Coluna do Meio

4 de julho de 2018

LIXO ZERO

 

 

 
Recentemente, a notícia de que a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou um projeto de lei¹ que proíbe canudos de plásticos na cidade do Rio de Janeiro, restringindo o fornecimento à canudos de papel biodegradáveis e/ou recicláveis chamou a atenção da população. Iniciou-se, assim, uma discussão por muitos ignorada, sobre a gestão dos resíduos sólidos no Brasil. 
 
A nova lei prevê multas em até R$ 3 mil a quem vier a descumpri-la, podendo este valor ser dobrado em caso de reincidência. O projeto altera uma lei vigente desde 2003, que obriga os estabelecimentos a oferecerem apenas canudos de plástico individual e hermeneuticamente embalados. A aprovação foi fruto do trabalho de uma ONG “Meu Rio”² que recolheu mais de 15 mil assinaturas para o fim dos canudos de plástico na cidade. Atualmente, o projeto aguarda apenas ser sancionado pelo Prefeito Marcelo Crivella.
 
Aproximadamente dez países no mundo já baniram totalmente a utilização de plástico no mundo³, sendo o Rio, a primeira cidade brasileira a iniciar a adoção de tal determinação. Coincidentemente, na mesma época que acontecia, em Brasília, o 1º Congresso Internacional Cidades Lixos Zero, organizado pelo Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB). O evento, realizado nos dias 5, 6 e 7 de junho deste ano, contou com a participação de representantes de todos os continentes para apresentar as melhores práticas e mais avançadas tecnologias em gerenciamento de resíduos sólidos, bem como governança de cidades que implementaram o programa “Zero Waste” e já apresentaram resultados consistentes, como, por exemplo, São Francisco, nos Estados Unidos.
 
Este programa, tem como objetivo traçar uma meta ética, econômica, eficiente e  para guiar as pessoas a um novo estilo de vida, ao incentivar os ciclos naturais sustentáveis, onde todos os materiais são projetados para permitir sua recuperação e uso pós-consumo⁴.
 
Sediado na capital, sabemos que o Brasil ainda esforça-se para implementar a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), Lei nº 12.305/10, que contém os instrumentos para permitir o avanço do País no enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado destes resíduos.
 
Conforme documento oficial do congresso⁵, o terceiro maior gasto dos municípios brasileiros é com lixo. A informação é de pesquisa recente da Ciclosoft, articulada pela organização Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), que, em 2016, analisou 1.055 municípios brasileiros, concluindo que a coleta seletiva está presente em apenas 18% destes. Mudando a metodologia de resíduos sólidos, o Brasil poderá deixar de perder anualmente R$ 120 bilhões de reais em produtos que poderiam ser reciclados.
 
Neste mesmo Congresso foi lançado o Projeto Amazônia Lixo Zero⁶, que tem como objetivo promover soluções para o desenvolvimento de um “cinturão” que que impeça que o lixo entre na região e conta com a aliança entre os Povos Internacionais e os Povos da Floresta pela volta do Lixo Zero. Os índios, segundo o coordenador do projeto, Guto de Lima, são os humanos que estão mais próximos daquilo que podemos entender como uma vida lixo zero. O ritual de celebração desta aliança foi conduzido pelos indígenas das etnias Yawanawa e Huni Kuin do Estado do Acre. “Colhemos aquilo que plantamos. Assim, proteger a floresta Amazônica não é apenas cuidar de plantas, animais selvagens e comunidades locais. É na verdade cuidar da Natureza que somos. É permitir que nós e as futuras gerações possam desfrutar da abundância da vida na Natureza”, garante Guto Lima”.
 
No último dia (7 de junho), os temas debatidos tiveram como foco, principalmente, a demonstração de como a mudança de consciência em relação ao lixo tem uma afetação socioeconômica. Um dos destaques foi para o reóleo, com Luiz Falcão, que entrou para o Livro dos Recordes (Guiness) ao reciclar até a data, 4 milhões de litros de óleo de cozinha, provenientes principalmente de restaurantes⁷.
 
A experiência das catadoras do Distrito Federal também mobilizou o público ao apresentar o lixo como instrumento de empoderamento feminino, ressaltando a visibilidade que fazer a diferença na reciclagem trouxe à essas mulheres como também  a prefeitura de Guarulhos, que mostrou uma redução nos gastos com tratamento de lixo na cidade de R$ 6 milhões de 2017 e 2018 com a mobilização da população, ações de educação ambiental e reforço de circuitos de coleta seletiva.
 
O conceito Lixo Zero, portanto, traça uma meta ética e econômica que pretende levar as pessoas a mudar seus modos de vida e incentivar os ciclos naturais sustentáveis, em que todos os materiais produzidos são projetados para permitir recuperação e uso pós-consumo, evitando a geração do lixo, que é uma mistura de resíduos recicláveis, orgânicos e rejeitos.
 
A responsabilidade de ser consciente é do indivíduo e de todas as organizações das quais ele faz parte: indústria, comércio, consumidor e governo. A importância da realização deste Congresso em Brasília não se deve apenas por esta ser a capital do país, mas por sediar dois exemplos de ações que decidiram abraçar essa mudança de paradigma.
 
A Ecovila Naval, localizada entre Gama e Santa Maria, no DF e a Superquadra 113 da Asa Sul⁸ são dois projetos iniciados no Distrito Federal que serviram de espelho, ao longo do Congresso, como modelos a serem seguidos na capital. Iniciado em 2010, a pretensão é que até 2020, a Eco Vila Naval seja a primeira Eco Vila Lixo Zero do país. Nas 2.016 casas que compõem o local, resíduos que seriam descartados e considerados lixo, transformam-se em fossas ecológicas criadas por meio de pneus ou entulho de obras. Essas fossas recebem tratamento de esgoto para que a água fique limpa. Grupos de moradores, em parceria com os alunos de Engenharia de Energia da UnB, criam, através de garrafas pets e tetra pak, placas de aquecimento solar que geram economia de energia elétrica em até 30%. O trabalho de conscientização envolve setores como o Serviço de Limpeza Urbana do DF e a Cooperativa de Catadores de Santa Maria. Além disso, o projeto oferece oficinas de compostagem e hora orgânica e os cursos de conscientização são abertos para toda a comunidade.
 
A superquadra 113 sul, de Brasília, Plano Piloto, adotou o conceito Lixo Zero, buscando informações perante o ILZB, eliminando as caçambas da quadra. Desde abril deste ano, todas as embalagens de vidro e plástico usadas nas casas de mais de 1,2 mil pessoas passaram a ser reaproveitadas ou enviadas às cooperativas de catadores. A próxima etapa é utilizar os resíduos orgânicos em espaços controlados de compostagem – um processo biológico de “reciclagem”.
 
Também na capital, a artista Maria Koijck construiu Dino, utilizando-se de garrafas pet, um dinossauro gigante, montado em frente a Catedral de Brasília. Ela foi uma das 27 convidadas internacionais do Congresso Cidades Lixo Zero e protestar, através da arte, contra a produção de plástico no mundo.
 
Com isso, o Brasil caminha para não apenas implementar sua Política Nacional de Resíduos Sólidos com efetividade, mas também para acompanhar a evolução dos demais países no combate à produção de resíduos, evitando a contaminação da biodiversidade (estima-se que atualmente haja mais de 150 milhões de toneladas de material plástico nos oceanos), e produzindo novas fontes de riquezas e geração de energia alternativa, através da reciclagem e reaproveitamento de tais resíduos.
 
 
 
 
 
 
1. Projeto de lei nº 1691/20, do Vareador Dr. Jairinho. http://mail.camara.rj.gov.br/APL/Legislativos/scpro1720.nsf/f6d54a9bf09ac233032579de006bfef6/832580830061f31883257eec0065c851?OpenDocument
 
2. http://www.riosemcanudo.meurio.org.br
 
3. Atualmente são mais de dez países que baniram o plástico, entre eles Índia, Bélgica, Costa Rica, França, Grenada, Indonésia, Noruega, Panamá, Santa Lúcia, Serra Leoa e Uruguai. O mais novo a adotar tais medidas é Taiwan. Fonte: https://marsemfim.com.br/paises-que-baniram-o-plastico/
 
4. https://www.cidadeslixozero.com.br
 
5. https://docs.wixstatic.com/ugd/e7831c_193b51200232477ca1c0898634a10b73.pdf
 
6. https://docs.wixstatic.com/ugd/e7831c_c063f27675254e1c94ddefb7b08469aa.pdf
 
7. https://docs.wixstatic.com/ugd/e7831c_2e8d007a4d1341a5bdd3539b2d3ec7be.pdf
 
8. https://docs.wixstatic.com/ugd/e7831c_48fbe0f6398d471ca03b1087a36f2c0c.pdf