EXPEDIÇÃO LANGSDORFF - PARTE 9

EXPEDIÇÃO DIVIDIDA, PROBLEMAS EM DOBRO

25 de julho de 2014

Os motivos que levaram Langsdorff a dividir a expedição em dois grupos


VATICÍNIO ?

“Para uma pessoa preocupada com o bem-estar comum e com o progresso da civilização, assistir a tanto descaso é de cortar o coração. A cada passo que dou, eu penso: ‘Meu Deus, como essa terra poderia ser rica, se não fosse tão mal administrada!”.

Dos diários de Langsdorff – 1828


“Prospecto da Villa de Bom Jesus de Cuyabá”. 

Ilustração provável de José Joaquim Freire, durante a expedição de Alexandre Rodrigues Pereira. Década de 1790.
 
 
Georg Heinrich von Langsdorff não explica no diário sua decisão de dividir a expedição em dois grupos, mas é a solução que encontra para manter o genial Taunay como ilustrador e ao mesmo tempo se livrar de sua impertinência. Langsdorff e o grupo maior de cerca de 30 pessoas, incluindo Florence e Rubtsov, seguiriam pelos rios Preto, Arinos, Juruena e Tapajós, até alcançar o Amazonas. De Santarém, deveriam subir o Amazonas até a barra do Rio Negro. O grupo menor, sob a responsabilidade de Riedel e acompanhado por Taunay, desceria o rio Guaporé e seguiria até o Forte de São José, no encontro do Negro com o Amazonas. O rio Guaporé é afluente do Mamoré, que após receber o rio Beni que vem dos lados do Peru, transforma-se no rio Madeira e vai desaguar no Amazonas, não muito longe da barra do Rio Negro. Os dois grupos se reuniriam no Lugar da Barra, como era conhecido o local onde hoje está a cidade de Manaus.
Nas orientações passadas a Riedel, está clara a permanência de Taunay como participante da expedição: “Tente conseguir que ele seja de boa vontade e aplicado, e desse modo possa organizar a vida dele. Talvez consiga isso melhor do que eu, porquanto mais adiante ele terá menos distração do que aqui. Se ele não o ajudar em nada, eu o autorizo a despedi-lo”.
Na carta, aconselha Riedel a evitar a Vila Bela de Mato Grosso, hoje Vila Bela da Santíssima Trindade, por causa das febres e a um período de espera na Vila de Borba, às margens do rio Madeira. No dia 21 de novembro de 1827, Riedel e Taunay deixam Cuiabá em direção à Vila de Diamantino. Aliviado do controle artístico imposto pela presença do cônsul, Taunay libera sua genialidade até então contida nos limites da ilustração científica. Pena que o processo logo seria interrompido.
 
 
Cabana de Bororos. Vê-se à direita o ‘jirau’, nome indígena de espécie de estrado alto de madeira, onde se guardam os mantimentos, protegendo-os dos xerimbabos (animais domésticos de estimação). Taunay, 1827.
 
Interior de uma oca dos índios Bororos. 
Adrien Taunay, 1827.
 
Vista da aldeia dos índios Bororo, chamada Pau-Seco, situada a 7 léguas do Paraguai e em seu lado esquerdo, no caminho de Vila Maria a Vila Bela de Mato Grosso”. 
Taunay, 1827.
 
Índios Bororo na volta de uma caçada. 
Adrien Taunay, 1827.
 
Reunião dos índios Bororos no acampamento chamado de Pau-Seco. Estão atentos ao relato de um deles de uma luta contra uma onça”. Adrien Taunay, 1827.
 
“Alguns Bororos fazem uma visita aos Srs. Riedel e Taunay na casa que ocupam perto de sua aldeia”. Taunay, de costas e Riedel, na rede, recebem os visitantes.  Taunay, 1827. 
 
Índios Bororo na entrada da casa dos Srs. Riedel e Taunay”. Taunay, Aldeia de Pau-Seco, 1827.
 
“Homme et Femme Bororos”. Adrien Taunay, 1827.
 
 
 
DE CUIABÁ PARA DIAMANTINO
Os motivos que levaram Langsdorff a dividir a expedição em dois grupos
 
“No caso do Brasil, eu esperava convencer
as autoridades das melhorias que sugeri,
pelo menos em gratidão ao meu interesse
e em respeito à minha idade avançada.
Mas os meus esforços acabaram
redundando em nada”
 
E no dia 5 de dezembro, o grupo maior liderado por Langsdorff parte também para a Vila de Nossa Senhora da Conceição do Alto Paraguai Diamantino. Natterer, aquele cientista que Langsdorff chorara inutilmente a morte, está presente na despedida do cônsul.
Em Coxipó, a adesão de “Antônio Fernandes Pinto, uma pessoa que já fez 3 vezes a viagem pelo Arinos e se ofereceu como marinheiro” é bem recebida. Em Baús, um fazendeiro abastado o recebe, interessado em ‘suas curas milagrosas’.
Ao comentar sobre as condições lastimáveis do caminho de Cuiabá para Diamantino, Langsdorff sintetiza uma situação que parece longe do seu final: “Para uma pessoa preocupada com o bem-estar comum e com o progresso da civilização, assistir a tanto descaso é de cortar o coração. A cada passo que dou, eu penso: ‘Meu Deus, como essa terra poderia ser rica, se não fosse tão mal administrada!”.
Como alertara o Presidente da Província sobre a precariedade do caminho e da disposição do magistrado de Diamantino em melhorá-lo, desabafa: “No caso do Brasil, eu esperava convencer as autoridades das melhorias que sugeri, pelo menos em gratidão ao meu interesse e em respeito à minha idade avançada. Mas os meus esforços acabaram redundando em nada”.
 
Em onze de dezembro, Florence se emociona com a atenção de uma beldade, “bela moça de 15 primaveras, que ali via correr desconhecidos os seus mais formosos dias. Estava ausente o dono do sitio Campo dos Veados, mas isso não impediu sua mulher de receber-nos com toda a franqueza, simples e digna. Essa simplicidade rústica brindou-nos com o máximo de descanso.  Aformoseiam este recanto matas de guaguaçus, a altiva e imponente palmeira, cujas folhas se volvem para o céu e não se curvam para a terra.  Dir-se-á que Deus, às vezes, se compraz em estabelecer um concurso de harmonias que fazem sonhar com a felicidade. Este sítio, estas pradarias, este ar, estas palmeiras, as fontes do Paraguai, que nasce a um quarto de légua, e sintetizando todos os encantos a moça da casa, a mais bela jovem que vi até hoje. Que experiência de belezas, quanta elevação do pensamento!…  
No dia seguinte, depois do almoço, terminada a excursão que empreendera com o objetivo de desenhar uma nova planta, disso resultando o retardamento de minha refeição, fazia-a sozinho, sentado num banco, quando Isabel veio postar-se colada à porta de seu quarto, que dá para a varanda. ‘vai agora para o Pará’, disse-me ela, ‘e sinto que jamais retornará’. Aperta-se-me o coração, aproximo-me dela e nossas mãos se tocam vivamente. ‘Minha mãe chega’ diz-me ela e, com efeito, sua mãe e sua irmã entram na varanda”. 
 
 

“O Paraguai a duas léguas de Sete Lagoas”, em ilustração de Florence.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

AS CABECEIRAS DO RIO PARAGUAI

As belezas do Ribeirão das  Pedras de Amolar

Logo, outra maravilha da natureza concorreria com as emoções despertadas pela formosa mato-grossense. Florence explora as nascentes do rio Paraguai e assim as descreve: “Atravessamos matos de guaguaçus no meio dos quais serpeia o ribeirão Pedra de Amolar. Recebe, não longe daí, outro tão estreito que para transpô-lo dei um pulo, mas que tem já o nome de Paraguaizinho e vem das Sete Lagoas, chamadas cabeceiras do Paraguai e distantes meia légua quando muito. Com mais razão caberia aquela denominação ao ribeirão das Pedras de Amolar, que corre de umas quatro léguas de distância e tem maior cabedal de águas, mas, enfim, depois da junção com o Paraguaizinho, aparece já o pomposo e célebre nome de Paraguai. Tão perto de nós achavam-se as Sete Lagoas que não tivemos mão do desejo de vê-las. Tomando à esquerda, em menos de uma hora chegamos a um terreno alagadiço, onde se vêem aqui e acolá, alguns banhados e pés de buritis. (…) Ali se acham as cabeceiras do Paraguai”.

Langsdorff é menos romântico:As unhas dos dedos da mão, principalmente a do polegar nos homens, são enormes, que eles exibem com orgulho, pois são uma prova de que eles não fazem nenhum trabalho braçal”.
A vila é cortada pelo ribeirão do Ouro que deságua no córrego Diamantino, topônimos que indicam o motivo de sua fundação. Florence e o cônsul ocupam uma casa “no quarteirão da colina Sul, entre o ribeirão do Ouro e o Diamantino, e nos relacionamos logo com todos os vizinhos que formam quase uma única família, a dos Pais Leme”.
 
 
Diamantino: entre a paixão pelo jogo e pela cata de diamantes
A jogatina é geral e o depoimento é de Florence: “Ociosamente vivem os habitantes de Diamantino do que lhes trazem seus pretos ou daquilo que acham quando assistem aos trabalhos, e não pensam senão em satisfazer a paixão dominante, que é o jogo. Todos os dias se reúnem, ou numa ou noutra casa, e ali jogam desde manhã até a meia-noite, uma hora da madrugada ou até o dia seguinte. (…) Catar diamantes é a indústria do lugar, o que de fato teria grande importância se as minas fossem inesgotáveis; parece, entretanto, que o distrito começa a depaupera-se”. 
 
 

“Plano da capital de Villa Bella do Mato groço  […]  Cujo plano se levantou no anno d’1777, por direção do Govor  e Capam  General daquella Capta  a mais Ocidental do Brazil, Luis d’Albuqe  d’Mello Pra  e Cáceres”. A criação da Vila era garantia de posse da região estabelecida pelo Tratado de Madrid, em 1750.

 

 

 

 

A expedição está confusa e o futuro uma incógnita

No outro grupo, Riedel ignora o conselho e chega com sua pequena trupe no dia 18 de dezembro em Vila Bela da Santíssima Trindade. Ele e Taunay são instalados no antigo palácio usado pelo governo, antes da sede ser transferida para Cuiabá. Em carta para seus irmãos no Rio, Taunay escreve em 18 de dezembro: “Amigos, é de uma das salas do abandonado palácio dos antigos capitães-generais de Mato Grosso que vos dirijo estas linhas, dessas imensas salas, testemunhas outrora das festas de uma corte assídua junto aos depositários da autoridade real, e que agora, silenciosas, não repetem senão o surdo ruído do inseto que rói a madeira ou os passos do curioso que percorre seus recintos. (…) Estamos acomodados, eu e Riedel, no recinto do palácio à espera que se esvazie a casa que nos fora destinada. Uma das portas, que dão acesso para o interior, abre sobre o pátio. Por aí é que entrei. Nada tinha sido aberto. Havia, pois, um cheiro de bafio que, unido à escuridão, produzia sensação eminentemente triste: a de um herdeiro que vem tomar posse da morada de seus antepassados. (…) O cônsul deve estar prestes a partir. Julgo, entretanto, que talvez não possa descer este ano, caso em que voltaremos também para Cuiabá. Não sei o que acontecerá então: demorar-nos-emos ainda um ano por cá ou seguiremos o Araguaia até ao Pará? A expedição está tão confusa que impossível é fazer conjecturas sobre seu futuro…”.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O belo Taunay, em autorretrato que esbanja sensualidade e em 
pose formal para seu pai, o pintor Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830).
 
 
Instalado no palácio desativado e decadente, “onde tudo reproduz a imagem da morte”, na carta para os irmãos, recheada de trágica premonição, Taunay expõe toda sua fragilidade emocional: “Quantas coisas eu tenho a dizer-lhes! (…) Que vocês possam desfrutar a felicidade que meu coração deseja e não se esqueçam que eu sou infeliz. Sou a personificação da melancolia, embora emoldurado pelos sinais externos da alegria.”
 
 

‘Indienne de Xiquitos’, na missão de São Rafael.
Talvez a última ilustração de Adrien Taunay.
 
 
 
 
 
 
 
 

“Prospecto da Povoação de Cazal Vasco, situada no Rio dos Barbados, 7 legoas ao Sul de Villa Bella”. Ilustração provável de José Joaquim Freire, na expedição de Alexandre Rodrigues Pereira.
Início da década de 1790.
 
 
A TRAGÉDIA NO RIO GUAPORÉ
 
“Alcanço o porto de Guaporé, sem encontrar meu amigo, supondo, porém,
abrigado em algum rancho arredado da estrada.
Numa canoinha, passo o rio, não sem perigo, porque as águas
iam se avolumando e chego, às 4 horas da tarde,
a Mato Grosso, onde me comunicaram a fatal notícia”
 
Em 30 de dezembro de 1827, Riedel e Taunay decidem visitar o presídio de Casalvasco, próximo da fronteira com a Bolívia. Visitam São Luiz e Salinas, os extremos do território brasileiro naquelas paragens.  Na volta, a impaciência e o excesso de autoconfiança provocam a tentativa de travessia do Guaporé a nado e Aimé-Adrien Taunay consterna a todos, até os nossos dias, com sua morte prematura e evitável. Riedel escreve imediatamente ao cônsul, mas protela até o dia 10 de março a carta devastadora para os familiares de Adrien:
“(…) Deixamos Casalvasco na manhã de cinco de janeiro para voltarmos à cidade. Vosso irmão, meu infortunado amigo, que não podia se afazer em acompanhar nossa resumida e lenta caravana, tomou a dianteira e daí a pouco o perdi de vista. (…) Alcanço o porto de Guaporé, sem encontrar meu amigo, supondo, porém, abrigado em algum rancho arredado da estrada. Numa canoinha, passo o rio, não sem perigo, porque as águas iam se avolumando e chego, às 4 horas da tarde, a Mato Grosso, onde me comunicaram a fatal notícia. Duvidei dar-lhe crédito, mas daí a pouco trouxeram-me o cavalo que ele montava – triste prova da verdade! Corro ao porto; acho várias pessoas empenhadas em procurar o corpo … debalde! Pois as águas turvas e carregadas de lodo tornavam a pesquisa inútil.  A uma légua da cidade perdeu-se Adrien; atravessou duas vezes o rio Alegre e entrou num canavial, onde uma negra lhe ensinou uma vereda que, por matos e pântanos, levava às margens do Guaporé, defronte da cidade, uns 300 passos acima da porto. Chegando ali, viu uma lavadeira e pediu que fosse avisar o ‘passador’.
A trovoada roncava com força e caía chuva a cântaros. Adrien impacienta-se, prende a rédea ao animal recomendando-o à lavadeira, toca-o para a água. A mulher avisa-o do perigo, mostra o barqueiro que vem chegando. Nada, porém, o desvia da funesta intenção; atira-se a nado; chega ao meio do rio; perde as forças; luta; dá um grito; levanta um braço e, vítima da excessiva temeridade, desaparece no momento em que chegava a canoa. Infelizmente o ‘passador’ não sabia mergulhar. As autoridades fizeram todas as diligências para achar o corpo.                                                                                                  
 No dia seis de janeiro, mais de 15 pessoas se ocuparam nesse triste mister. Entretanto, na madrugada de oito, vieram-me avisar que tinha sido descoberto. Corro. Chego… Vejo-o estendido na margem mutilado pelos peixes… Lanço-me sobre ele… Poupai-me esses pormenores! Nesse mesmo dia foi sepultado com a pompa devida à sua pessoa e família na igreja de Santo Antônio, que se ergue junto ao porto, encravada num frondoso e extenso laranjal. No mesmo dia nove celebraram-se cerimônias religiosas, conforme o costume do país (…)”.  
 
 
Langsdorff é comunicado do desastre
Taunay ainda não completara 25 anos. Ao receber a notícia, Langsdorff escreve em seu diário:
“Uma notícia muito dolorosa para mim, embora eu tivesse muitos e muitos motivos justos para estar descontente com o comportamento do falecido. Taunay tinha muitos talentos natos: era um verdadeiro artista, um gênio em todos os sentidos; tinha a imaginação aguçada, talento para música, mecânica, mas ao mesmo tempo era de uma imprudência e audácia sem limites. Graças à sua grande facilidade para desenhar, à sua imaginação fértil e à sua displicência, ele esboçava croquis que só ele e ninguém mais era capaz de finalizar. Por isso, eu, às vezes, o advertia amistosamente. Quando ele realmente queria trabalhar, o que era raro, ele conseguia produzir mais em uma hora que qualquer outro artista em meio dia. A genialidade de seu talento se revelava na sua capacidade de representar graficamente o que via sem precisar fazer correções no desenho, nem limpar o pincel. Ele se tornou pintor praticamente sozinho, sem ter estudado para isso, mas gostava muito de ler e tinha uma memória muito aguçada, o que estava diretamente relacionado com o seu grande potencial imaginativo. Ele conseguiu retratar de memória, e com muita fidelidade, seu pai e seu irmão. Pintou também o imperador D. Pedro I e fez caricaturas fidelíssimas de pessoas com traços marcantes de fisionomia, que ele só vira uma ou duas vezes na rua, de passagem”.
 
O acontecido é assim descrito por Florence: “14 de fevereiro de 1828. Dia nefasto, dia marcado pela mais cruel notícia. Comunicou-nos uma carta do Sr. Riedel que o Sr. Taunay se afogara no rio Guaporé, em Vila Bela. Encheu-nos de consternação esta desgraça. Diversos habitantes da vila vieram dar-nos os pêsames. Este moço, dotado de brilhantes disposições para a pintura e membro de distintíssima família, tinha por certo diante de si auspiciosa carreira. Prematura morte arrebatou-o aos 25 anos, às belas-artes e à família, cuja dor deve ser imensa. Com 16 anos apenas, fizera a volta do mundo na expedição do Sr. de Freycinet. Na qualidade de desenhista de nossa Comissão, remetera para São Petersburgo perto de 100 desenhos, ficando mais 130 em minhas mãos para serem coordenados”.

 

Segundo Pedro Corrêa do Lago, autor de diversos livros sobre história, arte e iconografia, poucos artistas tiveram sua reputação tão ampliada pelas descobertas dos últimos 50 anos como Aimé-Adrien Taunay. As aquarelas dos índios Bororo como esta ‘CHANT NOCTURNE DES INDIENS BORORÓS’ (Dezembro, 1827) são comoventes e atestam seu extraordinário talento.

 

FAMÍLIA TAUNAY: ARTISTAS E ESCRITORES

A dor da perda do caçula dos Taunay dilacera a família e seu pai morreria inconformado pouco tempo depois, no começo de 1830, na França. Seu sobrinho, o escritor Alfredo d’Escragnolle Taunay (1843-1899), filho do irmão de Adrien, o também artista  Félix Émile Taunay  (França, 1795 – Rio de Janeiro, 1881) e de Gabriela Hermínia Robert d’Escragnolle (?? – ??), também de origem francesa, nasceria 15 anos depois do fatídico episódio. 

Alfredo Taunay sintetiza em um de seus livros a dimensão da tristeza familiar ao recordar os comentários de Félix Emile sobre a morte de Adrien, quando se referia aos tristes lugares de Vila Bela, à beira do rio Guaporé, “testemunhas de um desastre, cuja recordação não mais se lhe apagara do espírito. Na verdade, cinquenta anos, cheios das maiores peripécias, já eram passados, e, entretanto, meu pai contava ainda, com lágrimas nos olhos e tremor na voz, o sinistro que, a 5 de janeiro de 1828, ocorrera nas águas revoltas do rio Guaporé, à vista de Vila Bela, arrebatando à existência seu irmão mais moço, Amado Adriano Taunay, em pleno desabrochar do mais precoce e admirável talento, de que soubera dar as provas mais brilhantes e prometedoras. E, incidentemente, levado pela misteriosa sedução dos lugares muito e muito apartados, no centro de terras longínquas e nas brumas de distâncias imensas, me falava ele nessa Vila Bela, no palácio em ruínas dos antigos onipotentes capitães-generais, nos afrescos que o adornavam, nos painéis que encerrava, reproduzindo trechos inteiros de cartas do audacioso e tão chorado viajante”.

 


 

Próxima edição:
Mas a expedição e a vida têm de continuar. Na edição 254, em agosto, o velho cônsul Langsdorff enfrenta seus próprios demônios.