Pedido de Natal
19 de dezembro de 2014Os sapatos inúteis na janela de quem não andará
“Um homem, — era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço no Nazareno, —
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,
Quis transportar ao verso doce e ameno
As sensações da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.
Escolheu o soneto… A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.
E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
“Mudaria o Natal ou mudei eu?”
A verdade é esta mesma. Entra ano e sai ano, tudo muda. O país, o mundo, a sociedade, eu… você… e até o Natal!
Mas tenho ainda um triste lembrar. É do poeta mineiro de Ubá, Ascânio Lopes [*1906 – +1929), que tuberculoso, aos 22 anos, deixou sua desesperança num poema comovente:
O Natal do Tuberculoso
Eu pensei que Papai Noel passasse por aqui
e pus na janela do quarto meus sapatos inúteis
de doente que não mais andará.
Depois rezei. Uma oração feita por mim,
entrecortada pelo arfar do peito e pela tosse rouca.
Pedi uma morte mansa suave
o coração parando, sem aflição, sem dor.
Lá fora os sinos da Missa do Galo
acompanhando minha morte lenta.
E aqui dentro ninguém… o silêncio… o descanso… o mistério…
Mas Papai Noel passou sem nada me dar.
achou decerto enormes meus sapatos…
Quantas pessoas, meu Deus, colocam suas angústias, seus desencantos, suas tristezas, seus sofrimentos e suas lágrimas nos sapatos inúteis de doente, que não mais andará, na escura janela do quarto?
E eu feliz – como, creio eu, o amigo leitor também.
Todos nós felizes entre a família e amigos, com os sapatos repletos de sorrisos e saúde, esperando ainda mais presentes e mais bênçãos de um bom viver.
Não posso nunca reclamar da vida. Tudo, tudo que eu fizer para agradecer aos Céus, ainda é pouco.
Tempo de Natal é tempo também de dizer:
– OBRIGADO, SENHOR!