Preservação da biodiversidade

Corredor de biodiversidade na Mata Atlântica

19 de agosto de 2005

Mesmo tendo perdido 92%, a Mata Atlântica ainda é um dos lugares que apresenta a maior riqueza de vida do planeta

A flora e a fauna da Mata Atlântica têm um valor histórico, cultural e científico incalculável, que, por si só, já justifica o esforço para sua conservação. Algumas espécies não podem se locomoverem e permanecem isoladas em fragmentos florestais.  


Para tentar entender a complexidade da Mata Atlântica, basta imaginar um imenso mosaico com mais de 3 mil quilômetros de peças de todas as formas, cores e tamanhos, que se movimentam em todas as direções e, de alguma forma, se mantém ligadas. Quando algumas destas ligações se rompem, surgem os fragmentos isolados. São ilhas de Mata Atlântica. Foi pensando nisso que a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica, formada pela Fundação SOS Mata Atlântica e pela Conservação Internacional (CI – Brasil) idealizaram o Programa “Corredores de Biodiversidade da Mata Atlântica”. A implantação dos ‘Corredores de Mata Atlântica’ visa garantir a proteção dos remanescentes florestais mais significativos e incentivar a conectividade entre porções da paisagem, aumentando assim o intercâmbio entre populações isoladas da fauna e flora regional.
Os Corredores de Biodiversidade fazem parte de um novo conceito de conservação do meio ambiente, onde os cidadãos são os principais atores e co-responsáveis pela natureza. Geralmente, uma área de grande diversidade biológica é delimitada para que se possa fazer um planejamento regional. Isto em áreas com diversas formas de uso e ocupação como parques e reservas, áreas de cultivos, centros urbanos e industriais. Em vários casos, essas estratégias de “salvo-conduto” podem ser muito eficazes para permitir o intercâmbio gênico e o resgate demográfico de populações em declínio.
Em 1995 foi iniciado o Programa Piloto de Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG-7) no intuito de apoiar projetos oriundos da sociedade civil organizada, prefeituras e governos estaduais com alternativas de utilização dos recursos naturais que reduzem danos ambientais e proporcionam modelos inovadores de desenvolvimento sustentável. Com o Projeto Corredores Ecológicos, o governo federal quer implementar ações de conservação em paisagens planejadas, utilizando o sistema de mosaicos de usos da terra.
O Programa de Fortalecimento Institucional (PFI) também vem contribuindo para a criação de uma rede de atores em ações de conservação nos corredores de biodiversidade, o que levará a uma maior articulação e parceria entre as organizações que atuam em diferentes escalas (local e regional) e abordagens ao longo dos corredores. O Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica, coordenado pela Aliança para a Conservação da Mata Atlântica, aprovou 56 projetos de apoio à criação de pelo menos 85 RPPNs.
O CEPF-Mata Atlântica (Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos), busca  interagir com outros programas e projetos no Hotspots, visando o estabelecimento de parcerias e complementaridade nas ações de conservação. Este complemento pretende viabilizar a criação de unidades públicas e privadas e a implementação de áreas protegidas já existentes e chave nos corredores de biodiversidade (ex: Reserva biológica do Una; Reserva biológica Sooretama; Parque Estadual Serra do Papagaio; Parque Estadual Três Picos).


Corredores de biodiversidade


Corredor Central
Compreende 252 municípios em uma área de 12 milhões de hectares, que começa no sul da Bahia e vai até o Espírito Santo. O Corredor Central da Mata Atlântica é composto por fragmentos de florestas e áreas naturais, tanto em propriedades públicas quanto privadas, representando quase a totalidade dos remanescentes florestais existentes. Estes fragmentos estão ameaçados sob diversas formas de exploração e perda da cobertura vegetal. Já se encontram ameaçadas de extinção 84 espécies de vertebrados, entre os quais o macaco-prego-de-peito amarelo, o mico-leão-de-cara-dourada, a saíra-apunhalada e o mutum-do-sudeste. No Corredor Central, o PFI é coordenado pelo Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia – IESB, e seus projetos envolvem temas como comunicação, educação ambiental, agroecologia, ambientes costeiros, desenvolvimento sustentável e unidades de conservação.


Corredor da Serra do Mar
Com 12,6 milhões de hectares, se estende do Paraná ao Rio de Janeiro, abrangendo 499 municípios. 100 espécies de vertebrados já estão ameaçadas, como a jararaca-ilhoa, o muriqui-do-sul e a jacutinga. Com 65 Unidades de Conservação públicas e de proteção integral, destacam-se o Parque Nacional do Itatiaia (primeiro parque Nacional do Brasil, criado em 1937), o Parque Estadual da Serra do Mar e a Reserva Biológica de Poço das Antas. O Corredor da Serra do Mar tem também 100 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN).
A flora e a fauna da Mata Atlântica têm um valor histórico, cultural e científico incalculável, que, por si só, já justifica o esforço para sua conservação. Mas a conservação é condição fundamental para o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida da atual geração e das outras que virão. No Corredor da Serra do Mar, o PFI é coordenado pela Associação Mico Leão Dourado. Lá são beneficiadas 33 instituições que desenvolvem projetos ligados a capacitação comunitária, diagnósticos sócio-econômicos e ambientais, levantamentos de fauna e flora, educação e divulgação, restauração de áreas degradadas e políticas públicas.
Estão sendo criados mais dois corredores: o do Nordeste (acima do rio São Francisco) e o das Araucárias, no Paraná. (Veja entrevista com a bióloga Márcia Hirota)


Mais informações:  www.corredores.org.br
Conservation International:
(31) 326-13889  www.conservacao.org
www.sosma.org.br
Instituto de Socioambientais do Sul BA
(73) 3634-2179.
Rua Major Homem Del Rey, 147,
45650 000 –  Ilhéus – BA


Márcia Hirota   ENTREVISTA


Márcia Hirota, diretora de Projetos da Fundação SOS Mata Atlântica, gosta de voltar sempre à história da colonização. Diz ela que após 505 anos do início da colonização européia no Brasil, o resultado final é a perda de mais de 92% da Mata Atlântica, um dos biomas mais ameaçados de extinção no mundo e considerado prioritário para a conservação dos recursos naturais por instituições nacionais e internacionais. De uma área original equivalente a 1,3 milhão de quilômetros quadrados, distribuída ao longo de 17 estados brasileiros, restam hoje apenas 7% desse total. Para a diretora de projetos da SOS Mata Atlântica, o Brasil tem vocação florestal e turística. Vamos à entrevista.


Folha do Meio – Que vantagens teriam os proprietários de terras nessas áreas onde estariam os corredores de biodiversidade?
Márcia Hirota – O projeto Corredores de Biodiversidade, também chamado de  Corredores Ecológicos, procura integrar os esforços e mecanismos que possam beneficiar os proprietários privados de terra, seja utilizando mais estrategicamente esses mecanismos ou buscando a criação de novos.
Um exemplo é o Programa de Incentivos as RPPNs da Aliança para Conservação da Mata Atlântica. A Aliança é uma associação entre a Conservação Internacional e a SOS Mata Atlântica, que apóia projetos de gestão e criação de RPPNs nos Corredores da Mata Atlântica. Tanto o Corredor Central e como o Corredor da Serra do Mar.
Outro exemplo é o apoio do projeto na implementação do ICMS-Ecológico nos estados que fazem parte do Corredor Central, na Bahia e Espírito Santo.
O ICMS-Ecológico pode trazer benefícios diretos aos proprietários e municípios, como vem acontecendo no Paraná. O projeto Corredores Ecológicos está realizando articulações nos estados, para a aprovação e implementação desses mecanismos.


FMA – A Aliança  vai apoiar projetos de conservação e recuperação de áreas dentro dos corredores?
Márcia Hirota – Sem dúvida essa é uma meta da Aliança. Esforços nesse sentido já vêm sendo realizados através da promoção de intercâmbio entre iniciativas de recuperação florestal nos Corredores. Um projeto do Fundo de Parcerias para Ecossistemas Críticos, conhecido como CEPF,  no Corredor Central da Mata Atlântica está mapeando várias iniciativas de recuperação florestal desenvolvidas por proprietários privados, ONGs e empresas.
O objetivo é desenvolver um protocolo técnico, que possa ser amplamente aplicado em todo o Corredor Central. Este projeto é uma parceria entre o Instituto BioAtlântica, CI-Barsil TNC, Aracruz Celulose e Veracel Celulose. Outro projeto do CEPF-Mata Atlântica, coordenado pelo Instituto Cidade, está iniciando a recuperação florestal da bacia do rio Caraiva, na área do Monte Pascoal, símbolo do Descobrimento do Brasil.
Vale registrar ainda o trabalho do projeto “Florestas do Futuro”, coordenado pela SOS, que tem avançado nos mecanismos de recuperação florestal na Mata Atlântica com forte envolvimento do setor privado.


FMA – Qual a participação do governo neste programa?
Márcia Hirota  – A iniciativa Corredores Ecológicos faz parte do Projeto Parques e Reservas. Entre os sete corredores propostos, o Corredor Central da Amazônia, no Estado do Amazonas, e o Corredor Central da Mata Atlântica, na Bahia e Espírito Santo, foram selecionados pelo Projeto para financiamento pelo Programa PPG7.
O projeto tem uma amplitude institucional muito interessante, com o envolvimento de vários órgãos públicos e a participação da sociedade civil organizada.
A Unidade de Coordenação Geral formada pela equipe técnica do MMA e as Unidades de Coordenação Estaduais, formada pelos órgãos estaduais de meio ambiente, como o CRA-BA e o IEMA-ES, são responsáveis pela estratégia de divulgação do Corredor e de construção de um processo participativo junto à administração pública estadual e municipal e junto à sociedade organizada.
Além disso, o projeto possui também os Comitês de Gestão, que funcionam para consultas e discussões sobre as atividades e ações no Corredor. Os Comitês de Gestão representam vários segmentos da sociedade, como universidades, ONGs, órgãos públicos, empresas, associações comunitárias etc.


FMA – Além do Corredor Central e o da Serra do Mar, há mais algum em implementação?
Márcia Hirota – Atualmente tem dois: o Corredor do Nordeste, ou seja, a Mata Atlântica acima do rio São Francisco. E está se iniciando o processo de criação de um Corredor na região das Araucárias, no Paraná. (B.F. B.)


Multiplicando Esforços
Nove municípios, produtores rurais,ONGs e acadêmicos  debateram o Corredor
de Biodiversidade na Mata Atlântica do Rio de Janeiro


Tetê Duche, do Rio de Janeiro
Um desafio e um novo conceito em desenvolvimento sustentável. O I Workshop “Corredor da Biodiversidade Tinguá-Bocaina”, organizado pelo Instituto Terra, em Paty dos Alferes, comprovou que tanto os atores socioambientais dos nove municípios do interior do Estado do Rio de Janeiro marcados por intensos processos erosivos em suas paisagens como os integrantes da sociedade civil que testemunham desmatamentos freqüentes da Mata Atlântica, precisarão se engajar mais em  ações conjuntas para solucionar o problema que aflige a  todos:  a lenta e contínua ação humana no meio ambiente. “Queremos fazer uma rede de conhecimento ambiental e fortalecer as iniciativas locais. Da comunidade para a Bacia; desta, para o município e do município para a esfera estadual. São escalas diferentes de trabalho”, diz o coordenador da ONG Instituto Terra e coordenador do
I Workshop, Maurício Ruiz.


A área do I Corredor de Biodiversidade Tinguá-Bocaina é definida por uma linha imaginária que congrega grande diversidade biológica e pode ser comparada a um mosaico de diferentes uso da terra.  No caso, os municípios envolvidos são Barra do Piraí, Piraí, Mendes, Paty dos Alferes, Miguel Pereira, Paracambi, Eng. Paulo de Frontin, Vassouras e  Rio Claro. Todos marcados pela intensa ação humana que vem aumentando  a poluição por esgoto doméstico, agrotóxicos  e sedimentos que estão sendo lançados intensivamente nos cursos d`água diminuindo assim a oferta de recursos hídricos.
O município de Paty dos Alferes, por exemplo, é o maior produtor de tomates do estado.  Entretanto, vem  sendo abastecido pelas águas da  turística  Miguel Pereira. Conseqüentemente, é em Paty que o Instituto Terra construiu a sede da Agenda 21, com o objetivo de capacitar pequenos produtores em agricultura orgânica e também para  iniciar os  programas de gestão integrada  entre os municípios do I Corredor da Biodiversidade Tinguá-Bocaina.
O evento discutiu, ainda, mecanismos para apoiar proprietários rurais na criação de RPPNs e no desenvolvimento do ecoturismo, transformando fragmentos de Mata Atlântica, entre o Parque Nacional da Serra da Bocaina e a Reserva Biológica do Tinguá, em destinos ecoturístico de âmbito  nacional.
Segundo dados da  ONG Conservação Internacional, das 633 espécies de faunas listadas pelo Ibama, como ameaçadas de extinção, 383 estão na Mata Atlântica o que significa que se medidas preservacionistas não forem implantadas logo, as espécies  poderão  desaparecer nos próximos 50 anos.  A Mata Atlântica é considerada de acordo com a Constituição Nacional, Patrimônio Nacional desde 1988 e, desde 1993, é regulada pelo do Decreto 750 que define seu limites e protege suas florestas nativas e as matas em regeneração.