Carnaval ‘99

Do lixo nasce o belo Carnaval de Pirenópolis

8 de agosto de 2005

Projeto Reciclar faz a beleza da folia e ajuda na conscientização ambiental

Lixo se joga no lixo, certo? Nem sempre. Em Pirenópolis, cidade histórica que fica a 130Km de Brasília, o lixo foi a principal matéria prima do Carnaval ‘99 e se transformou em samba e fantasia. Uma festa que encantou nativos e turistas, com a folia reciclável nas ruas.


Esse foi o segundo ano que o Bloco Urgente Reciclar desfilou pelas ruas de Pirenópolis. O projeto foi desenvolvido pela artista plástica Vera Lucena e apesar de ser novo, já se transformou em um veículo interessante de conscientização quanto a viabilidade da reciclagem de resíduos inorgânicos.


Um dos destaques foi a porta-bandeira, Isabela Rovo, que confeccionou sua própria fantasia  com cartelas de remédio e filmes de raio X. No peito da foliã, foi feita a cabeça do boi. E para simular os chifres do animal, a porta bandeira desfilou com os braços erguidos. A homenagem ao boi procurou resgatar a Festa do Divino, acontecimento tradicional na cidade, que acontece todos os anos, 45 dias após a Semana Santa. O bloco também não se esqueceu dos mascarados, muito comuns na Festa do Divino. No carnaval, as máscaras foram feitas com restos de papelão, tiras de plástico e cabos de vassoura.


Para dar um toque mais alegre, os adereços foram finalizados com verniz, purpurina, brilhos e em tamanho gigante para evitar assaltos e brigas. “Tem pessoas que confundem carnaval com violência e por isso poderiam se esconder atrás das máscaras para praticar delitos”, disse a coordenadora do bloco, Vera Lucena.


Onda reciclável
Os instrumentos musicais do bloco também entraram na “onda” reciclável. Os xiquexiques foram feitos de latinhas com arroz ou com metal. A expectativa de Vera Lucena é que para o ano que vem todos os instrumentos da bateria sejam de materiais reciclados. “Esse foi o segundo ano do Bloco. Temos muitas idéias para desenvolver, mas esbarramos em problemas financeiros. Não conseguimos nenhum patrocinador para a folia desse ano”, disse.


O único apoio veio da Construtora Biapó, de Goiânia, que doou 200 camisetas para o Bloco Urgente Reciclar. Elas foram vendidas à comunidade local e aos turistas que participaram da folia. Todo o material e o curso para fazer as fantasias  é gratuito. “A idéia é ensinar, principalmente para a população carente de Pirenópoilis, que é possível criar com o lixo e consequentemente, economizar no orçamento doméstico e até ganhar um dinheiro extra”, explicou Vera Lucena.


Para estimular a criatividade dos moradores, o Bloco lançou no carnaval desse ano um concurso de fantasia reciclável. As melhores foram premiadas com estada durante um dia, com acompanhante, nas pousadas da cidade.
Mas se engana quem acha que reciclar é só transformar resíduos inorgânicos. A lição veio do bloco que utilizou em uma ala fantasias de carnavais passados do Rio de Janeiro. Reciclar também é reutilizar.


Idealização
Para concretizar o Projeto do Bloco Urgente Reciclar, Vera Lucena trocou idéias com o mestre de carnaval Joãozinho Trinta. “Eu estava preocupada em como conseguir criar a tradição do carnaval na cidade e com pouco dinheiro”, disse a coordenadora. “Foi aí que ele me passou uma mensagem”, contou. Joãozinho Trinta disse a Vera para trabalhar com o povo. “Começa fazendo a bateria que o dinheiro aparece”. E hoje o povo já faz parte do Bloco Urgente Reciclar. “Só falta arrumarmos o patrocinador”, concluiu Vera Lucena.


Fantasias feitas pela população carente


A maioria das fantasias e adereços foi feita pela população carente de Pirenópolis. O trabalho teve a orientação de Vera Lucena e de outros voluntários da cidade. “Procuramos desenvolver com a comunidade um trabalho social para aumentar a renda familiar”, explicou Vera.


O projeto, além de ensinar sobre a importância da reciclagem de lixo também oferece oficinas de artes e ofícios, onde foram produzidas as fantasias do Bloco. Cada turma tem 20 alunos e as aulas tem a duração de um mês. Em janeiro, o curso foi oferecido para a primeira turma, que aprendeu como fazer xiquexiques e sacolas feitas de capas de revistas. “O Projeto ainda é muito novo e não se limita ao carnaval. O nosso objetivo é fazer com que o artesanato produzido seja vendido nas lojas da cidade”, disse Vera.
Na avaliação da coordenadora, as sacolas plásticas, por exemplo, poderão ser usadas para embalar presentes, já que Pirenópolis, por ser uma cidade histórica, atrai muitos turistas que sempre levam algum “souvenir”.


O Projeto começou a se concretizar no início desse ano e está passando por um período de experiência até o mês de maio. A prefeitura emprestou um prédio abandonado no Alto do Bonfim, uma das regiões mais carentes da cidade. A expectativa é que durante 5 meses o projeto atinja cerca de 100 pessoas. O curso acontece sempre de segunda a sexta-feira e a cada mês será oferecido uma aula diferente.


Antes do carnaval, as crianças e adolescentes também tinham aulas com o percussionista Mirim Santos que comandou também a bateria do Bloco Urgente Reciclar. “Todos os alunos fizeram questão de participar do bloco. Quando começaram a entender os sinais que o mestre da bateria fazia para comandar o batuque, os alunos ficaram encantados”, contou Vera.


Na avaliação da coordenadora, o contato de crianças e adolescentes com a música é muito importante pois relaxa e diverte. “Além disso, com os cursos, esses jovens vão aprender novos ofícios, e quem sabe, deixar de ser flanelinhas nos finais de semana”, disse Vera. Como a cidade de Pirenópolis tem se voltado para o turismo, esses os jovens carentes procuram ganhar dinheiro tomando conta de carros de turistas. Os pais dessas famílias normalmente trabalham em pedreiras da cidade e ganham pouco. Por isso, os filhos tem que ajudar no orçamento doméstico. Segundo Vera, o que não falta são idéias para serem implantadas, mas o projeto necessita de um patrocinador que ajude no custeio da oficinas.


Contato: Vera Lucena (fone: (062) 331-1461


A cidade histórica de Pirenópolis fica a 130 quilômetros de Brasília e a 128 de Goiânia. A beleza natural da Serra dos Pireneus, juntamente com as cachoeiras, atrai a cada ano mais turistas que se interessam por passeios ecológicos. A cidade é tranqüila, com pousadas rústicas e muito verde, ideal para descansar e fugir do corre-corre da cidade grande. Vale visitar a Fazenda Vagafogo, de Catarina Schiffer e Evandro Ayer, um verdadeiro santuário ambiental, e a Fazenda da Babilônia, do século XIX, que abriga diversos objetos históricos. A Festa do Divino  que acontece todos anos  45 dias depois da Semana Santa é outra atração da cidade com cavalhadas, congadas, pastorinhas e mascarado.


Onde ficar em Pirenópolis:
Pousada dos Pirineus: (062) 331-1345;  
Pousada das Cavalhadas: (062) 331-1261;
Hotel Quinta Santa Bárbara: (062) 331-1304;  
Pouso do Sô Vigário: (062) 331-1206


SUMMARY


Urgent Recycling Dance Group


In Pirenópolis, a small town 130Km from Brasília, the spirit of carnival has begun with the rhythm of recycling.  Costumes, decorations, and even some of the musical instruments have been made out of recycled trash.  One of the highlights is the flag bearer’s costume made out of medicine bottles and X-ray films.  A variety of giant masks have been fabricated on a large scale from cardboard, scraps of plastic, and old broomsticks.


The recycling “wave” has also washed over the percussion section. Many rattles have been made from cans with rice or metal bits.  The creator of Bloco Urgente Reciclar (Urgent Recycling Dance Group), Vera Lucena, believes that by next year all the musical instruments in her group’s carnival parade will be recycled.  “This is only the second year our group has paraded on the streets of Pirenópolis.  We still have a lot of work ahead of us.”


The carnival group, in addition to its educational goal of teaching the idea of trash recycling, has a social benefit.  All the costumes and musical instruments have been produced by the poorer population of the city in free art workshops.  This work began in January of this year and will continue until May.  Each class serves 20 students and lasts for one month.


The workshops also teach crafts that can be sold to tourists.  “Last month, for example, we taught hew to make shopping bags from magazine covers.”  Vera considers that, since Pirenópolis is an historic city, this craft could be taught to the tourists visiting the city.


“In this way the needy families of the city would earn some extra income while learning a little about the art of recycling,” she adds.  In this city, a large part of the community earns a living as stonecutters. As the salary for this work is low, on the weekends the children must work guarding the cars of the tourists.  “Our goal in these courses is that these youth can learn a new craft, a new source of income, and a way off the streets,”  she says.


But both the carnival group and the workshops need a sponsor in order to keep functioning.  For now, none of this work is receiving financial assistance, only the help of the mayor’s office which has provided a building in which to carry out the workshops.