SEMANA DO ÍNDIO
TAINARA TERENA – ENTREVISTA
22 de abril de 2014TAINARA: “O equilíbrio que buscamos no nosso trabalho é aprender o novo sem desprezar os saberes de nossos avós”. “Na aldeia aprendemos muito no convívio com a família e aprendemos a fortalecer nossas tradições. Quando saímos da aldeia percebemos grandes diferenças e uma concorrência para a qual não fomos preparados”. … Ver artigo
TAINARA: “O equilíbrio que buscamos no nosso trabalho é aprender o novo sem desprezar os saberes de nossos avós”.
“Na aldeia aprendemos muito no convívio com a família e aprendemos a fortalecer nossas tradições. Quando saímos da aldeia percebemos grandes diferenças e uma concorrência para a qual não fomos preparados”.
Filha do Povo Terena, Tainara é formada em Agronomia pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Foi coordenadora dos concursos nas Aldeias e Coordenadora da participação juvenil nos Jogos dos Povos Indígenas. Atualmente é instrutora do SENAR – Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, além de instrutora de cursos na área de agricultura para pequenos produtores e aldeias indígenas.

Tainara Terena repassando para os jovens índios os conhecimentos que trouxe da Universidade
FMA – Você nasceu em qual aldeia e onde estudou?
Tainara Terena – Minha infância foi na aldeia Ipegue município de Aquidauana – MS, estudei o ensino fundamental e médio na aldeia e aprendi que fora das aldeias havia muita concorrência e não tinha noção de como era. Já minha vida acadêmica e agronômica foi na UEMS – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Foi uma excelente experiência de conquista na minha vida por ser uma jovem índia Terena, aprendendo que temos capacidade de superação para uma vida profissional.
FMA – Como foi essa experiência, sentiu dificuldades ou discriminação?
Tainara – A maior dificuldade foi ficar distante do convívio familiar e de minha comunidade. Quanto às discriminações, elas surgiram sim, mas não diretamente a mim. Eram mais quando o tema se referia a “índios”.
FMA – Ser Miss Mato Grosso do Sul ajudou ou prejudicou seus estudos e seus trabalhos?
Tainara – Ao concorrer e vencer o concurso de Miss Aquidauana e chegar a Miss Mato Grosso do Sul foi uma grande experiência. Evidente que foi algo inédito, pois uma índia representou e concorreu a um concurso nacional de Miss. Então só obtive resultados positivos claro, com total apoio de minha família na aldeia. Entendi que somos todos iguais e com mesmos direitos, basta sermos persistentes e fortes.
FMA – O que você acha da criação no Brasil de uma Universidade Intercultural Indígena?
Tainara – O Brasil é imenso e tem tantas riquezas naturais e culturais. Mas num espaço tão próximo a gente se depara com diferenças de costumes e tradições em cada povo. Considero de extrema importância a criação de uma Universidade com temas voltados para as riquezas de conhecimentos tradicionais e valores existentes. Eu era criança lá na minha aldeia, em Aquidauana, e já ouvia de nossos líderes essas reivindicações e preocupações com o futuro. A verdade é que há o perigo sempre de haver uma erosão, um desaparecimento dessas riquezas culturais e naturais ao longo do tempo.
FMA – Quais as principais matérias ou temas para uma Universidade Intercultural Indígena dentro de sua formação profissional que é o setor agrícola?
Tainara – Como eu disse: nossos líderes já sonhavam com uma universidade indígena, pois sempre acreditaram que esta seria a forma de assegurar e preservar os conhecimentos medicinais e alimentares tradicionais, cultivar uma agricultura de forma sustentável sem agressão ao meio ambiente, e na sociologia buscar a interculturalidade dos povos indígenas. O que aprendi na vida acadêmica e no cultivo agrícola, meus antepassados já conheciam de forma empírica, acompanhando e se direcionando com a natureza.

FMA – Como você combina sua vida de mulher indígena e seu trabalho profissional no meio de tantas tecnologias modernas?
Tainara – Na vida acadêmica obtive conhecimentos técnicos e científicos para buscar ganhos de produtividades, lidar com o manejo da terra e dos recursos naturais e saber absorver o entendimento do avanço de novas tecnologias. Assim se faz a agricultura moderna. Mas também aprendi que precisamos ter uma vida saudável e isso só acontece quando buscarmos produzir de forma sustentável e sem agressões à natureza.
FMA – Não deve ter sido fácil deixar sua aldeia, sua família e seus costumes para se embrenhar numa cidade grande e entrar na competição de uma universidade normal…
Tainara – Olha, não foi nada fácil mesmo. Outras crianças de minha aldeia desistiram. Mas sempre tive na cabeça o que os nossos líderes falavam. Eles diziam que nós crianças tínhamos que nos preparar. Senti muita dificuldade no primeiro ano de universidade, pois estava distante do convívio familiar e de minha comunidade. No meu tempo de faculdade muitos desistiram. Na aldeia aprendemos muito no convívio com a família e aprendemos a fortalecer nossas tradições. Quando saímos da aldeia percebemos grandes diferenças e uma concorrência para a qual não fomos preparados.
FMA – Pretende fazer algum curso de especialização?
Tainara – Pretendo sim. Sempre entendi que em nossa vida profissional precisamos buscar aprender mais e aprimorar nossos conhecimentos técnicos, bem como os conhecimentos tradicionais do meu Povo. Este é o equilíbrio que buscamos no nosso trabalho. Aprender o novo sem desprezar os saberes de nossos avós.
Como forma de aprimoramento, atualmente estou fazendo especialização em “Gestão de Projetos” na Anhanguera/Uniderp de Campo Grande – MS e “Líderança Empreendedor no Agronegócio” na USP – São Paulo. A mensagem que deixo para os novos universitários é que não desistam, irão aparecer várias barreiras, basta enfrentá-las que conseguirão a vitória.
FMA – Uma mensagem para os novos universitários indígenas ou não.
Tainara – Mensagem? Olha, em primeiro lugar não deixar de conhecer cada um a sua história, cada um tem que saber de suas raízes. Isso é fundamental.
Esses valores vão enriquecer o nosso saber e vão nos dar mais força e amplitude à nossa vida. Indistintamente somos todos brasileiros e precisamos caminhar juntos para a construção do nosso futuro e de nosso País.
Na aldeia aprendemos muito no convívio com a família como fortalecer sempre nossas tradições e quando saímos da aldeia percebemos grandes diferenças e uma concorrência para a qual não fomos preparados.