Ex-parlamentar quer agência reguladora independente e atuante em todas as áreas: saneamento, outorga, manejo de águas pluviais, enfrentamento do desperdício, revisão tarifária, segurança hídrica e até na questão dos resíduos sólidos.
Advogado da União aposentado e professor universitário, o advogado Raimundo Ribeiro ingressou na vida política em 2006, sendo eleito deputado distrital pelo PSL – Partido Social Liberal. No governo Arruda, ocupou a Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania. Ribeiro foi fundador e primeiro secretário da pasta, permanecendo até 2008, quando reassumiu o mandato na CLDF. Em 2014, foi eleito novamente ao cargo de deputado distrital e ocupou a Primeira Secretaria da CLDF, desenvolvendo diversas ações administrativas e em seguida, assumiu a Terceira Secretaria da Casa. Natural de Piracuruca, no Piauí, Raimundo Ribeiro integra hoje o MDB, partido do governador Ibaneis Rocha, e acaba de assumir a diretoria da ADASA, como diretor.
FMA – A Adasa elaborou, na gestão passada, um Plano de Gestão Integrada de Recursos Hídricos do Distrito Federal, com horizonte até 2040, onde constam as obras necessárias para atender a demanda do DF.
Raimundo Ribeiro – Sim, conheço este plano que foi aprovado em junho de 2012 pelo Conselho de Recursos Hídricos do DF e era de conhecimento do governo Rollemberg. Se as obras recomendadas tivessem sido realizadas, na época indicada, não teríamos o racionamento.
FMA – Como agir para que essas obras não sejam postergadas?
Raimundo Ribeiro – Se a gente analisar bem, o governo Rollemberg conseguiu o que parecia impossível que foi implantar o primeiro racionamento de água na história do Distrito Federal. E, mesmo ciente do relatório aprovado na reunião do Conselho de Recursos Hídricos, em junho de 2012, desconsiderou as recomendações que alertava sobre a alta probabilidade de racionamento a partir de 2016, caso as três obras de captação recomendadas (Corumbá IV, do próprio lago Paranoá e do córrego Bananal) não fossem implantadas. Isso não depende só da Adasa, mas vamos unir esforços para conseguir que Brasília tenha segurança hídrica total.
FMA – Sim, houve uma audiência pública Câmara Legislativa em 2015…
Raimundo Ribeiro – Verdade. Em março de 2015, em audiência pública na Câmara sobre a situação hídrica, o que mais se ouviu dos especialistas foi um alerta sobre uma iminente crise de abastecimento no DF. Um ano depois a crise hídrica se instaurou no DF. A minha atuação será de, junto com a Diretoria Colegiada da Adasa e do quadro técnico, cobrar do GDF e da Caesb a execução das obras necessárias, na forma prevista no Contrato de Concessão, ao atendimento da demanda hídrica do Distrito Federal
FMA – Como será a sua atuação em situações quando o contrato de concessão, no caso do reajuste tarifário da Caesb, foi desrespeitado, tirando a segurança jurídica das decisões do órgão regulador?
Raimundo Ribeiro – Olha, a Adasa, em atendimento ao Contrato de Concessão, fez este reajuste tarifário que você citou no ano passado para a Caesb. Certo que o reajuste era necessário ao equilíbrio econômico-financeiro da concessão. A CLDF derrubou o aumento por decreto legislativo. Este fato nunca ocorreu antes desde que foram criadas, há vinte anos, as primeiras Agências Reguladoras. Aqui vale uma explicação.
As agências reguladoras foram criadas no Brasil com a missão, entre outras, de dar segurança jurídica aos contratos de concessão de serviços públicos, pois como são órgãos técnicos, com autonomia regulatória e sem subordinação hierárquica ao Executivo, têm a missão de dar cumprimento integral ao previsto no Contrato de Concessão firmado entre a concessionária e o órgão regulador. Isso dá a confiabilidade necessária para que o concessionário tenha o equilíbrio econômico e financeiro da concessão garantido. Evidente que o objetivo maior é que a sociedade receba um serviço seguro e de qualidade.
FMA – Mas como garantir esse serviço de qualidade?
Raimundo Ribeiro – Uma agência reguladora é um organismo de estado. Justamente para ter independência, seus dirigentes têm mandatos fixos, são previamente sabatinados pelo poder legislativo antes de tomarem posse, ratificando a qualificação do indicado pelo Poder Executivo. E se obrigam a cumprir a legislação pertinente ao ente regulado, entre elas a regulação econômica, que trata da fixação de tarifas apropriadas para a sustentabilidade da concessão dos serviços públicos concedidos. Vale lembrar que a tarefa do órgão regulador foi outorgada pelo legislativo, ao aprovar a legislação sobre o assunto, e, sancionado pelo poder executivo. Portanto, a partir daí, antes de se fazer qualquer reajuste tarifário, são feitas audiências públicas, coletadas sugestões da sociedade civil e da concessionária e, após estudos técnicos especializados, é definida a nova tarifa.
FMA – Interferências políticas então podem afetar a qualidade dos serviços…
Raimundo Ribeiro – A conclusão é essa mesmo. Por isto, a anulação de qualquer reajuste e revisão tarifária, que pode variar positivamente ou negativamente, tem forte impacto no equilíbrio econômico e financeiro da concessão. E pode afetar seriamente a qualidade dos serviços e a saúde financeira da empresa.
FMA – A Câmara Legislativa não tem o direito de analisar essas matérias?
Raimundo Ribeiro – Evidente que tem. A Câmara Legislativa é uma casa política e, como tal, tem o direito de analisar as matérias colocadas sob diversos aspectos, inclusive o político. Assim, cabe aos interessados – no caso o órgão regulador e a concessionária – recorrerem à própria CLDF para rever a sua decisão ou seguirem o caminho da Justiça. Assim é que funciona.
FMA – A Adasa regula os serviços de concessionárias importantes, como a Caesb e SLU – Serviço de Limpeza Urbana, cujo acionista majoritário é o GDF. A Adasa não tem um serviço jurídico próprio?
Raimundo Ribeiro – Sim, tem. O serviço jurídico da Adasa foi criado pela Lei 4385/2008, lei da Adasa, para atuar de forma independente do GDF, pois o ente regulador tem que ser neutro com as partes envolvidas, que formam o tripé da Regulação que é o governo, concessionária e consumidor. Acontece que a Associação dos Procuradores do Distrito Federal entrou no ano passado com uma ação para acabar com o serviço jurídico da Adasa. O serviço e as decisões jurídicas ficariam a cargo da Procuradoria. E por incrível que pareça, ganhou. Com isso, acabou a independência que toda agência reguladora requer.
FMA – Mas como advogado e ex-parlamentar como resolver essa situação?
Raimundo Ribeiro – Não é fácil. É bom lembrar a criação da Adasa teve origem como contrapartida de um empréstimo do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) ao GDF para aplicação dos recursos na Caesb e na proteção dos recursos hídricos do DF. O BID exigiu como contrapartida a criação de um ente regulador com plena autonomia e independência do executivo, para cumprir as funções de órgão regulador no DF, tanto que a minuta do PL que deu origem à Adasa foi analisada e discutido previamente com o BID, para posteriormente ser enviado para Câmara. Nas discussões, o BID deixou clara a intenção de só conceder o empréstimo, se as cláusulas pétreas de autonomia e independência, em relação ao executivo, fossem deixadas claras. O que aconteceu na Lei 3365/2004, que criou inicialmente a Adasa. O que preocupa é que qualquer mudança nessas cláusulas pétreas da contrapartida exigida pelo BID, coloca em risco operações financeiras do próprio GDF. Este é um desafio que vamos enfrentar e buscar uma solução.
FMA – O senhor quer dizer que a autonomia da Adasa corre risco.
Raimundo Ribeiro – Eu quero dizer que uma das características principais das agências reguladoras é a sua autonomia, que se dá no campo administrativo, financeiro e regulatório. É sua independência na tomada de decisões. Mas esta é uma situação que estamos vendo inclusive nas agências reguladoras federais.
FMA – Tem planos para a Adasa?
Raimundo Ribeiro – Tenho muitos planos. Temos muitas responsabilidades sobre a questão dos recursos hídricos no Brasil e em Brasília. Acabamos de sair de um racionamento. Estou estudando todas as questões para não errar. Temos a questão da tarifa, temos a questão do desperdício que não pode continuar nos níveis que está. Temos a questão do lixo, da coleta seletiva, enfim, água é o tema do momento aqui e no mundo inteiro. Não podemos esquecer, hoje, a complexidade do serviço público de drenagem e manejo de águas pluviais, de outorga e a grave questão do saneamento básico. O que a Adasa não pode ser é um departamento comum, subordinado ao governo. É uma agência, um ente regulador que tem que agir com independência.