Coluna do Meio

20 de agosto de 2018

Unidades de Conservação: breve reflexão sobre APA serra da tabatinga e desafios de implementação

 

 

O estabelecimento dessas áreas protegidas é uma das ferramentas mais utilizadas para a conservação da natureza, porém sua implementação tem enfrentado inúmeros desafios, das quais partes deles tem relação com a maneira pela qual essas áreas protegidas foram estabelecidas. Desafios de gestão, limitação de recursos humanos e financeiros também são relevantes nesse processo de estagnação e ineficácia das Unidades de Conservação, no geral.¹
 
No Brasil quando falamos desse assunto, percebemos que os desafios enfrentados para estabelecer essas áreas e implementa-las demanda superar diversos desafios.
 
Por isso, um ponto importante para se analisar é a situação atual das áreas protegidas no Brasil, pontuando esses desafios e levantando as dificuldades para implementá-las, uma vez que a maioria das unidades de conservação se tornam unidades de “papel”. Uma série de fatores influencia na avaliação da efetividade dessas áreas na proteção da biodiversidade, como: representatividade dos ecossistemas, extensão da área, o uso da terra e dos recursos naturais nas circunvizinhanças da unidade, a proteção dos processos ecológicos e a conectividade.²
 
Observarmos que as áreas de proteção ambiental (APAs), não tem tido uma boa reputação como importante para a conservação da biodiversidade, devido, ao seu baixo grau de implementação e, consequentemente, à sua ineficácia. Podemos dizer que há inúmeras APAs e PARNAs de “papel”, áreas protegidas oficialmente estabelecidas e não implementadas.³
 
Um trabalho realizado pelo Grupo de Pesquisa e Desenvolvimento Sustentável do UniCeub, levantou os dados atuais de todas as APAs do Brasil, e o resultado é assustador, visto que a maioria dessas áreas não contam nem mesmo com plano de manejo devidamente aprovado e encontram-se estagnadas desde seu decreto criador.⁴
 
A matéria tem caráter analítico-reflexivo e esperamos que as questões e problemas trazidos possam servir de reflexão para novas estratégias de atuação e que nosso país consiga se organizar na proteção da biodiversidade e no desenvolvimento sustentável através de chances reais de implantação e implementação de áreas protegidas. Deve-se cuidar com a seleção das áreas que são escolhidas para serem UC, para que sejam viáveis, uma vez que envolvem diversos fatores, como; áreas privadas, comunidades locais, direito à propriedade, áreas de grande biodiversidade, orçamento, capacitação, fiscalização, monitoramento, pesquisas locais, grande relevância econômica e ambiental, educação e consciência, turismo, exploração, fiscalização, recursos para a viabilidade das mesmas.
 
A área de proteção Serra da Tabatinga, foi criada pelo Decreto n. 99.278 de 6 de junho de 1990, situada nos Municípios do Alto Parnaíba – MA e Ponte Alta do Norte-TO, com o objetivo de: (i) conservar a fauna e a flora, e (ii) proteger as nascentes do Rio Parnaíba, de maneira a assegurar a qualidade das águas e as vazões de mananciais da região. A APA compreende a região do município de Mateiros (Tocantins), Alto Parnaíba (Maranhão) e Barreiras do Piauí (Piauí), com 61.000 ha. Essas áreas localizam-se na transição entre os climas úmidos equatoriais da Amazônia e os climas semi-áridos das depressões sertanejas do Nordeste, esses locais chegam a ficar de 8 a 9 meses na estação da seca.⁵
 
A vegetação  tem padrão savânico, ou seja, de cerrado, a cobertura vegetal pertence às formações florestais; estacionais, escleromórficas, semicaducifólias ou caducifólias. Possui um padrão fisionômico com duas características básicas: na porção superior da Serra da Tabatinga há extensas áreas de campo limpo e na parte inferior existe um ambiente bem mais úmido, com muitos brejos próximos as cabeceiras dos riachos e matas ciliares.   Nos interflúvios predomina o cerrado.⁶
 
O cerrado é uma das áreas mais importantes para as aves da América do Sul, com um total de 28 espécies endêmicas, das quais 5 espécies foram encontradas na área do presente estudo. Entre elas temos: Melanopareia torquata, Charitospiza eucosma e Porphyrospiza coerulescens, sendo as mesmas, comuns na parte superior da Serra da Tabatinga, onde existem extensas áreas de campos abertos.⁷
 
A ocupação demográfica na região é baixa com poucas famílias residindo na área e com grande parte das terras em estado de abandono ou devolutas, pertences aos Estados e a União.⁸
 
Na parte inferior da Serra da Tabatinga as terras são utilizadas principalmente como pastagens ou para a agricultura de subsistência, por conta da inviabilidade dos solos para agricultura comercial de grande escala, pois existem muitas áreas de brejos e extensas áreas alagáveis.⁹
 
Ocorre que, a APA Serra da Tabatinga foi recategorizada em 2002, a fim de compor o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba, tendo sua área de abrangência sido alterada e ampliada novamente em 2015.
 
O Parque Nacional Nascentes do Rio Parnaíba é o quarto parque nacional do Piauí. Sua criação atendeu às diversas demandas da sociedade do Piauí e Maranhão, interessados na preservação do rio. O mesmo possui cinco quedas d’agua, as quais temos: as cachoeiras do Murici, Pintado, Sussuapara, Urubu e Várzea Grande, originadas de rios diferentes.¹⁰
 
O que ficou de área remanescente é algo em torno de 15% somente, sendo que uma parte foi tomada pelo cultivo da soja e a outra foi inserida nos limites da área referente ao PARNA, sendo considerada, então, a menor APA do Brasil.¹¹
 
A carência financeira é percebida pelo surgimento desses “parques de papel” e, desta forma, tais unidades de conservação contribuem para diminuir o apelo para novas áreas mesmo sem cumprir seus objetivos de conservação e acabam por obstruir, em muitos casos, as áreas particulares inseridas em seus limites. Lembrando que conhecer e lidar com a questão fundiária é parte importante do estabelecimento e gestão eficaz de uma área protegida.¹²
 
O Brasil possui um enorme potencial de beleza turística dessas unidades para atrair, à essas regiões, a visitação e conseguir obter bons recursos financeiros, porém a dificuldade em implementar, fiscalizar e monitorar faz com que essas áreas não consigam se organizar, nem tampouco ter estrutura boa o suficiente para receber os visitantes. A região do Delta do Parnaíba possui uma beleza única e poderia ser muito mais explorada, respeitando os limites da unidade, atraindo investimentos e recursos para sua região, através do aumento de visitação.
 
A APA Serra da Tabatinga, não possui até o momento plano de manejo devidamente aprovado, nem conselho gestor ou quaisquer outros instrumentos de planejamento e gestão, conforme podemos ver pelo relatório disponibilizado pelo Cadastro de Unidades de Conservação do Ministério do Meio Ambiente.¹³ O PARNA Nascentes do Rio Parnaíba, também não possui até o momento plano de manejo devidamente aprovado.¹⁴   
 
Isto mostra, que muitas unidades de conservação no Brasil não possuem o plano de manejo e chegam a existir por mais de uma década sem qualquer documento de planejamento.¹⁵
 
Com a promulgação da Lei nº 13.090/2015, todas as áreas particulares inseridas no interior do PNNRP serão desapropriadas e indenizadas, assim os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados, envolvendo áreas inseridas dentro dos limites da unidade, perdem seus efeitos. Porém, até o momento nem o levantamento da cadeira dominial foi realizado. Há quanto tempo, o primeiro, decreto foi editado e até agora a área continua do jeito que está? A APA, desde 1990, e o PARNA, de 2002, com alterações em 2015, ou seja, vemos uma questão fundiária longe de se ter uma solução. 
 
Segundo informações obtidas junto ao responsável local, a Serra da Tabatinga foi praticamente extinta, existindo, no momento, somente “no papel”, uma vez que esta APA foi praticamente toda sobreposta a área do PARNA Nascentes do Rio Parnaíba e a área remanescente da APA, vem sendo fiscalizada pelos responsáveis do PARNA, conforme os motivos expostos.¹⁶
 
Portanto, percebe-se que as dificuldades têm sido de natureza financeira, em geral mais relacionadas com a implementação da unidade, que, também, condicionam as atividades de manejo, bem como as de natureza ecológica; como as situações ligadas as decisões de manejo e gestão de área.¹⁷
 

 

 

1. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006, pg.. 9.
 
2. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006, pg. 33
 
3. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006, pg. 34. 
 
4. Importante base de estudo, trabalho realizado no ano de 2017, com dados atuais de todas as APAs brasileiras. Este estudo estará disponível, em breve, na edição de um livro em 2018, sobre as APAS no Brasil. 
 
5. SANTOS, Marcos Pérsio Dantas. Composição da Avifauna nas Áreas de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga e Chapada das Mangabeiras, Brasil. Pg. 51. Disponível em: HTTP://repositorio.museu-goeldi.br/jspui/bitstream/123456789/661/1/B%20MPEG%20Zoo%2017%281%29%202001%20SANTOS.pdf Acesso em: fev/2018
 
6. SANTOS, Marcos Pérsio Dantas. Composição da Avifauna nas Áreas de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga e Chapada das Mangabeiras, Brasil. Pg. 52. Disponível em: HTTP://repositorio.museu-goeldi.br/jspui/bitstream/123456789/661/1/B%20MPEG%20Zoo%2017%281%29%202001%20SANTOS.pdf Acesso em: fev/2018
 
7. SANTOS, Marcos Pérsio Dantas. Composição da Avifauna nas Áreas de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga e Chapada das Mangabeiras, Brasil. Pg 53 Disponível em: HTTP://repositorio.museu-goeldi.br/jspui/bitstream/123456789/661/1/B%20MPEG%20Zoo%2017%281%29%202001%20SANTOS.pdf Acesso em: fev/2018
 
8. SANTOS, Marcos Pérsio Dantas. Composição da Avifauna nas Áreas de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga e Chapada das Mangabeiras, Brasil. Pg 53 Disponível em: HTTP://repositorio.museu-goeldi.br/jspui/bitstream/123456789/661/1/B%20MPEG%20Zoo%2017%281%29%202001%20SANTOS.pdf Acesso em: fev/2018
 
9. SANTOS, Marcos Pérsio Dantas. Composição da Avifauna nas Áreas de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga e Chapada das Mangabeiras, Brasil. Pg 53 Disponível em: HTTP://repositorio.museu-goeldi.br/jspui/bitstream/123456789/661/1/B%20MPEG%20Zoo%2017%281%29%202001%20SANTOS.pdf  Acesso em: fev/2018
 
10. Projeto (o) eco. Fundacação Grupo Boticário. Parque Nacional Nascentes do Rio Parnaíba. WikiParques. Dísponivel em: http://www.wikiparques.org/wiki/Parque_Nacional_das_Nascentes_do_Rio_Parna%c3%adba  Acesso: fev/2018
 
11. Informações enviadas via email e contato telefônico com o analista ambienta, Sr. Janeil, Chefe de Fogo do PARNA, responsável à época da gestão da APA da Tabatinga.
 
12. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006, pg. 50. 
 
13. MMA. CNUC. Unidade de Conservação: Área de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga. Relatório Pormenorizado.
 

http://sistemas.mma.gov.br/cnuc/index.php?ido=relatorioparametrizado.exibeRelatorio&relatorioPadrao=true&idUc=12     Acesso em: fev/2018
14. MMA. CNUC. Unidade de Conservação: Área de Proteção Ambiental Serra da Tabatinga. Relatório Pormenorizado. Disponível em: http://sistemas.mma.gov.br/cnuc/index.php?ido=relatorioparametrizado.exibeRelatorio&relatorioPadrao=true&idUc=12     Acesso em: fev/2018
 
15. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006pg.68
 
16. Informações enviadas via email e contato telefônico com o analista ambienta, Sr. Janeil, Chefe de Fogo do PARNA, responsável à época da gestão da APA da Tabatinga, em abril de 2017.
 
17. NURIT, Bensusan. Conservação da Biodiversidade: em áreas protegidas. Ed. FVG: Rio de Janeiro, 2006.pg. 49