Peixe-boi

Poluição da água supera caça como principal ameaça à extinção do peixe-boi marinho, diz especialista

29 de julho de 2019

Contaminação da costa por lixo, esgoto não tratado e combustível de embarcações contribuiu para que o animal fosse considerado extinto em três estados brasileiros.

 

 

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Poluição da água e degradação do habitat são ameaças de extinção ao peixe-boi
 
Extremamente simpáticos e carismáticos, os peixes-boi marinhos (Trichechus manatus) adoram o contato humano, mas foi essa docilidade um dos motivos pelos quais a caça predatória quase levou a espécie à extinção no século passado.
 
Embora a conscientização tenha superado esse problema, outra ação do homem mantém o peixe-boi na lista de animais em perigo de desaparecer, dessa vez de forma indireta: a poluição da água.
 
Especialistas estimam que o Brasil tenha entre 500 e mil peixes-boi marinhos ainda vivos nas costas do país. Há pelo menos 30 anos não há registros de caça ao peixe-boi, mas Pitágoras Viana Junior, coordenador de campo do Projeto Peixe-Boi na APA Costa de Corais, explica que cada vez mais ele perde seu habitat, atualmente a principal ameaça à conservação da espécie.
 
Segundo ele, essa perda acontece por causa da poluição industrial e de resíduos de residências, que afetam o peixe-boi diretamente, tanto clinicamente, com intoxicação, quanto indiretamente.
 
"O fato de frequentar águas poluídas enfraquece o seu sistema imunológico, o que causa infecções que podem vir a causar septicemia [infecção generalizada], matando o peixe-boi marinho", afirma Viana Junior.
 
Foi o que aconteceu com um filhote de peixe-boi encalhado em junho em Maceió, na época em que o Desafio Natureza do G1 visitou o projeto. A necropsia apontou septicemia como causa da morte.
 
 
 
Peixe-boi bebe água em cativeiro no rio Tatuamunha, no município de Porto de Pedras (AL) — Foto: Marcelo Brandt/G1
 
Peixe-boi bebe água em cativeiro no rio Tatuamunha, no município de Porto de Pedras (AL) — Foto: Marcelo Brandt/G1
 
 
 
 
Um animal é considerado "Em Perigo" (EP) quando as melhores evidências disponíveis indicam que ele corre risco muito alto de extinção na natureza, de acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), ligado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA).
 
Considerando a extensão da costa brasileira, o número de indivíduos da espécie é considerado muito pequeno.
 
 
Conservação da espécie
 
Historicamente, o peixe-boi marinho vivia em uma área da costa brasileira que começa no Espírito Santo e sobe ao norte até o Amapá. Mas, atualmente, ele já está extinto no Espírito Santo, Bahia e Sergipe.
 
Restam ao animal a faixa entre Alagoas e Amapá, mas com áreas de descontinuidade, nas quais não se encontram mais registros do animal (veja no mapa abaixo).
 
Esses locais são justamente os que apresentam índice maior de poluição da água, assoreamento dos rios e densidade populacional (onde a poluição piora), além de grande fluxo de embarcações, o que também contamina a água por causa do óleo de motor.

 

 

Estados de ocorrência do peixe-boi no Brasil — Foto: Rodrigo Sanches/G1

Estados de ocorrência do peixe-boi no Brasil — Foto: Rodrigo Sanches/G1
 
 
 
 
Alagoas é uma das áreas de ocorrência atual da espécie, graças ao trabalho da Área de Preservação Ambiental (APA) Costa dos Corais, do ICMBio, em Porto de Pedras, litoral norte do estado. Desde a década de 1980 a unidade realiza ações de resgate, monitoramento, reabilitação e soltura de peixes-boi ao longo do litoral do Nordeste do Brasil.
 
O primeiro sítio de soltura, e o único atualmente em atividade no Brasil, está localizado ali. O local foi escolhido porque Alagoas funciona como um corredor para conectar as populações da região Nordeste entre o sul da Bahia e o Ceará.
 
Desde 1994, o programa Peixe-boi resgatou e soltou 46 indivíduos.
 
 
Pitágoras Viana (de cinza), durante manejo de peixe-boi após resgate: trabalho já soltou 46 peixes-boi — Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação
 
Pitágoras Viana (de cinza), durante manejo de peixe-boi após resgate: trabalho já soltou 46 peixes-boi — Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação
 
 
 
O carisma dos peixes-boi
 
Um peixe-boi pode viver em torno de 60 anos, se as condições ambientais forem favoráveis, e pesar até 600 quilos. Seu tamanho o torna um belo atrativo turístico, especialmente incentivado por sua vontade de interagir com as pessoas. De acordo com especialistas, quando o peixe-boi é tocado, ele fica à espera de mais interação e corre o risco de encalhar na praia.
 
Isso é explicado ao turista pelos guias da Associação Peixe-boi, uma instituição de turismo de base comunitária fundada em Porto de Pedras em 2009.
 
Ali é possível fazer um passeio turístico de jangada no rio Tatuamunha e ver os peixes-boi que estão em cativeiro. A ideia é sensibilizar os visitantes e torná-los aliados na conservação da espécie.
 
No local, a reportagem do G1 conheceu a história de Assu e Netuno, dois peixes-boi que estão condenados a viver em cativeiro. Eles já foram soltos mais de uma vez, mas não se adaptaram ao habitat natural e foram recapturados.

 

 

Cativeiro de peixes-boi no rio Tatuamunha — Foto: Marcelo Brandt/G1

Cativeiro de peixes-boi no rio Tatuamunha — Foto: Marcelo Brandt/G1
 
 
 
Ações para reverter o quadro
 
A criação em cativeiro é uma das medidas do projeto para evitar novas quedas no número de indivíduos da espécie. Mas, segundo o coordenador do Projeto Peixe-Boi, é preciso conscientizar a população que, seja pela caça, pela poluição ou pela interação dos banhistas, tem representado os maiores perigos para a sobrevivência do Trichechus manatus.
 
"Com muita conscientização de que a espécie é importante tanto para o ambiente como para nós, dá tempo de reverter a extinção do peixe-boi", explicou o pesquisador, ressaltando que a educação ambiental nas escolas e o envolvimento das comunidades em ações de preservação são "essenciais" para que o objetivo seja atingido.
 
"Quanto mais a sociedade se sensibiliza e conhece a espécie, maiores as chances de ela não ser extinta", conclui Pitágoras.
 
 
 
Peixe-boi — Foto: Wagner Magalhães/G1
 
Peixe-boi — Foto: Wagner Magalhães/G1