Parque Nacional das Nascentes

OAB-Piauí entra na luta pelo Parque das Nascentes

23 de outubro de 2007

Com apoio do Ibama, OAB-PI promoveu expedição ao Parque Nacional das Nascentes do rio Parnaíba

Ao embrenharem-se na maior reserva de Cerrado do Brasil, 730 mil hectares, na divisa do Piauí, Maranhão, Tocantins e Bahia, os expedicionários foram surpreendidos com uma paisagem intercalando beleza e destruição, provocada por fogo ateado pelos posseiros para renovar o pasto. É assim há séculos.
Além do fogo, contribuem para arrasar o parque as plantações de soja e arroz e o tráfico de animais silvestres.
A programação não incluía o combate aos focos de incêndios que dominavam a paisagem e avançava engolindo o cerrado com uma ferocidade assustadora.  Comovidos com a cena, parte dos expedicionários, embora cansados da exaustiva viagem, desafiaram o fogo e ajudaram os brigadistas do Ibama a apagar as chamas. 


A viagem
A chegada foi sob a luz tênue de um pôr-do-sol que permaneceu iluminando por algum tempo, permitindo que observássemos a paisagem que exibia árvores frondosas e uma vegetação em processo de recuperação. O rio Água Quente, que não é nada quente, corria valente, claro e límpido ao encontro do rio Corriola, há 200 metros à frente.
A noite caiu e com ela a temperatura que dificultou conciliar o sono. A bem da verdade, não foi sacrifício já que o céu se mostrava exuberante, com milhares de astros e estrelas.
A viagem foi retomada ao amanhecer. Era preciso correr contra o tempo para se alimentar e percorrer mais 50km, até chegar a principal nascente do Rio Parnaíba, o parnaibinha.  No percurso mais focos de incêndios.
O doutor em Cerrado e professor da Universidade Federal do Piauí, Alberto Jorge, sempre atento à vegetação, perdeu as esperanças em encontrar uma mata bem preservada ao longo da viagem. “Tudo está antropizado”, alertou para o perigo que cerca às nascentes do maior rio genuinamente nordestino. “Se não forem evitadas as depredações, não demora muito e vamos perder o rio Parnaíba.  As nascentes correm perigo”.


Menos água
À medida que os carros avançavam, a Chapada das Mangabeiras surgia imponente com uma pigmentação avermelhada. Muito bela! Felizmente é mais difícil o fogo lhe destruir. Mas o homem está contaminando o lençol freático com fertilizantes.
A surpresa maior ainda estava por vir. Ao chegar a nascente principal, Gustavo (fiscal do Ibama no município de Corrente que guiava os expedicionários) informou que a cada dia diminui a força da água e também se distância do ponto conhecido a séculos.
Na avaliação de Gustavo, as nascentes já desceram cerca de 12  metros. Um perigo a vista.


Foto: Margareth Leite


Opresidente da OAB, Norberto Campelo e o Conselheiro Federal da Ordem, Marcos Vinicius, entraram com uma Ação Civil Pública contra o Estado


 


 


 


Parque das Nascentes
A degradação do Parque levou ao presidente da OAB, Norberto Campelo e o Conselheiro Federal da OAB, Marcos Vinicius, entrarem com uma Ação Civil Pública contra o Estado Brasileiro. Eles solicitam a liberação de mais de três milhões de reais, dinheiro de compensação ambiental, para a implantação da unidade de conservação. Este é o dinheiro prometido há mais de dois anos e que nunca foi liberado. “Implantar o parque é uma prioridade”, comentou Marcus Vinicius.
Desde que foi criado em  2002, a pecuária extensiva está mais forte e os plantadores de soja e arroz da Bahia, Tocantins e Maranhão, intensificaram o agronegócio. Esses senhores, pouco depois da criação do parque entraram na Justiça solicitando a anulação do decreto que o criou e foram contemplados pela Justiça Federal que acatou a denúncia, anulando o decreto.
O Ibama recorreu da decisão. Hoje esse é um problema superado, mas falta agora à regularização fundiária e o plano de manejo. O juiz federal, Augusto Brandão e os expedicionários defendem a integração dos posseiros e das famílias do entorno no processo de implantação do parque. “Se essas familias forem incluídas se sentirão úteis e, conseqüentemente, vão colaborar com a proteção do parque”, avalia o juiz.


Tráfico de animais
O tráfico de animais silvestres é outro grande problema na área que precisa de combate. Fiscais do Ibama de Corrente já autuaram pessoas estranhas que portavam animais e se hospedavam nas pousadas Hyacinth Cliiffd Reserve e Green Wing Valley, pertencentes à Fundação BioBrasil, que se encontram dentro da área da reserva.
O diretor da fundação, Cid Simon, diz que são ecopousadas destinadas a hospedar estrangeiros interessados na observação de animais.
A desertificação no município de Gilbuéis e em mais 14 municípios da região é outro fator preocupante e que já vem assoreando a calha do rio Parnaíba até mesmo nas proximidades do oceano. Desde que iniciou o processo, há 40 anos, até o momento nada foi feito para impedir o avanço.
Em 2006, o MMA liberou recursos para a construção de um prédio destinado a abrigar um núcleo que pretende combater a desertificação. Por enquanto, o Estado limitou-se a conceder licença para a mineradora DM Mineração pesquisar diamante ali existente. Denúncias publicadas na imprensa dão conta que a empresa está contrabandeando o precioso mineral.
O ambientalista Francisco Soares acredita que a denúncia é verdadeira, pois pesquisar minerais é uma função de órgãos específicos do governo brasileiro e de universidades e não de uma empresa estrangeira.
No local ninguém fala nada e nem é preciso pois o rombo no solo avermelhado e desertificado de Gilbués só um insano não percebe o quanto a natureza não vem sendo afetada.


Risco de vida
Conhecido entre os piauienses como Velho Monge, graças aos versos do poeta Da Costa e Silva, o Rio Parnaíba padece devido a uma grande carga de poluentes que recebe ao longo dos séculos. Os maiores impactos são decorrentes da concentração de esgotos oriundos dos grandes centros urbanos. Cidades como Teresina, Floriano e Parnaíba são responsáveis por injetar no manancial, toneladas de poluentes como esgotos e agrotóxicos. A destruição da mata ciliar é uma constante.
O Rio Parnaíba percorre 1.480 quilômetros até desembocar no oceano em forma de Delta. É o maior rio nascido no Nordeste, com 217 afluentes. Sua Bacia Hidrográfica abrange 338.390 Km².
O Piauí ocupa 75% dessa área, o Maranhão 19% e o Ceará 6%. Somente um município do Piauí, Cajueiro da Praia, a 384 km de Teresina, não faz parte da Bacia do Parnaíba.
Embora sua importância seja fundamental para garantir a sobrevivência do Piauí, até então não foi criado o Comitê de Bacia, para gerir a água superficial e subterrânea, disponível.
 Essa omissão tem contribuído para a degradação de muitos rios, entre eles, o Gurguéia, Piauí, Canindé, Poti, Balsas, entre outros.  Durante a expedição, foi possível ver que o rio Gurguéia está literalmente morto.
Um mês após a realização da visita da OAB, o coordenador da expedição, Marcus Vinicius, esteve com o ministro do Planejamento, que garantiu a liberação dos três milhões para, finalmente, estruturar o parque. “O verbo, tenho certeza, vai se transformar em verba”, comentou e acrescentou. “É um presente que o Piauí recebe em seu aniversário de 182 anos, já que o rio Parnaíba é o sustentáculo de nossas vidas”.