Elizabeth Tavares Pimentel Entrevista

20 de outubro de 2011

“Estamos propondo um projeto para mapear o fluxo subterrâneo de toda região”

O povo de Parintins também está muito orgulhoso da descoberta de Elizabeth Tavares.


 


“Só quem conhece a dedicação e a capacidade, além da paixão pela ciência e o amor ao Brasil desse indiano, pode entender o porquê dessa homenagem”.


 


 


Folha do Meio – Qual foi o sabor dessa descoberta e o que ela representa?


Elizabeth – Foi um sabor de vitória, mas foi algo bem simples em termos de descoberta, pois para mim parecia muito óbvio cientificamente. A importância da pesquisa foi conhecida, durante 12º Congresso Internacional da Sociedade Brasileira em Geofísica, no Rio de Janeiro, realizado em agosto. Na Universidade de Manaus dizem que é a descoberta de maior repercussão em 100 anos de existência da UFAM. O povo de Parintins também está muito orgulhoso da descoberta.



FMA – Como o Brasil pode melhorar a gestão das águas do rio Hamza e  do Aquífero Alter do Chão?


Elizabeth – Já existem órgãos competentes que gerenciam os recursos hídricos brasileiros, tanto superficiais como subsuperficiais de maneira responsável e sustentável. O objeto destas descobertas deve ser tratado como patrimônio nacional. Por isso, devemos ter todas as informações, pesquisas e estudos para preservar melhor.



FMA – Qual é o papel da ANA e dos estados nessa gestão?


Elizabeth – Se futuramente houver necessidade de utilização dessa água, certamente a Agência Nacional de Águas e os estados terão compromisso de regular o acesso, promovendo o seu uso sustentável em benefício das futuras gerações.



FMA – Quando acontece seca na Região, afeta o volume  de água no rio subterrâneo e no Aquífero Alter do Chão?


Elizabeth – A quantidade de água existente no planeta, em particular na Região Amazônica, faz parte de um sistema que está em equilíbrio. Em período de seca a parte que está na superfície está na forma líquida, condensada ou vapor. Em subsuperfície, na profundidade de aproximadamente 4 mil metros, o fluxo de águas não sofre influência das mudanças climáticas. O aquífero Alter do Chão é relativamente mais vulnerável ás mudanças nas taxas de precipitação do que camadas com fluxo subterrâneo em maiores profundidades.


FMAAs perfurações futuras na região à procura de petróleo ou de gás, podem contaminar ou comprometer a qualidade da água do rio Hamza ou do Aquífero?


Elizabeth – Existem casos de contaminação de aqüíferos rasos por ações antrópicas na região Amazônica. Influência das atividades de perfuração terão impactos apenas em escalas locais. No entanto, o fluxo subterrâneo mais profundo está atualmente menos vulnerável a essas ações, devido às dificuldades de acesso.



FMA – Quais as próximas etapas da pesquisa de campo do rio Hamza?


Elizabeth – Estamos prevendo atividades em parceria com todas universidades da Amazônia. Ainda estamos propondo um projeto específico com enfoque para o mapeamento do fluxo subterrâneo desta região. As pesquisas que fazem parte do projeto de doutorado incluem medidas complementares de temperaturas em poços e determinações de propriedades térmicas das formações geológicas da região Amazônica.



FMA – O que são gradientes geotérmicos e porque foram importantes para descoberta do rio Hamza?


ElizabethNo interior da terra as temperaturas aumentam com a profundidade, pois ocorre fluxo de calor vindo do interior do nosso planeta. As taxas de variações da temperatura com a profundidade são designadas como gradientes geotérmicos. Quando se analisa o campo térmico em profundidade, é possível observar anomalias que indicam a existência de movimentação de água, petróleo e gás. O método geotérmico é bastante sensível, capaz de determinar e quantificar parâmetros físicos, tais como a velocidade de fluidos, com ordem de grandezas inferior á valores de metros/ano. Não se conhece equipamentos que possam realizar tais medidas.



FMA – Como nasceu o seu interesse por física e depois por geotermia?


Elizabeth – Iniciei os meus estudos com curso de graduação em física em Parintins. Na época, era o que mais se aproximava de minhas aptidões. O curso foi concluído em Manaus-Am, na UFAM. Depois, resolvi fazer alguma aplicação prática dos conhecimentos adquiridos com o curso de Física. Não havia cursos de Física Aplicada em minha universidade, por isso fiz o mestrado em Geociências onde havia a linha de pesquisa em Geofísica. Depois disso entrei para o doutorado em Geofísica na mesma linha de mestrado que é a Geotermia. Minha família toda é cristã, alguns evangélicos e outros católicos, e foi nesse ambiente que cresci, então sempre digo que tudo o que aconteceu em minha vida foi permitido por Deus.



FMA – Quais são principais objetivos em pesquisar recursos geotermais?


Elizabeth – Os principais objetivos são determinação de recursos de energia geotérmica da Região Amazônica para o desenvolvimento de projetos de aproveitamento do calor do subsolo; estimar o fluxo de águas subterrâneas em subsuperfície e determinar as magnitudes e idades das mudanças climáticas dos últimos séculos.



FMA – Como a senhora conheceu o dr. Hamza?


Elizabeth – Foi em 2009, num congresso em Salvador, Bahia. Eu estava apresentando o meu trabalho de mestrado, feito na Universidade Federal do Amazonas-UFAM, em Geologia Ambiental com ênfase em geotermia.Neste encontro, o doutor Hamza quis conhecer o minha pesquisa. Pretendia fazer doutorado em geofísica/geotermia, pois sou graduada em física pela UFAM. Como na minha universidade não havia essa especialização, então, perguntei ao dr. Hamza se aceitava ser o meu orientador. Ele atendeu prontamente o meu pedido. Passei para o doutorado em 2010 e ganhei uma bolsa para fazer minha pesquisa, aqui no Observatório Nacional.



FMA – Por que geotermia?


Elizabeth – Geotermia analisa as variações de temperatura de tudo que tiver da superfície da terra para abaixo. Essas análises permitem identificar e detectar a maturação de hidrocarbonetos (petróleo), gás, minérios e água. Assim, identificamos o movimento da água. O doutor Hamza é um dos maiores especialistas em geotermia e mudanças climáticas. Atualmente, já aposentado, trabalha todos os dias sem ganhar nada a mais, para continuar orientando seus alunos.



FMA – Por que essa homenagem ao cientista Valiya Hamza, dando nome ao rio?


Elizabeth – Só quem conhece a dedicação e a capacidade, além da paixão pela ciência e o amor ao Brasil desse indiano, pode entender o porquê dessa homenagem.