Serra Vermelha pede socorro

Governo planeja termoelétrica no sertão do Piauí

28 de fevereiro de 2010

Projeto Energia Verde pode voltar com apoio do MMA

O governo deseja aprovar o retorno do projeto Energia Verde, de suposto manejo florestal, da empresa carioca JB Carbon, que foi acusada de grilagem de terras e tem planos para derrubar 78 mil hectares da mata nativa de Caatinga para produção de carvão num bioma que é exclusivo do Brasil, extremamente ameaçado e apontado pela Conservation International como um dos últimos 38 lugares selvagens da Terra.


 “Pelo projeto em andamento, a empresa deixa de fora áreas com comprovada ocorrência de mata atlântica devido a grande repercussão internacional das ameaças a esse ambiente e engloba outros trechos de florestas nativas de caatinga, adquiridas na própria região novamente de forma suspeita” denuncia o presidente da Fundação Rio Parnaíba, Francisco Soares, que também é membro do Conama, um órgão da sociedade civil que auxilia o Ministério do Meio Ambiente nas políticas de conservação.


 



 


Mapa do crime


 Apesar da Justiça Federal ter paralisado o empreendimento através de uma série de ações, a prova incontestável de que o projeto vem sendo tocado sob sigilo pelo Governo do Piauí, Ibama, ICMBio e MMA está em um mapa elaborado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente e que vazou para imprensa. “Nesse documento, fica clara a armação que se desenrola com a ampliação do Parque Nacional Serra das Confusões, divulgada nos últimos dias como a suposta “proteção” da Serra Vermelha. Ao contrario, conforme se observa no mapa que tem o DNA do governo, os limites apontados pelo documento não englobam as chapadas da Serra Vermelha, local de maior biodiversidade do interior nordestino conforme pesquisas do Museu de Zoologia da USP”, dispara o jornalista e ambientalista Dionísio Neto que é um dos coordenadores da Rede Ambiental do Piauí.


 



 


“Os limites apontados pelo documento não englobam as chapadas da Serra Vermelha, local de maior biodiversidade do interior nordestino conforme pesquisas do Museu de Zoologia da USP”.


Dionísio Neto, Coordenador da Rede Ambiental do Piauí


 


 


Pelo que se observa no documento, fica comprovado que o governo pretende retomar o projeto Energia Verde como uma iniciativa auto-sustentável com o argumento de que, agora, o carvão produzido na região, ao invés de abastecer as indústrias siderúrgicas do Brasil e do exterior, seria utilizado para gerar energia através de uma termoelétrica instalada na Serra Vermelha sob a responsabilidade da Tractebel, que atua no Brasil mais tem origem na Bélgica. A usina teria a capacidade de produzir 100 megawatts e seria alimentada através da biomassa produzida pelo projeto Energia Verde.


 


Como vários tipos de geração de energia, a termoeletricidade também causa impactos ambientais e o principal deles é a contribuição para o aquecimento global através do efeito estufa e da chuva ácida. A queima de gás natural lança na atmosfera grandes quantidades de oxidantes e redutores, que se entrar em contato com o ser humano, pode acarretar doenças como diarréia, alem de ser um combustível fóssil que não se recupera.


 


Atualmente o Brasil lança por ano 4,5 milhões de toneladas de carbono na atmosfera e com o incremento na construção de usinas termelétricas esse indicador poderá chegar a 16 milhões nos próximos anos. “Chamam-se termo-elétricas por que são constituídas de 2 partes, uma térmica onde se produz muito vapor a altíssima pressão e outra elétrica onde se produz a eletricidade. A energia elétrica é produzida por um gerador que possui um eixo movido por uma turbina que é alimentada através de um vapor sob forte pressão. Depois do uso o vapor que é produzido por uma caldeira alimentada pelo carvão vegetal é devolvido na atmosfera”, explica o ambientalista Francisco Soares.


 



 


Contra-informação


 


Mais polêmica vem aí


ICMBio explica vazamento do mapa


“Para evitar um maior desgaste junto a opinião pública, as assessorias do ministério do Meio Ambiente, do Instituto Chico Mendes e do Governo do Piauí iniciaram uma forte campanha de contra-informação, utilizando a técnica nazista de que uma mentira repetida mil vezes se torna verdade”, explica Francisco Soares. Para isso, estão sendo distribuídos junto a imprensa nacional matérias divulgando que a ampliação do Parque Nacional Serra das Confusões iria proteger a Serra Vermelha.


Para os ambientalistas, a estratégia seria passar para sociedade que o MMA, ICMBio e Governo do Piauí ficaram sensibilizados com o forte movimento em defesa da Serra Vermelha e decidiram acatar a proteção da região. No entanto, a polêmica já começa nas próprias manchetes, como a que está no site oficial do MMA: “Serra das Confusões será o maior parque de Caatinga do Brasil”. “É preciso esclarecer que o Parque Nacional Serra das Confusões é uma das maiores unidade de conservação do Brasil, excetuando-se os parques da Amazônia. O lugar tem 502 mil hectares e mesmo sem a propalada ampliação, ela já é o maior Parque Nacional no bioma da caatinga”, esclarece o presidente da Fundação Rio Parnaíba.


Para o funcionário do ICMBio, Allan Crema, que trabalha na Coordenação de Mosaicos e Corredores Ecológicos da Diretoria de Unidades de Conservação de Proteção Integral, o mapa que vazou para imprensa realmente foi enviado para o órgão ambiental como parte da proposta feita pelo Governo do Piauí para o Ministério do Meio Ambiente visando resolver o impasse do caso Serra Vermelha.


Outro técnico do ICMBio que confirma as negociações do Governo do Piauí com o Ministério do Meio Ambiente é Marcelo Cavallini, da Coordenação do Programa de Criação de Unidades de Conservação, que foi indicado pelo ministro Carlos Minc para fazer a gerência do GT (Grupo de Trabalho) criado para encontrar a melhor alternativa para a preservação da Serra Vermelha.


Em mensagem enviada a representante da Rede de ONGs da Mata Atlântica no GT, Tânia Martins, ele explica: “Houve sim um relativo consenso e estamos “aparando as arestas”. Acho que vai ficar minimamente satisfatório, considerando que o objetivo é poder proteger a maior área possível”. Porém, não é isso o que vem sendo divulgado oficialmente pelo MMA e ICMBio. Ao contrário, a proposta que o Governo do Piauí defende é exatamente contrária a preservação de Serra Vermelha e a favor da retomada do projeto Energia Verde.


Todo esse emaranhado de suspeitas talvez expliquem um cartaz lançado em dezembro do ano passado, pela Rede Ambiental do Piauí, onde vários políticos, entre eles o governador Wellington Dias e o ministro Carlos Minc, foram apontados como “predadores” da Serra Vermelha por permitir que fosse adiante a intenção de manter o projeto Energia Verde apesar de todas as implicações jurídicas, ambientais, trabalhistas, governamentais e éticas que se apresentam.