estávamos acompanhando a polêmica sobre a verdadeira nascente do Amazonas desde 1971, quando a revista americana Horizon publicou uma matéria de Frank e Helen Schreider. Eles foram os primeiros expedicionários a contestar a suposta nascente do rio Marañon, norte do Peru, como sendo o nascimento do Amazonas. Mas eles achavam que a nascente era no Monte Huagra.
Roberto Werneck – O Loren McIntyre, primeiro expedicionário a chegar à verdadeira nascente no Nevado Mismi, se inspirou nesse relato do casal Schreider e foi para o sul do Peru, a serviço da revista National Geographic. Fez um trabalho esplêndido com pesquisadores peruanos e determinou a nascente do Apurimar-Ucayali no Nevado Mismi, como sendo o ponto mais distante de onde brotam águas em direção à foz do Amazonas.


FMA – A viagem de vocês seguiu os passos de Loren McIntyre?
Roberto – Curiosamente não tivemos conhecimento da expedição do Loren até chegar à nascente no Nevado Mismi e dar de cara com uma cruz em homenagem a ele. Os peruanos falavam de expedições científicas ao local, mas não nos deram detalhes.
Paula – Quando os cientistas do Instituto Geográfico Nacional do Peru nos forneceram as coordenadas da nova nascente, registramos a nascente do Nevado Mismi num mapa em nosso livro “Expedições”, publicado pela Editora Salamandra, em meados de 1994. Tivemos pouquíssimo tempo para preparar a viagem no mês de novembro. Fomos com a cara e a coragem em busca da verdadeira nascente do Amazonas.


summary


Pororoca expeditions
Amazonas: the source is a myth and the mouth is a legend


I beg forgiveness from the Niles, the Euphrates, Ganges, the Danube, the Mississippi, the Plate, the Reno and the Taos.  However, the only truly imposing, exuberant and mystical river is the Amazon.  It is so mysterious and so fantastic that until today its source is a myth and the mouth is a legend.  Every year the river increases by one kilometer from sediment deposited in the Atlantic Ocean.  This is why the true mouth of the Amazon River continues to be a topic of discussion.   The Amazon River is so important that it influences more than the destiny of the nine countries which comprise its hydrographic basin, more than the geopolitics of one continent and even more than the day to day life in the river cities.  The Amazon River has an impact on the life of the Atlantic Ocean, the world’s climate and even Earth’s gravitational force field.  No one can visit a river such as the Amazon, without being truly moved, regardless of whether the person is a simple tourist, a scientist or a surfer, challenging the force of the Pororoca – the meeting of the waters.  This is exactly what happened to the navigator Vicente Pinzón (1500), Francisco Orellana (1542), Bandeira de Pedro Teixeira (1637), Jacques Cousteau, Frank and Helen Schreider (1970), Loren McIntyre (1971), the journalist Paula Saldanha and film maker/photographer Roberto Werneck. Likewise, the 43 researchers representing the nine countries which comprise the hydrographic basin of the Amazon and have just embarked on a research trip from the mouth to the source of the river will most certainly also be influenced by their experience.  The Amazon River is truly gigantic owed to its very own nature.  After the couple Paula Saldanha and Roberto Werneck had arrived at the geographic source of the mighty river in 1994 and showed their films, photos and reports of this epic journey, neither Paula nor Roberto were the same as before:  based on their expedition captured on film, the program ‘Expeditions’ was born, celebrating its 10th anniversary in July. 
In December 2000, several scientific institutions from around the world including the National Geographic Society and the Smithsonian Institute confirmed the location of the source of the river as being located at Quebrada Carhuasanta, Nevado Mismi, exactly where the two documentary film makers Paula Saldanha and Roberto Werneck had been in 1994. Based on the acknowledgement of this new source, Nevado Mismi, the Amazon River has just increased in length by 90 km to the south.   Paula and Roberto have confirmed since 1995, that historic records have shown that the Amazon River is even longer, since its approximately 300 km delta has failed to be included in its total extension.  The couple ended the documentary with recordings at the INPE – National Spatial Research Institute in 1995 and by informing researchers of the coordinates of this source requested that the length of the mighty Amazon be surveyed.  Now that the source of the Amazon River has been duly established on a map published by the Smithsonian Institute, Paula and Roberto have proposed that several institutions conduct research to define the outermost limit of the delta in the Atlantic Ocean and afterward conduct a survey of the total length of this legendary river which in the 1500s was referred to as the Fresh Water Sea.


ENTREVISTA – Paula Saldanha e Roberto Werneck


Amazonas: as controvérsias da foz


FMA – Na parte final da expedição pelos Andes, foi difícil subir as montanhas? Como foi feita a escalada?
Roberto – Não fizemos nenhum preparo físico anterior à viagem, só preparo mental. Saímos do nível do mar, subimos os Andes e passamos a caminhar acima de 5.500m de altitude. Foi muito difícil. Tivemos o chamado “sorocho”, ou mal da altitude.
Paula – A nascente do Amazonas fica na região mais seca do planeta, nos Andes, na metade da atmosfera terrestre! O ar rarefeito, pouco oxigênio… tudo dificultava a caminhada. Somente na descida, quando Roberto levou um tombo e quebrou uma costela, descobrimos que a equipe que nos acompanhava não tinha rádio para comunicação, nem garrafas de oxigênio para emergência. Mas os guias foram fundamentais para o sucesso da expedição.


FMA – Como foi o retorno ao Brasil, após a conquista?
Paula – Passamos as coordenadas da nascente para o INPE e fizemos a proposta de um workshop com pesquisadores do Brasil e do exterior, para ser feita a medição total do rio. Soubemos, recente, que o pesquisador Paulo Martini levou adiante os trabalhos, que ainda estão em andamento.
Roberto – O Brasil tem condições de realizar todas as pesquisas. Com tecnologia de ponta, imagens de satélite e softwares, a medida total do rio poderá ser feita, tão logo seja definido o ponto extremo em sua foz.


FMA – E a questão da foz, não há controvérsias?
Roberto – Evidente que há. Sem definir onde o rio termina, fica impossível concluir a medição. Muitos trabalhos divulgam um ponto no Canal Norte, como sendo o final da foz do Amazonas. Não se leva em consideração as ilhas que ficam mais ao norte e nordeste, formando o complexo e imenso delta. Não há mais dúvidas quanto ao local da nascente. Agora a questão é justamente saber até onde vai a foz. Alguns pesquisadores insistem em afirmar que o canal sul, por Breves, não deve ser considerado para medição do Amazonas. Mas estaremos apresentando toda esta questão agora, em julho, no Expedições “Amazonas, o maior rio do mundo”.
Nosso grande geógrafo, o Prof. Aziz Ab’Saber, deu uma entrevista que vale a pena lembrar. Diz que “Os dois canais foram criados pelo Amazonas, numa história geológica complexa. Para se medir o rio é preciso considerar sua nascente extrema, nos Andes, e seu braço mais extenso, até o final de seu delta”.
Paula – Só queria acrescentar que estamos lançando os documentários “Nascente do Amazonas”, em DVD, remasterizado e, também “Amazonas, o maior rio do mundo”, onde mostramos a entrevista que fizemos com Loren McIntyre.
Nesse último especial Loren, que faleceu recentemente, diz que escalamos pelo caminho mais difícil, mas nós chegamos exatamente no local onde ele esteve. Explicou então que, depois de décadas de pesquisas, a homologação desta nascente ocorreu em dezembro de 2000.


Rios mais extensos do mundo


Rios Nascentes Foz kms Região


Amazonas Carhuasanta, Nevado Mismi – Peru Atlântico – Brasil 6.840 América do Sul


Nilo Tributários do Lago Victoria – Uganda Mar Mediterrâneo – Egito 6.690 Africa


Mississippi/ 
Missouri Red Rock, Montana – EUA Golfo do México – EUA 5.970 EUA


Chang Yiang
(Yangtze) Planalto Tibetano –  China Mar Amarelo – China 5.797 China


Ob-Irtish Montanhas Altai – Rússia Mar de Kara, Ártico – Rússia 5.567 Rússia


Huang Ho
(Amarelo) P.  Oriental das Mont. Kunlan –  China Golfo de Chihli – China 4.667 China


Yenisei Mont. Tannu-Olatanhas, Tuva ocidental – Rússia Ártico – Rússia 4.506 Rússia


Paraná Confluência rios Paranaíba e Grande – Brasil Rio da Prata – Argentina 4.498 América do Sul


Zaire
(Congo) Confluência rios Lualab e Luapula –  Congo  Atlântico –  Congo 4.371 África Central


Heilong
(Amur) Confluência rios Shilka e Argun –  Rússia e China Estreito Tatar, Pacífico – Rússia 4.352 Ásia


Lena Montanhas Baikal –  Rússia Ártico – Rússia 4.268 Rússia


Niger Serra Leoa e Guiné Serra Leoa – Guiné 4.241 África Ocidental


Mekong Terras Altas Tibetanas – China Sul do Mar da China – Vietnan 4.184 Sudeste da Ásia


Mackenzie Great Slave Lake –  Canadá Mar de Beaufort, Ártico – Canadá 4.023 Canadá


 


O rio Amazonas nasce no sul do Peru, nas cabeceiras do
Apurimac-Ucayali. Coordenadas 15º 30′ 49″ LS e 71º 40′ 36″ LO


 


 


 


 


 


DADOS TÉCNICOS


– O rio Amazonas nasce na Quebrada Carhuasanta, Nevado Mismi, Cordilheira de Chila, sul do Peru, nas cabeceiras do Apurimac-Ucayali, a 5.597 metros de altitude. Coordenadas 15º 30′ 49″ LS e 71º 40′ 36″ LO.


– O rio Nilo mede 6.690km. O rio Amazonas, levando em conta a nascente no Monte Huagra, foi publicada no Guinness Book de 1993, como tendo 6.750km. Se levar em conta a nascente no Nevado Mismi, o Amazonas ganha mais 90km para o sul, ou seja, passa para 6.840km.


– Falta agora comprovar definitivamente o final do delta, para ter então o cumprimento total do rio Amazonas. O interessante é que, devido à grande quantidade de água e ao processo de sedimentação, o rio Amazonas continua aumentando a cada ano. Um quilômetro por ano.


– Pelas convenções internacionais, é considerada a nascente de um rio o lugar onde nasce seu formador mais extenso – no caso do Amazonas, o tributário mais longo e volumoso não é o Marañon, como se acreditava na década de 70, mas sim o Ucayali.


– Depois de três décadas de pesquisas e diversas expedições às cabeceiras do Apurimac-Ucayali a Smithsonian Institution publicou um mapa homologando a nascente no Nevado Mismi. Uma expedição conjunta da National Geographic Society e Smithsonian Institution, em julho de 2000, mobilizou 22 cientistas de cinco países e forneceu os dados finais para a homologação.


– Em junho de 2005, outra expedição formada por 43 profissionais partiu para pesquisar o rio Amazonas. São técnicos especialistas em desertificação, economia, meio ambiente, engenharia, médicos, geólogos, botânicos, geógrafos, sociólogos, arqueólogos e antropólogos, agrimensores e jornalistas de todos os países da bacia hidrográfica [Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela]. A expedição vai pesquisar a região das cabeceiras do Ucayali e o conteúdo sedimentológico que vem erodindo os Andes e se dispersando na bacia hidrográfica Amazônica. Os cientistas vão fazer uma radiografia das águas doces da Amazônia Sul Americana, que representam 20% de toda água potável disponível no planeta.