Série Expedição Parnaíba Vivo - I

Gilbués, o deserto vermelho

25 de junho de 2014

A gilbuerização, uma paisagem agressiva, domina o alto curso dos rios Gurguéia e Uruçuí Vermelho, no sudoeste do Piauí.

"A partir da confluência do rio Água Quente com o Lontras, o curso d’água passa a denominar-se Parnaíba. Região de fronteiras entre quatro estados: o Piauí, Maranhão, Tocantins e Bahia."

 

Geraldo Gentil Vieira

 

 

Gilbués parece o dorso de uma mão aberta queimada, avermelhada, com crostas e saliências. As grandes erosões e voçorocas parecem escorrer entre os dedos. 
 
 
 
 
Chegamos à imensidão das chapadas, uma forma de relevo peculiar à região Nordeste. Chapadões verde-escuros ou cinza a se perderem de vista, com as escarpas típicas dos tabuleiros em desníveis abruptos como se fossem bordas de forros de mesa, as “cuestas”, também chamadas pelos sulistas recém-chegados de “costaneiras”.
Nesses paredões nidificam as araras azuis e uma vasta fauna de aves. Do alto também avista-se muitas bocas de cavernas. E o pior: as chapadas desmatadas como colchas de retalhos, a Serra Vermelha não fica longe, um horizonte de destruição desafia sua flora e fauna únicas. 
O comandante avisa: “Eis a chapada das Mangabeiras”. É uma formação geológica e orográfica de grande beleza. Um dos seus contrafortes é a serra da Tabatinga onde nasce o rio Parnaíba, visto ao longe, espelhando a luz do sol. 
 
A partir da confluência do rio Água Quente com o Lontras, o curso d’água passa a denominar-se Parnaíba. Região de fronteiras entre quatro estados, o Piauí, Maranhão, Tocantins e Bahia. Mais um pouco, avistamos os rios Uruçuí Vermelho e o Gurguéia. O Uruçuí Vermelho, o nome já diz, corre sinuoso e nervoso por entre áreas desertificadas, passando ao largo da cidade de Gilbués. Mais abaixo corre o Uruçuí Preto, bem maior, com cerca de 280 km, desaguando no remanso do lago de Boa Esperança.
Gilbués hoje é matéria de relatórios, estudos, levantamentos, mapas e livros, mas raros projetos foram implantados para conter o processo de desertificação.
Ocorre que a desertificação no Brasil não passa da polêmica pura e simples, e o problema em vez de ser enfrentado na origem, é tema para reuniões e estudos acadêmicos com baixa participação das comunidades locais. Vista de cima, a região de Gilbués, Monte Alegre do Piauí, Barreiras do Piauí e outros quinze municípios, parece o dorso de uma mão aberta queimada, avermelhada, com crostas e saliências, as grandes erosões e voçorocas escorrendo entre os dedos.  
A degradação está sempre crescendo e se agravando. Essa paisagem agressiva domina o alto curso dos rios Gurguéia e Uruçuí Vermelho, na região sudoeste do Piauí. Em meio a isto, é praticada uma agricultura de subsistência “cultivo no toco”, com níveis baixíssimos de produtividade.
É este o processo de desertificação de origem geológica, não climático, agravado pelo homem, que eu denomino gilbuerização. O que fazer? Conviver com o fenômeno, não combatê-lo: disseminar a agroecologia, culturas anuais em meio às árvores, o sistema “Barraginhas” da Embrapa. 
Trabalhar com as comunidades, as escolas, educação ambiental. Plantar árvores frutíferas ou não, do cerrado e da caatinga, é região de transição de biomas. Plantar espécies de leguminosas como leucena, algaroba, guandu, etc, e gramíneas como os capins buffell, braquiária e outros, além de xerófilas e exóticas como tamargueiras diversas do gênero Tamarix e Atriplex. Viveiros e mais viveiros, em parceria com os pequenos agricultores. E semear de avião pelos ares nos grandes horizontes, e a lanço pelos agricultores. Até a arquitetura de adobe deve ser incentivada.