A reação de Marina
23 de maio de 2008Fatos, histórias, desgastes e controvérsias
Com alívio a saída de Marina foi recebida entre os que defendem a derrubada da floresta para a formação de pasto e a plantação de soja e cana: “já vai tarde” foi a expressão do líder dos arrozeiros, Paulo César Quartiero, que disputa com os índios o território da reserva Raposa Serra do Sol, e estava preso na Polícia Federal, em Brasília. O governador do Mato Grosso, Bairo Maggi, não escondeu sua satisfação com a saída da ministra, antevendo o fim das pressões sobre seu estado, o líder absoluto em desmatamento da floresta desde que ele assumiu o cargo.
A bancada ruralista também festejou a saída de Marina, assim como dirigentes da Confederação Nacional da Agricultura e parlamentares, tanto na Câmara como no Senado, comprometidos com a ocupação da floresta e as ações do agronegócio.
DESGASTE
Pelo menos sete fatos recentes contribuíram para formar, em Marina Silva, a convicção de que para ela havia acabado o espaço no governo:
1) As pressões para que seja revogada a norma do Banco Central, que entrará em vigor a partir de julho, estabelecendo a exigência de licença ambiental na concessão de crédito a quem pretenda explorar terras na Amazônia, e a certeza de que essas pressões estavam ganhando espaço no Palácio do Planalto;
2) A criação de novas áreas de conservação ambiental, que praticamente foi paralisada no segundo mandato de Lula, apesar da insistência da então Ministra do Meio Ambiente;
3) A articulação política para eliminar a restrição de que os proprietários de terras na Amazônia não desmatem mais do que 20% de suas áreas;
4) A nova política industrial anunciada recentemente pelo governo que desconheceu inteiramente a questão ambiental;
5) A indicação do ministro Mangabeira Unger para gerir o Plano Amazônia Sustentável (PAS). O anúncio da escolha foi feito na solenidade de lançamento do programa, na qual estava presente Marina. Para os assessores e amigos de Marina, essa atitude do Presidente foi a gota d’água.
6) Em 2004 ocorreu a explosão do desmatamento da Amazônia, que chegou a 27 mil km2. Depois, a concessão do licenciamento ambiental para as obras de transposição do rio São Francisco e das grandes hidrelétricas da Amazônia, sob forte pressão da ministra da Casa Civil, Dilma Roussef.
7) Também houve a decisão de construir Angra Três e outras usinas nucleares.
Quem ganha
Quem perde
Dilma Rousseff
A ministra-chefe da Casa Civil vivia em conflito com Marina, cobrando mais rapidez na concessão de licenças ambientais para obras do PAC. Também discordava da posição sobre transgênicos.
Rei
Reinhold Stephanes
O ministro da Agricultura discordava de Marina sobre transgênicos e batia de frente com o ministério por não aceitar o diagnóstico de que o agronegócio era responsável pelo avanço do desmatamento.
Governadores
São aliados de Dilma na cobrança de licenças. Um grupo, liderado por Blairo Maggi (MT), defende que o aumento da produção de alimentos deve sacrificar o ambiente.
CTNBio/Ciência e Tecnologia
Tinha na ministra adversária dos transgênicos.
Transposição do S. Francisco
Cujas obras iniciaram apesar de ainda não estar concluído o estudo de impacto. Marina exigia mais estudos ambientais para as obras, apoiadas pelo deputado Ciro Gomes (CE).
Mangabeira Unger e o vice José Alencar
O ministro de Assuntos Estratégicos, cujo “padrinho” é José Alencar, virou espécie de pai do PAS – Plano Amazônia Sustentável.
Sérgio Cabral e PMDB
O novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, ex-governo do Rio, é para o governador Sérgio Cabral mais um nome do estado no Planalto (o outro é José Gomes Temporão, na Saúde).
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Governo Lula
Imagem externa sai arranhada. Aumentarão pressões internacionais e serão maiores as cobranças contra desmatamento. Marina funcionava como um seguro-garantia de que o Brasil tinha voz em favor da preservação do ambiente. A imprensa internacional reagiu com críticas. O jornal britânico “The Independent” chegou a dizer que a saída de Marina era como um “golpe para o futuro do planeta”.
Na França, o “Le Monde” destaca que a carta de demissão de Marina Silva chegou ao presidente Luís Inácio Lula da Silva na mesma hora em que o anúncio era feito à imprensa.
Na Espanha, o “El País” afirma que Lula “deu as costas à maior defensora da Amazônia”, destacando que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, “sua rival no governo”, é quem ganha com a demissão.
Em artigo relacionado, o “El País” destaca ainda a “volatilidade” do governo Lula, afirmando que os ministros “não duram muito”.
O britânico “Financial Times” também destacou a saída de Marina Silva da pasta do Meio Ambiente. Segundo o jornal, a ex-ministra se demitiu depois de se ver cada vez mais isolada no governo.
Petismo
Marina estava no governo desde 2003 e representava o discurso histórico do PT pró-ambiente. Era uma figura mais identificada com “petismo” do que com “lulismo”.
Movimentos ambientais
Os movimentos vão se ressentir da perda de interlocução que estabeleceram na gestão Marina.