Parque das Nascentes do Rio Parnaíba

O triste começo de um Parque Nacional

18 de agosto de 2005

Juiz Osmani dos Santos atende fazendeiros de soja e criação do Parque das Nascentes do Rio Parnaíba não sai do papel


fotos: André Pessoa


Formações da Serra da Tabatinga, na Chapada das Mangabeiras, no Parque das Nascentes do rio Parnaíba.


O Ibama se defende e diz que a demarcação, bem como o plano de manejo, já estavam para começar com recursos de compensação ambiental oriundos da Chesf. O Piauí é o estado que mais se sente prejudicado uma vez que as nascentes do Parnaíba estão em seu território. “Estamos entrando com um recurso no Tribunal Superior de Justiça solicitando a suspensão da petição. “O Ibama não se conforma em perder o parque para produtores que, em sua maioria, se instalaram na região de forma irregular”, assegura o Gerente Executivo do órgão no estado, Romildo Mafra.


Procuradoria do Piauí
se mobiliza
A Procuradoria Geral da República no Piauí também está se mobilizando. O Procurador Travanvan Feitosa, está recorrendo à Câmara de Meio Ambiente do Ministério Público Federal a fim de reverter a decisão.” No meu entendimento foi uma decisão equivocada, considero que o princípio de preservação tem que sobrepor o burocrático. Não houve audiência pública, mas houve vários fóruns de discussões, inclusive organizados por juizes federais, promotores, prefeitos, ambientalistas, enfim, com a sociedade e que culminou com a criação do parque”, lembra o procurador. Confessa ainda temer que a força do capital leve a extinção da unidade e, conseqüentemente, o desaparecimento do frágil ecossistema da região.
Proteger as nascentes do Rio Parnaíba foi o principal objetivo para criar o Parque das Nascentes. O rio, que é o principal do Nordeste, constitui a base econômica dos estados do Piauí e Maranhão onde milhares de pessoas dependem de suas águas para o abastecimento, irrigação, pesca e meio de transporte. Ele nasce no sopé da chapada das Mangabeiras, nos limites dos Estados do Piauí e Tocantins. Em todo o seu percurso, estimado em 1.500 quilômetros, até a foz no Oceano Atlântico, onde desemboca após se dividir em cinco grandes braços, é o divisor natural entre os estados do Piauí e Maranhão.
Possui 217 afluentes e uma Bacia Hidrográfica com 339.390 Km2 distribuídos nos estados do Piauí, Ceará e Maranhão.
Os principais tributários do Parnaíba são os rios Uruçuí Vermelho, Uruçuí Preto, Gurgueia, Canindé, Poti, Prata, Mulato, Longa, Balsas e Itaueira.
Infelizmente, pela ação predatória do homem, o rio vem sendo degradado sistematicamente num processo secular. Queimadas, erosão das margens, assoreamento do leito e lançamento de esgotos e lixo são uma constante. O problema já chegou às nascentes onde dezenas de produtores agrícolas, oriundos do Sul do país, ocuparam as terras públicas e instalaram projetos agrícolas. Em 2004, uma vistoria realizada por técnico do Ibama/PI na área, detectou a existência de 22 grandes propriedades no platô da serra e um desmatamento de mais 30 mil hectares.


 As paisagens do parque
As destruições, no entanto, ainda não superaram as belezas cênicas aliadas a diversidade da fauna e da flora que transformam a área em um lugar de contemplação, aventura e de muitos mistérios a serem desvendados. É ainda o paraíso das águas.
Uma das áreas mais deslumbrante é o platô da Serra da Tabatinga. Já no sopé, dezenas de brotos d?água surgem da terra e se multiplicam formando inúmeros riachos e rios de águas cristalinas e que formam a bacia do rio Parnaíba.
O que existe de mais belo na região é a diversidade da fauna e da flora. Grandes mamíferos como onças de mais de três espécies, veados, roedores diversos e aves e pássaros raros são vistos a toda hora. Já a vegetação é em totalidade Cerrado com ocorrências de campos de buritis e mata de galeria.
Infelizmente, nos últimos anos, principalmente depois da criação do parque, as agressões às nascentes se intensificaram. A integridade da unidade está terrivelmente comprometida. Depois da descoberta dos Cerrados piauiense, considerado a última fronteira agrícola do Brasil, houve uma corrida desenfreada para ocupar o espaço para plantação de soja. E a maioria dos fazendeiros o fazem sem critérios legais e, até, com a conivência de órgãos ambientais estaduais. Tudo isto está levando a destruição das últimas florestas de Cerrado e a triste agonia do Parque das Nascentes do Rio Parnaíba.


Aventura no Parque
De como Maurinho, um anjo ermitão, protege a exuberante vida das nascentes


Conhecer o Parque Nacional das Nascentes é um desafio até para veteranos. O lugar é inóspito e as estradas péssimas.  Para encarar essa aventura é preciso ter fôlego, disposição e coragem. De repente você pode ficar cara-a-cara com uma onça pintada, um tamanduá-bandeira ou um veado-campeiro. Para onde se olha tem sempre uma boa surpresa. Percebe-se que tudo está interligado, formando uma corrente de energia. Não dá para conhecer todo o parque em apenas três dias. São 730 mil hectares. Uma região onde a natureza é exuberante e bela. Repleta de organismos vivos fascinantemente integrados à cadeia realimentar da vida.


 A vegetação do Parque das Nascentes é em totalidade Cerrado, com ocorrências de campos
de buritis e matas de galeria. O amanhecer no Parque é de beleza única, pelo refletir
da luz nas folhas dos buritizais.


Para chegar ao Parque das Nascentes, saindo de Teresina, o destino é a cidade de Barreiras, a 837km da capital. Nossa expedição deu uma parada em Gilbués para a gente ver o encontro do Rio Vermelho com o Rio Parnaíba. Diante do magnífico espetáculo pedi a Deus para que congelasse a imagem na minha retina. Que aquele encontro parasse o tempo e eu pudesse ver, sentir e eternizar aquele momento.



As águas vermelhas do rio Uruçui-Vermelho se contrasta com as águas cristalinas do rio Parnaíba.


A água vermelha do Uruçui-Vermelho com a cristalina do Parnaíba, emolduradas pela vegetação imponente do Cerrado e o céu azul turquesa. É de embargar a voz. Barreiras é uma cidade pequena, muito pobre e com pouca estrutura básica para a comunidade. Tem 45 anos. Os preparos para enfrentar a floresta começaram por lá. Um carro com tração, mateiros, alimentos e muitas ferramentas. Nada de repelentes, não há mosquitos na área.
Até chegar às nascentes, no sopé da Chapada das Mangabeiras, são mais de 100km pela mata. É preciso abrir picadas para concluir a viagem. Quando se chega, o impacto visual deixa até a gente meio tonta. Da serra e da terra brotam pequenos redemoinhos de água que vão se encontrando e seguindo juntos, formando a bacia hidrográfica do grande rio. São tantas explosões de rios e riachos que você cansa de contar. Vejam só um exemplo: tem riacho Águas Quente, o rio Lontra, o rio Curriola, rio Águas Clara,  rio do Peixe, rio Areias, rio Várzea Grande, riacho Brejo Fundo, rio Porteira, riacho Curral. Cansei, mais tem muito mais que isso.
Da Chapada das Mangabeiras não se consegue voltar no mesmo dia. A opção é armar um acampamento embaixo das árvores e dormir com o canto das água e o brilho das estrelas. O frio é forte, mas vale a pena.
Antes de sair para a aventura, ainda em Barreiras, fiquei sabendo que bem longe dali, no extremo do parque vivia um homem sozinho, isolado do mundo. Fiquei curiosa em conhecê-lo. No dia seguinte partimos das Mangabeiras para o Curral Queimado, onde mora o ermitão. Ele se chama Maurinho. Foram cinco horas de saculejo na L-200 do Ibama. Quando deram uma parada, os mateiros que nos guiavam deram-se conta que tinham errado o caminho e que, no mínimo, gastaríamos o mesmo tempo até encontrar Maurinho. Só não foi frustrante, porque conhecemos ainda mais a magia do lugar. (T.M)