Avanço dos canaviais

Cana de açúcar avança no Cerrado

17 de dezembro de 2007

Estudo do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) mostra a progressão dos canaviais no segundo bioma mais ameaçado

Desmatamento do Cerrado é maior que o da Amazônia


O Cerrado abrange cerca de dois milhões de quilômetros quadrados e faz conexão com a Amazônia, a Mata Atlântica, o Pantanal e a Caatinga. A área central está nos estados de Goiás, Distrito Federal, Tocantins, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, sul do Maranhão, oeste da Bahia e parte do estado de São Paulo. Abrange ainda uma pequena porção no Paraná e enclaves localizados em Roraima, no Amapá e extremo norte do Pará.
“Apesar de não haver monitoramento oficial, estima-se que o desmatamento na região gire em torno de 1,1% ao ano, o equivalente  à destruição de cerca de 22 mil km2 por ano, sendo maior que o desmate na Amazônia” compara Nilo D’Avila, assessor de políticas públicas do ISPN. Nas últimas décadas, o Cerrado já perdeu a metade de sua cobertura vegetal. As principais causas do desmatamento no Cerrado estão relacionadas à agricultura e pecuária praticadas inclusive sobre áreas que deveriam estar sob proteção e que são a base do estudo do ISPN.
Os mapas que mostram a nova geografia do etanol no Cerrado foram elaborados a partir de dados o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, do IBGE e do Ministério do Meio Ambiente. Ao cruzar os dados, o ISPN detectou situações que apontam riscos para a biodiversidade, a água e o clima na região.
Nos municípios de Goianésia e Barro Alto, em Goiás, por exemplo,  uma área de cerca de 2, 5 mil km2 considerada pelo MMA como “prioridade muito alta para o fomento e uso sustentável” já está dominada pela cultura da cana. A situação se repete em outras áreas do estado.


Nas nascentes do rio São Francisco
Na região que engloba as nascentes do rio São Lourenço – um dos mais importantes do Mato Grosso – as lavouras de cana avançam sobre áreas onde se tenta implementar um corredor de biodiversidade. Nesse caso, a produção canavieira se concentra nos municípios de Dom Aquino, Jaciara e Juscimeira.
Em Minas Gerais, outro exemplo gritante, estado que também está vivendo a expansão da monocultura da cana, o levantamento aponta exemplos como o do polígono que envolve os municípios na cabeceira do rio São Francisco, como Iguatama, Lagoa da Prata, Luz, Arcos e Japaraíba.
 “O governo precisa se antecipar e direcionar a expansão da cana-de-açúcar para áreas já alteradas se quiser evitar perdas inestimáveis para a biodiversidade do Cerrado e impacto indesejáveis sobre os recursos hídricos e o clima”, alerta o professor Donald Sawyer, do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília.
O estudo também apresenta a tendência regional de expansão da cultura da cana a partir de São Paulo para os estados vizinhos de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e projeção para Goiás, Mato Grosso e Tocantins. Os impactos sociais do avanço descontrolado da indústria da cana no Cerrado também são preocupantes. Segundo a antropóloga Andréa Lobo, presidente do ISPN, o desmatamento para dar lugar à lavoura de cana prejudica diretamente as populações rurais que sobrevivem do uso da biodiversidade do Cerrado.
Outra conseqüência temível é que os pequenos produtores de alimentos deixem suas plantações atraídos pelos empregos temporários no corte da cana, o que poderá diminuir a produção de alimentos na região, além de agravar a migração para as periferias urbanas.


Lula:mundo vai se curvar aos biocombustíveis


O avanço da cana-de-açucar parece irreversível. O preço alto do petróleo ajuda, o mercado ajuda e a vontade dos produtores de ganhar dinheiro e do Brasil de fazer divisas também ajuda. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva gosta de afirmar que o mundo vai “se curvar” aos biocombustíveis, sempre deixando claro que o Brasil não cederá a críticas relacionadas ao avanço das áreas de plantio de cana-de-açúcar. Lula caracteriza como “irreversível” a evolução do álcool e do biodiesel. Mais ainda: coloca o Brasil em uma posição privilegiada em relação a outros competidores internacionais.
“Podem falar o que quiserem, mas é irreversível. O mundo vai se curvar aos combustíveis renováveis e, na hora em que o mundo se curvar, não terá ninguém para competir com o Brasil”. E o presidente foi mais longe, já antevendo os críticos que dizem que a cana vai ocupar o espaço do plantio de alimentos: “Isso não significará redução da área de plantio de alimentos, e sim sua ampliação”. O presidente está sempre lembrando que um cidadão sempre pensará primeiro em garantir sua própria energia por meio da alimentação, para depois pensar naquela que alimenta seu carro.
Num encontro recente com pecuaristas, Lula destacou que , na medida em que a ciência avançar com novas tecnologias para a criação de gato, será necessário um espaço cada vez menor para o pasto. Em um recado aos críticos da evolução das áreas de plantio de cana, Lula afirmou que o Brasil não se submeterá às pressões. “O que a gente não pode é ceder aos discursos dos adversários, que lá da Europa vão dizer: ‘não, vai invadir a Amazônia’. Quem tem interesse em defender a Amazônia somos nós e não eles. Nós temos interesse em defender a Amazônia”, afirmou. “O que não pode é exigir que continuemos eternamente pobres e miseráveis. Não, nós temos vocação.” Lula disse que o Brasil tem 440 milhões de hectares de terras e apenas 1% desse total é utilizado para o plantio de cana e que sua meta e elevar esse patamar para 4%.