Mudanças climáticas

Amazonia e o aquecimento

21 de março de 2009

Será que o aquecimento global não vai afetar a maior floresta tropical do mundo? Os cientistas respondem.

Durante a seca inusitada na região Amazônica em 2005, eles puderam ver que ocorrências de seca assim causam perdas massivas de carbono em florestas tropicais. Secas como essa prejudicam a floresta por décadas seguidas.


 


Vamos voltar no tempo, quatro anos atrás. A seca de 2005, que atingiu toda a Amazônia, foi a maior da história, com temperaturas tão altas, que nos jornais e televisões do mundo inteiro só se via rios secando, igarapés sem água, barcos encalhados, populações isoladas e animais morrendo de fome e sede. Isso tudo em uma região que é conhecida por deter os maiores índices pluviométricos e mais de 20% da água doce do planeta! Das chuvas que caem usualmente na região, quase 50% vêm da “evapotranspiração” da própria floresta, que é o vapor de água expelido de suas árvores para a atmosfera. Em anos normais, a floresta Amazônica consegue absorver quase 2 bilhões de toneladas de dióxido de carbono. A seca que afetou a região em 2005 inverteu todo este processo, causando a perda de mais de 3 bilhões de toneladas de carbono. Resultado: 5 bilhões de toneladas extras de CO2 na atmosfera (ultrapassando as emissões de Japão e Europa juntos por ano).



A Amazônia ajuda a reduzir a velocidade
das mudanças climáticas. Mas, é claro,
não podemos simplesmente confiar
nesse ‘subsídio’ da natureza e
ficar de braços cruzados.
Professor Oliver Phillips,
da Universidade de Leeds, Reino Unido
.


O estudo, coordenado pelo professor Oliver Phillips, da Universidade de Leeds, Reino Unido, concorda que há anos a Amazônia ajuda a reduzir a velocidade das mudanças climáticas. Mas, é claro, não podemos simplesmente confiar nesse ‘subsídio’ da natureza e ficar de braços cruzados. Os estudos indicam que a seca que arrasou a Amazônia veio do aquecimento do Atlântico próximo a costa da África e próximo ao Golfo do México.
Isso alterou a circulação das correntes de ar, deslocando massas de ar seco para a Amazônia. Esta confusão toda na circulação das correntes alterou também a estação de furacões,  que atingiu com força brutal o Caribe e a costa leste dos EUA (Katrina). Este superaquecimento do Atlântico Norte e sua influência no norte do país mostra que o aquecimento global antropogênico intensifica os períodos de seca na Amazônia.


Laboratório Natural
Pesquisadores calcularam mudanças nos estoques de carbono examinando mais de 100 parcelas de inventários florestais pelos 600 milhões de hectares da Amazônia. Eles puderam identificar e medir o crescimento de mais de 100 mil árvores, registrando tanto as árvores mortas quanto as árvores novas.


Cientistas da RAINFOR  – Rede Amazônica de Inventários Florestais – da qual participam organizações de 13 países, publicaram em março deste ano seus estudos na revista “Science”.
Aproveitando o laboratório ‘natural’, durante a seca inusitada na região Amazônica em 2005, eles puderam ver que ocorrências de seca assim causam perdas massivas de carbono em florestas tropicais. Secas como essa prejudicam a floresta por décadas seguidas. As árvores gigantes, quando morrem, deixam de cobrir o assoalho da floresta. Como ela fica mais seca, sua vulnerabilidade ao fogo aumenta. Fogo ainda muito utilizado em queimadas para pasto e plantações agrícolas. Quando a floresta é substituída por pasto, a capacidade que ela tem de emitir o vapor que vai alimentar as nuvens se resume a quase nada. A copa das árvores mantém o interior da floresta úmido o bastante para evitar que o fogo se espalhe. Só que esta imunidade da floresta já está chegando próximo do seu limite. Pesquisas já mostraram que a fumaça das queimadas é um agravante na formação de nuvens. O problema é se essas secas se tornarem um ciclo vicioso. Hoje já há mais de 30% de gás carbônico na atmosfera que no século XVIII, antes da Revolução Industrial.


Princípio de precaução
Todos esses eventos ao redor do mundo, como as enchentes na China, nevascas cada vez mais fortes na Europa e América do Norte e a  seca na Amazônia são os primeiros passos de um aquecimento global desastroso. Embora sempre haja controvérsias, o princípio da precaução prevalece: quando não se tem uma certeza científica da segurança para o meio ambiente e para as pessoas de um certo produto ou atividade, estes devem ser proibidos ou, no mínimo, controlados. A questão é preocupante porque se a captação de carbono pelas árvores começar a diminuir no mundo todo, ou se as florestas começarem a emitir carbono ao invés de sequestrá-lo, os níveis de CO2 vão aumentar muito. E para estabilizar nosso clima serão necessários cortes bem mais profundos nas emissões de carbono.
O estudo feitos pelos cientistas britânicos enfatiza a importância fundamental da segurança de ecossistemas. Para eles, tanto o Brasil como os outros países da região terão que agir para tentar reverter a morte irreversível do leste da Amazônia (que é a parte mais suscetível às mudanças climáticas, incêndios e desflorestamentos). 
Para a ecóloga Sandy Andelman, vice presidente da TEAM – Programa de Ecologia, Avaliação e Monitoramento de Florestas Tropicais – este estudo revela que o clima mundial está cada vez mais seco, e isso pode causar danos irreversíveis à Floresta Amazônica e sua capacidade de estocar carbono. “Felizmente, começamos a criar ferramentas para obter dados científicos fundamentais”, diz. TEAM é uma rede de estações de monitoramento da biodiversidade que compara a diversidade de fauna e flora em uma variedade de ambientes, desde aqueles bem preservados até os mais afetados por ações do homem.
Aqui no Brasil projetos como este vem sendo desenvolvidos na Reserva Florestal Adolpho Ducke (AM), na Floresta Nacional de Caxiuanã (PA), além de estudos no Parque Estadual do Rio Doce (MG).
Mesmo com previsões tão sombrias, os pesquisadores mantém a esperança de que com as novas pesquisas que vão surgindo, a catástrofe a curto prazo possa ser reduzida.  Que sirva de alerta, o mundo está mesmo se aquecendo e surpresas como esta podem se tornar cada vez mais comuns.


Mudanças climÁticas  e suas transformações


Foto: Foto: Gervásio Baptista/ABr



 


 


 


 


 


 


 


 


Divulgação do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) para discutir impactos, adaptação e a vulnerabilidade
do país frente ao aquecimento global, inclusive, a floresta Amazônica


Divulgação : Correio Braziliense