Literatura & Meio ambiente

Meio Ambiente & Evolução Humana

16 de agosto de 2013

Como o ser humano se tornou um forte agente de transformações no planeta

 
Se é para ecologizar, ninguém melhor do que o arquiteto, escritor e ambientalista Maurício Andrés Ribeiro. Formado pela UFMG, Andrés foi Secretário Municipal de Meio Ambiente de Belo Horizonte, Presidente da Fundação Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais, Diretor e conselheiro do Conama e hoje trabalha na ANA – Agência Nacional de Águas.
Colabora com ONGs ligadas à cultura de paz e ao federalismo mundial. Colaborou com Pierre Weil, fundador da Universidade da Paz, tendo sido Vice Presidente da Fundação Cidade da Paz, em Brasília. Autor das obras: “Tesouros da India para a civilização sustentável”, “Ecologizar” e “Ecologizando a cidade e o planeta”. Acaba de lançar um novo livro: “Meio Ambiente & Evolução Humana”, sobre o qual conversamos com ele.
 

O livro trata da consciência ecológica como um estágio da consciência que nos faz vivenciar a unidade do ser com o ambiente.
 
 
 
 
 
Maurício Andrés Ribeiro – Entrevista
 
Folha do Meio – Como nasceu o livro?
Maurício Andrés – Este livro começou a nascer quando fui pesquisador visitante do CNPq na Índia. Tomei contato, então, com a obra de Sri Aurobindo e com sua concepção do ser humano como um ser em transição. A India é uma civilização movida por valores espirituais, pela cosmologia védica milenar que estimula comportamentos 
amigáveis em relação ao ambiente. Ali se estendeu ao mundo animal o princípio da não violência, usado por Gandhi na luta pela independência; o vegetarianismo; a ioga, com a consciência do corpo e as posturas corporais e consciência da respiração. A psicologia é refinada: para cada palavra de psicologia em inglês há 4 em alemão e 40 em sânscrito
 
FMA – Vamos situar o livro para os leitores?
Maurício Andrés – O livro nos situa no período antropoceno da história da Terra, no qual nossa espécie é a dominante. Focaliza o homo sapiens, que produz grandes transformações no planeta. O livro mostra os papéis que essa espécie tem hoje na evolução, da qual se tornou co-gestora. Um dos textos aplica a abordagem ecológica ao tema da corrupção. Os corruptores são predadores que tratam a sociedade como sua presa; são parasitas que sugam a sociedade que os hospeda e nutre. Há, na corrupção, relações ecológicas desarmônicas de parasitismo e de predação.
O livro focaliza a ecologia do ser. Define nosso corpo, como um ecossistema no qual vivem bilhões de micro organismos – vírus, bactérias, fungos etc. Fala da interação entre corpo, mente e emoções e como cada um deles influi sobre os demais. 
 
 
 
FMA – Qual a importância do autoconhecimento nesse momento de crise?
Maurício Andrés – O livro trata da consciência ecológica como um estágio da consciência que nos faz vivenciar a unidade do ser com o ambiente. Define o mito da sustentabilidade, no sentido que lhe dá Joseph Campbell: como um mito unificador que promove a convergência de energias e motivações. O capítulo final trata das tragédias e das diversas atitudes diante delas. 
“Ó espécie humana, conhece-te a ti mesma e conhecerás o ambiente e o universo em que vives”. Essa máxima resume o espírito do livro. O autoconhecimento é um recurso valioso para lidarmos com as circunstâncias desse momento de crise ecológica e de crise da evolução.
 
FMA – O que o motivou a escrever sobre o tema da Evolução humana?
Maurício Andrés – O ser humano tornou-se um forte agente de transformações no planeta. Suas motivações, interesses, desejos, emoções, sentimentos e afetos, além de pensamentos, movem suas ações. Procurei focalizar a ecologia do ser numa visão integradora. Para tanto, procurei fazer um distanciamento para ter uma visão macro, como um astronauta que enxerga a situação de longe, de fora; no sentido inverso, procurei me aproximar no micro, entrar na ecologia do ser humano. Recorri a minha vivência com Pierre Weil, fundador da UNIPAZ, que teve uma visão integradora das ecologias e que reconhecia a importância da ecologia interior.
 
FMA – Qual a magnitude da crise ecológica atual?
Maurício Andrés – A magnitude das transformações atuais tem paralelo com as que ocorreram há 65 milhões de anos e que levaram à extinção dos dinossauros. Naquela ocasião, ocorreu a passagem da era mesozoica para a era cenozoica – a era dos mamíferos – ao final da qual surgiu o homo sapiens, hoje um grande agente das transformações aceleradas que ocorrem no planeta. No atual contexto de rupturas, cada espécie viva procura se adaptar às novas condições ambientais. Algumas conseguem fazê-lo, outras se extinguem para sempre. A espécie humana encontra-se numa encruzilhada que pode levar ao colapso ou a uma auto superação que lhe permita sobreviver a essa situação critica.
 
FMA – Quais os papéis do ser humano, na atual etapa da evolução?
Maurício Andrés – O homo sapiens tem diversos papéis na evolução e influi nela de forma cada vez mais intensa, para o bem ou para o mal. Numa perspectiva que ressalta seus aspectos negativos, atua como agente deteriorador, degradador dos sistemas de vida, um produtor de desertos. Ele é o grande predador, o anjo exterminador de outras espécies vivas e pode ser visto como um parasita, que suga a Terra que o hospeda. O ser humano é visto como aprendiz de feiticeiro, ao liberar forças que não sabe controlar; James Lovelock, o criador da teoria de Gaia, o define ora como o engenheiro de manutenção do planeta, ora como um delinquente juvenil, pela irresponsabilidade que demonstra em suas ações. O ser humano tornou-se gestor e indutor da evolução, influenciada por suas ações, por suas atitudes e comportamentos individuais ou coletivos.  Por sua vez, essas ações decorrem de pensamentos e de sua consciência.
 

FMA – Quais os principais avanços atuais no estudo da consciência?
Maurício Andrés – No oriente, tradições milenares como na vedanta e no budismo, estudaram a fundo a consciência e constituem um manancial riquíssimo a ser mais bem conhecido e aplicado. O ocidente avançou com sua mentalidade tecno-científica, do pensamento lógico, da racionalidade, correspondente ao hemisfério esquerdo do cérebro: dele vem a lei.  O oriente valorizou a intuição e a aprendizagem criativa: dele vem a luz.  Da mesma forma, como os hemisférios esquerdo e direito do cérebro têm funções diferenciadas, nos hemisférios ocidental e oriental do planeta se desenvolveram concepções distintas sobre a consciência. 
FMA – Qual a influência da propaganda sobre a consciência ecológica?
Maurício Andrés – Da mesma maneira como o marketing e a publicidade atuam sobre o inconsciente e excitam o desejo de consumo, essas técnicas de comunicação também podem, caso haja consciência coletiva, promover o desejo por saúde ambiental. Podem reduzir a demanda por bens cujo processo de produção é destrutivo ou poluidor. Assim, por exemplo, podem-se contrapor, à publicidade comercial, mensagens que minimizem o desejo do consumo material cuja satisfação pressiona a natureza.  
 
A espécie humana encontra-se numa encruzilhada que pode levar ao colapso ou a uma auto superação que lhe permita sobreviver a essa situação critica.

 
FMA – O que podemos fazer, coletivamente?
Maurício Andrés – Políticas públicas ecologizadas, e a ecologização da administração pública e dos governos leva o tema ambiental a ser internalizado em cada setor de atividades: agricultura, indústria, saneamento, habitação, obras públicas, transportes, uso do solo, lazer e turismo, ação social, educação, cultura, saúde, segurança e defesa civil, entre outras. Para ecologizar a gestão pública é indispensável dispor da capacidade de articulação e de coordenação, autoridade para induzir a colaboração e para produzir a convergência de finalidades e objetivos. A articulação intersetorial e o estabelecimento de compromissos, envolvimentos e mobilização de todas e cada uma das áreas dos governos é forma de exercitar a ecologização governamental.