Turismo & sustentabilidade

PRAIA DE TAMBABA

21 de março de 2013

Não vale estuprar a mais bela praia de naturismo do mundo

Todo trecho da praia de Tambaba, praia naturista conhecida internacionalmente, se insere na APA de mesmo nome e apresenta orla exposta, retilínea, com grandes falésias e estreita faixa de praia. A erosão é bastante intensa na área atuando diretamente sobre as falésias favorecendo voçorocas. No trecho predomina cobertura do bioma da Mata Atlântica em estágio de regeneração. Possui grande concentração de arrecifes areníticos, com formatos interpretativos como Pedra da Baleia, da Caveira, do Elefante, etc.

 

O anúncio desse megaprojeto turístico assusta muita gente. Assusta a população local, assusta os ambientalistas e assusta as ONGs que defendem a natureza. É compreensível que o prestígio que Tambaba conquistou ao longo dos anos provoque todo tipo de fantasias na mente consumidora, mas empreendimentos dessa magnitude deveriam ser instalados em áreas já antropisadas, que existem várias na região. 

Ao sair de Tambaba, registrei um crime ambiental que para queimar a mata que fica na fronteira da Área de Proteção Ambiental de Tambaba e o assentamento rural denominado Sítio Tambaba. Para incendiar, sem nenhuma precaução, quatro lotes de 15x35m, os proprietários causaram incêndio que atingiu uma extensão aproximada de 10 hectares. Restaram na área a mesa construída com parte da madeira derrubada, o banco, troncos calcinados e vestígios de uma divertida bebedeira com muitas latas de cerveja.
 

 Antônio Augusto de Almeida – ENTREVISTA

 “A agressão à APA de Tambaba é um triste exemplo. A verdade é que gestão ambiental em nosso estado – e muito no Brasil inteiro – é somente formalidade para mascarar a legalidade”.
 
O engenheiro Antônio Augusto de Almeida tem histórico de seriedade e de luta pelas questões ambientais. Professor, ambientalista, sanitarista, Antônio Augusto foi secretário de Meio Ambiente de João Pessoa, na gestão do prefeito Ricardo Coutinho, atual governador do Estado da Paraíba, e é vice-presidente da Associação dos Amigos da Natureza. (RM)
 
 
Folha do Meio – O projeto Reserva de Garaú vai ocupar uma área contínua de 186 hectares. Que impactos ambientais vão ocorrer para a fauna e flora da região?
Antônio Augusto –  A área escolhida para implantação do projeto é a mais preservada e a que ainda guarda as características básicas do ecossistema local, entre as quais a fauna remanescente. As demais áreas já estão antropisadas.  

“Essa coisa do empresário imobiliário se apropriar de uma área notável por suas características naturais e paisagísticas, que é um patrimônio da sociedade, para agregar valor ao produto e, consequentemente, maximizar o lucro do capital, é uma velha estratégia posta em prática nos países que ainda não tem uma consciência da sustentabilidade”.
 
FMA – Pelo mapa de ocupação da área, se percebe que a cobertura florestal a ser conservada corresponde a apenas a uma franja perimetral a Leste do empreendimento. Nesse caso, a nesga de floresta residual passaria a exercer uma função paisagística simplesmente? 
Antônio Augusto –  Exatamente. A flora que restará terá função simplesmente paisagística para vender o empreendimento e depois passará a  sofrer pressão porque “incomoda” pois tem custo de manutenção e segurança.  Essa coisa do empresário imobiliário se apropriar de uma área notável por suas características naturais e paisagísticas, que é um bem comum de todos ou, patrimônio da sociedade, para agregar valor ao produto e, consequentemente, maximizar o lucro do capital, é uma velha estratégia posta em prática nos países que ainda não tem uma consciência da sustentabilidade. Em resumo: destrói a notabilidade, sai incólume da cena do crime e transfere a culpa para os compradores e seja lá quem for.
 
FMA – A área do empreendimento irá ocupar uma extensão de floresta secundária, do bioma Mata Atlântica, em estágio avançado de recomposição. A conservação dessa recuperação florestal não poderia cumprir uma função pedagógica para difundir uma experiência de sucesso que nasceu do acaso?
Antônio Augusto –  Claro que sim, a natureza dá lições, a todo momento, porém a ganância e a mentalidade da destruição impedem que se tirem proveito delas. 
 
FMA – Para construir esse complexo turístico, o empreendimento terá que desflorestar praticamente a área toda. Não seria mais interessante que esse projeto fosse deslocado para uma área já degradada?
Antônio Augusto Sim. A visão da sustentabilidade econômica e socioambiental  aponta para uma apropriação de um patrimônio natural notável preservado, por uma maioria, inclusive de empresas, que se instalassem no entorno, passando a gozar de uma qualidade de vida cada vez melhor. Num país sério, o responsável por um órgão ambiental que licencia um empreendimento localizado numa APA, oficialmente instituída, mofaria na cadeia.
 
FMA – O incremento populacional previsto será de 8.800 pessoas, que corresponde a 41% do total de habitantes do município. Que impactos poderiam ser causados por essa concentração de população adicional?
Antônio Augusto –  Imagine-se cerca de 9 mil pessoas, numa estimativa por baixo, e mais de 1.400 veículos  trafegando em áreas pavimentadas. É a urbanização de uma área de preservação. Infelizmente, em nosso país a culpa por prática de ilícitos, que implicam em perdas de vidas ou danos coletivos diversos, acaba diluindo-se e vem a impunidade. Num país sério, o responsável por um órgão ambiental que licencia um empreendimento localizado numa APA, oficialmente instituída, mofaria na cadeia.
 
FMA – Qual seria a vocação turística mais adequada para Tambaba, considerando-se o patrimônio ambiental existente?
Antônio Augusto – Como disse anteriormente ou, ao invés de matar a galinha dos ovos de ouro, preservá-la, colher e fazer eclodir seus ovos para se ter novas galinhas.
 
FMA – As experiências fracassadas de megacomplexos turísticos, no Brasil e na Espanha, indicariam que a licença ambiental poderia ser usada para mascarar o loteamento da área?
Antônio Augusto –  Sim. Vivemos uma vulnerabilidade total das instituições responsáveis pela implementação das bases da sustentabilidade em nosso país, especialmente na Paraíba. A verdade é que gestão ambiental em nosso estado – e muito no Brasil inteiro – é somente formalidade para mascarar a legalidade.
 
FMA – O projeto arquitetônico apresentado não incorpora nenhuma vinculação sustentável ou comprometida com o turismo ecológico. De que forma poderia se praticar um turismo ambiental, que garantisse a manutenção florestal e assegurasse o desenvolvimento econômico vocacionado da região?
Antônio Augusto –  Como já disse, é um projeto, de um modo geral,  votado para o lucro imediato e nisso, como não poderia deixar de ser, está contribuindo a arquitetura convencional.
 
FMA – Considerando o prestígio internacional de Tambaba, de que modo poderia ser praticado o turismo na área, como vetor econômico, sem impactar o meio ambiente?
Antônio AugustoTambaba tem os pré-requisitos para o desenvolvimento de um turismo sustentável, desde que preservada na sua integridade. Há inúmeras experiências mundiais e algumas em nosso país nesse sentido. São muitos os exemplos recentemente divulgados, guardadas as diferenças culturais, como na Croácia.
 
 FMA – Numa visão macro, que medidas a Prefeitura do Conde deveria adotar para potencializar a vocação turística natural, sem causar tantos danos ambientais?
Antônio Augusto –  Uma prefeitura como a do Conde deveria ter, além de uma legislação ambiental consubstanciada no seu plano diretor, um projeto estratégico de desenvolvimento sustentável. 
Porém, não nos devemos iludir. Como está o sistema eleitoral e o processo da gestão pública em nosso país e estado, em que não há continuidade administrativa e o administrador se comporta como dono, proprietário, não é fácil. A própria comunidade ambiental tem que reagir. Há que haver mobilização séria na área política e junto aos órgãos fiscalizadores.
 

Para salvar Tambaba, a própria comunidade ambiental tem que reagir. Há que haver mobilização séria na área política e junto aos órgãos fiscalizadores.
 
 
 
 
 
 
 
Fotos: Reginaldo Marinho  

O crime ambiental choca os olhos de quem visita a APA de Tambaba. O assentamento rural denominado Sítio Tambaba virou cinza. Aproximadamente 10 hectares foram queimados para virar lotes de 5x35m. Tambaba está ameaçada de ter um de seus recantos mais nobres extinto para dar lugar a gigantesco complexo turístico, composto de quatro resorts, com 1.892 apartamentos, um campo de golfe, quatro condomínios com 959 lotes residenciais, três pousadas com 288 unidades habitacionais, três clubes, un centro comercial e estacionamentos com 1.400 vagas.Como licenciar um empreendimento situado dentro de uma APA?
 
  

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Professor ANDRÉ PIVA adverte: um absurdo acontece na APA de Tambaba

O grave é que a licença ambiental já foi até previamente concedida

 

 Professor André Piva, da UFPB, e sua filha Alice.

O professor André Piva, da Universidade Federal da Paraíba, tem conhecimento, experiência e autoridade para criticar e analisar projetos que envolvem turismo e meio ambiente. André Piva, Doutorado em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia, é o Coordenador do Programa de Pós-graduação lato sensu em Turismo de Base Local – UFPB. Com vasta experiência em planejamento, organização e execução de eventos artístico-culturais, especialmente na cadeia produtiva do turismo, André Piva conhece muito bem o empreendimento na APA de Tambaba e tem posições. Pesquisador nas áreas de turismo e cultura em perspectivas da economia criativa e indústrias criativas.    (Reginaldo Marinho)

 

Violência ambiental – “Tambaba já é oficialmente considerada como Área de Proteção Ambiental, por isso nosso estarrecimento com uma licença já previamente concedida, e indícios de que o empreendimento pode se tornar realidade. Como isso é possível? Quais as forças e interesses que estão possibilitando tal conduta?”

 
Massacre na fauna – “Um impacto total e violento. Vai simplesmente erradicar a fauna do lugar. Não se trata apenas de extinguir ou expulsar animais silvestres que habitam e sobrevivem da área, mas de comprometer toda a fauna de uma grande área de todo o entorno que depende da mata que o projeto vai destruir, ou seja, há animais do próprio local e de outras áreas que dependem da alimentação nativa do lugar, de relacionamentos para procriação, de pássaros que lá vivem e voam para outros locais fazendo o natural trabalho de semeadura, como também de pássaros que trazem sementes dos outros locais. 
O megaempreendimento vai quebrar a contiguidade de áreas conservadas com áreas em recuperação e o rio com áreas de mangues, fontes de alimentação da vida silvestre. Vai fechar o contato natural dos animais com suas fontes de alimentação e, certamente, as construções e dejetos a serem despejados poluirão o rio e o mangue”.
 
Na contramão da ONU e da sustentabilidade – “Walter Aguiar, enquanto representante do governo da Paraíba, disse que o Estado não tem posição contrária a construção de resorts porque condiz com a realidade do turismo.Explicou que a tentativa é construir em conjunto com a sociedade de forma participativa e de maneira sustentável, levando em conta os objetivos do milênio pautados pela ONU”.
 Esse pensamento nos preocupa. Se o Estado aceita os resorts na Paraíba por condizer com a realidade do turismo, colocamo-nos, como pesquisadores, embasados na literatura acadêmico-científica, que o turismo compatível com tal tipo de empreendimento, nada tem de sustentável, contrário, portanto, às diretrizes da ONU. 
No caso, o empreendimento se torna um oásis de luxo cercado de favelas. O Estado não pode pender para o poder econômico, beneficiando poucos privilegiados em detrimento do povo”.
 
Agressão irrecuperável “O projeto trará uma agressão irrecuperável ao meio ambiente, poluição do rio Garaú e uma urbanização desordenada no entorno, além da extinção da praia naturista de Tambaba, que é um produto turístico especial, claro que para públicos específicos, entretanto de grande valor simbólico. 
O certo é que o projeto arquitetônico, assim como toda a concepção do empreendimento nada tem de sustentabilidade, mesmo que no projeto se diga isso, ou mesmo se tratar de um projeto ecoturístico tudo não passa de falácias”. 
 
Como confiar na fiscalização? “É sabido que os construtores, após o projeto aprovado, não cumprem com o comprometido e não há como se confiar na fiscalização. Não vemos quaisquer chances de sustentabilidade estrutural no projeto: abastecimento de água, coleta de lixo e tratamento de esgotos, formas de se evitar a favelização da área, estrutura de mobilidade compatível com o número de público que se quer atrair”.
 
Desafio do novo prefeito – “O município do Conde já foi muito agredido e muito depredado, mas ainda dá tempo de corrigir muita coisa. Temos que pensar em programas macros e micros para o desenvolvimento de seu turismo em bases exclusivamente sustentáveis. Há muito o que fazer e muitos desafios para a nova administração. O setor de turismo conta com pessoal competente, com muita boa vontade, porém temo se eles realmente conseguirão derrotar interesses poderosos”.
 
APA de Tambaba – “É fundamental conservar as áreas da APA de Tambaba. O verde do município deve ser preservado e valorizado ao máximo, em função do turismo. Há que se incrementar parques ecológicos, bosques, hortos florestais e florais, estruturas variadas para práticas ecoturísticas, construções de vias mais condizentes com o tráfego de veículos, leis mais severas para construções e aí por diante”. 
 
 
  
Área de Proteção Ambiental de Tambaba
A APA tem por finalidade garantir a integridade dos ecossistemas terrestres e aquáticos, proteger os cursos d`água, melhorar a qualidade de vida da população e disciplinar a ocupação da área.
 
Silvestre Gorgulho
 
Tambaba é uma praia situada no município de Conde, a 17 km de João Pessoa-PB. É conhecida por ser uma praia onde se pratica o nudismo, sendo a primeira praia do Brasil a permitir o naturismo por lei municipal.
 
 
 

A área é de rara beleza e tem mirantes lindíssimos que permitem observar a natureza exuberante de toda a costa, com trilhas para caminhadas a beira mar. Além das falésias multicoloridas, existe uma Unidade de Conservação de uso sustentável – APA de Tambaba – que abrange parte da microrregião do litoral sul do estado da Paraíba entre os municípios de Conde, Alhandra e Pitimbú
 
 
 
 
 
O nome vem do tupi-guarani e tem dois significados: “o conteúdo das conchas” e “monte de Vênus”. Segundo a lenda, uma bela índia de nome Tambaba, apaixonou-se por um guerreiro de outra tribo. O cacique, pai de Tambaba, não permitiu o casamento. A bela índia pôs-se a  chorar e suas lágrimas inundaram as terras secas e transformaram primeiro num lago e depois numa praia, com ondas suaves. Deus sol eternizou o local como um templo natural do amor e da vida. A praia, que tem uma topografia intimista e protegida, é um presente dos deuses com suas águas cristalinas e mornas.
A área é de rara beleza e tem mirantes lindíssimos que permitem observar a natureza exuberante de toda a costa, com trilhas para caminhadas a beira mar. Além das falésias multicoloridas, existe uma Unidade de Conservação de uso sustentável – APA de Tambaba – que abrange parte da microrregião do litoral sul do estado da Paraíba entre os municípios de Conde, Alhandra e Pitimbú. 
Encontram-se inseridas na APA as praias de Tabatinga, Coqueirinho, Tambaba, Graú e praia Bela e as localidades de Mata da Chica, Garapaú, Andreza, Roncador e Mucatu.
A APA está em uma das mais belas áreas do litoral paraibano, resguardando um mosaico de fitofisionomias da Floresta Atlântica, como a mata de tabuleiro, a mata de reestinga e os maguezais. Além disso, apresenta formações geomorfológicas   de beleza singular como suas falésias, nichos de cabeceiras, vales e canyons.
A APA de Tambaba tem por finalidade garantir a integridade dos ecossistemas terrestres e aquáticos, proteger os cursos d`água que integram a região, melhorar a qualidade de vida da população e disciplinar a ocupação da área, para que esta não avance de forma desordenada e em ritmo acelerado,   como se apresentava antes da criação da UC, contribuindo assim para a redução da degradação do ambiente local e sua restauração futura.