Amazônia doce

Debaixo do rio Amazonas tem outro rio a 4 mil metros de profundidade

20 de outubro de 2011

A descoberta do rio Hamza eleva o Brasil à maior potência mundial em água doce.

 



 


“É fundamental que essas pesquisas sejam comandadas por brasileiros. O custo da pesquisa de campo é relativamente modesto, porque o País já possui base de dados, no Observatório Nacional, da pesquisa da Petrobras, feita em 241 poços. O momento agora é de detalhar melhor estas pesquisas e buscar a preservação dessas águas”.


Valiya Hamza


 


Valiya Hamza explica como é o rio subterrâneo


Em entrevista exclusiva à Folha do Meio Ambiente, o mestre indiano elogiou a qualidade dos cientistas brasileiros e informou que o Observatório Nacional, onde ele entrou por concurso e coordena o banco de dados, tem mais de 60 doutores. Pacientemente explicou onde fica o aquífero Alter do Chão. Ele está num trecho mais próximo da superfície terrestre, a 800 metros de profundidade e abrange o oeste do Pará, Amapá e Amazonas. Já o rio subterrâneo, que recebeu o nome de Hamza em sua homenagem, atinge quatro mil metros de profundidade, quando entra no Acre, e atravessa toda a calha amazônica, numa extensão de seis mil quilômetros.


Para o professor Hamza, esta descoberta é um subproduto da pesquisa principal – Campo Geotérmico da Região Amazônica – projeto de doutorado, sugerido por ele a Elizabeth Pimentel.


O trabalho foi apresentado durante o 12º Congresso Internacional da Sociedade Brasileira em Geofísica, no Rio de Janeiro, e divulgado pelo Observatório Nacional, no final de agosto. A repercussão, como era de se esperar, foi muito grande.


A largura do rio Amazonas varia de um a 100 quilômetros na área de estudo, enquanto o rio Hamza varia de 200 a 400 quilômetros de largura e não corre por enorme túnel embaixo da terra, como se imagina, mas permeia através de poros das rochas sedimentares.


O doutor Hamza fez questão de ressaltar a diferença entre um aquífero e esse rio subterrâneo. Enquanto a água do aquífero está parada, a do rio subterrâneo corre, tem movimento. E o rio Hamza corre do oeste para o leste, embora sua vazão seja muitíssimo menor. Conforme dados geofísicos, à vazão do rio Amazonas é de 133 mil metros cúbicos por segundo, enquanto do rio subterrâneo é pouco mais de 3 mil metros cúbicos por segundo. Comparativamente, pouco superior à vazão Rio São Francisco.



 



O rio Hamza corre do oeste para o leste, embora sua vazão seja muitíssimo menor. Conforme dados geofísicos, à vazão do rio Amazonas é de 133 mil metros cúbicos por segundo, enquanto do rio subterrâneo é pouco mais de 3 mil metros cúbicos por segundo.


 


 


 


 


 


Elizabeth, a Amazônida
Universidade Federal do Amazonas: descoberta do rio subterrâneo é a mais importante do século



Elizabeth Tavares Pimentel é cientista nata. Ela lembra muito Mário Schenberg, considerado o maior físico teórico brasileiro. As histórias sociais dos dois são diferentes, mas o despertar pela ciência para eles aconteceu muito cedo. Os dois projetaram o país no conhecimento da física. Elizabeth tinha apenas cinco anos, quando pediu aos pais que queria estudar muito. Ela ainda não sabia verbalizar exatamente o que desejava. Seus pais, sem condições materiais de cumprir o sonho da filha, a encaminharam para casa dos tios em Parintins, às margens do rio Amazonas. Na cidade dos “Bois Garantido e Caprichoso”, Elizabeth estudou até o início da graduação em física, no Campus Avançado  da Universidade Federal do Amazonas-UFAM. Foi terminar o curso em Manaus. Em 1979, quando chegava do exílio, conversando com a repórter, Mário Schenberg dizia que Brasil tinha muito mais do que riquezas naturais. Tinha um povo criativo e grandes cientistas. A prova está aí: Elizabeth Pimentel.


A pesquisadora Elizabeth Pimentel terminou a graduação em 1998. Fez concurso para o Exército Brasileiro. Passou e foi ser professora de física do Colégio Militar de Manaus, onde deu aulas por sete anos.


Em 2005, fez concurso para Universidade Federal de Manaus e passou para ser professora auxiliar. No ano seguinte, fez Mestrado em Geologia Ambiental com ênfase em Geotermia.


Em 2009, quando  estava apresentando seu trabalho num Congresso em Salvador, o professor Hamza gostou tanto de sua pesquisa que se ofereceu para ser seu orientador no doutorado. Ela aceitou prontamente.


Em 2010, Elizabeth começou suas análises de gradientes geotérmicos, agora, geotermia profunda. No mestrado ela havia pesquisado geotermia rasa (até cem metros de profundidade). Mas seu interesse era mais embaixo: pesquisar geotermia profunda. Para isto criou novas modelagens para pesquisas de bacias sedimentares (até então feitas em poços).


Foram essas pesquisas que levaram à descoberta do rio subterrâneo, o Hamza, orgulho da comunidade científica amazonense. Afinal de contas, foi a descoberta de maior repercussão em 100 anos de existência da UFAM.




“Sempre quis aprofundar e detalhar pesquisas na região Amazônica. Esse projeto foi uma dádiva que aconteceu na minha vida”.  Elizabeth Tavares Pimental




(Veja a entrevista com Elizabeth T. Pimentel)


 


Quem é Valiya Hamza


Valiya Hamza: da Índia para o Canadá e do Canadá para a USP e para o Instituto de Pesquisas Tecnológicas, no Brasil.


Valiya Hamza nasceu na India, bacharel em física e mestrado em geofísica, no seu país. Foi para o Canadá onde fez doutorado na Universidade Western Ontario em Geofísica. Veio para o Brasil para trabalhar na USP como professor de geofísica no Instituto Astronômico de Geofísico, onde passou 12 anos. Depois foi para o IPT/SP- Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, por mais dez anos. Como gostava da linha de pesquisa do Observatório Nacional, prestou concurso e passou, em 1995.


Ele se aposentou este ano, mas, não deixou de coordenar o banco de dados. Durante este período, fez alguns trabalhos sobre mudanças climáticas na Região Amazônica. Ele ressaltou que ficou impressionado com a pesquisa de mestrado de sua aluna Elizabeth Pimentel e, que por isso, aceitou prontamente orientá-la em seu projeto de pesquisa do doutorado.


Hamza é casado com uma brasileira, professora de português, e tem três filhos, que nasceram em São Paulo.


Sua dedicação e paixão pelo Brasil lembra uma outra pesquisadora, que embora tenha nascido na antiga Tchecoslováquia, se dizia que era mais brasileira do que muitos: Johanna Dobereiner. A pesquisadora da Embrapa dizia sempre que havia escolhido o Brasil como pátria. Graças às pesquisas de Dobereiner (*1924 +2000) o Brasil economiza milhões de dólares em divisas com a não importação de adubos químicos nitrogenados. Além de brilhante cientista, batalhava de forma incansável pelo meio ambiente, pesquisando e advogando sempre o uso de fertilizantes naturais. (ZF)


 


Aquíferos: Alter do Chão e Guarani


Nilton Matta, da Universidade Federal do Pará -UFPA


 


Ao contrário do Aquífero Guarani, o Aquífero Alter do Chão é genuinamente nacional pois está sob o Amapá, Amazonas e Pará. O Alter do Chão possui um volume estimado em 86 mil quilômetros cúbicos de água, aproximadamente, o dobro do volume do Guarani, que embora mais extenso tem um volume de 45 mil quilômetros cúbicos de água.


O Guarani está situado no centro-sul do Brasil, onde fica sua maior parte, mas abrange também Argentina, Paraguai e Uruguai. Até recentemente era considerado o maior do Brasil e um dos maiores do mundo. No início de 2010, Nilton Matta, da Universidade Federal do Pará-UFPA, divulgou o potencial do Alter do Chão, após estudos detalhados. Esse aquífero foi descoberto em 1958, pela Petrobras, quando perfurava poços de petróleo. Ele mereceu estudos aprofundados do INPA, no final da década de 90, mas não foram divulgados. Sabe-se que sua água é de excelente qualidade e é muito cobiçada por empresas nacionais e estrangeiras. O Aquífero Alter do Chão, diferente do Guarani, é inteiramente em território brasileiro.


“Foi descoberto em 1958, pela Petrobras, quando perfurava poços de petróleo. Ele mereceu estudos aprofundados do INPA, no final da década de 90. “