CAVALOS-MARINHOS DO BRASIL
O projeto que luta para salvar os cavalos-marinhos do brasil
5 de junho de 2017Como nascem, vivem e sobrevivem os cavalos-marinhos no Brasil.
O cavalo-marinho (Hippocampus) é um peixe ósseo, da família Syngnathidae. Existem 32 espécies diferentes de cavalos-marinhos nos mares de regiões de clima tropical e temperado. Todas as espécies são consideradas vulneráveis por órgãos de proteção à natureza.
COMO NASCEM OS CAVALOS MARINHOS?
Os cavalos-marinhos, assim como todos os peixes da Família Syngnathidae, são os únicos representantes do reino animal onde os machos ficam grávidos. Para isso, a fêmea transfere os ovos que produz para a bolsa incubadora do macho, onde são fecundados e…, está grávido! O tempo de gestação depende da temperatura da água e deve durar entre 12 e 21 dias. Nascem então os alevinos perfeitamente formados. Cada macho adulto pode incubar em sua bolsa uma média de700 embriões, que ao nascerem são completamente independentes dos pais até para comer. No Projeto Hippocampus já foram registrados de 120 até 1.610 cavalinhos em uma única “barriga”.
O QUE COMEM?
Os cavalos-marinhos são carnívoros, tanto em ambiente natural como em cativeiro comem muito e sempre seu alimento deve ser constituído por presas vivas, em geral animais microscópicos: rotíferos, copépodas e náuplios de crustáceos em geral, pós-larvas de camarão marinho e alevinos de outros peixinhos.
ONDE VIVEM?
No Brasil, os cavalos-marinhos habitam regiões estuarinas e águas costeiras de norte a sul, incluindo manguezais. Eles são animais de baixa mobilidade e podem ser encontrados com muita facilidade na maré baixa, agarrados às raízes dos mangues. Os manguezais têm uma importância ímpar na vida marinha, pois são os verdadeiros berçários da fauna dos mares.
QUANTAS ESPÉCIES EXISTEM?
No mundo todo existem cerca de 50 espécies e no Brasil temos somente três: Hippocampus reidi, o cavalo-marinho do focinho longo, Hippocampus erectus, o cavalo-marinho raiado e Hippocampus patagonicus, o cavalo-marinho do focinho curto. Os Hippocampus, que são fontes de pesquisa no PROJETO HIPPOCAMPUS, em Porto de Galinhas, Pernambuco, apresentam as mais variadas cores e tonalidades. Isso é explicado pelo fator genético, pois seus cromossomos carregam genes para expressar várias cores. Também o ambiente onde vivem determina muito as cores destes animais que costumam se confundir com algas e pedras para driblar seus predadores. Já fechamos o ciclo de vida de H. reidi e H. erectus (reprodução em cativeiro, com cultivo dos recém-nascidos até atingirem a idade adulta e a primeira reprodução).
É ALIMENTO AFRODISÍACO?
A Tradicional Medicina Chinesa é a prática popular que diz que os cavalos-marinhos são bons para saúde humana, para curar desde unha encravada, até câncer e doenças respiratórias, entre outras.
É aí que está o perigo, porque atraídos por estas artimanhas farmacêuticas e pela fama de curadores, os cavalos-marinhos são caçados aos montes e vendidos como peças secas nos mercados pesqueiros por míseros R$ 10,00, a unidade. Evidente que além do comércio para remédios e simpatias, têm um outro comércio forte: peixes ornamentais para aquários. No exterior existem empresas fazendo o cultivo de cavalos-marinhos para venda como peixes ornamentais, prática mais adequada à conservação dos estoques naturais.
Aliado ao comércio desenfreado, existe uma outra grande preocupação: a degradação do ambiente, a poluição das áreas costeiras, o aterramento de manguezais, a pesca predatória, tudo isso levou a espécie a entrar na lista dos animais ameaçados de extinção da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza) e no Brasil, na lista do MMA (Ministério do Meio Ambiente do Brasil).
O QUE É O HIPPOCAMPUS?
Quem explica é a bióloga Rosana Beatriz Silveira que coordena o Projeto Hippocampus desde 1995, vinda do Rio Grande do Sul. O projeto estuda a biologia dos cavalos-marinhos brasileiros em laboratório e em ambientes naturais para confecção de programas de manejo e revigoramento populacional para as espécies, atuando ativamente na conservação das espécies. Há 17 anos, desde março de 2001, esse projeto foi transferido para o município de Ipojuca, em Pernambuco, e tem sua sede em Porto de Galinhas.
MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA
Rosana Beatriz Silveira deixa três lembretes importantes para quem quiser ajudar os cavalos-marinhos:
1 – Não comercialize, não compre e não use cavalos-marinhos como remédio ou como decoração, pelo menos até que este animal sai da lista de espécies ameaçadas. Para uma experiência “pet” em aquários marinhos procure um criador autorizado.
2 – Ajude a conservar as águas estuarinas, os manguezais e os mares, não permita que joguem lixo em nosso bem maior: a natureza, de onde retiramos nosso sustento.
3 – Não retire estes animais de seus habitats.
Lara Vidon e Carolina Sant'Anna são duas biólogas pesquisadoras que mergulham e trabalham no mar do Rio de Janeiro e de Porto de Galinhas para estudar os cavalos-marinhos.
CAVALOS-MARINHOS DO BRASIL
ROSANA BEATRIZ SILVEIRA – Entrevista
Doutora em Zoologia pela PUC-RS e mestre em Biologia Animal pela UFRGS, Rosana Silveira, dedica toda a sua vida de estudos aos cavalos-marinhos do Brasil. Nesta entrevista, Rosana fala sobre o Projeto Hippocampus, que nasceu em 1994, pioneiro no estudo do cavalos-marinhos e também na conservação, educação ambiental e inclusão social proporcionadas há 23 anos.
Rosana Silveira: “Estamos lutando muito pela confecção de leis específicas que protejam e regulamentem a pesca de cavalos-marinhos no Brasil”.
Guardem este nome: Rosana Beatriz Silveira. Ela é mãe, defensora, pesquisadora e guardiã de um dos mais belos peixes da costa brasileira: os cavalos-marinhos. A paixão extrema e a dedicação da bióloga Rosana Silveira para com os cavalos-marinhos fez com que ela se mudasse até de Estado. Nascida no Rio Grande do Sul, formada em biologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rosana foi parar em Pernambuco. Mais precisamente, na belíssima praia de Porto de Galinhas. Toda essa paixão começou em 1994, quando Rosana fundou o Labaquac e criou o Projeto Hippocampus. Um dia, ao fazer um trabalho de revisão bibliográfica de literatura científica e de divulgação para compor o acervo do laboratório de cavalos-marinhos, ela levou um susto: o abandono total da espécie. O susto acabou por nortear seu trabalho: esses peixes estavam ameaçados de extinção e, mesmo assim, eram muito procurados para decoração e para medicação. Rosana não teve dúvida: passou a se dedicar inteiramente ao estudo dos cavalos-marinhos. Eles precisavam ser salvos. Doutora em Zoologia pela PUC-RS e mestre em Biologia Animal pela UFRGS, Rosana Silveira, dedica toda a sua vida de estudos aos cavalos-marinhos do Brasil. E responde à entrevista:
Folha do Meio – Como foi implantar o projeto no Rio Grande do Sul e depois transferi-lo para Porto de Galinhas?
Rosana – O Projeto Hippocampus nasceu em 1994, juntamente com o Laboratório de Aquicultura Marinha-Labaquac, em Porto Alegre. Ao ingressar com bolsa de aperfeiçoamento no Laboratório de Ictiologia da UFRGS, oficializou-se o primeiro trabalho científico do Labaquac. Após, o mestrado em Biologia Animal com dissertação sobre o “Desenvolvimento ontogenético de Hippocampus reidi Ginsburg 1933, em laboratório” e, na sequência, o doutorado: “Dinâmica populacional do cavalo-marinhos Hippocampus reidi no manguezal de Maracaípe, Ipojuca, PE” tornou os Hippocampus uma marca registrada em nosso trabalho. Depois disso, desenvolvemos outros vários trabalhos, dando origem às publicações científicas e de divulgação. Nossas publicações iniciais referiam-se a dados de laboratório, não possuíamos naquela época, nenhum registro em ambientes naturais. E aqui em Porto de Galinhas, com o apoio da prefeitura de Ipojuca (2001-2003; 2016) e da Petrobras (2008-2015), tivemos a possibilidade de fazer esses registros naturais em Pernambuco e em vários estados brasileiros.
FMA – Por que a transferência?
Rosana – Simples, os trabalhos do Projeto Hippocampus começaram a ganhar reconhecimento pelas publicações do Labaquac. Uma matéria feita pela revista Época, em 1998, lançou nosso trabalho ao conhecimento do Brasil. Foi quando aconteceu o convite para o Projeto se estabelecer em Ipojuca, Pernambuco. Mais precisamente em Porto de Galinhas. Este convite partiu da Prefeitura Municipal do Ipojuca, por meio da Secretaria do Desenvolvimento Econômico, Turismo e Meio Ambiente e o motivo foi a preocupação com a drástica redução dos cavalos-marinhos no Pontal de Maracaípe. Essa praia tem relevância turística para o município, pois é visitada por turistas do mundo inteiro. E um dos principais objetivos dos turistas é, justamente, estar próximo à natureza exuberante de nosso País.
FMA – O projeto Hippocampus ainda continua no sul?
Rosana – A sede do Projeto, agora, está em Porto de Galinhas, porém, desenvolvemos trabalhos de pesquisa no Sul, Sudeste e Nordeste (RS, SC, PR, RJ, BA, PE, CE e PI).
FMA – Tem outros projetos de pesquisa semelhantes em alguma outra parte do Brasil?
Rosana – O Projeto Hippocampus é pioneiro no estudo do cavalos-marinhos no Brasil. Como projeto de conservação, educação ambiental e inclusão social (apoiamos projetos de geração de renda às comunidades) ele é único. Existem pesquisadores individuais de singnatídeos que realizam importante contribuição científica (família do cavalo-marinho), mas é do meu conhecimento que nenhum deles dedica-se exclusivamente ao estudo dos cavalos-marinhos brasileiros.
FMA – Qual o futuro do Projeto Hippocampus?
Rosana – Crescer e servir. Um dos principais objetivos de nosso estudo é fornecer dados para a formulação de políticas públicas, através de um programa de manejo para as espécies brasileiras de cavalos-marinhos, que tornou-se possível após muitos anos de estudos de dinâmica populacional e biologia básica pelo litoral do Brasil e, ainda continua.
FMA – Quais as maiores dificuldades para a pesquisa?
Rosana – Atualmente, esbarramos no recurso financeiro e na manutenção de pessoal qualificado. Não é pouca coisa, para manter a estrutura que conquistamos com muito trabalho, necessitamos de apoio ao desenvolvimento das atividades, que são inúmeras. Além da pesquisa científica em campo e em laboratório, mantemos um espaço de exposição dos animais em cativeiro, onde recebemos escolas, universidades e turistas de todo o mundo. Cultivamos nossos próprios cavalos-marinhos e tudo o que é necessário para fazê-los crescer (fitoplâncton, zooplâncton, camarões).
As pesquisas científicas são feitas em campo e no laboratório do Hippocampus
FMA – Vale a pena entrar no cultivo industrial de cavalos-marinhos como existe, por exemplo, com camarões?
Rosana – Essa é uma boa questão. Sem dúvida! Pensamos que desta maneira, as populações naturais podem ser preservadas. A pesca e o comércio são intensos no mundo inteiro.
FMA – Tem algum país ou empresa que tem pesquisas mais avançadas sobre cavalos-marinhos?
Rosana – Sim, os Estados Unidos (Havaí) e China. Já existem empresas especializadas no cultivo para comércio, porém a demanda é maior que a oferta.
O projeto Hippocampus recebe visita diariamente de estudantes e turistas.
FMA – O Projeto Hippocampus tem alguma atuação na área social?
Rosana – Sim, possuímos um programa de educação ambiental, no qual recebemos a visitação de escolas, universidades e turistas nacionais e internacionais para exposição acerca da biologia dos cavalos-marinhos e a necessidade de conservação das espécies e do ambiente onde elas vivem. Também visitamos escolas e universidade fazendo palestras sobre este assunto. Por seis anos consecutivos formamos três grupos de geração de renda com mães das comunidades do entorno do Projeto: montamos uma sala de costura e artesanato para cada grupo (fornecemos as máquinas de costura reta, overloque, bordadeira, mesas, cadeiras e todos os insumos pertinentes), contratamos uma instrutora para ensinar as mães, não só a confecção, mas o cálculo dos preços de custo e venda, fazer as compras, colocar o produto no mercado, etc. Durante o primeiro ano, fornecemos uma verba para compra de materiais, após este prazo, a verba é cortada, e é hora de mostrar que o projeto deu certo!! Todo esse equipamento/material é doado às mães para que elas gerenciem suas atividades. Somos sempre o primeiro cliente a comprar dos grupos criados e até hoje, eles continuam a nos fornecer produtos.
FMA – Como está o projeto Hippocampus hoje?
Rosana – Estamos muito mudados da última vez que a FMA esteve conosco, crescemos muito, mudamos o local da sede em 2005 para o local atual (nesta foto), onde realizamos todas as atividades de pesquisa e educação como descritas anteriormente.
Trabalhamos com importantes parceiros, pesquisadores da UFPE, UFRPE, UEFS, UFSBA, UNESP, e com igualmente importantes Instituições governamentais como o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), SEMAS (Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de PE) e o INEA (Instituto Estadual do Ambiente do RJ). Nossa mais nova atividade diz respeito a um projeto que estamos desenvolvendo em toda a costa do estado do Rio de Janeiro com financiamento do FUNBIO (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade) e que levanta dados através de mergulhos de monitoramento buscando os cavalos-marinhos nos mares fluminenses e através do monitoramento da fauna acompanhante que ocorre nas pescas de emalhe e arrasto no mesmo Estado.
As escolas estão sempre levando os alunos para visitarem o Hippocampus e se conscientizarem com a importância da preservação dos cavalos-marinhos.
FMA – O que visa este estudo? E o apoio financeiro?
Rosana – Este estudo visa contribuir ao manejo sustentável dos cavalos-marinhos no RJ e tem sido uma experiência incrível, com resultados preliminares muito interessantes. O trabalho possui todo o apoio financeiro que necessita par seu desenvolvimento e conta com verbas de um TAC celebrado entre a Chevron e o Ministério Público Federal/PRRJ.
Porém, infelizmente, em Pernambuco, estamos atualmente sem um patrocínio fixo que possa sustentar nossas atividades/sede, e nossos únicos recursos são a renda da bilheteria que cobramos para visitação e venda de alguns produtos em nossa lojinha. O que não é suficiente para cobrir metade de nossos custos. Estamos lutando para realizar nosso trabalho, como fizemos a vida toda, mas agora é hora de pedir ajuda aos “Amigos do Hippocampus”, campanha lançada recentemente com o objetivo de promover e apoiar nossos trabalhos. Acesse nosso facebook: @projetohippocampus e veja a “Carta aos amigos do Hippocampus”.
Somos inscritos no CNEA (Cadastro Nacional das Entidades Ambientalistas) e somos membros IUCN.