Folha do Meio Ambiente

Piracanjuba em boa companhia

Programa Peixe Vivo: o exemplo que vem da Cemig

A piracanjuba, peixe nativo da Bacia do rio Grande, no Centro Sul, é uma espécie de piracema – macho e fêmea realizam migração nupcial, nadando entre 100 e 300 quilômetros, rio acima, para se reproduzir entre setembro e outubro, culminando com a desova em novembro e janeiro.
Com a construção de   barragens na região Centro-Sul e Sudeste, já nos anos 60, a imprensa brasileira levava ao conhecimento público uma triste noticia: a piracanjuba praticamente havia desaparecido de seu habitat natural. Pudera! A espécie além de só sobreviver e se reproduzir em águas correntes e limpas, depende de uma farta mata ciliar, com árvores frutíferas que se deitam sobre o rio para que os peixes possam obter os frutos que lhe servem de principal fonte de alimento.
Tudo o que uma hidroelétrica normalmente destrói e que nenhuma tecnologia, até hoje, conseguiu recriar.
O fato alentador é que, atualmente, depois de mais de quatro décadas, a Cemig, eleita este ano pelo Índice Dow Jones como a empresa mais sustentável do mundo em seu setor, está com seus reservatórios povoados de piracanjubas.
A Cemig opera várias hidroelétricas em rios mineiros, a exemplo da usina de Volta Grande, no município de Conceição das Alagoas, onde está situada a Estação Ecológica de Volta Grande.
Ela tem 390 hectares de extensão e abriga um moderno laboratório de reprodução induzida de peixes, com banco de sêmen criogênico e inúmeros tanques para manejo de matrizes e alevinos. Ali também há um viveiro de mudas que tem sido vital para o reflorestamento da mata ciliar.

Peixamentos
Os peixamentos (reposição de peixes nos rios) realizados pelos técnicos da Cemig entre o ano reprodutivo de agosto 2006 a julho de 2008 devolveram às águas do Triângulo mais de cinco mil exemplares. Isto significa mais de duas toneladas de alevinos  só da espécie piracanjuba.
A safra total foi de quase 580 mil alevinos de espécies nativas dos rios mineiros como piau, piapara, dourado e jaú – este último, sob ameaça de extinção, está sendo alvo de cuidados especiais na Cemig. Dado importante: a soltura dos peixinhos foi feita em 65 localidades e a população que vive nas proximidades dos reservatórios sempre é envolvida na iniciativa.

Parcerias
Entre 2005/2006, a Cemig promoveu a soltura de 445 mil alevinos de espécies nativas nos rios da região. A maior parte foi produzida nas estações de piscicultura de Volta Grande e Itutinga, mas o trabalho também se desenvolve em Três Marias, por meio de um convênio com a Codevasf, e na de Machado Mineiro, em convênio com a Escola Agrotécnica Federal de Salinas.
Uma parceria entre a Cemig e produtores rurais de Minas Gerais também garante a produção de alevinos em tanques de piscicultura. A companhia fornece o material e o suporte técnico necessário, recebendo, em troca, 50% dos peixes reproduzidos nos tanques localizados nessas fazendas para seus peixamentos.
O Programa Peixe Vivo mantém ainda convênio com várias universidades mineiras, o que possibilita desenvolver projetos de cultivo de peixes nativos e zoneamento de reservatórios, avaliações sobre o impacto da fauna aquática em reservatórios e pesquisas sobre a relação entre as usinas hidrelétricas e a ictiofauna.
São realizados também estudos sobre a migração dos peixes, com seu monitoramento por telemetria e marcação de espécimes.  

Escada para peixe nas barragens aumenta risco de extinção

Até o Canal da Piracema, na barragem de Itaipu, está sendo questionado pelos pesquisadores. O canal é um rio artificial ao lado da barragem, com 10km. Tem muita correnteza para vencer um desnível de 120 metros. O canal ficou pronto em 2002. Para os pesquisadores, esses dispositivos funcionam como uma armadilha ecológica e faz a festa dos predadores. Por isso, o trabalho da Cemig é considerado exemplar, explica o ambientalista Dalgas Frisch.

O Canal da Piracema usa um trecho do leito do rio Bela Vista para vencer o desnível de 120m entre o Rio Paraná e a superfície do reservatório.

Monitoramento
  A Cemig iniciou um trabalho de monitoramento de algumas espécies de peixes no trecho após a barragem de Três Marias, incluindo o dourado, o mandi e a matrinxã, para buscar subsídios sobre o comportamento dessas espécies e garantir maior segurança no planejamento das ações operativas nas usinas. Outra iniciativa do programa Peixe Vivo é o portal www.clickpeixe.com.br. Ele dá ao internauta a oportunidade de participar virtualmente dos peixamentos da Cemig. Num simples clique e sem custo algum, é possível escolher a espécie do alevino e o lago em que deseja que ele seja solto.   De acordo com  João de Magalhães Lopes, analista de Meio Ambiente da Cemig e um dos envolvidos no programa, o site tem como objetivo o repovoamento da Bacia do Rio Grande, na região do Circuito Turístico dos Lagos, através da soltura mensal de cerca de 10 mil alevinos.

Berçários naturais
O processo de fecundação artificial é crucial para repor exemplares no rio. “O governo federal precisa fazer um estudo aprofundado e integrado das bacias hidrográficas para que, com base nesses dados e análises, separe alguns cursos d’água que ofereçam condições adequadas para servir de local de procriação e berçários naturais dos peixes. Novas hidroelétricas vêm aí”.
O engenheiro-agrônomo Newton Prado, coordenador do Programa Peixe Vivo da Cemig toca num ponto nevrálgico. “Na comunidade acadêmica tem sido bastante questionada a eficácia de escadas e elevadores como recursos para os peixes de piracema realizarem a transposição dos rios. Os índices de reprodução são muito baixos. O processo de fecundação artificial é crucial para repor exemplares no rio, mas sua complexidade e alto investimento estão longe de nos permitir produzir alevinos na escala necessária”, afirma o coordenador do Programa Peixe Vivo da Cemig.
 Segundo Prado, o governo federal precisa fazer um estudo aprofundado e integrado das bacias hidrográficas para que, com base nesses dados e análises, separe alguns cursos d’água que ofereçam condições adequadas para servir de local de procriação e berçários naturais dos peixes.
“Essas áreas têm de ser intocáveis. Na minha opinião, só com esse conjunto de esforços, a reprodução induzida, peixamentos freqüentes e locais de reprodução e berçários naturais protegidos, podemos ter a certeza que novas hidroelétricas, que vão estar por todos os rios do País nas próximas décadas, terão a necessária relação amigável com a fauna aquática”, avalia Newton Prado.

A comunidade acadêmica está sendo muito questionada quanto à eficácia de escadas e elevadores nas barragens para favorecer os peixes de piracema. Os índices de reprodução são muito baixos.
Engenheiro-agrônomo
Newton Prado

Peixamento de Jaú
A Cemig deu um passo importante para a preservação do jaú, espécie de peixe de grande porte ameaçada de extinção nas bacias dos Rios Grande e Paranaíba. O jaú pode chegar a 150 quilos. Uma série de atividades previstas no Projeto Jaú, incluindo a soltura de 250 alevinos, foi realizada com sucesso na Estação Ambiental de Volta Grande, em Conceição das Alagoas, no Triângulo Mineiro. Os trabalhos se iniciaram em janeiro, com a seleção das fêmeas e o manejo reprodutivo. Em seguida, foi realizada a soltura de 150 alevinos no rio Quebranzol, localizado na bacia do rio Paranaíba e que deságua no reservatório da Usina de Nova Ponte. O Quebranzol possui vasta proteção de mata ciliar, ideal para peixamentos. O peixamento ocorreu no córrego Buriti, afluente do rio Grande, próximo ao reservatório da Usina de Volta Grande, com a soltura de 200 peixes. Outros cem alevinos foram utilizados para experimentos sobre os hábitos alimentares do jaú.