NATURALISTAS VIAJANTES

CAMINHOS QUE SE CRUZAM – Parte 3

2 de março de 2017

Freyreiss, Eschwege e Marlière

 

ESCHWEGE E O ESPINHAÇO
 
O naturalista José Vieira Couto (1752-1827) já havia reconhecido o importante papel da serra. Em 1801, explicava: “Toda superfície da capitania de Minas Gerais é composta de continuados montes e serrotes, mas entre todos eles sobreleva-se muito mais esta dita serra, a qual eu lhe chamo a ‘Grande Serra’, como a mais principal e que corta toda capitania de sul a norte. Esta mesma serra pela sua cumeada, sempre encadeada, vai dividindo as águas da mesma capitania em duas principais: em águas de Leste, que vão todas ao Rio Doce e em águas do Poente, que vão todas ao Rio São Francisco”.
 
Serra do Espinhaço, vista de Lapinha da Serra, foi batizada em 1822 Wilhelm Ludwig von Eschwege,  numa referência explícita à sua pequena variação longitudinal, entre 50 e 100 km, 
 
 
A Serra do Espinhaço, considerada por alguns geólogos a única cordilheira brasileira, tem seu nome associado definitivamente ao do Barão von Eschwege, que a batizou em 1822 numa referência explícita à sua pequena variação longitudinal, entre 50 e 100 km. Eschwege a define não somente como divisor de águas, mas a identifica como importante limite geológico, biológico e geográfico e inclui a Serra da Mantiqueira, antiga Serra do Jaguamimbaba, e a serra de Paranapiacaba como extensões do Espinhaço, que assim atingiria o Rio Grande do Sul. 
 
Em carta de 1º de junho de 1822, Eschwege escreve a José Bonifácio: “Nada vi que se pudesse comparar ao Brasil e decidi-me a escrever um ‘Prospecto Geognóstico do Brasil’, que prometo remeter com o primeiro navio”. A publicação teve tradução integral para o francês e resumo de poucas páginas em português, sob o curioso título de ‘Bosquejo Geognóstico do Brasil’. 
 
Pela primeira vez, são batizados os dois grandes divisores de águas: um de direção aproximada leste-oeste, que separa as bacias do Paraná e Paraguai da bacia Amazônica e é chamada por Eschwege de ‘Serra das Vertentes’. O outro, que separa a bacia do São Francisco dos rios Doce, Jequitinhonha, Pardo, rio de Contas, Paraguaçu, Itapicuru, Vaza-Barris, etc. que correm diretamente para o Oceano Atlântico, recebe do geólogo o nome de ‘Serra do Espinhaço’. Batismos competentes, pois ambas as denominações se fazem presentes em nossos mapas atuais. 
 
 
CONTORNOS DEFINITIVOS DA SERRA DO ESPINHAÇO
 
O geógrafo e geólogo americano Orville Adalbert Derby é responsável por fornecer os contornos definitivos à Serra do Espinhaço. Nascido em 1851 nos EUA, Derby participa na década de 1870 da Expedição Morgan à Amazônia e, após o doutorado na Universidade de Cornell, transfere-se de vez para o Museu Nacional do Rio de Janeiro. Posteriormente chefia a Comissão Geográfica e Geológica do Estado de São Paulo, instituição que dá origem ao Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP. 
 
 
 
 
 
Orville Adalbert Derby
 
 
É também responsável, com Francisco de Paula Ramos de Azevedo e Albert Loefgren, pela fundação do primeiro jardim botânico ou Horto Botânico de São Paulo em 1896, atual Horto Florestal, situado no sopé da Serra da Cantareira, e pela publicação dos primeiros mapas geológicos do Brasil. 
 
 
 
 
Parque Estadual Albert Loefgren, em São Paulo, no sopé da Serra da Cantareira.
 
 
 
O Dr. Orville Derby era um homem solitário e os hotéis eram sua residência. Debilitado emocionalmente pela solidão e por uma tentativa malograda de trabalhar para o Governo do Estado da Bahia, ele retorna ao Rio de Janeiro e morre por decisão própria aos 64 anos. Faleceu num luxuoso quarto do Hotel dos Estrangeiros, no dia 27 de novembro de 1915. Aliás, poucos meses após tornar-se cidadão brasileiro e dois meses após o assassinato do político gaúcho José Gomes Pinheiro Machado, no saguão do mesmo hotel. Está enterrado no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.
 
 
EXTENSÃO DA CORDILHEIRA DO ESPINHAÇO
 
 
 
 
Na grande curva de Cabrobó, nas bordas do estado de Pernambuco, o São Francisco, após contornar o Espinhaço, altera seu curso de Nordeste para Sudeste, precipita-se na Cachoeira de Paulo Afonso.
 
 
 
Em 1906, Derby restringe a extensão da Serra do Espinhaço ao segmento entre Ouro Branco e Juazeiro (BA). Praticamente é a margem oriental do rio São Francisco. Hoje considera-se a Serra das Cambotas, perto de Barão de Cocais, a terminação sul da Cordilheira do Espinhaço. É uma grande espinha dorsal de mais de 1200 km que segue quase sem interrupção até a divisa da Bahia com Pernambuco. Na grande curva de Cabrobó, nas bordas do estado de Pernambuco, o São Francisco, após contornar o Espinhaço, altera seu curso de Nordeste para Sudeste, precipita-se na Cachoeira de Paulo Afonso, banha a linda cidade histórica de Penedo, nas Alagoas e se entrega ao Oceano Atlântico na pequena Piaçabuçu, retribuindo em beleza os desrespeitos sofridos em seu curso de quase três mil quilômetros.
 
 
 
 
 
O Pico do Itambé. Por Tom Alves.
 
 
PRÓXIMA EDIÇÃO 277 em ABRIL  – PARTE 4
 
As serras de Minas e a sociedade do bom senso – O Espinhaço são todas estas montanhas e serras popularmente conhecidos como Serra da Moeda, Serra da Gandarela, Serra do Caraça, Serra da Piedade, Serra do Curral, Serra dos Alves, Serra do Cipó, Chapada Diamantina, Serra dos Cristais, Serra de Ouro Branco e Serra Geral. E todas elas cada vez mais vulneráveis ao apetite voraz das mineradoras e das plantações de eucaliptos.
 
 
 
 
 
 

Serra do Espinhaço, vista de Lapinha da Serra, foi batizada em 1822 Wilhelm Ludwig von Eschwege,  numa referência explícita à sua pequena variação longitudinal, entre 50 e 100 km,