Roliude Nordestina
23 de julho de 2008Um passeio por Cabaceiras, uma visita ao Lajedo do Pai Mateus e uma parada na Festa do Bode Rei
A cidade está localizada nos Cariris da Paraíba, a 189 km da capital. A população em 2000 somava 4.240 habitantes, sendo a maioria jovem sem grandes perspectivas de emprego e renda, por falta de capacitação profissionalizante. A extensão territorial é de 407,2 km², e o Índice de Desenvolvimento Humano, é 0,682 – oitavo melhor da Paraíba entre 223 municípios.
O semi-árido paraibano revela uma cidade com ares cinematográficos. Um letreiro destaca-se na paisagem na entrada da cidade, com a legenda Roliúde Nordestina. É um trocadilho jocoso, uma forte metáfora da dura realidade sertaneja da cidade mais seca do Brasil, onde chove 330mm/ano. Comparando, em João Pessoa chove 1.727mm, e Campina Grande, ali perto, 750mm/ano. Sendo a água caída dos céus coisa rara, a região tornou-se uma das preferidas dos diretores de cinema, somado à arquitetura característica. Fundada em 1735 e emancipada em 1834, as coloridas casas típicas de hoje são as mesmas da época. Aquele casario geminado, os sotaques e rostos marcados pelo sol emolduram a exótica paisagem semi-árida.
Quem visita Cabaceiras pode almoçar na confortável pousada Pai Mateus, conhecer a cidade e arredores, aprender com o guia a distinguir o mandacaru de um facheiro, o xique-xique da cabeça-de-frade, a macambira do gravatá e este do caroá, o umbuzeiro do juazeiro, e ainda admirar a frondosa faveleira.
Para merecer o título de Roliúde Nordestina, Cabaceiras foi ganhando devagarinho cada filme, naquele exótico cenário da Caatinga. Com uma vegetação e arquitetura em tudo diferentes da Hollywood norte-americana, a cidade já conta com uma filmografia de 23 títulos, entre longas, curta-metragens e documentários. O primeiro filme rodado foi Ferração dos Bodes, de Antônio Barrancas, em 1921, que trata da caprinocultura local. O último “O romance de Tristão e Isolda”, de Guel Arraes, em fevereiro de 2007.
Cabaceiras foi cenário dos recentes “São Jerônimo”, “Viva São João”, “Cinema, Aspirinas e Urubus” e “Canta Maria”, entre outros. No geral os filmes retratam um lugar que parou no tempo, as grandes secas que assolam a região, o êxodo nordestino para o sul-maravilha. “Viva São João”, de Andrucha Waddington e “São Jerônimo”, de Julio Bressane, são exceções. Mas foi “Auto da Compadecida” de Ariano Suassuna, filmado por Arraes, que colocou a cidade no roteiro do cinema nacional.
O interessante é que o envolvimento dos moradores de Cabaceiras com o cinema não se resume a apenas assistirem aos filmes ali rodados. Eles participam da produção como pontas e dubladores, e até mesmo contracenam com atores experientes. Criou-se um forte mercado de trabalho local, onde os moradores operam câmeras, fazem maquiagem em atores e atrizes, servem como guias e seguranças. E claro, se orgulham do lugar.
Outra atração é o Lajedo do Pai Mateus, um sítio arqueológico situado não longe da cidade, com dois quilômetros belas e raras formações rochosas. Tem atraído brasileiros e turistas de vários países, dentre eles mais de mil escandinavos que por ali passaram na virada do século e do milênio. Sinal que os ares semi-desérticos e holliwoodianos de Cabaceiras atraem trekkers de todas as latitudes.
Quem se dispor a conhecer Cabaceiras, vai curtir um cenário singular. Pode caminhar, fotografar e conversar com gente simples da cidade. Todos com muita auto-estima e orgulhosos da exótica paisagem. E eles tem sempre uma novidade para contar: “Ontem quem esteve aqui foi o Paulo Betti”. “Quem vai chegar aqui na semana que vem é fulano de tal”. “O próximo filme será… ” E por aí vai. Com certeza todo turista levará na sua retina, além das formações rochosas fantásticas, um crepúsculo tão vermelho de ofuscar a vista. Mais, não deixará de carregar lembranças do belíssimo artesanato local. A verdade é que o turismo ecológico é uma realidade na Roliúde Nordestina. E a Caatinga exótica, rude e bela joga adrenalina prá valer no coração da gente.