Política socioambiental

Nova era para o Pantanal

13 de dezembro de 2010

De como a ciência pode tornar o Pantanal sustentavel

Em alguns minutos dá para perceber que a diversidade biológica do Pantanal é maior do que muitos podem pensar. A poucos quilômetros de distância estão amostras de vegetação típicas de florestas semidecíduas como a Mata Atlântica, de cerradão e cerrado como em grande parte da região central do Brasil e até do agreste nordestino. Mas não é só isso. Logo vão surgindo, para surpresa e deleite do viajante, campos limpos, as baías permanentes e as vazantes e baixadas, entre outros ecossistemas formadores desse painel multicolorido que é o Pantanal. Tudo sob o olhar atento dos tuiuiús e seus vôos rasantes ou, de longe, pelo olhar preguiçoso dos jacarés, em seus sonos aparentemente intermináveis, ambos acompanhados pelo povo pantaneiro, em suas embarcações corajosas ou nos cavalos, companheiros seculares. 


Um novo olhar
Mudar o olhar que o Brasil tem sobre o Pantanal. Primeiro passo para uma compreensão mais exata e detalhada desse que é o bioma melhor protegido do país, patrimônio natural da humanidade e reserva da Biosfera pela Unesco (os dois títulos conquistados em 2000). Com uma visão mais atenta, utilizando-se uma lente em zoom sobre a infinidade de situações ambientais, econômicas, sociais e culturais que formam a região, a sociedade brasileira terá a dimensão correta do que é o Pantanal e, sobretudo, de seu potencial em termos de desenvolvimento sustentável. Pois se esse território mágico ainda parece um paraíso, mas aqui e ali existem sinais inquietantes eprovocadores de destruição. Um dos maiores crimes ambientais da história recente do Brasil aconteceu lá, embora seja um fato ainda praticamente desconhecido. Foi a destruição provocada pela agropecuária intensiva e inadequada praticada no Alto do Vale Taquari, sob o estímulo dos projetos patrocinados pelo governo federal deste a ditadura. Era a época do “plante que o João garante”, uma referência aos projetos agropecuários incentivados pelo governo do general João Batista Figueiredo.


Assoreamento descomunal


O resultado da campanha foi um assoreamento descomunal dos rios e um desmatamento galopante, além da ocorrência de erosão em larga escala. Na Bacia do Alto Taquari, 62% da vegetação natural foram desmatados. Pesca e várias atividades agrícolas foram duramente afetadas, e muitos ribeirinhos tiveram de se mudar para a periferia de cidades como Corumbá. Campos inundáveis da Planície do Baixo Taquari foram substituídos por vegetação aquática flutuante ou por brejos e baceiros. Esses brejos, baceiros e vegetação aquática foram tomando, com os anos, o lugar do que era campo, mata ciliar e cerrado. A saturação de água, na planície, inviabilizou culturas de subsistência.
 Esse foi o maior crime ambiental registrado no Pantanal, mas os indícios de degradação já ocorrem em outros formatos. A caça ilegal de jacarés (visando a cobiçada carne da cauda), a ausência de sistema integrado de destinação de resíduos (grande parte do lixo é depositada a céu aberto), as queimadas que ocorrem aqui e acolá, a presença de moluscos invasores na bacia do rio Miranda são alguns indicadores.


Conhecimento científico para novos planos
Mas esse não precisa ser o caminho. Pelo contrário. Nas duas últimas décadas e meia, os pesquisadores da Embrapa-Pantanal, de universidades locais e outras instituições reuniram um conhecimento científico e tecnológico sobre praticamente todas as dinâmicas socioambientais, culturais e econômicas do Pantanal. Diversas alternativas econômicas sustentáveis, propícias para o Pantanal, foram desenvolvidas a partir desse vasto conhecimento acumulado. “É preciso considerar as peculiaridades da região, antes da adoção de qualquer política”, defende a dra.Emiko Kawakami de Resende, chefe da Embrapa-Pantanal. 
  Iniciativas na esfera governamental apontam para uma atenção mais apurada para essa que é uma das maiores, senão a maior, áreas úmidas do planeta, protegida pela Convenção de Ramsar. Nos últimos anos foram criados, na esfera do Ministério da Ciência e Tecnologia, o Centro Nacional de Pesquisas do Pantanal (CNPP), sediado na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), em Cuiabá, e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Áreas Úmidas, mais conhecido como INAU, igualmente sob a coordenação da UFMT. Instituições que consolidarão e ampliarão a massa crítica sobre diversos aspectos do Pantanal. Nova era para o Pantanal parece estar começando. O Brasil que quase erradicou a Mata Atlântica, agrediu de modo incomensurável o Cerrado e que está devastando a Amazônia pode fazer diferente com o Pantanal. As trilhas foram rastreadas. Falta o Brasil escolher o plano de viagem, como o país quer o futuro desse caleidoscópio deslumbrante de vida.  



Os crimes ambientais provocaram um assoreamento
descomunal dos rios e um desmatamento galopante,
além da ocorrência de erosão em larga escala.


 


 


 


Pantanal sustentável
Veja as melhores alternativas para a região pantaneira


São muitas alternativas de atividades econômicas sustentáveis para o Pantanal, em estudo por pesquisadores de várias instituições. Algumas delas foram apresentadas no 5º Simpósio sobre Recursos Naturais e Socioeconômicos do Pantanal (Simpan), realizado de 9 a 12 de novembro em Corumbá, pela Embrapa Pantanal com vários outros apoios. Aqui estão alguns exemplos de possível economia sustentável para o Pantanal.


Mel pantaneiro –  A apicultura é atividade promissora. Estudo de Edileuza Medeiros de Jesus e outros mostrou que existe floração de espécies apícolas durante o ano inteiro na região do Maciço do Urucum.
Peixes multiplicados – O Pantanal tem registradas pelo menos 263 espécies de peixes. Mas o Brasil ainda não tem uma cultura de consumo de peixe como deveria. Algo pode mudar com o Programa Aquabrasil, um dos maiores programas científicos em curso no país, reunindo pesquisadores de 16 unidades da Embrapa, universidades públicas e privadas e várias outras instituições. O objetivo é desenvolver a aqüicultura, com foco em tilápia, tambaqui e pintado, e também no camarão marinho. Apenas para a tilápia GIFT é estimado ganho de peso de 15% a cada geração melhorada. O cardápio do brasileiro poderá mudar no futuro, diminuindo-se o consumo de carne bovina.
Biodiesel da bocaiúva – A bocaiúva é uma das delícias do Pantanal, e já representa alternativa de renda para muitas famílias. A Embrapa Pantanal estuda o possível aproveitamento da bocaiúva para produzir biodiesel.
Biocombustível do aguapé – Presente em toda região, o aguapé pode ser empregado como fonte de matéria-prima para a produção de bio-óleo e gás de síntese no Pantanal.   (JPSM)