Arte e Sustentabilidade
22 de novembro de 2011“Em nosso ofício, as esculturas de bambu são nosso meio ambiente, e a nossa arte é fazer parte, integrar este meio”. ROBERTA MARTINS “O bambu é apontado como a madeira alternativa sustentável do milênio. Ele é uma gramínea que, dependendo da espécie, desenvolve-se em touceira ou se alastra em floresta”.POEMA MOHLENBERG FMA – Como… Ver artigo
“Em nosso ofício, as esculturas de bambu são nosso meio ambiente, e a nossa arte é fazer parte, integrar este meio”.
ROBERTA MARTINS
“O bambu é apontado como a madeira alternativa sustentável do milênio. Ele é uma gramínea que, dependendo da espécie, desenvolve-se em touceira ou se alastra em floresta”.
POEMA MOHLENBERG
FMA – Como surgiu o grupo e a ideia de usar a árvore para manter a vida longa e ativa?
Ana Flávia: A Cia Nós No Bambu foi fundada por um pequeno grupo de praticantes de Integral Bambu que resolveu aprofundar suas possibilidades cênicas. O Sistema Integral Bambu foi iniciado há 11 anos pelo professor de Educação Física Marcelo Rio Branco, que desenvolveu um método para manter sua saúde e exercitar suas faculdades motoras. Subindo em árvores, visualizou a diversidade de situações que exigiam o aprimoramento da inteligência corporal, da sensibilidade ao toque e, acima de tudo, a “presença de espírito” para não cair. Percebeu que nas árvores tinha tudo que precisava para manter uma vida longa e ativa, trabalhando corpo e mente.
FMA – E o bambu nesta história?
Poema: Marcelo Rio Branco quis compartilhar o “insight” para que mais pessoas conquistassem a autonomia motora e o autoconhecimento através desta pesquisa que ele iniciava. Procurando um suporte que possibilitasse um ambiente comum para que o vocabulário adquirido pudesse ser replicado, teve este encontro próspero com o bambu, que é uma matéria-prima natural renovável, agradável ao toque e de beleza estética única. Assim ele pode “construir” suas próprias árvores e compartilhar o sistema. Este é o berço da Cia Nós No Bambu. Foi no desenvolvimento desta pesquisa que alcançamos vôo próprio. Fizemos a opção de focar na plasticidade dos movimentos construindo uma linguagem artística a partir daí.
FMA – Eu já vi vocês se apresentarem. É muito lindo. Mas como é esta pesquisa cênica com bambus?
Roberta: Com a interação entre o corpo e as esculturas, desenvolvemos um repertório acrobático. O cuidado no andar e a atenção com a leveza nos proporcionaram harmonia no deslocamento. A exigência de tempo de permanência nos bambus nos fez explorar os limites do tato e a relação com a pele. Aprendemos a mesclar nosso corpo ao bambu e não a tentar dominá-lo, assim ele se tornou um Mestre.
FMA – Mestre? Explique melhor…
Roberta: Vamos sim. O bambu é natureza, responde a inúmeras variações: temperatura, umidade, pressão, etc. Um dia ele escorrega, no outro ele gruda. Um dia ele acolhe, no outro repulsa. Nós também somos natureza, e cada integrante da Cia possui um tato diferenciado com o bambu. Nossa expertise está no domínio desta interação e não no domínio do bambu. Aprendemos com ele. Em nosso ofício, as esculturas de bambu são nosso meio ambiente, e a nossa arte é fazer parte, integrar este meio.
FMA – Bem, vamos ao início. Como vocês chegaram à utilização do bambu? Como foi esta pesquisa?
Poema: O bambu é apontado por inúmeros arquitetos e designers como a madeira alternativa sustentável do milênio. Ele é uma gramínea que, dependendo da espécie, desenvolve-se em touceira ou se alastra em floresta. Ou seja, quando colhemos uma vara de bambu, não extinguimos um “pé de bambu”, como acontece com as árvores, apenas tiramos uma de suas ramificações, fazemos sua poda, o manejo. Cerca de sete anos são suficientes para que uma vara de bambu esteja madura para o corte. Desta forma, com uma área não muito grande, é possível desenvolver um manejo sustentável de bambu. Nossa pesquisa é viva, constante. Aprendemos todos os dias alguma coisa diferente e assim estamos formando um caldo de saberes que aplicamos na nossa arte. Estamos crescendo e formando uma linguagem nova.
FMA – De um modo mais geral, como a Cia vê sua arte em relação às atuais questões de sustentabilidade?
Ana Flávia: Muito interessante, pois percebemos muitas vezes a arte sendo mídia de um discurso sobre a sustentabilidade. Sem desconsiderar a importância disto, nos desafiamos a realizar uma arte sustentável em si – o que não é fácil. Renovar o bambu que se desgasta porque é um material orgânico, orquestrar um grande grupo e valorizar todos que trabalham, cuidar do corpo sem exigi-lo em demasia ao mesmo tempo em que exploramos as acrobacias… Ser sustentável para nós é cuidar do todo que envolve o nosso trabalho e sua perpetuação.
FMA – Sei que nada é fácil. Quais as grandes dificuldades encontradas?
Poema: Tem razão. São muitos os desafios. Mas a gente vence um por um. O importante é que vamos vencendo na contramão da cultura mercantilista de consumo, ao mesmo tempo em que tentamos nos inserir e conquistar o nosso mercado. Se analisarmos o panorama atual, o que se percebe é a proliferação dos trabalhos com poucas pessoas, pois é mais “barato” para quem investe em cultura, e é o que vêm comportando a maioria dos editais de fomento à arte. Podemos dizer que recurso financeiro necessário às condições ideais para a excelência do desenvolvimento de grupos no Brasil é um fator limitante, a grande dificuldade. Fazemos números cênicos menores, mas insistimos em ser grupo. Não queremos desagregar por uma questão meramente mercadológica. Esta é a nossa militância. Conseguir o patrocínio para a manutenção da companhia por dois anos, por meio do edital Petrobras Cultural, é uma grande conquista para Nós.
“Vamos carregando nossos bambus, não como quem carrega uma cruz, mas como quem carrega uma vida”.
LILI – produtora do grupo Nós no Bambu