Folha do Meio Ambiente

Secretário Geral da União Internacional da Pré-história da Unesco, Luis Miguel Ostembeek, classificou o encontro de São Raimundo Nonato como o melhor já realizado pela entidade.  É provável que o potencial pré-histórico encontrado na área do parque, tenha sido o responsável pelo o sucesso do Global Rock Art. O acervo de pinturas rupestres reunido ali é o maior das Américas, são mais de mil sítios arqueológicos com vestígios humanos de sociedades que viveram ali há pelo menos 100 mil anos. E, segundo revela as  pesquisas da Fundação Museu do Homem Americano-FUMDHAM, iniciadas  em 1978, estes vestígios tem forma continua até a chegada do colonizador.
O que os estrangeiros viram na Serra da Capivara revolucionou a teoria sobre o povoamento das Américas e transformou o parque em Patrimônio Cultural e Natural da Humanidade. Com a realização do Global Rock Art, a expectativa se volta para as definições do INFRAO em relação a estudos, definição de políticas de proteção e preservação do acervo encontrado não somente na região do parque, mais por todo o seu entorno, incluindo o Parque Nacional Serra das Confusões, a 100km dali e onde também recentemente foi encontrado, na Toca do Enoque, vestígios de esqueletos com mais de 15 mil anos.
Durante o fórum, a palestrante do INFRAO, Niède Guindon, presidente da FUMDHAM e responsável pelas pesquisas na Serra da Capivara, falou a platéia sobre a Arte Global num único destino: a sobrevivência discorrendo sobre a capacidade humana de representar o pensamento abstrato, que,  segundo ela, se  desenvolveu com a arte pré-histórica . A arqueóloga afirmou que os registros rupestres pré-históricos como marcadores de memória humana coletiva tiveram início há 30.000 / 25.000 anos.
 “Essa explosão da manifestação rupestre, a nível mundial, não pode ser explicada apenas culturalmente através da difusão das idéias. Sua explicação tem origens biológicas que indicam marcadores culturais. O surgimento da arte pré-histórica, como um florescer simultâneo em várias partes do mundo, pode estar relacionado com a evolução da capacidade cognitiva do gênero Homo, que lhe permitiu o desenvolvimento do processos de abstração”, entende Niède. Argumenta ainda que “a fragilidade da memória humana levara à percepção de que a transmissão oral não era suficiente para a preservação da tradição coletiva”, por isso, segunda ela, o homem precisou fixar graficamente suas idéias, direitos, fronteiras, vitórias ou medos.
Ainda de acordo com a arqueóloga, existem códigos de representação que se repetem e que são indicativos de cada grupo. ”É a diversidade dentro da globalidade do fenômeno rupestre mundial”, disse Niède que propôs aos congressistas do Global Rock Art uma reflexão conjunta da qual participem todos os pesquisadores que o desejem, com as suas opiniões e também as suas dúvidas, sobre a função, o significado e o futuro da pesquisa em arte rupestre. 
Os vestígios milenares da presença do homem no Parque Nacional Serra da Capivara, muito têm contribuído para o entendimento da vida humana na pré-história das Américas. Pela teoria defendida por Niède Guindon, o homem chegou à região durante o período glacial. Segundo ela havia muitas ilhas entre os continentes e a passagem da África para o litoral nordestino do Brasil e para o Caribe não era problema. “O Homo sapiens já existia na África há 190 mil anos, por isso é normal que possa ter chegado até as costas americanas antes de 100 mil anos”, sustenta ela. Adianta que até a chegada do colonizador branco, foram diversas as sociedades que se permitiram a se desenvolverem plenamente adaptadas ao meio ambiente.
Os vestígios considerados mais importantes na Serra da Capivara estão no Sítio Pedra Furada o que fez a pesquisadora a propor uma teoria sobre a ocupação do homem no continente americano ao longo dos últimos 100 mil anos. Para a arqueóloga, a partir dos vestígios do sítio de Pedra Furada, considerando dados da paleoclimatologia, da paleoparasitologia e da genética, seria possível propor uma teoria sobre a ocupação da América por grupos humanos diferentes, vindo de diferentes regiões, em diferentes épocas.

O Parque Nacional da Serra da Capivara tem uma paisagem exuberante e encanta todos os visitantes

QUEM É NIÉDE GUIDON
Cientista da arte rupestre

Por Silvestre Gorgulho
Paulista de Jaú, Niéde Guidon se formou em História Natural na USP e há 36 anos pesquisa um dos mais importantes sítios do mundo em arte rupestre. Ela é a verdadeira guardiã dos tesouros arqueológicos do Parque Nacional da Serra da Capivara. Reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho científico, Niéde Guidon é arqueóloga e doutora pela Sorbonne. Foi o seu trabalho, sua luta e sua dedicação que gerou a criação do Parque Nacional da Serra da Capivara. Niéde luta pelo seu ideal de tornar a pobre região do Piauí em grande centro turístico. Ela quer mudar o perfil econômico da área com investimentos em turismo e dar ao Brasil um enorme patrimônio cultural. “É inútil falar em proteção ambiental em regiões como São Raimundo Nonato, onde as pessoas estão morrendo de fome, sem criar alternativas de trabalho. Se algo não for feito imediatamente, os sítios serão destruídos, a paisagem degradada  e o ecossistema – único na região – será aniquilado”. É por esta luta para impedir a depredação e para criar condições de preservação do parque que Niéde e sua equipe vêm sofrendo até ameaças de morte. Mas ela não desiste. Niéde Guidon é guerreira e aprendeu a ser uma legítima sertaneja honorária. É antes de tudo forte.

SUMMARY

Who is Niéde Guidon
  Niéde Guidon was born in the state of São Paulo, in Jaú. She is graduated in Natural History from USP, São Paulo State University and has conducted research for 36 years in one of the most important sites in the world in rupestral or cave art.  She is the true caretaker of the archeological treasures of the Parque Nacional da Serra da Capivara (Serra da Capivara National Park).  Internationally renown for her scientific work, Niéde Guidon is an archeologist and received her doctorate from the Sorbonne. It was her work, her battle and dedication that resulted in the creation of the Parque Nacional da Serra da Capivara. Niéde continues to fight for her ideal of turning the impoverished region of Piauí into a large tourist center.   She would like to change the economic profile of the area by investing in tourism and give Brazil an enormous cultural heritage. “It is useless to discuss environmental protection in regions such as São Raimundo Nonato, where people are dying of hunger, without creating job opportunities.  If something is not done immediately, the farms will be destroyed, the landscape ruined and the ecosystem, the only one in the region, will be annihilated.”

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Parque Nacional da Serra da Capivara

Fotos: Aureliano Muller

Cartão postal do Parque Nacional da Serra da Capivara: a Pedra Furada

A Fundação Museu do Homem Americano é uma instituição privada, sem fins lucrativos e declarada de utilidade pública federal, com sede na cidade de São Raimundo Nonato, Piauí. A Fundham, como é chamada, foi criada para, em parceria com o Ibama, administrar o Parque Nacional da Serra da Capivara e promover o desenvolvimento de pesquisas interdiciplinares e a proteção do patrimônio cultural e ecológico da região.
A Fundham foi criada por uma equipe de cientistas brasileiros e franceses. A abundância de sítios arqueológicos pré-históricos portadores de pinturas rupestres existentes na região piauiense e a necessidade de  estudá-los e

A beleza preservada das pinturas rupestres no sítio da Pedra Furada

conservá-los, levou o governo a criar o  o Parque Nacional da Serra da Capivara. No Parque Nacional existe o sítio arqueológico Toca do Boqueirão da Pedra Furada, que traz as evidências da mais antiga presença humana nas Américas até agora encontradas. Há 50.000 anos, uma população pré-histórica morava na região e deixou abundantes vestígios culturais de sua presença. Este sítio foi preparado para visitação pública como um museu ao ar livre. A importância das descobertas e do acervo cultural do parque levaram a Unesco, em 1991, a integrar os sítios arqueológicos do Parque Nacional da Serra da Capivara na lista do Patrimônio Cultural da Humanidade. Uma equipe de cientistas da Fundação, em parceria com o Ibama, preparou o Plano de Manejo do Parque Nacional destinado a garantir uma gestão que permita recuperar seu equilíbrio ecológico. O plano sustenta uma proposta de gestão de caráter empresarial, pois é preciso que se criem os instrumentos para que o Parque não dependa de instâncias governamentais e possa gerar seus próprios recursos. É a única

Capivara: a pintura rupestre símbolo que deu nome ao parque nacional

real garantia de conservação. O Parque está situado no Polígono da Seca. A população, em sua maioria analfabeta, sobrevive com extrema pobreza, o que a leva a depredar o Parque, praticando a caça, o desmatamento, a destruição de colméias e a exploração antieconômica de calcário transformado em cal. A Fundham decidiu desenvolver uma ação junto à população local mediante a criação de Núcleos de Apoio à Comunidade. Esses Núcleos, formados por um centro de ensino e um posto de saúde, atuam no plano da educação (crianças e adultos), saúde e sistemas de produção alternativa, destinados a oferecer reais alternativas de trabalho.
O Museu do Homem Americano está destinado a preservar todos os vestígios materiais de uma cultura milenar, que morou ininterruptamente na região, e a promover uma ampla difusão desses acervos mediante exposições e eventos em relação a pré-história do continente americano. Um Museu desta natureza, no sertão nordestino, tem uma função cultural e educacional altamente benéfica para a população local e constitui um atrativo suplementar para o desenvolvimento do turismo cultural ecológico e sustentável.

SUMMARY

Capivara Mountain National Park
 
On June 5, 1979, the Presidency of Republic established the Capivara Mountain National Park in Southeast Piaui.
The establishment of this National Park had been requested by the French-Brazilian Mission members who conduct since 1970, a research program in that area and who created in 1986, the Foundation of the America Man Museum (Fumdham), a non-profit making civilian organization The interdisciplinary team is constituted by researchers from Brazilian institutions (University of São Paulo, Federal University of Pernambuco, Federal University of Piaui, University of Campinas, Oswaldo Cruz Institute) and French institutions (University Claude Bernard of Lyon, University Pierre et Marie Curie, French Institute of Scientific Research for Cooperation Development, Scientific Research National Center, Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales).
The works initially devoted to prehistory, have been diversified from 1978 on. Presently, interdisciplinary research related to thematics defined for the program are being developed: Relationship Man / Environment in the Southeast Piaui-from prehistory to current days.
Fumdham with Brazilian Institute of Environment and Renewable Natural Resources support is carrying out researches which aim at managing and developing the Park in order to protect archaeological sites and extensive zones of primary “caatingas” that are found in those areas.
The archaeological research revealed important data about America’s settlement. It concluded that on the contrary to what the classic theory states, man has arrived in the American continent quite before 50,000 years ago. Digging out the site “Toca do Boqueirão da Pedra Furada” has led to the discovery of vestiges that have been dated -throught carbon 14 process-to 48,000 years ago. Remains of pictures have been found in extremely old layers being, therefore, the first manifest signal of American prehistoric art. Boqueirao da Pedra Furada and today is the oldest and most important archaeological site in the Americas.