“Fazendas” de peixes ou de gado?

25 de dezembro de 2007

O conhecimento existe. Só falta vontade política para fazer dos rios brasileiros verdadeiras fábricas de proteínas, com muitas fazendas de piscicultura.

 

 

Hoje há consenso científico em torno do fato de que as represas são um sério obstáculo à reprodução natural dos peixes de piracema. E sobra controvérsia quanto à  real eficácia de “escadas” e “elevadores” de peixes, os quais tentam simular as condições naturais.
“Por tudo que já vi, dentro e fora do Brasil, afirmo sem qualquer dúvida que tais recursos são de concepção poética e de resultados simbólicos. Essas iniciativas estão longe de atender às reais necessidades dos peixes de piracema”, afirma Dalgas Frisch. A reprodução induzida das espécies nativas de nossa ictiofauna, se levada a sério, somada a outras medidas como as que Dalgas Frisch pioneiramente colocou em prática e o trabalho de referência atualmente desenvolvido por companhias como a Cemig, por meio de seu Programa Peixe Vivo, são exemplos do que, de fato, pode funcionar nos reservatórios.
“Há 20 anos, eu e meu filho Christian achávamos dourados com até 34 quilos de peso. Hoje é um milagre encontrar algum com 10 quilos no rio Paraná. É uma pena. A piraíba e outros bagres da Amazônia seguem a mesma e triste sina, Todos esses fatos têm sido registrados por meu filho, hoje um fotógrafo apaixonado pela natureza e que, em breve vai lançar um livro sobre os peixes da Amazônia”, conta Dalgas Frisch. 
“A experiência que tive no governo Geisel – continua Dalgas Frisch – mostrou o quanto é importante que a autoridade máxima do País esteja à frente destes projetos.  Também está provado que é possível produzir mais proteína por alqueire com piscicultura do que com gado bovino. E com o milagre da preservação. Sem devastação”. Segundo o presidente da APVS, hoje o Brasil detem todo o conhecimento necessário para fazer dos rios amazônicos e de outras regiões verdadeiras fanzendas de piscicultura. “Só falta, mesmo, vontade política”, frisa Dalgas.

Hormônio da carpa é usado na reprodução induzida de várias espécies

O Programa Peixe Vivo, da Cemig, faz reprodução artificial da piracanjuba, utilizando hormônios da carpa.
Este será tema de reportagem da próxima edição da Folha do Meio Ambiente.

A Cemig, em Minas Gerais, dá um exemplo: lançou o Programa Peixe Vivo. Segundo a mestre em Biologia da Cemig, Alessandra Bedore, hoje o método adotado para a reprodução induzida da piracanjuba e de outros espécies nativas baseia-se na aplicação de hormônios naturais importados da Hungria, extraídos da hipófise da carpa, uma espécie exótica.
A substância, que estimula as glândulas do animal, é diluída em soro fisiológico. Poucos miligramas da solução são injetados nas fêmeas, que em menos de 72 horas desovam.
Dos machos é retirado o esperma. O sêmen fecunda o ovo e os embriões, visíveis no microscópio, se desenvolvem em incubadoras, tambores de tamanho médio, cheios de água em movimento, os quais  tentam reproduzir o que acontece no ambiente natural. Vale ressaltar que a fêmea que recebe o hormônio e o macho doador vivem normalmente após os procedimentos a que são submetidos.   
Depois de algumas horas, ocorre a eclosão – a larva sai do ovo. Em dez dias, a piracanjubinha é perfeitamente visível – tem aproximadamente cinco  centímetros de tamanho e alimenta-se de larvas de outros peixes, especialmente corimba. Na segunda semana de vida, o alevino é transferido para tanques de grandes dimensões e duas vezes por dia é alimentado com ração balanceada de frutos e sementes. Entre quatro e cinco meses, o alevino já consegue sobreviver por conta própria, podendo então ser solto nos rios. “O espécime não pode ser pequeno demais, sob pena de virar presa fácil. Se estiver grande demais, corre o risco de estar tão domesticado que não consegue mais sobreviver fora do cativeiro”, conclui Alessandra Bedore.