"A Serra da Moeda está desprotegida e corre sérios riscos. Nos
últimos anos toda essa região sofreu bastante com dois dos desdobramentos da trajetória econômica brasileira: o crescimento do setor mineral e a formação de uma grande bolha de ativos imobiliários na região."
Fotos: ILANA LANSKY
A cada dois anos a organização World Monuments Fund (WMF, o Fundo Mundial para Monumentos), atualiza a relação de patrimônios da humanidade ameaçados. A lista inclui monumentos, cidades e regiões em todos os continentes, ameaçados por guerras, fanatismo religioso, atividades econômicas predatórias ou simplesmente descaso.
A Serra da Moeda foi indicada para a lista do WMF pela ARCA, organização social que trabalha com a preservação, a conservação e a recuperação ambiental e cultural das serras da Moeda, do Curral e entorno. A ARCA – Associação para a Recuperação e Conservação Ambiental promoveu um estudo que encaminhou ao WMF, mostrando que o complexo da Serra da Moeda está seriamente ameaçado pela mineração e pela expansão urbana descontroladas.
A documentação encaminhada ao WMF pela ARCA mostra em detalhes a fabulosa riqueza natural e cultural da Serra da Moeda. A paisagem, o patrimônio arquitetônico e arqueológico, os grupos quilombolas remanescentes, as tradições familiares e religiosas, bem como os campos de altitude, as nascentes, as cavernas e os cursos d’água, estão entre os aspectos destacados pela ARCA no dossiê.
OUTRO LADO DA MOEDA
DE UM LADO A BLEZA E ADIVERSIDADE DA SERRA DA MOEDA, DE OUTRO O CRESCIMENTO DA MINERAÇÃO E DOS ATIVOS IMOBILIÁRIOS
A área descrita pela ARCA abrange todo o complexo da Serra da Moeda, incluindo então a crista principal da serra, os platôs centrais e suas encostas mais a leste, voltadas para o rio das Velhas – como a Serra de Itabirito, por exemplo. A área começa na região de Nova Lima, quase em Belo Horizonte, e segue até Congonhas, passando pelos municípios de Brumadinho, Itabirito, Rio Acima, Belo Vale, Moeda e Ouro Preto.
Alguns trechos da Serra da Moeda já têm a sua proteção garantida, após enormes esforços da sociedade organizada e de alguns órgãos governamentais, como a Serra da Calçada.
A Serra da Calçada é tombada pelo Estado de Minas Gerais, e foi decretada, em 2013, um monumento natural municipal, na sua área correspondente ao município de Nova Lima. No entanto, a Serra da Moeda como um todo está desprotegida e corre sérios riscos. Nos últimos anos toda essa região sofreu bastante com dois dos desdobramentos da trajetória econômica brasileira: o crescimento do setor mineral e a formação de uma grande bolha de ativos imobiliários.
Minas a céu aberto e áreas degradadas
Por um lado, o rápido crescimento da demanda asiática resultou em um aumento expressivo no preço da tonelada do minério de ferro no mercado internacional, o que viabilizou economicamente a abertura de novas minas na região da Serra da Moeda. Para piorar, as mineradoras continuam seguindo, via de regra, seu péssimo padrão de qualidade: para economizar, desenvolvem as minas a céu aberto, abrem estradas a esmo, utilizam superfícies cada vez maiores do território e chamam de “recuperação de áreas degradadas” algo bem diferente do que isso realmente deveria significar.
O setor imobiliário, por sua vez, nadou por algum tempo nos dólares que inundaram o mercado financeiro internacional depois do susto norte-americano de 2008. A euforia aumentou o preço dos imóveis (na planta, novos e usados) e também dos terrenos, e assim um cenário que poderia levar a um ganho de qualidade no setor gerou, na verdade, uma corrida especulativa, do tipo pirâmide ou bolha. A pressão pela utilização de áreas ambientalmente importantes ou delicadas no complexo da Serra da Moeda subiu junto com o valor da terra.
Moeda: mineradoras continuam seguindo seu péssimo padrão de qualidade na exploração de recursos naturais
PATAMAR DE RECONHECIMENTO INTERNACIONAL
O reconhecimento pelo WMF da importância do complexo da Serra da Moeda coloca essa região de Minas no honroso patamar da cidade de Veneza, do complexo arqueológico de Angkor (no Camboja), dos budas gigantes de Bamiyan, no Afeganistão, e dos castelos dos cruzados na Síria.
Os degradadores da Serra da Moeda, por sua vez, também ficam em excelente companhia, ao lado dos fanáticos sírios, dos terroristas do Talebã e das piores empresas de turismo que operam na Europa.
A ARCA continuará trabalhando, junto com seus parceiros, pela melhoria das condições ambientais da Serra da Moeda, pela organização e fomento do lazer e das atividades esportivas e culturais e pelo resgate e preservação definitivos de seu patrimônio cultural, histórico e arqueológico.
A luta dos ambientalistas é para garantir um futuro sustentado para a Serra da Moeda.